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Primeira Infância Melhor uma inovação em política pública; 2007

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Brasília, novembro de 2007
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Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO)
Vincent Defourny
Representante da UNESCO no Brasil
Célio da Cunha
Coordenador do Centro de Comunicação e Publicações 
Marilza Regattieri
Coordenadora de Educação a.i.
Governo do Estado do Rio Grande do Sul
Yeda Rorato Crusius
Governadora do Estado do Rio Grande do Sul
Osmar Gasparini Terra
Secretário Estadual de Saúde (Coordenador do Programa Primeira Infância Melhor)
Mariza Abreu
Secretária Estadual de Educação
Mônica Leal
Secretária Estadual de Cultura
Fernando Schüller
Secretário Estadual de Justiça e Desenvolvimento Social
As autoras são responsáveis pela escolha e apresentação dos fatos contidos neste livro, bem como pelas
opiniões nele expressas, que não são necessariamente as da UNESCO, nem comprometem a Organização.
As indicações de nomes e a apresentação do material ao longo deste livro não implicam a manifestação de
qualquer opinião por parte da UNESCO a respeito da condição jurídica de qualquer país, território, cidade,
região ou de suas autoridades, nem tampouco a delimitação de suas fronteiras ou limites.
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Alessandra Schneider e Vera Regina Ramires
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Colaboradores da publicação:
Arita Gilda Hübner Bergmann - Gerente do Programa Primeira Infância Melhor 
Lacy Maria da Silva Pires - Supervisora Técnica
Leila Maria de Almeida - Coordenadora Geral do Programa Primeira Infância Melhor
Liése Gomes Serpa - Supervisora Técnica
Maria da Graça Gomes Paiva - Supervisora Técnica
Maria Helena Capelli - Supervisora Técnica
Osmar Gasparini Terra – Secretário Estadual de Saúde do Rio Grande do Sul
Sandra Silveira Nique da Silva - Supervisora Técnica
Vera Maria da Costa Ferreira - Supervisora Técnica
Wilda Maria Blasi - Supervisora Técnica
Revisão: DPE Estúdio
Projeto gráfico, diagramação e capa: Edson Fogaça
Fotos: As fotos da capa e das páginas 18, 21, 24, 28, 29, 35, 53, 58, 64, 68, 73, 78 e 
98 são de autoria do fotógrafo Beto Scliar. As demais, pertencem ao acervo do Programa.
©UNESCO, 2007
Schneider, Alessandra
Primeira Infância Melhor: uma inovação em política pública / Alessandra Schneider e 
Vera Regina Ramires. – Brasília : UNESCO, Secretaria de Saúde do Estado do Rio Grande do Sul, 2007.
p. 128
BR/2007/PI/H/11
1. Primeira Infância—Avaliação de Projetos--Políticas Públicas—Brasil 2. Educação 
Infantil—Avaliação de Projetos--Brasil I. Ramires, Vera II. UNESCO III. Rio Grande do 
Sul. Secretaria de Saúde IV. Título
CDD 305.23
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Secretaria Estadual da Saúde do Rio Grande do Sul
Programa Primeira Infância Melhor - PIM
Av. Borges de Medeiros, 1501, 6º andar – 
Ala Norte, Centro.
90110-150 - Porto Alegre – RS - Brasil 
Tel.: (55 51) 3288-5853/5955/5887/5888 
Fax: (55 51) 3288-5810
E-mail: primeirainfanciamelhor@saude.rs.gov.br
Site: www.pim.saude.rs.gov.br
SAS, Quadra 5, Bloco H, Lote 6, 
Ed. CNPq/IBICT/UNESCO, 9º andar
70070-914 - Brasília - DF - Brasil
Tel.: (55 61) 2106-3500
Fax: (55 61) 3322-4261
E-mail: grupoeditorial@unesco.org.br
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Abstract . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .7
Prefácio . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .9
Apresentação . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .11
Questões para Reflexão . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .13
Introdução . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .15
Contextualizando o Programa . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .16
Alguns indicadores socioeconômicos, educacionais e de saúde . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .17
Os direitos das crianças e a legislação brasileira de proteção da infância . . . . . . . . . . . . . . .19
O nascimento de um Programa voltado para a primeira infância . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .22
Capítulo 1 - Por que investir na primeira infância? . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .25
A situação da primeira infância no Brasil . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .27
Algumas contribuições da ciência sobre o desenvolvimento na primeira infância . . . . . . . . . .36
Capítulo 2 - Apresentando o PIM . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .49
Da teoria à prática: pressupostos teóricos e eixos estruturantes do PIM . . . . . . . . . . . . . . . . .52
A estrutura e o funcionamento do Programa . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .65
O PIM na Diversidade . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .72
Capítulo 3 - Algumas experiências municipais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .79
O PIM em Bento Gonçalves e a intersetorialidade: um novo paradigma de ação . . . . . . . . . .79
PIM – Crianças egressas da UTI neonatal: a experiência de Rio Grande . . . . . . . . . . . . . . . . .84
O PIM em Santiago – Um futuro melhor . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .89
O PIM na área rural: a experiência de São João do Polêsine . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .92
A criança egressa do PIM em São Sepé . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .94
Capítulo 4 - PIM: de proposta inovadora a política pública . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .99
A adesão dos municípios e o crescimento do PIM . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .101
As atividades paralelas de advocacy sobre a primeira infância . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .104
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O PIM como política pública amparada em lei estadual . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .109
Capítulo 5 - Considerações finais (refletindo sobre a experiência) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .113
Referências . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .119
Nota sobre as autoras . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .127
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A B S T R A C T
This book aims at presenting the Primeira Infancia Melhor Program (Better Early
Childhood Program) - PIM, launched in April of 2003 in the state of Rio Grande do Sul.
PIM is one of the most important public policies of the state and works towards early
childhood holistic development. This publication starts by discussing the importance of
investing in the early years, based on the childhood scenario in Brazil and on the
contributions of sciences about the relevance of the early years for child development.
The program is then presented by discussing its theoretical assumptions, structuring axes
and service modalities. Five experiences in different municipalities are reported, as well as
the PIM in Diversity project, the program's development since its beginning, UNESCO's
technical cooperation, Cuban Centro de Referencia Latinoamericano para la Educación
Preescolar - CELEP's assistance, UNICEF's support, and the parallel advocacy activities
about early childhood up to the moment of passing it as a bill
that institutes PIM as a
permanent public policy giving total attention to early childhood in the state of Rio
Grande do Sul. The program's experience has demonstrated that it is not only possible,
but also desirable to mobilize head people and society in the implementation of public
policies towards early childhood. This benefits the children's cognitive, psychic and social
development, the improvement of bonds within a family and with the community where
they are inserted, and the promotion of citizenship and social participation, which
contributes to the growth of the nation.
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O grande acúmulo de descobertas científicas recentes tem revelado a extraordinária
importância dos primeiros anos da infância na formação das habilidades e competências
humanas que existirão ao longo de toda a vida, para sua realização como pessoa, e
integrada à sociedade. Isso nos mostrou a necessidade imperiosa de estruturar uma
política pública para a promoção do desenvolvimento integral da primeira infância no Rio
Grande do Sul. 
O Programa Primeira Infância Melhor (PIM) foi produto desse entendimento. Iniciado
em 2003, no governo anterior, foi priorizado e ampliado no governo atual. Sua ampliação
se dá também para propiciar a articulação de todas as políticas públicas voltadas para as
gestantes e as crianças pequenas, visando a garantir seu desenvolvimento mais adequado
e, através deste, uma mudança em direção a uma sociedade mais integrada, menos
violenta e mais saudável.
O PIM, porém, não se limita a essa integração e vai muito além disso. Seu objetivo
maior é estimular o desenvolvimento socioemocional e cognitivo dos bebês e crianças
para que possam aprender melhor e mais rápido ao entrar na escola, possam regular de
forma mais adequada seus sentimentos e seu comportamento, e com isso ter um
desempenho melhor na vida. 
Por todos esses aspectos, o PIM é uma proposta abrangente e profundamente
transformadora, que pretendemos levar a todas as famílias gaúchas onde exista uma
gestante ou uma criança pequena, atendendo prioritariamente às mais pobres. Também
é parte essencial da nossa proposta inovadora dentro de uma política estadual de
prevenção da violência. Estudos longitudinais mostram que ao cuidarmos melhor dos
nossos bebês estaremos desenvolvendo seres humanos mais afetivos e com maior controle
da impulsividade e agressividade. Portanto, tenderão a ser mais pacíficos e sociáveis na
vida adulta, além de adquirir uma menor propensão para a dependência de drogas. O
PIM é um Programa essencialmente de promoção da saúde que envolve todas as dimensões
humanas, trabalhando nas suas raízes o desenvolvimento durante a primeira infância.
Hoje já são mais de 40 mil famílias com mais de 60.000 crianças acompanhadas em
casa, semanalmente, pelo PIM em 217 municípios do Rio Grande. Pretendemos, nos
próximos três anos, multiplicar esse atendimento para chegar a todas as crianças em
situação de vulnerabilidade social no nosso Estado. Ao propiciar que os filhos tenham
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uma escolaridade maior que a sua e se sociabilizem melhor, as famílias mais pobres
propiciam uma ruptura na sua transmissão intergeracional da pobreza, favorecendo
uma melhoria na sua situação econômica e social. 
Importante frisar que a qualidade e a rapidez de implantação do PIM se devem muito
às parcerias com as entidades internacionais, em particular com a UNESCO, que nos
permitiu o acesso às informações e experiências que são referência mundial para o tema.
Acreditamos que o PIM, pela sua concepção, estrutura, forte parceria com os municípios
e pela sua intersetorialidade é um Programa inovador que permitirá realizar uma
mudança transformadora no modo de trabalhar políticas educacionais, sociais e de saúde
em todo nosso país. Oportunizando um começo de vida digno para todos os brasileiros
estaremos mudando para melhor, em médio e longo prazo, toda a nossa sociedade. 
Yeda Rorato Crusius 
Governadora do Estado do Rio Grande do Sul
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A P R E S E N T A Ç Ã O
A Representação da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a
Cultura – UNESCO – no Brasil, em parceria com o Governo do Estado do Rio Grande do
Sul, tem a grata satisfação de apresentar o Programa intersetorial Primeira Infância Melhor
– PIM, adotado como política pública permanente de atenção integral à primeira infância
nessa Unidade da Federação.
Em março de 1990, sob a liderança da UNESCO, os representantes dos países-membros
da Organização, reunidos em Jomtien, na Tailândia, aprovaram a Declaração Mundial de
Educação para Todos, reconhecendo que todos os indivíduos têm o direito a oportu-
nidades educativas que satisfaçam suas necessidades básicas de aprendizagem. Esta
Declaração, adotada por 183 países (dentre eles o Brasil), incluiu a educação e os cuidados
na primeira infância como parte da educação básica, afirmando que “a aprendizagem inicia
com o nascimento. Isso implica cuidados básicos e educação inicial na infância, propor-
cionados por meio de estratégias que envolvam as famílias e comunidades ou programas
institucionais, como for o caso” (Art. 5). Esta afirmação aponta que a primeira infância –
a base sólida para todas as aprendizagens humanas – é um tema que requer política
abrangente e intersetorial. O Programa Primeira Infância Melhor, implementado no Esta-
do do Rio Grande do Sul, Brasil, é uma demonstração concreta de como equacionar o
desafio da atenção integral, promovendo uma ação articulada entre as áreas de saúde,
educação, assistência social e cultura, em benefício das crianças, gestantes e famílias em
situação de maior vulnerabilidade social.
Pesquisas e experiências realizadas nas últimas décadas ofereceram evidências contun-
dentes de que a educação e os cuidados de qualidade na primeira infância formam os
pilares essenciais para a promoção do bem-estar e do desenvolvimento do potencial de
aprendizagem das crianças. Análises econômicas têm também demonstrado que é no iní-
cio da vida que os investimentos públicos e sociais encontram seu melhor custo-benefí-
cio, para o aperfeiçoamento das habilidades humanas, sejam elas intelectuais, emo-
cionais ou motoras.
Este reconhecimento levou as nações a assumirem, em Dacar, em 2000, entre os com-
promissos pela Educação para Todos, a meta de ampliar a oferta e melhorar a qualidade
da educação e dos cuidados na primeira infância, com especial atenção às crianças em
situação de vulnerabilidade. O Brasil é um dos signatários desse compromisso e a
UNESCO é a instituição das Nações Unidas que tem entre suas atribuições a de liderar,
em escala mundial, o alcance dessa meta.
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Ao lançar o Programa socioeducativo Primeira Infância Melhor, em 2003, e ao
conferir-lhe o status de política pública estadual de atenção integral à primeira infância,
a partir de 2006, o Governo do Estado do Rio Grande do Sul assume importante papel
pelo reconhecimento de que “o aprendizado de uma vida começa na primeira infância”,
e que “os primeiros seis anos de uma criança valem para sempre”. 
A presente publicação visa a registrar e disseminar a experiência
exitosa do PIM e sua
trajetória de projeto-piloto à política pública, descrevendo seus pressupostos teóricos,
eixos estruturantes e modalidades de atendimento. Cinco relatos municipais foram iden-
tificados dentre inúmeras experiências inovadoras inseridas neste livro, dando voz à cria-
tividade e ao protagonismo dos municípios – parceiros imprescindíveis na implementação
e execução do Programa. 
O livro apresenta, ainda, um panorama atual sobre a situação das crianças brasileiras
de zero a seis anos, as contribuições das ciências sobre o desenvolvimento na primeira
infância, e analisa os resultados de programas que se voltaram para a promoção do
desenvolvimento infantil. 
Compartilhar e divulgar este oportuno Programa, que já beneficia dezenas de milhares
de famílias e crianças menores de seis anos, em mais de 200 municípios gaúchos, é o
objetivo maior desta publicação, na expectativa de que o relato dessa experiência sirva de
inspiração e estímulo para o desenvolvimento e fortalecimento de políticas integradas de
atenção à primeira infância no Brasil.
Por último, importa salientar que, na educação da primeira infância, instaura-se concre-
tamente a possibilidade de assegurar a todas as crianças e jovens itinerários educacionais
de sucesso. Nela se assentam as bases de um continum educacional exitoso ao longo
da vida. 
Vincent Defourny
Representante da UNESCO no Brasil
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Q U E S T Õ E S P A R A R E F L E X Ã O
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Qual a importância dos primeiros anos na vida de um indivíduo?
Em que idade da criança começa sua educação?
O que é desenvolvimento integral na primeira infância?
Existe alguma relação entre o desenvolvimento integral na primeira infância e o desen-
volvimento de uma nação?
Qual é a situação da população brasileira de zero a seis anos?
Qual é o papel e a responsabilidade dos governos no desenvolvimento das crianças em
seus primeiros anos?
Existe alguma relação entre intersetorialidade e promoção do desenvolvimento na
primeira infância?
Quais as políticas públicas que você conhece dedicadas à educação e aos cuidados na
primeira infância?
Vale a pena investir em programas voltados para a educação e os cuidados das crianças
pequenas?
Este livro é uma tentativa de responder, ou, pelo menos, discutir e refletir sobre essas
questões. Inspirado na experiência pioneira do Programa Primeira Infância Melhor, o PIM,
desenvolvido desde 2003 pelo Governo do Estado do Rio Grande do Sul, Brasil, em
estreita parceria com os municípios gaúchos e contando com a cooperação técnica da
UNESCO. O livro traz um panorama sobre a primeira infância brasileira no que diz respeito
a alguns indicadores de educação, saúde e assistência social. Aborda também contribuições
da ciência sobre o desenvolvimento infantil, e analisa os resultados de programas que se
voltaram para a promoção da educação e dos cuidados na primeira infância.
O PIM é apresentado no capítulo 2, desde seus fundamentos teóricos, eixos estrutu-
rantes, organização e funcionamento. Implantado em mais de 200 municípios gaúchos
atualmente, algumas experiências municipais são também relatadas neste livro, bem
como as atividades de advocacy em prol da infância vinculadas ao Programa. 
A evolução do PIM e seus resultados possibilitaram que ele desse origem a uma Lei
Estadual que o instituiu como uma política pública de estado. Compartilhar e divulgar
esta experiência são os objetivos maiores deste livro, em benefício das crianças brasileiras
e suas famílias. Boa leitura!
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I N T R O D U Ç Ã O
O objetivo deste livro é apresentar o Programa Primeira Infância Melhor (PIM), implan-
tado em abril de 2003 no Estado do Rio Grande do Sul. Voltado para a promoção do
desenvolvimento integral na primeira infância, o PIM constitui-se numa das mais impor-
tantes políticas públicas desse Estado e, sob a coordenação da Secretaria Estadual da
Saúde, articula esforços das Secretarias Estaduais da Educação, da Cultura, e da Justiça e
do Desenvolvimento Social. 
Implementado através de parcerias entre estado e municípios, o PIM estrutura-se em
torno de três eixos: a família, a comunidade e a intersetorialidade. O Programa prioriza
áreas cuja população se encontra em situação de vulnerabilidade e risco social, que con-
centram um alto número de crianças de zero a seis anos e gestantes, que apresentam
índices elevados de mortalidade infantil e um grande número de crianças não assistidas
por escolas de educação infantil. 
Até dezembro de 2006, o PIM foi implantado em quase 50% dos municípios do Rio
Grande do Sul, atendendo a 40.125 famílias e beneficiando 60.187 crianças. Contando
com o apoio e a cooperação técnica da Organização das Nações Unidas para a Educação,
a Ciência e a Cultura – UNESCO, a sensibilidade, o reconhecimento e a valorização da
primeira infância por parte dos gestores da Secretaria Estadual da Saúde, e a vontade
política do Governo do Estado, em 2006 o Programa foi instituído como parte integrante
da Política Estadual de Promoção e Desenvolvimento da Primeira Infância, através da Lei
Estadual nº 12.544. 
O PIM vem possibilitando a construção de uma nova história na vida de todas as
crianças e famílias atendidas, com o apoio das comunidades e de todos os setores
envolvidos, com reflexos para essa mesma comunidade. Guiado por princípios éticos e
democráticos, reconhecendo a importância da interdisciplinaridade e da intersetoriali-
dade, ao promover a saúde e o desenvolvimento das crianças atendidas, o PIM favorece
o seu crescimento, e aumenta as chances de um processo de educação e de formação de
qualidade. Conseqüentemente, contribui para um futuro produtivo e bem-sucedido,
prevenindo e minimizando problemas de desenvolvimento e de aprendizagem, bem
como os riscos de evasão escolar, violência, conflitos com a lei, entre outros.
Num país com problemas tão graves como o Brasil, de desigualdades sociais extremas,
violência, falta de segurança e desrespeito aos direitos humanos mais elementares, investir
na primeira infância constitui-se numa estratégia política da mais alta relevância. Seus
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resultados, em curto, médio e longo prazo, para além da história individual de cada
criança, contribuem para mudar os rumos do país.
Contextualizando o Programa
Situado no extremo Sul do Brasil, o Rio Grande do Sul possui uma área de
281.748.538km2 que abrange 496 municípios. Possui uma população estimada de
10.984.000 habitantes em 2006, dos quais 129.000 são crianças com menos de um ano
de idade, 571.000 são crianças de um a quatro anos e 369.000 são crianças de cinco a
seis anos, totalizando uma população de 1.069.000 crianças de zero a seis anos, cujo per-
centual populacional é de 9,73% (IBGE, 2007). 
O Rio Grande do Sul é o quinto estado mais populoso do Brasil, e o terceiro com o
mais alto Índice de Desenvolvimento Humano (IDH). Sua história remonta ao século XVII,
quando, em 1627, jesuítas espanhóis criaram as Missões, próximas ao rio Uruguai. Foram
expulsos pelos portugueses em 1680, sendo que em 1687 os jesuítas portugueses esta-
beleceram os Sete Povos das Missões. As lutas pela posse das terras entre portugueses e
espanhóis tiveram fim em 1801, quando os próprios gaúchos dominaram os Sete Povos,
incorporando-os ao seu território. Em 1807, a área foi elevada à categoria de capitania.
O estado gaúcho tem sua população derivada principalmente
da imigração e coloniza-
ção européia do século XIX, sendo um dos estados mais europeizados do Brasil. Os
açorianos, somados aos ameríndios, aos portugueses continentais e aos escravos africanos
vieram compor a população rio-grandense. Os principais imigrantes foram os italianos e
os alemães. Os alemães começaram a chegar a partir de 1824 e os italianos a partir de
1875. Além desses, pode-se citar entre os grupos de imigrantes minoritários, os espanhóis,
os poloneses, os russos, judeus, árabes, japoneses, argentinos e uruguaios, entre outros. 
O Rio Grande do Sul, portanto, apresenta uma rica diversidade cultural a qual, de forma
sucinta, pode ser sintetizada em duas vertentes: a gaúcha propriamente dita, cujas raízes
estão vinculadas aos antigos habitantes dos pampas, e a cultura trazida pela colonização
européia, pelos colonos portugueses, espanhóis e pelos imigrantes alemães e italianos.
A cultura gaúcha nasceu na fronteira entre a Argentina, o Uruguai e o Sul do Brasil,
sendo marcada pela vida no campo e pela criação bovina. Os gaúchos viviam em uma
sociedade nômade, baseada na pecuária. Mais tarde, com o estabelecimento das fazendas
de gado, eles acabaram por se estabelecer em grandes estâncias espalhadas pelos pampas.
O gaúcho era mestiço de índio, português e espanhol, e a sua cultura foi bastante
influenciada pela cultura dos índios guaranis, charruas e pelos colonos hispânicos.
Na outra vertente, encontram-se os alemães que começaram a se estabelecer ao longo
do rio dos Sinos, a partir de 1824. Ali estabeleceram uma sociedade baseada na agricul-
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tura e na criação familiar, bem distinta dos grandes latifundiários gaúchos que habitavam
os pampas. Até 1850, os alemães ganhavam facilmente as terras e se tornavam
pequenos proprietários, porém, após essa data, a distribuição de terras no Brasil tornou-
se mais restrita, dificultando a colonização nas proximidades do Vale dos Sinos. A partir
de então, os colonos alemães passaram a se expandir, buscando novas terras em lugares
mais longínquos e levando a cultura da Alemanha para diversas regiões do Rio Grande
do Sul, principalmente nas terras baixas, até as encostas das serras.
Os primeiros imigrantes italianos a chegar ao Brasil estabeleceram-se no Rio Grande
do Sul a partir de 1875. Os colonos italianos foram atraídos para a região para trabalhar
como pequenos agricultores, ocupando as terras na encosta da serra gaúcha. Na região,
foram criadas as três primeiras colônias italianas: Conde D’Eu, Dona Isabel e Campo dos
Bugres, hoje as cidades de Garibaldi, Bento Gonçalves e Caxias do Sul, respectivamente.
Com o tempo, os italianos passaram a subir a serra e a colonizá-la, dando origem a
inúmeras outras cidades, introduzindo na região a vinicultura, ainda hoje base da econo-
mia de diversos municípios gaúchos. Estima-se que vivam hoje três milhões de italianos e
descendentes no Estado, representando cerca de 30% da sua população.
Alguns indicadores socioeconômicos, educacionais e de saúde
O Rio Grande do Sul é a quarta maior economia do Brasil, pela dimensão do seu
Produto Interno Bruto (PIB), que chega a 8,08% do PIB nacional, superado apenas por
São Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro (BRASIL. Ministério da Saúde, 2006a). A economia
do Estado possui uma associação com os mercados nacional e internacional superior à
média brasileira, oscilando conforme a evolução da economia do país e também de
acordo com a dinâmica das exportações. 
A economia do Rio Grande do Sul é baseada na agricultura (soja, trigo, arroz e milho,
entre outros produtos), na pecuária e na indústria (de couro e calçados, alimentícia, têxtil,
madeireira, metalúrgica e química). Na década de 1990 e no início do século XXI, houve
o surgimento de pólos tecnológicos importantes no Estado, na área petroquímica e de
tecnologia da informação. A industrialização do Rio Grande do Sul está elevando sua partici-
pação no PIB brasileiro, trazendo investimento, mão-de-obra e infra-estrutura para o Estado. 
A taxa de alfabetização no Estado era de 94,8% para a população com 15 anos e
mais, em 2005 (BRASIL. Ministério da Saúde, 2006a). Das crianças de 7 a 14 anos, em
2006, a taxa de freqüência escolar variou de 97,5% (nas famílias com rendimento mensal
de até meio salário mínimo per capita) até 99,7% (nas famílias com rendimento mensal
de mais de três salários mínimos per capita) (IBGE, 2007). Em 2005, para cada 1.000 habi-
tantes, havia 2,02 médicos, 1,12 dentistas, 0,96 enfermeiros e 2,82 leitos (BRASIL. Ministério
da Saúde, 2006b). Os índices de saneamento indicam que 83,91% da população era
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atendida pelo abastecimento de água em 2005, 79,41% tem algum tipo de esgoto
sanitário e 86,78% é atendida por serviço de coleta de lixo. A administração do Estado
possui uma organização de 19 Coordenadorias Regionais de Saúde (CRS), 30 Coorde-
nadorias Regionais de Educação (CRE) e 22 Delegacias Regionais de Assistência Social. 
Em posição privilegiada no cenário nacional, o Estado têm o menor coeficiente de
mortalidade infantil: 13,9/1000 nascidos vivos em 2006 (IBGE, 2007). O Índice de Desen-
volvimento Humano (IDH) no Estado era de 0,81 em 2000 (ATLAS SOCIOECONÔMICO
DO RIO GRANDE DO SUL, 2007), e o Índice de Desenvolvimento Infantil (IDI) de 0,72 em
2004 (UNICEF, 2005). Entretanto, mesmo realizando avanços significativos ao longo dos
anos em favor da criança, constata-se que ainda existe no Estado uma parcela importante
da população em situação de vulnerabilidade social, com indicadores que exigem maior
atenção. Um desses indicadores refere-se à faixa de renda em famílias com crianças de
zero a seis anos, de até meio salário mínimo per capita, cujo percentual é de 33,6%, con-
siderado abaixo da linha de pobreza (IBGE, 2007). A desigualdade social e a pobreza têm
como conseqüência crianças vitimadas pela má nutrição, vivendo em habitações
precárias, muitas vezes sem saneamento básico, com dificuldade de acesso à escola e a
serviços básicos de saúde, e mais vulneráveis às discriminações de gênero, etnia ou classe
social, o que pode acarretar um maior índice de violência no cotidiano dessas famílias. 
Com relação à atenção pré-natal, um dado preocupante é que, em 2005, 18,7% dos
recém–nascidos vivos eram filhos de mães com até 19 anos (BRASIL. Ministério da Saúde,
2006b). Além disso, dados do Sistema de Informações de Nascidos Vivos de 2006 revelam
que 91,3% das gestantes realizaram o pré-natal, mas muitas dessas mulheres consul-
taram apenas até três vezes durante o período gestacional, quando o adequado seria, no
mínimo, sete consultas.
Nesse sentido, é possível
observar que, embora a
cobertura de atendimento
pré-natal já seja significativa,
ainda necessita ser mais bem
implementada de forma a
garantir a diminuição dos
óbitos infantis e a prevenção
de distúrbios no desenvolvi-
mento infantil.
A comprovada importân-
cia da educação no processo
de desenvolvimento da criança
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75,28% das crianças de zero a seis anos estão fora da escola no Rio Grande do Sul
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nos primeiros anos de vida e a crescente necessidade das famílias de dispor de uma insti-
tuição que compartilhe o cuidado e a educação de seus filhos, bem como o número de
crianças atendidas fazem com que a oferta existente ainda esteja aquém da demanda
para este nível de ensino. Segundo o Censo Escolar de 2006, o número de crianças de
zero a seis anos matriculadas em escolas de educação infantil foi de apenas 264.225. Des-
tas, 75.218 crianças estavam matriculadas em creches, e 189.007 na pré-escola. Merece
destaque o fato de que da população total de 1.069.000
crianças de zero a seis anos
(IBGE, 2007), estima-se que 804.775 ainda não se encontram incorporadas ao sistema de
atendimento educacional. Este número representa 75,28% da população infantil de zero
a seis anos sem o atendimento institucional necessário, o que justifica pensar em um novo
posicionamento de gestão pública municipal e estadual que incorpore a Primeira Infân-
cia como uma prioridade absoluta.
Os direitos das crianças e a legislação brasileira de proteção da infância
Na história da legislação brasileira, identificam-se três correntes jurídico-doutrinárias
em relação à proteção da infância em nosso país, desde o século XIX (PEREIRA, 2000). A
primeira delas, conhecida como a Doutrina do Direito Penal do Menor, inspirava-se nos
Códigos Penais de 1830 e 1890. Preocupava-se especialmente com a delinqüência, e
baseava a imputabilidade no entendimento do “menor” a respeito da prática do ato
criminoso. Posteriormente, passou a vigorar a Doutrina Jurídica da Situação Irregular, com
o advento do Código de Menores de 1979. Pereira destaca que o período de vigência do
Código de Menores foi marcado por uma política assistencialista fundada na proteção do
menor abandonado ou infrator. 
As decisões tomadas em nome da lei, norteadas por essa doutrina, eram marcadas
pela “competência de caráter penal e tutelar do Juiz; sua interferência ocorria nas hipóte-
ses de prática do ato infracional e nas demais situações caracterizadas como problemas
sociais” (PEREIRA, 2000, p. 13). As situações de perigo ou irregulares estavam associadas
ao abandono material ou moral, considerando-se que poderiam conduzir o “menor” à
criminalidade. Compreendia-se que tais situações irregulares, via de regra, eram conse-
qüência da situação irregular da família, principalmente da sua desagregação.
Marques assinala o paternalismo das instâncias voltadas para a infância e a adolescência
nesta doutrina, já que a criança e o adolescente eram tomados como objetos de medidas
de proteção, em uma perspectiva tutelar, receptores de uma prática assistencialista, tida
“como benesse e, portanto, sem considerar seus direitos à convivência familiar e comu-
nitária, à opinião, ao respeito e à dignidade” (MARQUES, 2000, p. 468).
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A Doutrina Jurídica da Situação Irregular foi substituída pela Doutrina
Jurídica da Proteção Integral, que passou a vigorar no Brasil a partir da
Constituição Federal de 1988. O Código de Menores, da mesma forma, deu
lugar ao Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei 8.069, de 13 de julho de
1990). A Doutrina Jurídica da Proteção Integral teve suas bases no movi-
mento de mobilização do início da década de 1980, marcado por intenso
debate acerca da proteção da infância e da adolescência (PEREIRA, 2000).
O Brasil foi se alinhando, assim, às diretrizes e documentos internacionais de proteção
da infância. Já em 1948, a Declaração Universal dos Direitos Humanos das Nações Unidas
destacou, para as crianças, o “direito a cuidados e assistência especiais”. Em 1959, a
Declaração Universal dos Direitos da Criança determinaria, em seu segundo princípio, que:
a criança gozará de proteção especial e disporá de oportunidade e serviços,
a serem estabelecidos em lei ou por outros meios, de modo que possa
desenvolver-se física, mental, moral, espiritual e socialmente de forma
saudável e normal, assim como em condições de liberdade e dignidade. Ao
promulgar leis com este fim, a consideração fundamental a que se atenderá
será o interesse superior da criança (UNICEF, 1959).
Os direitos estabelecidos nas declarações são princípios, não representando obrigações
para os Estados, diferentemente das Convenções, que delineiam políticas legislativas a
serem adotadas pelos Estados-Partes. Assim, em 1989, no ano em que se comemorava
30 anos da Declaração Universal dos Direitos da Criança, foi aprovada por unanimidade
a Convenção Internacional dos Direitos da Criança, em sessão de 20 de novembro da
Assembléia Geral das Nações Unidas, após o trabalho árduo de 43 países-membros da
Comissão de Direitos Humanos. O Brasil ratificou esta Convenção em 24 de setembro de
1990, por intermédio do Decreto nº 99.710, que assegura, em seu artigo 3.1, o seguinte:
“Todas as ações relativas às crianças, levadas a efeito por instituições públicas ou privadas
de bem-estar social, tribunais, autoridades administrativas ou órgãos legislativos, devem
considerar, primordialmente, o interesse maior da criança” (UNICEF, 1959). 
Observa-se uma mudança de foco na legislação brasileira de proteção da infância, que
se desloca da exclusão e da repressão para a proteção com prioridade absoluta, que não
é mais obrigação exclusiva da família e do Estado: é um dever social. Passa-se ao enfoque
da inclusão social, da prevenção e da promoção do desenvolvimento integral da infância. 
Na Doutrina Jurídica da Proteção Integral a criança, que antes era tomada como objeto
das ações do Estado, do Poder Judiciário e da própria família, passa a ser reconhecida
como sujeito de direitos, como alguém em condição peculiar de desenvolvimento. A
Constituição Federal de 1988, em seu artigo 227, contempla o princípio do melhor
interesse da criança, ao estabelecer que: 
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É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao ado-
lescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação,
à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao
respeito, à liberdade e à convivência familiar comunitária, além de colocá-los
a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência,
crueldade e opressão (BRASIL, 1989).
O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) o incorporou em seus dispositivos, espe-
cialmente ao considerar a criança e o adolescente como sujeitos de direitos e ao assumir
a doutrina da proteção integral, assegurando assim os direitos fundamentais inerentes à
pessoa humana (RAMIRES; RODRIGUES, 2003). Em seus artigos 4º, 5º e 7º, tais disposi-
tivos ficam bem explicitados: 
Art. 4º É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do
poder público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos
direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao
lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito à liberdade e
à convivência familiar e comunitária. 
Art. 5º Nenhuma criança ou adolescente será objeto de qualquer forma de
negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão
punida na forma da lei, qualquer atentado, por ação ou omissão, aos seus
direitos fundamentais. 
Art. 7º A criança e o adolescente têm direito à proteção, à vida e à saúde,
mediante a efetivação de políticas sociais públicas que permitam o nasci-
mento e o desenvolvimento sadio e harmonioso, em condições dignas de
existência (BRASIL, 1990).
Essa perspectiva redireciona todas as questões relacionadas a crianças e adolescentes,
tanto na esfera das políticas governamentais como nas decisões judiciais. De uma postura
mais assistencialista e punitiva ocorre o deslo-
camento para uma nova postura, voltada para
cuidar, proteger e educar. Antes da Constituição
Federal de 1988 (BRASIL, 1989) e do ECA
(BRASIL, 1990), o atendimento à faixa etária
abaixo dos sete anos era de natureza assisten-
cial, não-educacional, e numa visão de saúde
pública não universalizada, não havendo maior
comprometimento do Estado com a primeira
infância. Após 1988, contudo, a nova legislação
legitima o papel e o compromisso do Estado
com a primeira infância. 
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O ECA reconhece a criança e o adolescente como
sujeitos de direito e preconiza sua proteção integral
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No âmbito da educação, já na Constituição Federal identifica-se a preocupação com
os primeiros anos. O artigo 208, inciso IV, estabelece que “O dever do Estado com a
educação será efetivado mediante a garantia de atendimento em creche e pré-escola às
crianças de zero a seis anos de idade” (BRASIL, 1989). O artigo 211, parágrafo 2º, atribui
aos municípios a responsabilidade por uma atuação prioritária no ensino pré-escolar e
fundamental, da mesma forma que o artigo 11, inciso V da Lei de Diretrizes e Bases da
Educação Nacional. 
Sabe-se, porém, que apenas uma legislação avançada não garante o cumprimento e
a efetivação de todos os seus dispositivos. É necessário mais do que isso: vontade políti-
ca, sensibilidade, envolvimento e comprometimento dos gestores, participação e controle
social, bem como investimentos, articulação entre as várias esferas de governo, entre outros
requisitos. Neste contexto, o PIM emerge como uma experiência e como uma política
pública que visa a dar vida a essa legislação, a garantir de fato os direitos das crianças,
promovendo integralmente o seu desenvolvimento.
O nascimento de um Programa voltado para a primeira infância 
O PIM foi concebido na Secretaria Estadual de Saúde do Rio Grande do Sul, em 2003, pelo
secretário Osmar Gasparini Terra. Com formação médica, interessado nos avanços das pes-
quisas e descobertas das neurociências, Terra sensibilizou-se para o fato de que tais avanços
demonstravam uma relação direta entre os cuidados e estímulos adequados na primeira
infância e o desenvolvimento cerebral e global da criança. Quando eleito prefeito do municí-
pio de Santa Rosa (gestão 1993-1996), Terra quadruplicou o número de creches então exis-
tentes, e capacitou profissionais para cuidar das crianças de zero a três anos de idade. 
Sempre interessado no desenvolvimento dos primeiros anos de vida da criança, Terra
criou uma Organização Não-Governamental voltada para a discussão das políticas públicas
que focalizam este período da vida, o Instituto Zero a Três. Visitou programas de outros
países como o cubano “Educa a Tu Hijo” e verificou os seus significativos benefícios para
o desenvolvimento das crianças cubanas, Programa que se tornaria o modelo inspirador
das linhas básicas do PIM. Sobre essa base, reuniu uma competente equipe técnica e for-
mulou o Programa Primeira Infância Melhor, acolhido e estimulado pelo então Gover-
nador Germano Rigotto (gestão 2003-2006) e implantado oficialmente no Estado em 7
de abril de 2003. Os resultados positivos do Programa sensibilizaram a Governadora Yeda
Crusius, eleita para o mandato de 2007 a 2010, que apoiou e assumiu sua continuidade
e sua importância, como uma das políticas prioritárias do governo. 
Comprometido com o desenvolvimento integral da primeira infância, o PIM articula
esforços das esferas estadual e municipais, da sociedade civil e dos vários setores interes-
sados e comprometidos com a educação e o desenvolvimento das crianças de zero a seis
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anos. Seu objetivo principal é “orientar as famílias, a partir de sua cultura e experiências,
para que promovam o desenvolvimento integral de seus filhos, desde a gestação até os
seis anos de idade, com ênfase no período de zero a três anos”.
Respeitando as experiências e a cultura das famílias atendidas, o PIM tem o protago-
nismo como um dos seus alicerces fundamentais. Toma a comunidade e a família como
o mais importante agente na promoção da saúde e do desenvolvimento de suas crianças.
Contribui para o rompimento do ciclo de pobreza nas famílias atendidas, através da
potencialização de um cuidado e de uma educação de qualidade. É um passo importante
no sentido de tirar do papel os direitos de nossas crianças assegurados em nossa legis-
lação, dando-lhes forma e vida. 
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O protagonismo das
famílias é um dos 
alicerces do PIM
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C A P Í T U L O 1 
Por que investir 
na primeira infância?
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Pode-se afirmar que já é praticamente consenso a importância dos investimentos que
amparam a educação e os cuidados dirigidos à primeira infância, isto é, o período com-
preendido desde a concepção até o sexto ano de vida. Numerosos estudos e relatos de
experiências bem-sucedidas testemunham em favor desta afirmação (BANCO MUNDIAL,
2002; COFFEY, 2007; CUBA; UNICEF; CELEP, 2002; GRUNEWALD; ROLNICK, 2007; LOVE;
SCHOCHET; MECYSTROTH, 2002; KIRPAL, 2002; McCAIN; MUSTARD, 1999; MUSTARD,
2002; SCHNEIDER; TERRA, 2001; TARULLO, 2002; UNICEF, 2005; YOUNG, 1996; 2002; 2007).
Em março de 1990, sob a liderança da UNESCO, a comunidade mundial reunida em
Jomtien, na Tailândia, anunciou a Declaração Mundial de Educação para Todos (também
conhecida como Declaração de Jomtien), reconhecendo que todos os indivíduos têm o
direito a oportunidades educativas que satisfaçam suas necessidades básicas de apren-
dizagem. A Declaração de Jomtien enfocou a educação básica e destacou no seu Artigo
5 que “a aprendizagem começa com o nascimento”, incluindo a educação e os cuidados
na primeira infância (ECPI) como parte da educação básica. Além disso, afirmou que os
serviços destinados à primeira infância poderiam ser proporcionados seja através de
estratégias que envolvessem as famílias e comunidades ou programas institucionais. Esta
afirmação aponta que a primeira infância – a base sólida para todas as aprendizagens
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humanas – é uma área da educação que requer a atenção das políticas nacionais. A
primeira infância foi, assim, declarada como não mais pertencendo somente ao domínio
privado das famílias. 
Apesar das inspirações conceituais e de políticas que a Declaração de Jomtien pro-
moveu, ela, entretanto, não trouxe um progresso significativo na expansão dos serviços
de ECPI nos países. A Avaliação do Ano de 2000 da Educação para Todos (EPT) promovi-
da pela UNESCO mostrou que, naquele início de milênio, dos mais de 800 milhões de
crianças com menos de seis anos de idade, menos de um terço era beneficiado com algu-
ma forma de educação infantil. Além disso, quase 113 milhões de crianças, sendo 60%
meninas, não tinham acesso ao ensino fundamental, e, ainda, pelo menos 880 milhões
de adultos eram analfabetos, a maioria mulheres (UNESCO, 2001). Tais números
afrontam a dignidade humana, impedem a superação da pobreza e o desenvolvimento
sustentável dos países. De acordo com outro estudo conduzido em 2000 por ocasião do
décimo aniversário da Declaração de Jomtien, a visão ampliada de aprendizagem a
partir do nascimento está longe de ser uma realidade. Na maioria dos países, a educação
e os cuidados na primeira infância são ainda entendidos basicamente como educação
pré-escolar ofertada a crianças a partir dos três anos de idade. 
O Fórum Mundial de Educação para Todos, realizado no ano de 2000 em Dacar,
Senegal, promoveu uma avaliação dos progressos obtidos durante a década 1990/2000.
Na ocasião, 164 países do mundo, dentre eles o Brasil, comprometeram-se a envidar
esforços para alcançar, até 2015,
uma educação básica de quali-
dade para todos.
Neste evento, o compromisso
com a educação
e os cuidados na
primeira infância foi renovado e
ampliado. O Marco de Ação de
Dacar fixa seis metas, sendo que
a primeira delas consiste na
“expansão e aprimoramento da
educação e dos cuidados na
primeira infância, especialmente
para as crianças mais vulneráveis
e desfavorecidas” (UNESCO, 2001,
p. 15). Embora esta meta não
apresente dados numéricos a
serem atingidos no período (2000-2015), urge que os governos invistam na expansão do
acesso, na melhoria da qualidade e na eqüidade dos serviços de ECPI. O Marco de Ação
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A expansão e o aprimoramento da educação e dos cuidados na
primeira infância é uma meta de 164 países, inclusive o Brasil.
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de Dacar apresenta uma visão ampliada dos serviços de ECPI, afirmando que devem ser
integrados e abrangentes, respondendo às necessidades de aprendizagem, desenvolvi-
mento e crescimento das crianças pequenas de forma holística. Comparado ao Artigo 5
da Declaração de Jomtien, a primeira meta de Dacar é muito mais específica e direta
em termos dos objetivos das políticas para atingir a ECPI.
O Relatório de Monitoramento Global de Educação para Todos 2007, intitulado
“Bases sólidas: educação e cuidados na primeira infância”, alerta para os riscos que os
países enfrentam ao negligenciar as conexões entre a educação e os cuidados na primeira
infância, a educação primária, secundária e a alfabetização dos adultos (UNESCO, 2007).
Esse relatório adota uma abordagem holística ao considerar que a Educação e Cuidados na
Primeira Infância (ECPI) tem como objeto “o apoio à sobrevivência, ao crescimento, ao
desenvolvimento e à aprendizagem das crianças – o que compreende ocupar-se da saúde,
nutrição e higiene e, bem como do desenvolvimento cognitivo, social, físico e emocional –
desde o nascimento até sua entrada na escola primária em ambiente formal, informal e
não-formal” (UNESCO, 2007, p. 5).
A educação e os cuidados na primeira infância podem melhorar o bem-estar das
crianças em tenra idade, promovendo o seu desenvolvimento integral, sobretudo nos
países que não pertencem ao chamado primeiro mundo. Em tais países, a criança tem
quatro chances em dez de viver na extrema pobreza, e 10,5 milhões morrem por ano,
antes dos cinco anos, em decorrência de doenças preveníveis (UNESCO, 2007). 
Alcançar a justiça social em nosso país, e garantir uma sociedade mais democrática,
igualitária e não discriminatória passa pela atenção à primeira infância. As contribuições
da ciência apontam para a importância fundamental dos seis primeiros anos de vida para
o desenvolvimento saudável do indivíduo. Portanto, programas integrados, dedicados à
educação, cuidados e promoção do desenvolvimento infantil mostram-se como um recur-
so eficiente para reverter o ciclo intergeracional da pobreza nos países, auxiliando suas
crianças, famílias e comunidades. A seguir, apresenta-se um breve panorama da situação
da infância no Brasil, apontando os principais problemas a serem superados, para logo
depois trazer algumas contribuições das ciências e relatos de experiências bem-sucedidas,
que testemunham em favor do investimento na primeira infância.
A situação da primeira infância no Brasil
De acordo com a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios – PNAD 2006 (IBGE,
2007), a população brasileira estimada em 2006 era de 187.228.000. Na faixa de zero a
quatro anos havia 14.210.000 crianças, correspondendo a 7,59% da população. Já na
faixa etária dos cinco aos nove anos de idade estima-se que havia 16.734.000 crianças,
correspondendo a 8,94% da população. A população estimada no Estado do Rio Grande
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do Sul era de 10.984.000, sendo 700.000 na faixa etária de zero aos quatro anos de
idade, correspondendo a 6,37% da população total do estado. Na faixa etária dos cinco
aos nove anos de idade a PNAD 2006 estimou 898.000 crianças, correspondendo a
8,17% da população.
O Brasil está entre os países que possuem menor percentual de população infanto-
juvenil. Em 2005, quando a população brasileira de zero a 14 anos representava 27,8%
da população, o Brasil superava apenas o Uruguai, o Chile e a Argentina, com percentu-
ais de 23,8%, 24,9% e 26,4%, respectivamente (UNITED NATIONS, 2007). Segundo a
PNAD, em 2006, o percentual brasileiro já se reduziu para 26%, significando que naquele
ano viviam no Brasil 48,6 milhões de crianças e adolescentes de até 14 anos. Os fenô-
menos da queda de fecundidade e gradual envelhecimento da população vêm reduzin-
do a proporção dessa faixa etária que, em 1996, representava 31,2% da população. 
Entretanto, esse segmento merece atenção especial por parte das políticas públicas
e projetos sociais. Cerca de 28,9 milhões de famílias brasileiras têm crianças e adoles-
centes com até 14 anos de idade, o que representa quase metade das famílias do país
(48,9%). Essas famílias compõem um segmento vulnerável da população quanto ao nível
de pobreza. Segundo o IBGE (IBGE, 2007), o percentual de famílias consideradas pobres,
que são aquelas com rendimento mensal per capita de até meio salário mínimo, era de
25,1% em relação ao total de famílias brasileiras, em 2006. Se considerarmos as famílias
com crianças de zero a 14 anos, o percentual se eleva para 40,4%. Se considerarmos ape-
nas as famílias com crianças na primeira infância, de
zero a seis anos de idade, a situação é mais dramática:
45,4% dessas famílias vivem com rendimento mensal
per capita de até meio salário mínimo. No Rio Grande
do Sul, esse percentual é de 33,6%. Na faixa de mais
de meio a um salário mínimo per capita, no Estado,
encontram-se 30,6% das famílias, na faixa de mais de
um a dois salários, 20,2% das famílias, e acima de dois
salários mínimos per capita, 10,9% (IBGE, 2006).
Constata-se que as crianças brasileiras de zero a seis
anos compõem um dos segmentos mais vulneráveis da
população, senão o mais vulnerável, devendo ser prio-
rizadas nas ações governamentais e da sociedade civil. 
O Brasil tem, pois, alguns desafios a vencer no que
diz respeito à primeira infância. Além da pobreza em
que vive grande parte dessas crianças, o país necessita
reduzir sua taxa de mortalidade infantil e de desnu-
trição infantil. A universalização do direito ao registro
28
As crianças de zero a seis anos
brasileiras compõem um dos 
segmentos mais vulneráveis da 
população do país
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civil de nascimento, assim como a oferta de pré-natal e parto humanizado para as ges-
tantes também está aquém do que seria o esperado. Da mesma forma, a garantia efeti-
va dos direitos das crianças, conforme estabelecida na Constituição Federal de 1988 e no
Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), de 1990, a redução dos índices de violência
doméstica e dos riscos ao desenvolvimento, a promoção dos fatores de proteção desse
desenvolvimento e da saúde mental de nossas crianças são aspectos que requerem a
atenção e o cuidado dos governos e da sociedade. O trabalho infantil e uma oferta sufi-
ciente e de qualidade na educação infantil também são questões à espera de soluções. 
Um empecilho para que se conheça a situação real da primeira infância no país é o
grande número de crianças não registradas. Segundo estimativas do IBGE, com base em
dados apurados em 2003, a cada ano aproximadamente 750 mil crianças brasileiras com-
pletam um ano de idade sem ter sido registradas, o que corresponde a mais de um
quinto do total de recém-nascidos. Sem o registro civil, requisito básico para seu
reconhecimento como cidadã, a criança não existe perante o Estado e deixa de ter acesso
a uma série de serviços e benefícios que a lei lhe garante. A falta de registro civil dificulta
também
a formulação de programas dirigidos para a população infantil, e agrava
questões como o tráfico de crianças e o trabalho infantil (UNICEF, 2005). 
No campo da educação infantil, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional
(LDBEN) promoveu mudanças importantes a partir de 1996. Creches e pré-escolas, até
então vinculadas à assistência social, tornaram-
se oficialmente reconhecidas como um direito
das crianças e passaram a fazer parte da edu-
cação básica. A LDBEN dividiu a educação infan-
til em creches (para crianças até três anos) e pré-
escolas (para crianças de quatro a seis anos).
Com a nova lei, essas instituições devem se ajus-
tar e evoluir do cuidado básico para a prática
educacional, com um padrão mínimo de quali-
dade e garantindo o acesso de todas as crianças.
Segundo a Síntese dos Indicadores Sociais
(IBGE, 2007), a freqüência escolar das crianças
de zero a seis anos vem aumentando no Brasil,
embora ainda esteja aquém do que seria dese-
jável. Em 2006, o percentual de crianças de zero
a seis anos freqüentando a educação infantil
chegou a 43% (contra 27,5% em 1996).
Porém, há diferenças significativas no acesso à
escola entre as faixas etárias. No grupo de crianças
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Parcela significativa da população brasileira de zero
a seis anos ainda não é atendida pelo sistema de edu-
cação e vive em condições de extrema pobreza
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de zero a três anos, apenas 15,5% freqüentou creches no País em 2006, enquanto no
grupo de quatro a seis anos, 76% das crianças teve acesso à pré-escola naquele ano. As
crianças pobres são as mais prejudicadas no acesso às creches. Do grupo de zero a três
anos, entre aquelas cujas famílias têm uma renda mensal per capita de até meio salário
mínimo, apenas 9,9% freqüentavam creches em 2006, contra 40,7% das crianças de
zero a três anos cuja renda familiar per capita era superior a três salários mínimos. Na
região Sul, esses percentuais variaram entre 11,4 e 44,8%, respectivamente. Nessa
região, 18,3% do total de crianças de zero a três anos teve acesso a creches em 2006.
Entre as crianças de quatro a seis anos, a freqüência tem sido maior, embora a cobertu-
ra ainda não seja integral. Daquelas que vivem em famílias com rendimento mensal per
capita até meio salário mínimo, 68,1% freqüentaram pré-escolas em 2006 no Brasil, e
50,8% na região Sul. Já as crianças dessa faixa etária cuja renda familiar mensal
per capita foi superior a três salários mínimos tiveram mais acesso à pré-escola, tanto no
Brasil como na região Sul, cujos percentuais chegaram a 95,7 e 94,6%, respectivamente. 
A renda das famílias tem maior influência no início da vida escolar das crianças
(creches e pré-escolas) e no ensino médio (15 a 17 anos). O baixo rendimento familiar é
menos sentido no ensino fundamental (seis a 14 anos), o qual é obrigatório e está prati-
camente universalizado no Brasil (IBGE, 2007). Apenas 1.427.942 crianças brasileiras
estavam matriculadas em creches no Brasil (incluindo aqui os estabelecimentos federais,
estaduais, municipais e privados) em 2006 (BRASIL. Ministério da Educação, 2007). Na
região Sul, foram contabilizadas 259.364 matrículas, sendo 75.218 no Rio Grande do Sul.
Na pré-escola, em 2006, 5.588.153 crianças foram matriculadas nos estabelecimentos de
ensino federais, estaduais, municipais e privados em todo o Brasil. Dessas matrículas,
608.007 foram realizadas na região Sul, sendo 189.007 no Rio Grande do Sul. 
Nas regiões urbanas, mais da metade das creches eram instituições privadas (15.891
das 29.562 existentes em 2006) no Brasil. Com relação às pré-escolas, a participação das
instituições privadas também é significativa nas zonas urbanas brasileiras (26.082, de um
total de 59.969 pré-escolas em 2006) (BRASIL. Ministério da Educação, 2007). Esses
fatores dificultam o acesso de um grande contingente de crianças à educação infantil,
conforme preconizado pela legislação brasileira, e nos conduzem a considerar a urgência
e a importância de políticas e programas voltados para a primeira infância. 
O Brasil tem a terceira maior taxa de mortalidade infantil da América Latina, estando
atrás apenas da Bolívia e da Guiana (UNICEF, 2005). No período de 1999 a 2004, houve
uma queda nesse índice, de 32,6%, chegando a 26,6 por mil nascidos vivos. A meta do
governo para 2015 é chegar a um índice de 16 por mil nascidos vivos. Para 2007, é
esperado um índice de 24 por mil nascidos vivos. 
Também é preocupante o fato de que há disparidades entre as regiões e os grupos
sociais. Enquanto no Nordeste a taxa de mortalidade infantil em 2002 foi de 41,4 por mil
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nascidos vivos, na região Sul esse índice foi 17,9. Nesse mesmo ano, o Rio Grande do Sul
apresentou um índice de 15,4 por mil nascidos vivos (UNICEF, 2005). Em 2006, o Rio
Grande do Sul apresentou a menor taxa de mortalidade infantil do país: 13,9 por mil
nascidos vivos. Nesse mesmo ano, Alagoas apresentou a taxa mais elevada, de 51,9,
enquanto a média nacional foi de 25,1 por mil nascidos vivos (IBGE, 2007). 
A redução no índice de mortalidade infantil é associada a melhorias nas condições
de vida da população e à atenção à saúde da criança e da gestante. Questões como segu-
rança alimentar e nutricional, saneamento básico e vacinação são decisivas. Porém, no
Brasil, esses progressos não beneficiam a população de maneira uniforme. 
Além das diferenças regionais, há as diferenças dentro de uma mesma região de
acordo com o grupo social e de acordo com a raça. Assim, em nível nacional, a taxa de
mortalidade infantil relativa aos 20% mais pobres era mais que o dobro em relação aos
20% mais ricos em 2000, de acordo com o UNICEF. A taxa de mortalidade infantil entre
os filhos de mulheres negras era 39,7% maior que a dos filhos de mulheres brancas.
Entre os filhos de mulheres índias essa diferença chegou a 75,6% naquele mesmo ano
(UNICEF, 2005). Portanto, é preciso focalizar os grupos mais vulneráveis nos programas
sociais e de saúde. 
Embora o número de óbitos a partir do segundo mês de vida tenha sido reduzido, a
mortalidade de recém-nascidos se manteve estável, o que aponta para a necessidade de
intensificar o acompanhamento pré-natal, assim como a atenção ao parto e ao pós-parto.
A mortalidade neonatal, causada principalmente pelas afecções perinatais, que são aque-
las que se originam até a primeira semana de vida (prematuridade, asfixia durante o parto
e as infecções neonatais são as mais freqüentes) podem ser prevenidas e/ou reduzidas
com o acompanhamento pré-natal adequado para as gestantes, e reforços nos cuidados
com o parto e o pós-parto (UNICEF, 2005).
O papel desempenhado pela mãe é fundamental na redução da mortalidade infantil.
A recomendação internacional de que o aleitamento materno seja exclusivo até os seis
meses e se prolongue até os dois anos não é seguida no Brasil, onde, segundo dados do
Ministério da Saúde de 1999, apenas 9,7% das crianças alimentaram-se somente com o
leite materno até os seis meses naquele ano. Além disso, o grau de instrução da mãe
também tem um grande impacto sobre o índice de mortalidade infantil, o qual é signi-
ficativamente reduzido conforme aumenta o número de anos de estudo da mãe. 
No que diz respeito à desnutrição infantil, há uma tendência de queda nos
índices encontrados entre crianças menores de cinco anos desde a década de 70. A
proporção de crianças com baixo peso para a idade, que era de 18,4% em 1974, caiu
para
5,7% em 1996, porcentagem menor que a média da América Latina, que é de
8,3%, porém maior que a dos países desenvolvidos, que é próxima de 1%, e ainda
acima do índice recomendado, que é de 4% (UNICEF, 2005). O Semi-Árido brasileiro
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é a região que apresenta os maiores problemas de desnutrição, miséria e vulnerabilidade
da infância. 
Além da deficiência protéico-calórica, relacionada aos indicadores de peso, altura e
idade, a falta de micronutrientes como ferro, vitamina A e iodo (a chamada fome oculta)
pode ocasionar danos à saúde das crianças. A falta de ferro está relacionada à falta de
apetite, podendo chegar até o comprometimento do desenvolvimento intelectual e psi-
comotor. Baixos níveis de vitamina A podem comprometer a visão (até causar cegueira
total) e debilitar o sistema imunológico, aumentando o risco de diarréias que podem levar
à morte. O iodo é necessário para evitar problemas de saúde como retardo do crescimento,
comprometimento do desenvolvimento cerebral e retardo mental severo. Na gravidez, a
falta de iodo pode provocar abortos, má-formação do feto e nascimento de crianças pre-
maturas ou com retardo mental (UNICEF, 2005). 
A desnutrição e as demais deficiências nutricionais têm uma relação muito estreita
com a pobreza, que implica, entre outras coisas, uma alimentação insuficiente e/ou
inadequada. Além disso, em geral, a desnutrição está associada à exposição a doenças
infecciosas. As doenças infecciosas (uma diarréia, por exemplo) elevam o risco de a
criança ficar desnutrida, estabelecendo-se um círculo vicioso de alto risco para a infância.
Sua imunidade poderá ser atingida, o que poderá gerar novas infecções, e assim por
diante. Sendo assim, para que seja possível superar os problemas de desnutrição é
necessária a atenção à saúde da criança, o que implica, entre outras coisas, uma orien-
tação adequada às famílias. 
Entre as principais causas de morte das crianças brasileiras de um a seis anos encon-
tram-se os acidentes e as agressões. “A violência contra a criança é compreendida como
qualquer ação ou omissão que provoque danos, lesões ou transtornos ao seu desenvolvi-
mento. Pressupõe uma relação de poder desigual e assimétrica entre o adulto e a criança”
(UNICEF, 2005, p. 21). É preocupante o fato de que na maioria das vezes a violência
contra a criança acontece dentro de casa, e é praticada pela família. Isso se deve ao fato
de que existem fatores bastante complexos, de ordem cultural, social, psicológica,
econômica. O UNICEF (2005) apresenta uma classificação dessas relações que não
cumprem sua função de proteção à infância. São elas:
• decorrentes de práticas educacionais que lançam mão de violência física: castigo,
palmadas, surras, entre outros;
• acidentes, negligências, abusos, incluindo o sexual;
• ações ou omissões que levam à morte. 
Esses fatores muitas vezes fazem com que a criança se afaste de casa, ou que ela seja
afastada do convívio familiar, o que pode levá-la a outras formas de violência, que podem
ocorrer nas ruas ou em abrigos. Por outro lado, como ocorre em geral em espaços priva-
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dos, a violência pode ficar encoberta por meses e até mesmo anos. Crianças pequenas
não têm como denunciar a violência que sofrem, e nem sempre sua palavra é considera-
da, podendo ser tomada como fantasia. O medo, a vergonha e os sentimentos de culpa
também são fatores que contribuem para o silêncio das vítimas, dificultando a proteção
das crianças e a intervenção sobre tais situações (ROSAS; CIONEK, 2006).
A literatura em geral considera quatro tipos de violência doméstica contra crianças:
a violência física – que corresponde ao emprego de força física no processo disciplinador
de uma criança, ou a toda ação que causa dor física; a violência sexual – que corresponde
a todo ato ou jogo sexual entre um ou mais adultos e uma criança ou adolescente, que
tem por finalidade a obtenção da satisfação sexual do adulto; a violência psicológica –
que se manifesta pela depreciação da criança ou do adolescente, humilhações, ameaças,
impedimentos, causando sofrimento psíquico e minando sua auto-estima. Pode manifes-
tar-se também por atitudes de rejeição ou de abandono afetivo; e a negligência – que
seria a ausência de cuidados físicos, emocionais e sociais, falta de assistência e de cuida-
dos necessários ao bom desenvolvimento da criança (ROSAS; CIONEK, 2006; SILVA, 2002).
Segundo levantamento do Laboratório de Estudos da Criança (LACRI), do Instituto
de Psicologia da Universidade de São Paulo (IP/USP), a modalidade de violência contra
crianças e adolescentes até 19 anos que apresenta maior incidência é a negligência
(UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO, 2007). Os dados disponíveis nesse estudo são relativos
a 70 municípios de 14 estados brasileiros, mais o Distrito Federal, e referem-se a três
meses do primeiro semestre de cada ano. Assim, dos casos notificados em 2006, entre as
crianças e adolescentes vítimas de violência doméstica, 41,1% foram vítimas de
negligência. Em 2007 esse percentual se elevou para 46,3%. A violência física aparece
em segundo lugar, atingindo 26,7% dos casos notificados em 2006 e 25,1% em 2007.
Ela é seguida pela violência psicológica, que vitimou 18,9% das crianças e adolescentes
em 2006 e 19,5% em 2007. A violência sexual esteve presente em 13,2% dos casos noti-
ficados nos municípios pesquisados em 2006, e em 9,0% dos casos em 2007. No Rio
Grande do Sul, em 2007, foram pesquisados nove municípios e o tipo de violência mais
freqüentemente notificada foi a violência física (UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO, 2007). 
A violência doméstica tem um grande impacto em todas as esferas do desenvolvi-
mento da criança e do adolescente, podendo atingir as dimensões afetiva, cognitiva,
social, física e neurológica desse desenvolvimento. Devido à grande quantidade de casos
e à magnitude das seqüelas causadas na pessoa que sofre violência doméstica,
pesquisadores a consideram um dos mais graves problemas de saúde pública
(GONÇALVES; FERREIRA, 2002; HABGZANG; CAMINHA, 2004; HABGZANG et al., 2005,
2006; PFEFFERBAUM; ALLEN, 1998; POLANCZYK et al., 2003; RIBEIRO; FERRIANI; REIS,
2004). Crianças que vivenciam atos violentos cotidianamente podem desenvolver uma
dessensibilização emocional à violência, passando a percebê-la como um componente
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normal da realidade. Quando adultos, podem apresentar dificuldades nos seus relaciona-
mentos interpessoais, transtornos de personalidade, e podem também se tornar pais e
mães que maltratam seus filhos, repetindo o ciclo da violência sofrida. 
Para romper com a violência, é necessário voltar a atenção para a família como um
todo, e não apenas para a criança. Famílias com dinâmicas violentas em geral enfrentam
mais exclusão social do que as famílias que não apresentam essa dinâmica. Para o
UNICEF, “a ampliação, a articulação e a integração de programas e projetos de apoio
sociofamiliar são, portanto, as principais diretrizes da política de convivência familiar”
(UNICEF, 2005, p. 35). A política de assistência social no Brasil foi marcada por uma
mudança de paradigma nesse sentido, tendo elegido a família como a unidade básica
para a ação. Essa política busca estimular que no contexto do Sistema Único de Assistên-
cia Social (SUAS) os trabalhos preventivos de fortalecimento dos vínculos familiares e
comunitários sejam ampliados. Esse é um desafio que merece a dedicação dos gestores,
dos estudiosos e da sociedade brasileira em geral.
Quanto ao trabalho infantil, a PNAD mostrou em 2006 que havia no Brasil cerca de
2.718 milhões de crianças de cinco a 15 anos de idade ocupadas, sendo
que nessa faixa
etária o trabalho é ilegal no país. Houve uma redução com relação a 2005, quando 2.934
milhões de crianças trabalhavam. Na faixa de cinco a nove anos de idade, cerca de 237
mil crianças trabalhavam em 2006, e na faixa dos 10 aos 15 anos 2,5 milhões de crianças
estavam ocupadas. O país vem evoluindo ano a ano na redução desses números. Em
1996, considerando a faixa de 10 a 15 anos, constata-se que o percentual era sete pon-
tos mais elevado, envolvendo o trabalho de 4,2 milhões de crianças. Mesmo assim, trata-
se de um importante desafio a ser superado em prol da infância e da sociedade brasileira. 
A PNAD revela ainda que, dos trabalhadores de cinco a 15 anos de idade em 2006,
51,3% (cerca de 1,273 milhão) estava envolvido em atividade agrícola, sendo que mais
da metade deles (675 mil) residia em estados nordestinos. Outro fator agravante, segun-
do a PNAD (IBGE, 2006), é que entre os jovens de cinco a 17 anos que trabalham a taxa
de freqüência escolar diminui em relação aos que não trabalham, numa proporção de
93,6 para 81%. 
No Rio Grande do Sul, segundo dados divulgados pela Delegacia Regional do Trabalho,
Núcleo de Apoio aos Projetos Especiais (2007), o trabalho infantil ocupa cerca de 11%
de meninos e meninas entre cinco e 14 anos. A maior incidência é na agricultura
familiar, na reciclagem de lixo e no comércio ambulante. Em algumas regiões do Estado,
há registros de jovens trabalhando na extração de acácia, na serra crianças trabalham na
cultura de ervas, especiarias e alho, e na região do Vale dos Sinos e em Erexim crianças
cumprem jornadas exaustivas em ateliês caseiros de fabricação artesanal de calçados. Na
capital, crianças comercializam produtos nas sinaleiras, além de atividades ilícitas como
tráfico de drogas e prostituição. Das 496 cidades gaúchas, apenas 138 possuem comis-
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sões municipais do Programa de Erradicação do Trabalho Infantil (DRT, 2007). Na ocasião
da PNAD (IBGE, 2006), 16,6% das crianças que trabalham no Rio Grande do Sul haviam
começado antes dos nove anos de idade, 56,7% começaram entre 10 e 14 anos, e
26,4% iniciaram entre 15 e 17 anos. 
No que diz respeito aos problemas de saúde mental na infância e adolescência, Hackett
e Hackett salientam que, nos países em desenvolvimento, dados de prevalência são escassos
(HACKETT; HACKETT, 1999). Duarte e outros realizaram uma revisão da literatura sobre
estudos epidemiológicos conduzidos na América Latina e no Caribe e identificaram ape-
nas 10 trabalhos publicados entre 1980 e 1999 (DUARTE et al., 2003). As taxas de prevalên-
cia, baseadas em amostras probabilísticas de crianças e adolescentes, variaram de 15 a 21%. 
A literatura discute os fatores de risco para os problemas de saúde mental na infância.
As crianças e os adolescentes estão expostos a inúmeros fatores de risco, desde os fatores
biológicos (anormalidades biológicas do sistema nervoso central causadas por lesões,
infecções, desnutrição ou exposição a toxinas), os genéticos (história familiar de
depressão, por exemplo), os psicossociais (disfunções na vida familiar, discórdia conjugal
grave, psicopatologia materna, criminalidade paterna, falta de laços afetivos entre pais e
filhos) até os eventos de vida estressantes (morte ou separação dos pais) e a exposição
aos maus-tratos (negligência, abuso físico, psicológico ou sexual) (UNITED STATES, 1999).
Fatores ambientais como comunidades desorganizadas e escolas inadequadas também
podem trazer reflexos negativos para a saúde mental na infância e na adolescência.
Bordin e Paula destacam que “a com-
plexa interação entre fatores de risco
biológicos, genéticos, psicológicos e
ambientais têm impacto negativo sobre
o comportamento e o desenvolvimen-
to” (BORDIN; PAULA, 2007). 
No Brasil, grande parte da popu-
lação de crianças e adolescentes vive em
condições adversas e expostos a muitas
situações de estresse, o que aumenta o
risco de desenvolverem problemas de
saúde mental. Tais problemas comprome-
tem os relacionamentos interpessoais, e
aumentam o risco de fracasso escolar. 
É preciso estar consciente da importância da prevenção precoce em saúde
mental, pois ela está inexoravelmente vinculada à saúde em geral e ao suces-
so no aprendizado escolar, da mesma forma que inversamente associada aos
conflitos com a lei e a privação de liberdade (BORDIN; PAULA, 2007, p. 113).
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Muitas crianças no Brasil ainda vivem privadas dos cuidados
e da educação necessários para o seu desenvolvimento
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Sem a educação e os cuidados adequados, considerável parcela dessas crianças e
jovens se tornará uma população adulta problemática, com sérios prejuízos para esses
indivíduos, para seus familiares e para a sociedade como um todo. 
Algumas contribuições da ciência sobre o desenvolvimento na primeira infância
Os primeiros anos da vida de uma criança constituem um período crucial para o seu
desenvolvimento, em todas as esferas que o compõem: afetiva, cognitiva, social, física.
Desenvolvimento é definido como um processo de mudança no qual a criança passa a
dominar níveis cada vez mais complexos de movimento, pensamento, sentimento e de
interação com pessoas e objetos do ambiente. Desenvolvimento infantil envolve tanto um
gradual desdobramento das características biologicamente determinadas quanto de
traços que resultam das experiências e aprendizagens infantis. Os aspectos físico, mental
e emocional são fundamentais no desenvolvimento global da criança. A aprendizagem é
também crucial para o desenvolvimento. É definida como o processo de aquisição de
conhecimentos, habilidades, hábitos e valores a partir da experiência, experimentação,
observação, reflexão e/ou estudo e instrução (MYERS, 1995, apud EVANS, 2000).
Newcombe, discutindo o conceito de desenvolvimento, o considera em termos das
mudanças que ocorrem ao longo do tempo de maneira ordenada e relativamente
duradoura e que afetam as estruturas físicas e neurológicas, os processos de pensamento,
as emoções, as formas de interação social e muitos outros comportamentos
(NEWCOMBE, 1999). Um dos objetivos de se estudar o desenvolvimento é compreen-
der as mudanças que aparentam ser universais. Por exemplo, as crianças de todo o
mundo sorriem ao ver rostos humanos durante o segundo ou terceiro mês de vida, pro-
nunciam a primeira palavra em torno do décimo mês e caminham em torno do décimo
terceiro. O conhecimento gerado pode ser usado para determinar, entre outras coisas,
que comportamentos são esperados para as diferentes idades. Um segundo objetivo de
se estudar o desenvolvimento é o de explicar as diferenças individuais. Algumas crianças
são sociáveis e extrovertidas; outras têm dificuldades em lidar com estranhos e com novas
situações. Um terceiro objetivo é entender a forma como o comportamento das crianças
é influenciado pelo contexto ambiental ou situação. O contexto ambiental inclui não
apenas a situação imediata, mas também atributos dos cenários mais amplos em que as
pessoas convivem – a família, a vizinhança, o grupo cultural, o grupo socioeconômico.
Estes três aspectos do desenvolvimento infantil – padrões universais, diferenças indi-
viduais e influências contextuais – são todos eles necessários para uma compreensão
integrada do que seja desenvolvimento. 
O desenvolvimento infantil é um processo complexo e contínuo por meio do qual a
criança adquire capacidades crescentes para mover-se, coordenar-se, pensar, sentir e
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interagir com os outros e com o meio que a rodeia (OPAS, 1999). O desenvolvimento
começa antes do nascimento e continua ao longo de todo o ciclo da vida. Desenvolvimento

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