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[Artigo] Itamar Freitas A Pedagogia da História de Fernand Braudel, São Paulo 1936

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A PEDAGOGIA DA HISTÓRIA DE FERNANDO BRAUDEL: SÃO PAULO, 1936 
Itamar Freitas1
PEPG-EHPS/PUC-SP e DHI-UFS 
Por que Braudel? 
“Braudel é o mais importante historiador do século XX”, escreve um dos seus 
estudiosos, o professor da Universidade Autônoma do México – UNAM, Carlos Antônio 
Aguirre Rojas. O especialista não economiza na argumentação. Fernando Braudel 
(1902/1985) foi premiado com vinte títulos de doutor onoris causa, ajudou a conceber 
três das mais prestigiadas instituições educacionais francesas: a Maison des Sciences de 
l’Homme, a Ecole de Hautes Etudes em Sciences Sociales, e a nova revista Annales,
Histoire, Sciences Sociales. Publicou, pelo menos, três obras de grande sucesso entre os 
historiadores que se transformaram em best-sellers: O Mediterrâneo e o mundo 
mediterrâneo na época de Felipe II (1972),2 Civilização material, economia e capitalismo:
séculos XV-XVIII (1979),3 e A identidade da França (1986/1987).4 Teve influência 
decisiva na formação de historiadores e cientistas sociais de renome, como Immanuel 
Vallerstein, Emmanuel Le Roy Ladurie e Marc Ferro; e suas obras são discutidas na 
América Latina, Japão, Rússia, Turquia, China, Estados unidos, Austrália, África e Europa. 
Justificando essa “ubiqüidade planetária” das heranças braudelianas, Carlos Rojas afirma: 
isso deve-se “tanto à dimensão universal dos problemas abordados em sua obra, como ao 
caráter radicalmente inovador das propostas de explicação e de solução desses mesmos 
problemas.” (Rojas, 2001, p. 17, grifos do autor). 
No Brasil, a escrita se repete. No entanto, bem mais que a contribuição braudeliana 
para a epistemologia da história – com a tríade conceitual: “tempo, duração e civilização” 
– é o seu papel de pedra angular conformação da escrita da história brasileira, sobretudo, 
na historiografia universitária paulista que é constantemente invocado. Ele foi professor de 
história da civilização no curso de história e geografia da Faculdade de Filosofia Ciências e 
Letras da Universidade de São Paulo, em 1935/1937 e juntamente com outros mestres 
1 Doutorando em História da Educação (PUC-SP) e mestre em História Social (UFRJ). E-mail: 
itamarfreitas@bol.com.br 
2 Foi transformado em edição de bolso em 1975. Foi a base de doze programas de televisão intitulados “O 
Mediterrâneo”. 
3 O livro de história mais vendido no mundo anglo-saxão, entre 1945 e 1985. 
4 Vendeu 250 mil exemplares. 
franceses teria introduzido a “preocupação com a orientação metodológica e com o rigor 
da análise documental, iniciando uma relação com temas da historiografia francesa, 
especialmente a dos Annales, vanguarda na época.” (Capelato, et. al., 1995, p. 18; cf. 
Paula, 1971, p. 424-471; e Arruda e Tengarrinha, 1999, p. 49). 
Claro que há controvérsias sobre o papel do professor francês na conformação da 
historiografia brasileira dos anos 1930, bem como dos resultados da apropriação da sua 
experiência pelos professores nativos. (cf. Miceli, 2001, p. 263; França, 1984, p. 155; 
Iglésias, 1991, p. 479). Óbvio que o Braudel de 1935 possuía apenas um esboço do seu 
Mediterrâneo e não imaginava o império que herdaria de Lucien Febre. Não esperava 
transformar-se naquele mandarin conhecido de muitos nos idos de 1960 (cf. L’Histoire,
1995, p. 78-79; Burke, 1992, p. 56-58).
O “legado” de Braudel para a historiografia brasileira bem merece uma monografia. 
Mas, não é desse tipo de debate que trato nessa comunicação. Interessa-me uma faceta do 
braudel pouco comentada:5 suas prescrições sobre a formação do professor de história para 
o ensino secundário. É a “pedagogia da história” anunciada por Braudel numa conferência 
proferida aos alunos do Instituto de Educação da Universidade de São Paulo – IEUSP que 
examinarei nos parágrafos seguintes. O texto fora publicado originalmente nos Arquivos
dessa instituição e, dezenove anos após a sua fala, reimpresso na Revista de História. Na 
opinião de um dos seus discípulos brasileiros, o professor Eurípedes Simões de Paula, era 
ainda um trabalho de “grande atualidade” em 1955. (cf. Braudel, 1955, p. 3n.). 
O Braudel é oportuno, sobretudo, porque a divulgação das suas experiências 
ocorreu no momento em que o “ensino regular” – tipo ginasial – consolidava-se frente ao 
“ensino de preparatórios.” (cf. Antunha, 1980). Entre 1931 e 1942, pode-se dizer, ganhou 
forma o que conhecemos, durante muitas décadas, como ensino secundário – seriado, 
simultâneo, com exames ao longo do curso, com finalidades e diploma independentes etc. 
E nesse processo de “consolidação”, a economia interna das várias disciplinas que o 
compunham nos anos 1930 muito tem a depor sobre o assunto.6
Certamente, não se pode, por hora, avaliar as implicações e condicionamentos 
existentes na relação entre finalidades-conteúdos-metodologias das disciplinas escolares e 
5 O Braudel professor não tem sido objeto freqüente por parte dos historiadores. Isso não causa estranheza, 
como também não surpreende a ausência de comentários sobre a “Pedagogia da história”. O próprio Carlos 
Rojas (2001), ao listar os cento e quarenta e quatro trabalhos individuais mais representativos sobre a obra e a 
figura de Braudel, produzidos em espanhol, inglês, português, francês e alemão, registra apenas uma 
publicação que referencia o tema em questão. 
6 A história também buscava a distinção metodológica nesse período. 
finalidaes-conteúdos-medotologias do ensino secundário. Mas, que é relevante por os olhos 
sobre o crescente movimento de “cientificização” das pedagogias “particulares” (relativas 
às disciplinas), verificáveis no âmbito da literatura educacional (cf. Lourenço Filho, 1998; 
Nagle, 2001, p. 339n.) e nos currículos dos cursos de formação de professor no Rio de 
Janeiro e em São Paulo (cf. Freitas, 2003), não restam dúvidas. O exame, portanto, da 
conferência “A pedagogia da História” de Fernando Braudel insere-se nessa problemática. 
O relato do professor francês é, assim, duplamente indiciário: ele trata da história ensinada 
no secundário francês dos anos 1920/1930 e também sobre a sua intenção de interferir na 
constituição de uma pedagogia da história à brasileira, partindo do interior dos recém-
criados cursos de formação docente em nível superior. 
Uma pedagogia francófila? 
O discurso de Braudel é um relato da sua experiência de quatorze anos como 
professor de história nas cidades de Constantine e Argel. Uma experiência que não se 
restringiu ao início da carreira. Nos anos 1960, ele produziu um manual para os alunos 
franceses que concluíam o liceu. Rojas constata que o didático Le monde actuel (1963) é
um trabalho “que esboça os principais contornos de uma teoria geral das civilizações e 
serve como premissa de explicação das principais curvas evolutivas da história da 
humanidade.” (Rojas, 2003, p. 11 e 74). Neste manual foram condensadas as grandes 
noções cunhadas ao longo de sua vida: os conceitos de civilização e de duração. Em 
Braudel, como se vê, o movimento entre a teoria da história stricto sensu e a pedagogia da 
história foi um exercício enriquecedor para ambos os lados do ofício. 
Mas, que teoria trazia na bagagem ao ocupar-se do ensino secundário na Argélia? 
Que teoria da história professava ao tomar conta da cadeira de história da civilização da 
USP? Provavelmente, toda a base da “escola metódica” que seria expurgada 
posteriormente nas obras de Marc Bloch – Apologie pour l’histoire ou métier d’historien – 
e do seu futuro orientador, Lucien Febvre – Combats pour l’histoire. Em outras palavras, 
Braudel era herdeiro da “dúvida metódica” codificada Charles Victor Langlois e Charles 
Seignobos (1898). Observem que tais “manifestos” por uma história nova ainda não 
existiam em 1936. Mas, Braudel já advertia nesse tempo aos futurosprofessores/historiadores.
Esquivo-me... de vos recomendar essa imparcialidade em que insistem mil vezes, como 
indispensável à nossa profissão e ao nosso ensino. Desde logo desagrada-me o termo: ser 
imparcial, em sentido restrito, é não tomar partido. Ora, é preciso que tomeis partido, em 
meio às dificuldades e controvérsias que são próprias do ofício, como também é mister que 
aceiteis vossas responsabilidades com vigor e mesmo com alegria. Na verdade, o que vos 
pedem, em nome da imparcialidade, é não tomar partido antes do conhecimento e do exame 
dos fatos, para vos decidirdes com inteira probidade, com toda lealdade. Direis então: ‘esta 
conclusão é provisória, frágil por tal motivo, ou, ainda, vejo as coisas assim, mas é possível 
outro caminho, que aqui está...’ (sic). 
Penetrais no passado com simpatia e serenidade. Mas, valia a pena vô-lo dizer: Terei o 
direito de supor, por um instante, que seja necessário vos recomendar a probidade, a 
serenidade, o escrúpulo, a simpatia para com seres e coisas do passado, e sem as quais não 
há professor ou intelectual digno deste nome? (Braudel, 1955, p. 4).
Outro ponto importante da sua teoria: não se duvida que a ciência da história seja 
útil, “pela própria forma com que ela se oferece, como especulação lícita e valiosa do 
espírito, em que também há utilidades de ordem intelectual.” Mas, como ciência “social” e, 
por isso, “incerta”, ela “se mantém fora da moral política como da moral religiosa.” (idem, 
p. 3-4). 
Esses três pontos – objetividade, utilidade e natureza epistemológica (social) – têm 
incidência direta na sua pedagogia da história. Por essa orientação, Braudel afirmará sem 
meias palavras que o professor, assim como historiador, precisa fazer escolhas em suas 
tarefas cotidianas, portanto julga – não pode chegar àquela imparcialidade olímpica 
(pregada por Ranke e/ou Langlois e Seignobos?); e que a finalidade do ensino de história, 
assim como da ciência da história, não é formar o cidadão, nem formar o cidadão ideal: 
“quando eficaz, a história forma um certo modo de ver, de julgar, uma certa maneira de 
ser, toda intelectual. E é só. Resta saber se essa formação convém a este ou aquele 
pragmatismo político.” (idem, p. 4). 
Essa finalidade7 está atrelada ao objetivo da pedagogia que é didatizar o 
conhecimento científico: “o problema pedagógico, ou melhor, o obstáculo pedagógico, 
sempre diferente e sempre o mesmo, (...) se resume na necessidade de tomar o pensamento 
em seu estado original para o comunicar, o tornar sensível, a quem vos ouve, com maior ou 
menor atenção”. (idem, p. 3). 
7 O tradutor grafa como “objetivo”. 
E qual história deveria ser comunicada ao aluno? Inicialmente, uma história que 
levasse em conta os lugares, os espaços, os cenários da ação.
Todo o acontecimento que tereis para contar tem um lugar no espaço e não se compreende 
fora de seu ambiente. São as árvores, as rochas, as costas, os rios de um país que trazem de 
seu passado o mais rico dos testemunhos. Numa época em que uma geografia inteligente 
nos proporciona os meios para indagar dessas coisas não deixeis de o fazer. Perguntai 
sempre onde se passaram os fatos que tereis de narrar, fixai-os ao solo. Com isso não 
perdereis tempo e trabalho. (idem, p. 8). 
Seria também uma história de temáticas e agentes vários, fundada sobre “células”, 
“grupos”, “classes sociais”, mas que não desprezasse a ação dos “grandes homens”. Eles, 
às vezes, definem o rumo da história. Aqui Braudel deixou vazar a crítica nada sutil a 
alguns franceses que concebiam o grande homem como um construto da sociedade. A 
crítica foi dirigida aos historiadores de maneira geral: como “raramente [os historiadores] 
são homens eminentes e a eles tocando a tarefa de os julgar [aos grandes homens], pela 
tendência com que se empresta aos outros a própria estatura, verifica-se uma obscura mas 
perpétua erosão do grande homem.” (idem p. 10). 
Há entre os grandes homens os que o são só na aparência, mas há também, creio eu, os que 
o são na realidade dos fatos. Entre ele toda uma escala de diferenças de estatura, cumprindo 
julgá-los pelas suas obras, ainda os mais pequenos dentre vós. Penso que seria para deplorar 
banir o grande homem das nossas palestras escolares. Neles encontro ensinamentos de 
tamanho valor! Por eles o despertar da inteligência toma consciência do que há além do 
caso individual, do humano, do social. Ao lado dos grandes homens que magníficas janelas 
abertas para as profundidades da vida! (idem, p. 10). 
Por fim, o método de ensino propriamente dito. Para “fazer reviver os grandes 
personagens” não serve a ação dramática do professor – o diálogo e o monólogo podem 
recair no cômico ou na deturpação da vida do grande homem devido à transposição dos 
traços da personalidade do professor. Braudel tem um “método próprio”, que depende 
muito da “colaboração do auditório.” Ele explica: 
Conto, com efeito, ao apresentar o personagem, que quem me ouça busque em sua vida, em 
suas recordações, essas coincidências, esses ecos, que são o sinal da reflexão, da 
inteligência, da cumplicidade com que se fala. Espero essa escala de imagens para dar um 
sopro de vida ao personagem que tento mostrar, e abandoná-lo a quem me ouve, como um 
ser que irá viver fora de mim, entre o público e eu. (...). 
Narro tão sumariamente quanto possível a vida do grande homem: nasceu em tal lugar, em 
tal dia, estudou... etc. (sic.). Mas, de quando em quando, tendo apanhá-lo num breve 
momento de sua vida, importante, e, se possível, grave, dramático, comovedor. Lanço-o 
então, como um pião. Haverá sinal que vos dirão se em vosso auditório, em vossa classe, 
esse pião gira ou não. Tereis sempre nas fisionomias, que vos defrontam indícios claros 
para saber se vossa manobra deu resultado: um sorriso, por vezes o riso franco, demonstram 
um auditório que se entrega ao conferencista. (idem, p. 11). 
Mas isso não diz tudo. É preciso deixar os alunos livres para julgarem os grandes 
homens. É fundamental saber narrar, não suprimir o suspense da história para manter vivo 
o interesse do aluno. E necessário narrar diacronicamente, mostrando a transformação no 
curso da história, na média duração, descrevendo e apontando o contraste e a mudança de 
mentalidades através do tempo. 
Braudel também fez considerações de caráter genérico sobre a natureza e a 
especificidade de uma aula para adolescentes. Uma aula é uma “viagem” onde o professor 
é o “guia”. Deve partir do concreto para o abstrato, do conhecido para o desconhecido: 
“não direis a democracia, mas o povo. Não direis o Brasil, mas conforme o caso, os 
brasileiros, o governo brasileiro.” (idem, p. 8). Uma aula deve ser “simples” e “clara”, sem, 
contudo, resvalar na “mediocridade.” Em outras palavras, uma aula deve “cingir-se às 
grandes idéias” e com o tempo de quarenta e cinco ou cinqüenta minutos não há como 
“apresentar” mais que uma ou duas idéias gerais: “o melhor a fazer no ensino secundário, 
sobretudo, para o acomodar às pausas indispensáveis, é repetir o mesmo tema, variando a 
forma, a disposição dos argumentos e o raciocínio. O ensino é a repetição, a idéia que se 
quer mergulhar com obstinação e paciência... (sic.). (idem, p. 5). 
Podemos estranhar que em meio ao debate acalorado entre os adeptos da 
“pedagogia nova” e os da pedagogia “tradicional”, até mesmo entre os defensores das 
escolas novas – como foi o caso da discussão entre Jonathas Serrano (1932) e Lourenço 
Filho (1930) – o ilustre acadêmico francês tenha derramado uma experiência bem distante 
da idéia de renovação requerida para o ensino de história. Ainda que o Braudel não 
defendesse como finalidade pedagógica o acúmulo de conhecimentos e sim o convite à 
reflexão, aindaque não entendesse a relação aluno-mestre como de estrita obediência do 
primeiro ao segundo, a sua pedagogia situava-se no extremo oposto dos que pregavam o 
ensino ativo.8 Era uma pedagogia centrada no professor, o “guia” e simplificador, para 
quem o ensinar traduzia-se na apresentação/comunicação de idéias claras e na repetição 
das mesmas. O objetivo era sensibilizar os alunos – vistos coletivamente como auditório e 
público. O aprender era familiarizar-se com as idéias do professor, depois, medi-las, 
transformá-las, substituí-las – se fosse o caso –, comentá-las e digeri-las. A aula era uma 
“viagem” do aluno e do professor, mediada pela voz do mestre: a preleção. Era, por fim, 
uma pedagogia sem “pedagogia” – como Durkheim (2002) denunciou acerca do 
secundário da sua terra. Requeria-se do professor o amplo domínio do assunto e o 
conhecimento das diferenças entre o ofício do historiador e do professor – diferenças 
expressas entre o meio livro e o meio aula, entre o público leitor e o público audiente. O 
domínio da matéria, segundo Braudel, viabilizaria a extração das idéias principais. O 
domínio de ambos os ofícios evitaria a transposição abrupta do método de pesquisa 
histórica – os últimos avanços entre os historiadores – para o ensino da história. A 
pedagogia da história de Braudel tinha o mérito de diferenciar os ofícios, mas era ainda 
fundada na observação das práticas dos velhos mestres, o seu, no caso era Henri Pirenne.9
Esse nosso estranhamento em relação à pedagogia da história anunciada por 
Braudel pode perder o seu significado se procurarmos compreendê-la como um exemplo 
colhido entre centenas de experiências de professores secundários de história na França, no 
mesmo período. Na pátria de Braudel, os pais da história disciplina escolar – Ernest 
Lavisse e Charles Seignobos – e os instituidores das primeiras pedagogias da história bem 
que tencionaram modificar o caráter verbal do ensino. Seignobos (1890) tentou aproveitar 
os passos do método para as tarefas do ensino: exercícios de observação de imagens e 
leitura de textos estariam bem próximas às tarefas de observação, análise, comparação e de 
síntese característicos do ofício do historiador – a crítica histórica. Entre as décadas de 
1910 e 1930, procurou-se introduzir o ensino por imagens, filmes, estudos dirigidos, todos 
sem grande apelo entre a massa dos docentes. No entanto, até mesmo o uso do documento 
histórico – a pedagogia do documento – permaneceu marginal e ilustrativo. O que vigorou 
no ensino secundário francês entre o final do século XIX e os anos 1970, foi o recurso à 
voz do mestre para enfrentar as situações didáticas. Uma pedagogia fundada no esquema 
lição-interrogação. Évelyne Héry (1999, 2000), pacientemente demonstrou que esse “curso 
magistral” poderia ser lido – a redação de toda a matéria da aula – ou ditado – a recitação, 
8 Ver síntese dessas idéias em As escolas novas, de Paul Foulquié (1952). 
9 Heri Pirenne: “o primeiro historiador de língua francesa dos tempos que correm, professor notável, entre 
todos, por quem não sou o único a votar uma veneração particular.” (Braudel, 1955, p. 7). 
para a cópia, de um resumo da matéria no início da aula – e que a interrogação variava 
entre a participação individual e a coletiva (esse é ainda o aspecto menos conhecido). 
(...) le schéma-type de l’enseignement d l’histoire s’est fondé sur l’articulation de la leçon 
et de l’interrogation. La seconde est l’aboutissement de la première qu’elle resume. En 
même temps, l’interrogation permet d’enchaîner la leçon precedente avec la suivante et de 
donner à la continuité des heures et des programes son maximum d’efficacité. (Héry, 2000, 
p. 43). 
Héry também afirmou que a mudança mais significativa do período foi o gradativo 
desaparecimento do ditado, que resultou na “evolução” do curso continuamente lido ao 
curso dialogado, ou seja, a aula interrompida pela participação espontânea do(s) aluno(s). 
Mas, isso era constatado ainda timidamente na década de 1930. A centralidade do 
documento na pedagogia da história, o fim do verbalismo exclusivo só ganharam corpo a 
partir da década de 1970. Por que sobreviveu tanto tempo, podendo ainda ser flagrado nas 
escolas francesas na década de 1990? A autora apresenta várias razões, duas das quais 
considero as mais importantes. A primeira é de ordem epistemológica. 
Sans nier la part de l’innertie au sein de l’institution, il nous semble que l’explication de 
cette longévité reside aussi dans le fait que l’enseignnement verbal, au sens propre 
d’enseignemennt par le Verbe, et donc la leçon magistrale, mode oral d’énonciation fondé 
sur l’unité de thème et l’unité de parole, indépendamment des dysfonctionnements qu’ils 
ont pu engendrer, ont constitué um modèle pédagogique ajuste au contenu et au message de 
l’enseignemente de l’histoire. Le maître déroulait de façon continue le fil linéaire de 
l’histoire passée, restituant de séance em séance l’enchaîtenement dês faits et donant aux 
élèves la conscience de la continuité de l’histoire et dês solidarités entre lês générations. 
Ainsi, dans cette forme pédagogique, s’accomplissait la vocation messianique de 
l’enseignement historique. (Héry, 2000, p. 47). 
A outra razão, que nos remete ao tempo da pedagogia de Braudel, é de natureza 
pedagógica stricto sensu, estando relacionada à formação docente. O que era requerido de 
um bom professor secundário nos anos 1920? Conta Hery que “enseigner était um art, l’art 
de composer et de bien dire. Aussi, bien que les réformateurs comme E. Lavisse s’em 
soient désolés, n’y a-t-il pás eu de véritable formation pédagogique. L’aptitude à enseigner 
s’évaluait à partir de la maîtrise des contenus, em attenndant que l’expérience fit le rest!” 
(Hery, 2000, p. 46). 
* * * 
Depois da leitura do discurso de Braudel – um Braudel às vezes imperativo, às 
vezes sugestivo – fico imaginando o que estaria pensando o professor Afonso de 
Escragnolle Taunay, catedrático de história da civilização brasileira da mesma Faculdade 
de Filosofia da USP e do Ginásio São Bento, se estivesse assistindo a conferência do 
colega naquela primeira fila reservada às autoridades. Taunay foi considerado a face 
tradicional da historiografia uspiana, o mantenedor do paradigma dos Institutos Históricos 
do final do século XIX – IHGB, IHGSP, notadamente. O que poucos sabem é que ele leu o 
mesmo manual que fundamentou o ofício de historiador no tempo em que Braudel 
concluía a sua formação básica de pesquisador. Não é, portanto, improvável que Taunay, 
além de sorver da teoria da história “metódica”, também conhecesse muito bem as 
orientações da nova pedagogia da história difundidas por Charles Seignobos e, 
paradoxalmente, também manifestasse parte dos “vícios” da maioria dos professores 
franceses dos liceus (vícios na ótica de Durkheim). Dos raros depoimentos sobre a prática 
do velho mestre no Ginásio São Bento, já nos idos da Primeira República, são eloqüentes 
os indícios sobre a distribuição do tempo e o predomínio da palavra magistral. Conta o 
Antônio Gontijo de Carvalho, seu aluno no quarto ano ginasial, que o professor Taunay 
“dividia o período da aula, de sessenta minutos, em dois tempos iguais. No primeiro, 
tomava dos alunos a lição da véspera. No segundo, expunha a matéria próxima. Embora a 
preleção do mestre fosse repleta de dados, colhidos desde a juventude nas obras de 
Mommsenn, Onckey e César Cantu, as lições dos alunos primavam por excessiva síntese.” 
(Carvalho, 1951, p. 445). 
Então, o discurso de Braudel e os fragmentos de Taunay orientam-nos para a 
hipótese de que as duas pedagogias eram semelhantes em largos traços? Não é exatamente 
essa a conclusão a que se chega provisoriamente. A centralidadedo professor, o 
predomínio da palavra, a arte de saber narrar, e o “esquema-típico” lição-interrogação 
podem muito aproximar Brasil e França sob o aspecto da teoria do ensino de história em 
vigor nos anos 1920. Mas, a pedagogia de Braudel foi construída à distância, e sob os 
influxos das suas especulações para o trabalho de doutoramento. Enquanto os professores 
brasileiros atrelavam e reforçavam a ligação da experiência brasileira ao movimento 
civilizatório europeu, Braudel sugeria um certo afastamento dessa orientação. Não se 
tratava de tomar a civilização européia como conteúdo proeminente da história universal. 
Tratava-se de considerar as várias civilizações do globo. Eram várias “Europas” a serem 
referidas nos programas brasileiros, segundo Braudel: as Europas australiana, africana, a 
velha Europa, a norte-americana, anglo-saxônica e a sul-americana. Além disso, seria 
inovador reservar um espaço para o “mar oceânico”, o Atlântico que faz a ligação entre as 
três últimas Europas, “a velha, a moça, e a juvenil” (Braudel, 1955, p. 20). Mais que alterar 
os conteúdos, o empreendimento de se formar uma pedagogia brasileira no terreno da 
história requereria uma outra atitude do professor para enfrentar a situação paradoxal de 
estudar a história das civilizações sem desprezar a experiência histórica brasileira. Braudel 
dizia:
É necessário afastá-los [os alunos brasileiros] da realidade ambiente sempre que ela se 
oponha à do ambiente que descreveis, e, aproveitá-la, ao contrário, quando ela se apresente 
semelhante ao passado. Técnica difícil e delicada e que equivale a mostrar o passado do 
mundo pelas frestas e janelas que o presente e o passado do Brasil vos oferecem. Não se 
julgue a história do mundo senão através da história de seu país. (Braudel, 1955, p. 20). 
A pedagogia de Braudel, como o próprio confessou, não era “revolucionária,” pelo 
contrário, às vezes, excessivamente “conservadora” aos olhos do auditório do IEUSP (cf. 
Braudel, 1955, p. 20). Mas, a idéia de elaborar-se uma pedagogia da história à brasileira, 
tendo o Atlântico como o eixo dos conteúdos de história da civilização e a idéia de ler a 
história do mundo pela perspectiva da história do Brasil podem ter causado grande espanto. 
Seria bastante esclarecedor para a história do ensino de história no país se se pudesse 
cotejar em que medida as soluções conservadoras ou revolucionárias de Fernando Braudel 
foram incorporadas à vulgata pedagógica ou reforçaram as prescrições da União no 
momento em que se uniformizava o ensino secundário brasileiro (entre Francisco Campos 
e Gustavo Capanema) para a história, inclusive. Fica registrada a sugestão. 
Referências bibliográficas 
ARRUDA, José Jobson e TENGARRINHA, José Manuel. Historiografia luso-brasileira 
contemporânea. Bauru: Edusc, 1999. 
BRAUDEL, Fernand. Pedagogia da história. Revista de História, São Paulo, v. 11, n. 23, p. 
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