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FADERGS FADERGS - v.6, n. 1, jan..-jun. 2014 141 CONTRATOS ELETRÔNICOS, APLICAÇÃO DO CDC, CONTRATOS INTERNACIONAIS VIRTUAIS E O MARCO CIVIL DA INTERNET Tatiana da Silva Fermino RESUMO No presente estudo, busca-se aprofundar os conceitos já explorados em artigo anterior, onde se tratou do panorama geral das contratações por meio eletrônico, dando ênfase aos pontos omissos apontados pelo nobre Coordenador do Curso de Pós-Graduação em Direito Civil e Processos Civil da FADERGS, Professor Mestre, Guilherme Antunes da Cunha, aclarando de que forma se dá a aplicação do Código de Defesa do Consumidor às contratações por meio eletrônico, em especial no que tange os contratos internacionais, com foco na preservação dos direitos da parte hipossuficiente. Além disso, o artigo busca esclarecer quais as mudanças trazidas pela promulgação do marco civil da internet. Palavras-chave: Contrato eletrônico. CDC. Contratos Internacionais. Marco Civil da internet. ABSTRACT In this study, we seek to deepen the concepts already explored in the previous article, in which were discussed the overview of hires electronically, emphasizing the omitted points indicated by the noble Coordinator of the Graduate Program in Civil Law and Civil Processes Fadergs, Master Teacher, Guilherme Antunes da Cunha, clarifying how it gives the application of the Consumer Protection Code to contracts by electronic means, in particular in relation to international contracts, focusing on the preservation of the rights of hipossuficiente part. Furthermore, the article seeks to clarify the changes brought about by the enactment of landmark civil internet . Keywords: Electronic Contract . CDC . International Contracts. Civil Marco the internet. REVISTA NOVATIO IURIS 142 FADERGS - v.6, n. 1, jan..-jun. 2014 1 INTRODUÇÃO O artigo vertente consiste em uma análise aplicada do comércio em meio eletrônico, com foco na execução do Código de Defesa do Consumidor a esse tipo de avença, principalmente naquelas contratações feitas no exterior, onde a preservação dos direitos dos consumidores é ainda mais difícil. O estudo também busca revelar em que consiste o marco civil da internet, em qual contexto foi concebido, bem como qual sua base e contribuições para o comércio virtual. Nesse sentido, faz-se necessário aclarar de que forma introduzem-se os princípios do CDC nas contratações pela internet, revelando quais teorias inserem-se nesse campo obrigacional. Por outro lado, mostra-se relevante esclarecer as nuances que envolvem as contratações com algum elemento estrangeiro. Não obstante isso, importante revelar em que consiste o marco civil da internet. 2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA Considerando a insegurança jurídica própria da contratação por meio eletrônico, surge a necessidade de se analisar a aplicação do CDC a este tipo de avença, bem como explicitar de que forma são preservados os direitos dos hipossuficientes quando se trata de contrato internacional, objetivando dar ao contratante menos favorecido um mínimo de certeza quanto às suas garantias. Para tanto, o marco civil da internet contribui, mas de forma muito incipiente, ao contrário do que esperava a comunidade jurídica. 2.1 DA APLICAÇÃO DO CDC CONDIDERANDO A CONFIANÇA E A TEORIA DA APARÊNCIA Com efeito, não se tem dúvidas de que a confiança é critério relevante a ser analisado quando se trata de relação jurídica criada em meio virtual, considerando o anonimato inerente a essa via de manifestação que, se sabe, tem em seu bojo, muitas vezes, a dificuldade de definir de forma clara o efetivo consumidor e o fornecedor do produto ou serviço. FADERGS FADERGS - v.6, n. 1, jan..-jun. 2014 143 A propósito: O mandamento da proteção da confiança está intimamente ligado ao anonimato das novas relações sociais e à massificação das relações contratuais e pré-contratuais, da produção e comercialização, por vezes sem a possibilidade de se identificar claramente os consumidores e usuários (MARTINS, 2007, p.43). Nesse passo, a confiança é nos contratos eletrônicos um critério para sopesar a distribuição dos riscos, que advém da comodidade das compras pela internet (MARTINS, 2007, p.43). Vejamos: Por detrás da noção de confiança encontra-se a garantia ao consumidor da adequação do produto e dos serviços às expectativas legítimas que este mesmo consumidor tem em relação à atividade de consumo. Na acepção de Lima Marques “[...] a manifestação de vontade do consumidor é dada almejando alcançar determinados fins, determinados interesses legítimos (SANTOLIM, 2005, p.53). Assim, para a proteção da confiança que permeia a contratação envolvendo o consumidor eletrônico de boa-fé, a doutrina majoritária entende aplicável aos contratos virtuais o CDC e a Teoria da Aparência, a qual pressupõe, nestes casos, além do antes citado animus, um elemento objetivo consistente em uma aparência suficientemente forte de regularidade da avença, bem como sujeitos definidos, quais sejam, o titular real do direito, o titular aparente e o terceiro contratante, que estabelece com o primeiro citado um conflito de interesses. Vejamos o entendimento doutrinário acerca da aplicação da Teoria da Aparência, antes citada: Seu objetivo é, em nome da proteção do sujeito de boa-fé, desconsiderar o vício interno de uma situação aparente válida para fazer valer a situação como se perfeita e regular fosse. Para assegurar o agente que, de boa-fé, negocia com um falso titular do direito, a lei impõe a produção dos mesmos efeitos jurídicos que o negócio surtiria se ocorresse com o assentimento do verdadeiro legitimado (MARTINS, 2007, p.43). REVISTA NOVATIO IURIS 144 FADERGS - v.6, n. 1, jan..-jun. 2014 E aqui, segundo o antes citado jurista, um exemplo claro da aplicação da teoria da aparência às relações jurídicas estabelecidas em meio virtual seria a responsabilização do provedor de acesso do consumidor de boa-fé, quando este não puder identificar o titular real, no caso fornecedor do produto ou serviço. O autor esclarece que: Portanto, as regras da aparência, como observa Jean Calais- Auloy, justificam-se pela necessidade de se atribuir uma obrigação a cargo da pessoa que, de uma forma ou de outra, contribuiu para criar uma situação enganosa (MARTINS, 2007, p.43). Aqui urge salientar a ausência no ordenamento jurídico vigente de norma expressa acerca da aplicação da teoria da aparência; todavia, há uma disposição no Código Civil de 2002 aplicável aos contratos eletrônicos, que traz em seu bojo a referida teoria, qual seja o art. 180 daquele Diploma Legal, que assinala que o menor que se declarar maior não se exime da obrigação a qual aderiu (MARTINS, 2007, p.43). Nesse diapasão, outro instituto do Direito do Consumidor aplicável aos contratos eletrônicos é o princípio da solidariedade da cadeia de fornecedores de produtos e serviços previsto no art. 7º1, §1º e art. 142, ambos do CDC que, no caso de não identificação do real fornecedor, transfere a responsabilidade a outro integrante da cadeia, fato visualizado claramente na hipótese de responsabilização do provedor antes citada. 1 Art. 7° Os direitos previstos neste código não excluem outros decorrentes de tratados ou convenções internacionais de que o Brasil seja signatário, da legislação interna ordinária, de regulamentos expedidos pelas autoridades administrativas competentes, bem como dos que derivem dos princípios gerais do direito, analogia, costumes e equidade. Parágrafo único. Tendo mais de um autor a ofensa, todos responderão solidariamente pela reparação dos danos previstos nas normas de consumo. 2 Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentementeda existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos. FADERGS FADERGS - v.6, n. 1, jan..-jun. 2014 145 2.2 DOS CONTRATOS INTERNACIONAIS Com efeito, é notório que a internet é uma ferramenta importante para o comércio internacional nos dias atuais, pois viabiliza de forma mais célere o intercâmbio de produtos e serviços. Porém, nas lides que surgem nessa seara virtual, emergem algumas dificuldades para a aplicação do direito ao caso concreto, uma vez que a ciência jurídica não evoluiu no mesmo passo desse tipo de contratação, em especial nos contratos internacionais, inexistindo regras capazes de nortear com clareza os direitos e deveres dos contratantes, tampouco consenso na doutrina quanto a sua regulamentação. A primeira dificuldade que emerge é a incidência de normas de mais de um país sobre a mesma relação jurídica e, frente a essa dualidade, qual seria a mais adequada para resolver eventual conflito, sendo que para tal análise é importante ponderar a localização do fato que originou a lide, bem como a relação da Lei aplicável com os destinatários da norma (GOMES, 2012, p. 136). Nesse sentido: A incidência de mais de uma norma internacional sobre a mesma relação jurídica pode ser um obstáculo para a consecução dos direitos das partes. A solução para o problema decorre da atividade legislativa, que deve ser sensível à nova realidade contratual, segundo afirma Ferrer Correa, pois “não se trata de escolher a melhor lei, mas a melhor colocada para intervir - em razão da localização dos fatos, ou da relação dela com as pessoas a que estes respeitam (CHIAPPINI, 2010, p.136). Segundo a citada jurista, quanto à eleição de foro, que foi objeto de artigo anterior, que seria uma solução para o conflito de normas, a doutrina diverge quanto à validade desse tipo de cláusula. Tem-se uma corrente que defende a autonomia da vontade, onde o consumidor pode optar por se submeter à legislação diversa do CDC, válida em qualquer país, na busca de evitar uma desgastante discussão judicial para fazer valer as regras estabelecidas no contrato. Por outro lado, outros doutrinadores pensam que, considerando a aplicação do CDC a esse tipo de avença, a autonomia da vontade não pode prevalecer, tendo em vista o caráter de ordem pública inerente ao CDC, que visa à proteção do hipossuficiente. REVISTA NOVATIO IURIS 146 FADERGS - v.6, n. 1, jan..-jun. 2014 No Brasil, em se tratando de contrato eletrônico envolvendo relação de consumo, com o fornecedor estabelecido em nosso país e o consumidor residente no exterior, deve-se seguir os princípios do CDC, que seria a lei mais benéfica a parte mais frágil. Como referido, para a solução desse tipo de conflito, deve-se ponderar a legislação de onde se encontra o consumidor e o local onde foi celebrado o contrato. Em tese, a legislação do domicílio do consumidor tende a ser a mais benéfica a ele. Ademais, não se podendo identificar a legislação do país do consumidor, poderia se aplicar o art. 9, § 2º, da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro3, que entende aplicável a lei do proponente da obrigação. Mas há também os que afastam a aplicação da LINDB, pois esta poderia impor a aplicação de lei desconhecida estrangeira aos consumidores brasileiros, em manifesto conflito aos princípios esculpidos no CDC. A propósito, conforme destaca a professora Carolina Dias Tavares Guerreiro Cruz, nos casos de contratação à distância, não se deve aplicar a norma de conflito supramencionada. Para ela: “entendemos incabível a incidência aos casos previstos na dissertação do art. 9.º, § 2.º, da LICC (LGL\1942\3), na medida em que este pode conduzir à determinação de lei estrangeira, como lei material aplicável aos contratos em questão. Semelhante possibilidade compromete a tutela do consumidor, uma vez que o consumidor residente no Brasil não pode estar sujeito à lei que desconhece, suscetível de não lhe outorgar garantias de proteção pelo menos idênticas àquelas de que ele dispõe, sob a lei nacional de sua residência. A incerteza quanto à proteção legal, em cada caso, pode ser relevantíssima, mas ainda mais relevante nos parece a circunstância de o consumidor não ter consciência da lei aplicável à relação em que está prestes a entrar, como elemento determinante da tutela assegurada nos termos peremptórios pela Constituição Federal (LGL\1988\3) (CHIAPPINI, 2010, p. 136). E aqui cumpre observar a existência de um movimento no sentido da alteração dos artigos 7º e 101 do CDC, com vistas a garantir uma maior 3 Art. 9o Para qualificar e reger as obrigações, aplicar-se-á a lei do país em que se constituírem. § 1o Destinando-se a obrigação a ser executada no Brasil e dependendo de forma essencial, será esta observada, admitidas as peculiaridades da lei estrangeira quanto aos requisitos extrínsecos do ato. § 2o A obrigação resultante do contrato reputa-se constituída no lugar em que residir o proponente. FADERGS FADERGS - v.6, n. 1, jan..-jun. 2014 147 proteção das relações estabelecidas fora do âmbito nacional. A doutrina sugere as seguintes modificações: Para ilustrar essa questão, é interessante trazer a colação a proposta da professora Claudia Lima Marques, de inserção de três parágrafos, ao atual art. 101 do CDC (LGL\1990\40), para introduzir brasileiro uma norma de direito internacional privado ao Código especializado mencionado, com relação à lei aplicável. Neste sentido, sugere a professora que estes parágrafos deveriam ter a seguinte redação: “Art. 101 do CDC (LGL\1990\40). (...) § 1.º. Os contratos e as transações contratadas a distância, por meios eletrônicos, de telecomunicações ou por telefone, estando o consumidor em seu país de domicílio, serão regidos pela lei deste país ou pela lei mais favorável ao consumidor, escolhida entre as partes, se a lei do lugar da celebração do contrato, a lei do lugar da execução do contrato, a lei da prestação característica ou a lei do domicílio ou sede do fornecedor de produtos e serviços. § 2.º. Em todos os casos, aplicar-se-ão, necessariamente, as normas do país do foro que tenham caráter imperativo, na proteção do consumidor. § 3.º. Tendo sido a contratação precedida de qualquer atividade negocial, de marketing do fornecedor ou de seus representantes, em especial de envio de publicidade, correspondências, mensagens eletrônicas (e-mails), prêmios, convites, manutenção de filial ou representantes e demais atividades voltadas para o fornecimento de produtos e serviços e atração de clientela no país de domicílio do consumidor, aplicar-se-ão, necessariamente, as normas imperativas deste país, na proteção do consumidor, cumulativamente àquelas do foro e à lei aplicável ao contrato ou relação de consumo” (CHIAPPINI, 2010, p. 357). A relevância da mudança é tão premente que a Comissão de Reforma do CDC inseriu os contratos eletrônicos em sua pauta. 2.3 DO MARCO CIVIL DA INTERNET Já há muito se buscava consolidar um instrumento normativo que trouxesse regras específicas sobre as relações jurídicas estabelecidas virtualmente e, em 23 de abril de 2014 (BITELLI, 2014, p. 291), foi promulgada a Lei 12.965/14, o chamado marco civil da internet, objeto de Projeto de Lei do ano de 2009, precedido de consulta pública promovida pelo Ministério da Justiça. Destarte, o objetivo inicial era a criação de uma Constituição da REVISTA NOVATIO IURIS 148 FADERGS - v.6, n. 1, jan..-jun. 2014 Internet, de onde decorreu o nome marco civil, ideia que foi criticada, uma vez que os direitos fundamentaisjá estão inseridos na Carta Magna. Como o próprio nome já diz, a antes citada legislação tem o objetivo de traçar o primeiro caminho de proteção do direito envolvendo o mundo virtual, as regras gerais, sendo um Diploma Legal basicamente principiológico, preparatório para que a doutrina e a jurisprudência, num perfeito diálogo entre as fontes do direito, adéquem essas normas fundamentais ao caso concreto. O marco civil da internet tem como norte a preservação dos dados dos usuários deste meio, eis que sua versão final foi concebida em meio ao escândalo da espionagem dos EUA em nosso país. A referida norma, considerando sua especialidade, não veio limitar a aplicação das outras fontes de direito, mas sim auxiliar na construção da incipiente proteção dos direitos que decorrem do uso da internet. Um dos princípios e, talvez o mais relevante, que emerge da novel legislação é o da neutralidade, onde é garantido ao consumidor a preservação de seus dados pessoais, estabelecido no art. 9º da referida legislação4, sendo vedado, dentre 4 Art. 9o O responsável pela transmissão, comutação ou roteamento tem o dever de tratar de forma isonômica quaisquer pacotes de dados, sem distinção por conteúdo, origem e destino, serviço, terminal ou aplicação. § 1o A discriminação ou degradação do tráfego será regulamentada nos termos das atribuições privativas do Presidente da República previstas no inciso IV do art. 84 da Constituição Federal, para a fiel execução desta Lei, ouvidos o Comitê Gestor da Internet e a Agência Nacional de Telecomunicações, e somente poderá decorrer de: I - requisitos técnicos indispensáveis à prestação adequada dos serviços e aplicações; e II - priorização de serviços de emergência. § 2o Na hipótese de discriminação ou degradação do tráfego prevista no § 1o, o responsável mencionado no caput deve: I - abster-se de causar dano aos usuários, na forma do art. 927 da Lei no 10.406, de 10 de janeiro de 2002 - Código Civil; II - agir com proporcionalidade, transparência e isonomia; III - informar previamente de modo transparente, claro e suficientemente descritivo aos seus usuários sobre as práticas de gerenciamento e mitigação de tráfego adotadas, inclusive as relacionadas à segurança da rede; e IV - oferecer serviços em condições comerciais não discriminatórias e abster-se de praticar condutas anticoncorrenciais. § 3o Na provisão de conexão à internet, onerosa ou gratuita, bem como na transmissão, comutação ou roteamento, é vedado bloquear, monitorar, filtrar ou analisar o conteúdo dos pacotes de dados, respeitado o disposto neste artigo. FADERGS FADERGS - v.6, n. 1, jan..-jun. 2014 149 outras restrições, aos sites utilizar tais referências como forma de marketing, sugerindo acessos a locais relacionados às preferências do consumidor, atitude recorrente nas redes sociais, tais como o facebook, que sugere a aquisição de vários produtos, com base no perfil do usuário. Nesse diapasão: A oferta gratuita de acesso à determinada aplicação é uma estratégia de marketing, pois evidentemente tanto o provedor de conexão, que amplia sua base de usuários e o volume de tráfego por suas redes, quanto o provedor de aplicações, que incrementa o potencial publicitário de seu serviço, têm benefícios econômicos indiretos por essa oferta. Ocorre que, ao estimular o acesso a determinada aplicação (como o Facebook), o provedor de conexão viola o princípio da neutralidade de rede, pois privilegia o conteúdo de uma aplicação em detrimento de outro, redirecionando (ou estimulando o redirecionamento) o internauta a determinada aplicação (OLIVEIRA, 2014, p.271). No que tange aos contratos eletrônicos internacionais, a legislação, infelizmente, ao contrário do que esperava a comunidade jurídica, não vem regular qual o Diploma Legal a ser aplicável no que tange à execução da avença, apenas definindo qual disposição aplica-se nas hipótese de coleta, guarda, armazenamento ou tratamento de registros, dados pessoais ou de comunicações, senão vejamos: Primeira conclusão: o Marco Civil não cuida de definir a legislação que disciplinará o contrato celebrado por um brasileiro que adquire um produto em um site estrangeiro, salvo no tocante à coleta, guarda, armazenamento ou tratamento de registros, dados pessoais ou de comunicações. Para isso, seguem vigentes os elementos de conexão7 previstos na LINDB e na jurisprudência do STJ. Em outras palavras, para definir qual legislação disciplinará os contratos celebrados pelos brasileiros em compras a distância, não se invocará o Marco Civil, que nada diz a respeito, e sim a LINDB e a jurisprudência. ... Segunda conclusão: o art. 11 do Marco Civil cuida de elemento de conexão específico e exclusivo para aplicação da legislação brasileira relativa a coleta, guarda, armazenamento ou tratamento de registros, dados pessoais ou de comunicações (OLIVEIRA, 2014, p.271). REVISTA NOVATIO IURIS 150 FADERGS - v.6, n. 1, jan..-jun. 2014 3 METODOLOGIA Este tópico visa descrever como os objetivos propostos neste trabalho foram alcançados. A pesquisa teve como seu princípio fundamental uma análise qualitativa, onde foi implementada uma pesquisa bibliográfica, com análise documental. Sendo assim, foi denominada como uma pesquisa qualitativa exploratória teórica (MALHOTRA, 2006). 4 CONSIDERAÇÕES FINAIS Por derradeiro, conclui-se plena a aplicabilidade do CDC aos contratos eletrônicos, em especial aos contratos firmados em âmbito internacional. Para tanto, cumpre observar que a relação jurídica se dá em um ambiente tido como envolto em confiança, eis que sem ela, considerando o anonimato próprio das avenças estabelecidas em âmbito virtual, seria impossível estabelecer um mínimo de segurança jurídica, ou seja, seria inviável preservar o consumidor, sabidamente hipossuficiente segundo o CDC. Nesse diapasão, importante salientar que a relação jurídica contratual é permeada pela boa-fé do consumidor e lastreada na teoria da aparência onde, existindo elementos suficientemente fortes de regularidade da contratação, são preservadas as garantias do contratante de boa-fé, através, por exemplo, da responsabilização do servidor sede de fornecedor não identificado, por força do princípio da solidariedade da cadeia de fornecedores de produtos ou serviços. Por outro lado, no que pertine aos contratos internacionais, considerando a recorrente dualidade de normas afetas ao caso concreto, deve-se analisar, para implementar a escolha da legislação aplicável, o lugar do fato que originou a lide, bem como os destinatários da norma. Na realidade, o mais adequado seria a eleição de um foro; todavia, não há consenso na doutrina sobre a legalidade de seu estabelecimento, na medida em que alguns juristas entendem que essa autonomia da vontade fere os princípios do CDC. Logo, optando por solução diversa da eleição de foro, deveria ser adotada a legislação mais benéfica ao consumidor, que costuma ser a de seu país de origem. Por outro lado, não se podendo identificar a legislação do país FADERGS FADERGS - v.6, n. 1, jan..-jun. 2014 151 do consumidor, aplicável seria o art. 9º, §2º, da LINDB, que opta pela legislação do proponente da obrigação, qual seja, o fornecedor, entendimento que sofre críticas, sob o fundamento de que se estaria criando uma hipótese onde o consumidor brasileiro poderia se sujeitar a uma legislação desconhecida, o que se mostra completamente censurável segundo o CDC. A referida dificuldade para a escolha da norma aplicável é objeto da reforma do CDC, havendo sugestões de mudanças dos artigos 7º e 101 daquele Diploma Legal. Quanto ao marco civil da internet, trouxe uma contribuição muito tímida para as relações jurídicas firmadasno âmbito da internet, consubstanciando-se, basicamente, em princípios, dos quais se destaca o da neutralidade, que garante a privacidade do consumidor, em especial de suas preferências. Por derradeiro, nota-se que a Lei 12.965/14, ao contrário do que esperava a comunidade jurídica, não é a Constituição da Internet, mas sim um início de regulamentação das obrigações daí decorrentes, preparatória para que os pormenores sejam objeto de análise e definição pela doutrina e jurisprudência. REFERÊNCIAS ARTESE, Gustavo. As trancas da lei da internet. Revista Jurídica Consulex, n. 405. BITELLI, M. A S. A Lei 12.965/2014 - O Marco Civil da Internet. Revista de Direito das Comunicações, v. 7, p. 291, Jan / 2014. BLUM, Renato Opice; VAINZOF, Rony. O Marco Civil da Internet e a Legislação Brasileira. Informativo Consulex, n. 5/2011. Tema da Semana. BLUM, Renato Opice. 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