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SONHOS uma questão de contingências

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1 
SONHOS: uma questão de contingências 
Renata Cristina Rodrigues Alves1 
 
 
Resumo: O comportamento de sonhar, para a Análise do Comportamento, está 
associado a eventos privados cujo acesso se dá através do relato verbal. O terapeuta 
pode utilizar o relato do cliente como forma de intervenção ou como instrumento para 
auto-observação por parte do cliente. O presente artigo apresenta uma revisão dessa 
temática na análise do comportamento utilizando-se de um caso clínico como exemplo. 
 
 
Palavras-chave: sonho, análise funcional, terapia comportamental. 
 
______________________________________________________________________ 
 
 
A análise dos sonhos é uma questão antiga na história da humanidade, sendo 
objeto de estudos místicos e até esotéricos. O filósofo Aristóteles (384 – 322 a.C.) 
afirmava que “sonhar é uma atividade mental normal durante o sono e que os sonhos 
são produzidos dos mesmos processos biológicos como a imaginação, o pensamento e a 
lembrança” (VANDENBERGHE; PITANGA, 2007, p. 240). Para o povo egípcio os 
sonhos faziam parte de um mundo sobrenatural e por isso vistos como mensagens 
divinas (SCHULZE, 1997 apud SILVA, 2000, p. 435). 
Na Psicologia, Sigmund Freud (1856-1939) pode ser considerado o autor 
mais famoso no contexto dessa temática. Dentro da abordagem psicanalítica, em sua 
obra “A interpretação dos sonhos”, de 1900, ele apresenta a primeira concepção sobre a 
estrutura e funcionamento da personalidade. A Psicanálise nesse contexto teria como 
função principal buscar a origem do “sintoma” do indivíduo, de origem inconsciente, o 
que poderia ser atingido através de vários métodos. Entre eles estariam interpretação de 
sonhos, atos falhos e associações livres. 
 
1
 Renata Alves é graduada em jornalismo (2003), pós-graduada em Gestão de Negócios (2006) e 
atualmente concluiu o 9º período de Psicologia no Centro Universitário Newton Paiva. 
 
2 
O relato de sonhos acontece usualmente pela concepção comum de que são 
causados por sentimentos e pensamentos. A interpretação dos sonhos não é 
exclusividade da Psicanálise. Terapeutas clínicos de diversas abordagens lidam 
constantemente com relatos de sonhos de seus clientes e podem utilizar-se deles ou não 
no contexto clínico de acordo com os objetivos terapêuticos. 
Para a Análise do Comportamento (AC) sonhar é um tipo de 
comportamento encoberto, como sentir, pensar e desejar. Isso significa dizer que eles 
não são acessíveis a uma observação direta, mas através de uma forma pública por 
comportamento verbal. Nesse contexto, eventos encobertos não podem ser entendidos 
como indícios de uma entidade mentalista, interna ao sujeito. Delitti (1993, p. 44) 
defende que o sonho é um comportamento manifesto que descreve outro 
comportamento, encoberto, e as relações entre esses dois tipos de comportamento 
precisam ser compreendidas funcionalmente. “O interesse do terapeuta comportamental 
não está no que o cliente sonha, mas em como o que ele sonha se relaciona com o seu 
repertório e seu contexto” (op. cit., 2000, p. 207). Isso significa considerar o sonho 
como um comportamento modelado por contingências, assim como os demais 
comportamentos que esse mesmo sujeito emite. 
A maneira como a pessoa reage ao contexto do sonho é resultado da sua 
história de aprendizagem nas suas vivências acordadas. Isso é importante 
para o clínico, porque comportamento modelado pelas contingências 
inevitavelmente traz informações sobre as contingências que o modelaram. 
(VANDENBERGHE; PITANGA, 2007, p. 243). 
 
Silva (2000, p. 442) afirma que Skinner (1974) relaciona o comportamento 
de sonhar com a privação. Por estar privado, o sonhador pode se empenhar em ver o 
objeto e esse comportamento tem como consequência uma frequência de respostas 
diretamente relacionadas ao grau de privação. Ou seja, quanto mais privado mais 
reforçador esse comportamento e maior a probabilidade de emissão do mesmo. Tais 
comportamentos serviriam de estímulos para o comportamento de sonhar. Para ter 
 
3 
acesso ao comportamento privado de sonhar é necessária a auto-observação e, na sua 
expressão pública, o sonho torna-se um exemplo de comportamento verbal. 
(GUILHARDI, 1994). 
 
CASO CLÍNICO 
 
Fátima2, 29 anos, solteira, um filho de seis anos. Mora em um barracão nos 
fundos da casa dos pais e passa muitas dificuldades financeiras, uma vez que afirma não 
ter ajuda de ninguém para cuidar do filho ou com as despesas da casa. Trabalha em um 
emprego que não gosta e está cursando universidade com o objetivo de crescer 
profissionalmente e poder dar uma vida melhor para o filho. Buscou terapia por motivo 
do término do namoro por parte do companheiro há quase dois meses. Após algumas 
sessões de terapia, Júlio1, seu ex-namorado, volta a procurar Fátima mantendo várias 
conversas pelo telefone. Em uma das sessões, a cliente afirma gostar do ex-namorado e 
querer reatar a relação, mas ao mesmo tempo deseja não gostar tanto dele. Fátima 
considera que ela e Júlio brigam demais e que ele talvez não seja o homem da sua vida 
por não possuir as características básicas que aprecia em um homem. Quanto maior o 
número de ligações por parte de Júlio, mais nervosismo Fátima passa a demonstrar nas 
sessões. A cliente afirma que quando estão juntos eles brigam muito e o ex-namorado 
deixa sua casa muito desorganizada. Apesar do desejo de retomar o namoro, Fátima 
afirma ter muito medo do retorno de Júlio para sua casa, porque acha que a relação não 
vai dar certo. A cliente disse que aceitaria voltar a namorá-lo, desde que fosse “fora da 
sua casa”. 
Duas sessões após Júlio ter voltado a ligar para Fátima, a cliente chega à 
sessão muito angustiada. Ela se queixa de ter tido um sonho muito ruim e que gostaria 
 
2
 Nomes fictícios. 
 
4 
que a terapeuta lhe dissesse o que significa. Fátima relatou que sonhou que estava em 
sua casa quando viu a figura de um capeta muito feio na sua cozinha. Ele a perseguia, 
tentava agarrar-lhe e ela desviava de seus braços rapidamente. Ela pedia insistentemente 
para que ele fosse embora, mas ele lhe afirmou que voltou pra ficar e a sensação que ela 
tinha é de que realmente ele já tinha estado na sua casa. Muito nervosa, ela relatava que 
queria realmente que ele fosse embora, mas não tinha forças para expulsá-lo. Fátima 
explicou para a terapeuta que ela tinha tido esse sonho há umas duas semanas e não sabe 
por que se lembrou dele naquele momento. 
Na perspectiva da Análise do Comportamento, a partir do sonho a terapeuta 
buscou compreender junto com a cliente porque ela resolveu relatar tal sonho naquela 
sessão e se havia alguma relação entre o sonho e seu atual momento de vida. A relação 
que foi estabelecida por Fátima entre o relato e seu contexto foi que mesmo ainda muito 
apaixonada por Júlio, ela tinha muito medo da relação dar errado e principalmente das 
brigas em casa voltarem o que era muito aversivo pra ela. Fátima associou a figura do 
capeta ao seu ex-namorado, não porque ele era ruim com ela. Como o capeta é uma 
figura que lhe causa medo, naquele momento ela sentia medo semelhante ao imaginar o 
namorado voltando pra casa dela. As cenas do capeta tentando agarrá-la foram 
relacionadas com as ligações de Júlio, tentando convencê-la a reatar o namoro e como 
ela ainda estava muito receosa e dava muitas desculpas para não voltar, pôde associar 
essas estratégias com o fato de no sonho ter conseguido escapar dos braços do capeta. 
É possível que os dados obtidos com o relato e a interpretação deste 
pudessem ser coletados de outra forma durante as sessões com essa cliente o que 
significadizer que a análise de sonhos não é um tipo de intervenção essencial para a 
Análise do Comportamento. Porém, o terapeuta da AC precisa ficar sensível a esse tipo 
de relato percebendo-o como uma possibilidade de conhecer seu cliente. Através do que 
 
5 
é dito ele pode, por exemplo, ter acesso a acontecimentos da história passada e atual do 
cliente, que sem o sonho poderiam demorar muito ou não aparecerem nas sessões. Na 
prática clínica, o terapeuta pode usar os sonhos relatados de três formas distintas: como 
instrumento de coleta de dados, para intervenção terapêutica e para se estimar 
funcionalmente os efeitos de tais relatos na terapia (DELITTI, 1993, p. 42; 
VANDENBERGHE & PITANGA, 2007, p. 242). De modo geral, a interpretação de 
sonhos junto ao cliente é uma oportunidade de promover o autoconhecimento por parte 
deste, principalmente para aqueles que tem um repertório de auto-observação baixo. 
Por estar privada a certo tempo dos reforçadores do ex-namorado, é possível 
compreender porque Fátima sonhou com o mesmo. Três fatos podem ter servido de 
estímulos para o comportamento de sonhar de Fátima: trabalhar somente esse tema nas 
sessões de terapia durante um mês, pensar no relacionamento durante várias horas por 
dia e ainda ter acesso aos telefonemas de Júlio. 
A partir do caso relatado pode-se perceber que dificilmente consegue-se 
interpretar um sonho sem o conhecimento da história de vida do sujeito. É improvável 
que os símbolos e significados disponíveis em livros de sonhos, por exemplo, sejam 
adequados a todas as pessoas. É preciso fazer o caminho inverso: os significados vão de 
encontro com a história de cada sujeito, sendo particulares, individuais. Isso pode ser 
observado na análise feita pela cliente, em que a interpretação dada é muito próxima ao 
contexto vivido por ela. A significação que é atribuída ao sonho vai depender também 
do repertório verbal do sujeito que o descreve uma vez que o comportamento de sonhar 
é muito distinto do comportamento de relatar um sonho. Quanto mais rico esse 
repertório, maior a probabilidade do terapeuta analisar funcionalmente junto ao sujeito 
aquilo que foi sonhado com as contingências da sua vida quando desperto. “Interpretar 
um sonho sem conhecer a história do cliente não é fazer uma análise funcional. Do 
 
6 
ponto de vista do behaviorismo radical, isso seria sem sentido” (GUILHARDI, 1994, p. 
14). 
 
 
REFERÊNCIAS 
 
 
DELITTI, M. O uso de encobertos na terapia comportamental. In: Temas em 
Psicologia. São Paulo: Editora Gráfica FCA, 1993, n. 2, p.41-46. 
 
 
______. Relato dos sonhos: como utilizá-los na prática da terapia comportamental. In: 
WIELENSKA, R. C. (org.). Sobre Comportamento e Cognição. Santo André: SET, 
2000, v. 6, cap. 24, p. 204-210. 
 
 
FREUD, Sigmund. A Interpretação dos Sonhos (segunda parte) e sobre os sonhos. Rio 
de Janeiro, Imago, 1972, v. 5, 773 p. 
 
 
GUILHARDI, H. J. Um modelo comportamental de análise dos sonhos. In: RANGÉ, B. 
(org.). Psicoterapia comportamental e cognitiva. Campinhas: Editora Psy, 1994, p. 257-
256. Disponível em: 
<http://www.alppsicologa.hpg.ig.com.br/MODELO_COMPORTAMENTAL_DE_AN
ALISE_DOS_SONHOS.pdf>. Acesso em: 12 out. 2010. 
 
 
SILVA, Francynete Melo e. Uma análise behaviorista radical dos sonhos. Psicologia: 
Reflexão e Crítica, 2000, v. 13, n. 3, p. 435-449. Disponível em: 
<http://www.scielo.br/pdf/prc/v13n3/v13n3a12.pdf>. Acesso em: 11 out. 2010. 
 
 
SKINNER, B. F. Contingencies of Reinforcement: a theoretical analysis. New York: 
Appleton Century Crofts, 1969, p. 255-262. 
 
 
VANDENBERGHE, L.; PITANGA, A. V. A análise dos sonhos nas terapias cognitivas 
e comportamentais. Estudos de Psicologia. Campinas, 2007, v. 24, n. 2, p. 239-246. 
Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/estpsi/v24n2/v24n2a10.pdf>. Acesso em: 11 
out. 2010.

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