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21ÁÁlp.‘)-5 ote-Sswicrle. (--)L-£-J-L DESINSTITUCIONALIZAÇA0 • 4 E-4 ça2 Este livro reúne textos inéditos no Brasil da internacionalmente reconhecida experiência italiana em Saúde Mental iniciada por Franco Basaglia. Dirige-se não apenas ao profissional de Saúde Mental mas a todos os que buscam um novo agir e pensar a loucura. "A subjetividade do paciente existe verdadeiramente arenas no momento em que ele pode sair do manicômio, ou seja somente quando lhe são atribuídos e reconstruídos os recursos e condições materiais, sociais, culturais que tornem possível o efetivo exercício de sua subjetividade." Franco Rotelli dirertor des Serviços de Saúde Mental de Trieste EDITORA HUCITEC t'ti1'1', isi 78U27:), 3ESINSTITItC0,17/C10 H iCITEC 616.P R841 2001' !Ex.: FRANCO ROTELLI OTA DE LEONARDIS DIANA MAURI 2.a edição EDITORA HUCITEC • P.2/0/2203 ;;• )-; L. ji(2-12 Direitos desta edição reservados pela Editora tlucitec Ltda., Rua Gil Eanes, 713 - 04601-042 São Paulo, Brasil. Telefone: (11)5044-9318 (geral), 5543-5810 (vendas) 5093-5938 (fax). e-mail: hucitec@terra.com.br Home-page: www.hucitec.com.br SUMÁRIO ISBN 85-271-0123-8 Depósito legal efetuado (Decreto n.° 1.825, de 20/12/1907) Ilustração ria rapa. fotografia de Romeu di Sessa, de manifestação de arte de Eduardo de Oliveira, Hercilio Trindade, José Rodrigues Borrs, Leo Alexandre Forensen Gou- veia, Pedro Manuel e Roberto do Amaral Gomes. Este mural encontra-se no Núcleo de Atenção Psico-Social da Zona Noroeste, Santos, São Paulo. Apresentação Fernanda Nicricio 1. Desinstitucionalização, uma outra via . Franco Rotelli, Ota de Leonardis, Diana Matai 2. O inventário das subtrações Franco Rotelli 3. Prevenir a prevenção Ota de Leonardis, Diana Mauti, Franco Rota 4. A instituição inventada Franco Rotelli 9 17 61 65 . 89 5. Uma análise crítica dos fundamentos epistemo- lógicos na concepção de anormalidade e de psi- copatia em Kurt Schneider 101 C. de Risio, Franco Rotelli 7 DESINSTITUCIONALIZAÇÃO, UMA OUTRA VIA A Reforma Psiquiátrica Italiana no Contexto. da Europa Ocidental e dos "Países Avançados" j1/ SÍNTESE FRANCO ROTELLI diretor dos Serviços Psiquiátricos de Trieste OTA DE LEONARDIS Universidade de Salemo, Instituto de Sociologia DIANA MAURI Universidade de Milão, Instituto de Sociologia Este ensaio analisa a experiência italiana de desinstitucio- nalização em Psiquiatria com a qual foi amadurecida uma reforma conhecida em nível internacional porque é a única nas sociedades industriais que aboliu a internação no Hospi- tal Psiquiátrico do con'unto de prestações e serviços d2 saúde mental.' E os autores assinalam a diferença em relação às ou ras re ormas psiquiátricas na Europa e nos Estados Unidos, nas quais a desinstitucionalização foi redu- Tradução de Maria Fernanda de Silvio Nicácio (Universidade de São Paulo), do original italiano "Deistituzionalizzazione, un'altra via (la Rifor- ma Psichiatrica Italiana nel contesto dell'Europa Occidentale e dei `paesi avanzati)"; publicado em Health Promotion, Oxford University Press, 1986 vol. 1 n. 2. Revisão da tradução: Beatriz Ambrósia do Nascimento (Univer- sidade Federal de São Carlos) e Denise Dias Barros (Universidade de São Paulo). 1 Na realidade, até agora, somente no Estado de Saskatchewan (Canadá) se optou pelo fechamento de fato dos hospitais psiquiátricos, enquanto em alguns estados Gos r ir",?Wkilguns hospitais foram suprimidos Sr, in..rn rá.o, r ia, íes pragmáticas na 1 na Suécia por parte dos respectivos governos. 17 3 o zida à desospitiáiiNau, fazendo uma síntese crítica dos pro- blemas e falências dessas reformas. E ão reconstruídos os diferentes conteú- dos e métodos da desinstitucionalização italiana nos locais onde foi efetivada, começando pela (crítica do paradigma racionalista problema-solução• como normalmente é aplica- do em Psiquiatria. Os autores colocam em evidência que a verdadeira desinstitucionalização em Psiquiatria tornou-se na Itália um processo social complexo que tende a mobilizar como atores os sujeitos sociais envolvidos, que tende a trans- formar as relações de poder entre os pacientes e as institui- ções, que tende a produzir estruturas de Saúde Mental que substiti~ inteirarael lie c1;111%..iaação ao Hospital Psiquiá!ri coe que nascem da desmontagem e reconversão dos recursos materiais e humanos que estavam ali depositados. Para argu-1 mentar este último ponto os autores se referem em particular ao exemplo da organização dos Serviços de Saúde Mental de Trieste. Em , é examinada a lei de Reforma que surge no interior esse processo e as características de sua imple- mentação, para mostrar que a desinstitucionalização, como processo social, continua através desta implementação. Os autores concluem que coei estes significados a &sins:- titucionalização não se esgota com a chámadaWise do ao contrário, ela oferece indicações im ortantes ara produzir inovações nas políticas sociais do ós-Welfare. Se o objeto observado é a transformação da instituição psiquiátrica, nossa opinião é que o discurso que apresenta- mos tem também implicações referentesa toda a organização sanitária, sobretudo em relação à crise dos projetos sanitários que se contrasta com a transformação cy instituição psiquiá- trica nesta fase histórica. O presente estudo representa somente a primeira parte de um trabalho que na seqüência pretende analisar o signifi- cado do processo de desinstitucionalização-ao nível das rela- ações interpessoais-e ain-wort4e„Gia-c4iTelpáíristit.,,c;:- nalização na abordagem do mundo psicopatelógicó individual. 1.,k PSIQUIATRIA REFORMADA NA EUROPA E NOS ESTADOS UNIDOS: a desinstitucionalização torna-se desospitalização A grande estação de reforma na Europa e nos Estado -s Unidos, que envolveu e por vezes transformou em várias medidas os sistemas de saúde mental, foi impulsionada pelo intento de renovar a capacidade terapêutica da Psiquiatria, liberando-a dá suas funções arcaicas de controle social, coação e segregação'-. Neste contexto cultural e político a desinstitucionalização era uma palavra de ordem central uti- lizada para muitos e diferentes objetivos: para os reformado- res ela sintetizava precisamente esses objetivos; para os gru- pos de técnicos e poifticos radicais ela simbolizava a perspec tiva da abolição de todas as instituições de controle social, e 1 se emparelhava à perspectiva antipsiquiátrica; para os admi- nistradores, ela era sobretudo um programa de racionaliza- ção financeira e administrativa, sinônimo de redução de lei- tos hospitalares e uma das primeiras operações conseqüentes da crise fiscal. _ -- - É sobretudo com este último significado que_a desinstitu cionalização foi realizada, ou seja, foi prnticada como desos- pitalização, poiflica de ali as tiopitolarcs, redução moí, , .^;n- \ - menos gradual do número de leitos (e em alguns casos;-- -" eriibora não freqüentemente, de fechamento mais ou menos brusco de hospitais psiquiátricos). Entre outros aspectos, como é sabido, nesta versão a desinstitucionalização sobre- vive à crise dasPoltticas de saúde mental que dela fizeram uma bandeira, e revela-se coerente com as orientações neo- liberais e conservadoras de redimensionamento do próprio Tomada como bandeira, ou "mito", a desinstitucio- 2 É significativo observar que este processo nem ao menos "arranhou" a situação de outro grande país industrializado, o Japão, onde, ao contrá- rio, o desonvoKinicin;rifirriniernação psiquiátrica se ampliou enui me- ':'. ío.i alingir a cifra dos. 18 19 „ g nalizaçãofoi imputada aos reformadores e reevocada para liquidar a vontade de mudança daquele período ou para alimentar as autocríticas dos próprios reformadores. Para orientar a discussão sobre o significado adquirido pela própria desinstitucionalização para os grupos de técni- cos que a Sustentaram com extrema exigência nas experiên- cias desenvolvidas na Itália, afirmamos desde já que esta não foi entendida nos termos redutivos de urna perspectiva "abo- licionista" do tipo político radical, e também nunca se iden- tificou com a desospitalizaçãO (e isto particularmente nos locais que promoveram a Reforma de 1978). Em suas intenções todas as reformas psiquiátricas dos anos 60 nc "r- •!rcp-4 se propunham a 2.tingfr superação gradual da internação nos manicómios através da criaçao de serviços na comunidade, do deslocamento da intervenção terapêutica para o contexto social das pessoas, a prevenção, a reabilita- ção etc... Esta transformação da forma organizativa dos siste- mas de saúde mental rompeu o predomínio cultural do mo- delo segregativo clássico da Psiquiatria, no qual o manicômio constituía a única resposta ao sofrimento psíqUico. E nesta perspectiva foram multiplicadas as estruturas extra-hospita- lares, médicas e sociais, que deveriam assistir aos pacientes egressos deis hospitais psiqUiátricos e constituir um filtro contra hospitalizações ulteriores. Mas quais efeitos, desejados ou não, esta mudança produ- ziu na prática? Que eficácia tem demonstrado em relação ao objetivo de superar a internação? As análises sobre a psiquia- tria reformada põem em evidência alguns traços comuns: a) A internação psigitidtrica continua a existir na Europa e nos Estados Unidos. Em todos os sistemas de saúde mental nascidos das reformas, malgrado as intenções que as anima- vam, permaneceram os hospitais psiquiátricos e as estruturas de internação que têm um peso não secundário: calcula-se, por exemplo, que na Europa estas estruturas contêm cerca de uni milhão de pessoas. As política de desoápitaJização foi acoinpanhada por uma redução no período das internações 20 e por uni aumento complementar de :3;tas e de recidivas. Em outras palavras, os hospitais psiquiátricos são em parte reor- ganizados segundo atAgica do(Grevolving doo s.). Ao mesmo tempo, e ao lado desses hospitais, começaram a funcionar outras estruturas de tipo assistencial ou judiciário que inter- nam e asilam pacientes psiquiátricos. A desinstitucionaliza- ção, portanto, entendida e praticada como desospitalização, produziu o abandono de parcelas relevantes da população psiquiátrica e também uma transinstitucionalização (passa- gem para casa de repouso, albergues para anciãos, cronicá- rios "não psiquiátricos" etc...) e novas formas (mais obscuras) de internação _(Rose 1979, Warren 1980, Scull 1981, Morris- sey 1982). _ b) Os sei viços ter itoriais ou de comunidade convivem com a internação mas não a substituem, ao contrário, como vere- mos, confirmam sua necessidade. Os serviços territoriais são os lugares nos quais se expressa a renovada intenção terapêu- tica da Psiquiatria, que queria finalmente libertar-se da fun- ção imprópria de custódia e de coação. Esses serviços se desenvolveram junto ao hospital psiquiátrico e se especiali- zaram seguido a lógica de "um serviço para cada problema" (Castel e outros 1979, De Leonardis c Mauri 1980, 1983). Isto é, cada problemà vem selecionado e assumido com base no critério da coerência e da pertinência aos códigos da prestação do serviço. Em geral, na Europa, os serviços psi- quiátricos têm utilizado esta lógica para diferenciarem-se em três modelos principais: o modelo médico, que tem seu lugar institucional no hospital geral e sua prestação principal na ministração de fármacos; o modelo do auxílio social, que privilegia as condições materiais da vida da pessoa e oferece assistência social; o modelo de escuta terapêutica, que privi- legia a vivênciasiketi a ia Esta subdi- visão macroscópica se concretizou em uma total comparti- mentalização e ausência de relações entre estes diversos 'tipos de serviços, qum qPRinrarn separando-se uns dos outros e articulando-se én. Infla posterior especialização e fragmen- 21 tação por tipos singulares de p; estação. Este desenvolvimen- to é particularmente observável no campo das psicoterapias (Castel 1981). As análises sociológicas e sócio-psiquiátricas têm insistido em apontar os riscos presentes nesta difusão e especialização dos serviços psiquiátricos na comunidade: psiquiatrização dos problemas sociais e difusão capilar dos mecanismos de controle social na comunidade (nota-se o caso extremo das terapias para os normais). Mas estas preocupações deixaram de lado outros efeitos complementares a estes, ou seja, os efeitos de seleção, de falta de resposta aos problemas e sofrimentos das pessoas, de abandono. Dctenhamo-nos um 'N momento neste'aspeeto. O elevado nível de especializ2,;ko e de refinamento das técnicas de intervenção tem como con- seqüência uma correspondente elevação da seleção de pa- cientes assumidos, ou seja, os serviços funcionam segundo uma lógica de empresa: selecionam os problemas com base na própria competência e quanto ao restante podem dizer "não é um problema nosso". Isto significa em primeiro lugar que os pacientes devem saber colocar a requisição coerente com o tipo de serviço ou devem ser conscienciosos, ou ao menos devem apresentar problemas pertinentes às presta- ções oferecidas. Em segundo lugar, a eficácia das prestações preconizadas, freqüentemente motivada pelo esforço de especialização profissional dos operadores dos serviços, se confrontada e relativizada em relação ao grande número de perguntas e problemas que não são nem ao menos conside- rados, revela-se muito insuficiente. Ao final, e como conse- qüência, esta forma especialista e seletiva de funcionar dos serviços psiquiátricos faz com que as pessoas sejam separa- das, "despejadas", jogadas de um lado para outro entre com- petências diferentes e definitivamente não sejam de respon- sabilidade de ninguém e sim abandonadas a si mesmas. O abandono dc que foram acusadas as políticas de desospitali- za& é uma prRica cotidiana, ainda que mais leve e iMtpa -rente, dos serviços territoriais. Este abandono produz nova 22 cionicitiatie e aiimen, e necessidade dc lugares nos temporariamente, possa "despejar" e internar os pacientes. c) O sistema de saúde mental funciona como um circuito. Aí análises sociológicas e piiquiátricas sobre a psiquiatria reformada colÓcam em evidência que entre os serviços da comunidade e as estruturas de internação existe uma com- plementaridade, um jogo de alimentação recíproca; fala-se de "efeitos hidráulicos", de "circuito" (Bachrach 1976, Feeley 1978, Steadman & Monahan 1984). Particularmente a ima- gem do circuito coloca em evidência o fato de que na psiquia- tria reformada a "estática" da segregação em uma instituição separada e total foi substituída pela "dinâmica" da circulação entre serviços especializados e prestações pontuais e frag- mentadas. Assim, funcionam: o centro para intervenção du- rante a crise, o serviço social que distribui subsídios, o ambu- latório que distribui fármacos, o centro de psicoterapia etc... Assim também funcionam os locais de internação, os quais também são organizados, como vimos, segundo a lógica do "revolving door" e portanto exemplificam o funcionamento em circuito do sistema em seu conjunto. No circuito eles representam um "ponto de descarga" necessário, temporário e recorrente., O circuito é, entretanto, também uma espiral, ou seja, um mecanismo qtie alimenta os problemas e os torna crônicos. Não por acaso, o dilema central e dramático dos sistemas de saúde mental nascidos das reformas não são mais os velhos pacientescrônicos egressos dos hospitais psiquiátricos com a desospitalização, mas os novos crônicos. Pensemos no caso dos Young Adult Chronic Patients que lotam os serviços nos E.U.A.: eles são jovens, uma multidão trazendo problemas diversos (sociais e econômicos, de saúde, psicológicos), per- turbam a ordem pública, não são redutíveis a categorias diagnósticas definidas, circulam entre os serviços sem nunca construir uma relação estável. E naturalmente habitam peri- odicamente os locais para internação (Bachrach 1982, Pep- per & Ryglewicz 1982), 23 (E 6,41-)-k\> ° EXPERIÊNCIA ITALIANA Portanto esse jovens representam de forma exemplar aquilo que se produz no funcionamento em circuito dos novos serviços psiquiátricos: um número maciço e crescente de crônicos, um sentimento difuso de impotência e frustra- ção entre os Operadores e a necessidade de locais de inter- nação que funcionem como válvula de escape. Podemos então concluir estas breves notas sobre os siste- mas de saúde mental nos países "avançados" nascidos das reformas, firmando que o balanço desta desinstitucionaliza- çãd não pode ser senão um balanço negativo. 1. A intenção de liberar a Psiquiatria (e o seu objeto) da coação e da cronicidade que esta produzia para restituir-lhe o estatuto terapêutico resultou na construção de um sistema wmplexo de prestações que, reproduzindo ,,illtiplicando a lógica somente negativa da desospitalização selecionam, de- compõem, não se responsabilizam, abandonam. A nova cro- nicidade então produzida constitui o sinal mais macroscópico e dramático da falência dessas intenções. Na realidade pode- se avançar na hipótese de que no fundo deste processo estivesse a exigência de relegitimar a Psiquiatria "liberan- do-a" de sua relação histórica com a justiça e de seu ser imanente às políticas de controle social; dar-lhe uma digni- dade exclusivamente "terapêutica". É rázoável reter que este é um projeto impossível, mas que atrav4 dessas operações} tenta-se fazê-lo parecer real. 2. Um sinal complementar desta falência está no fato de que esta forma de de,sinstitucionalização não alcançou o objetivo de superar a necessidade da coação e, portanto, dos locais de internação. Eles permanecem e se confirmam como um elemento necessário ao funcionamento do sistema como um todo. Não é simples explicar positivamente o que foi e O que —é a desinstitucionalivação nos locais que prepararam a refor- ma: trata-se definitivamente de reconstruir todo o processo de transformação da instituição psiquiátrica desenvolvido ao longo de mais de, vinte anos e que deixou sua marca em múltiplas dimensões: do microcosmo da relação terapêutica (e das concepçõeá e práticas de tratamento) à dimensão da construção de uma nova política psiquiátrica (e das concep- ções e práticas da ação política). Consideramos importante tratar de identificar as características do processo de desins- titucionalização nestes lugares, exatamente porque, também na Itália, corre-se o risco (ou pior) de passar a realizar não a desinstitucionalização assim como ela foi intencionada, mas a versão'que ilustramos esquematicamente nas páginas ante- riores. 2.1. Desinstitucionalizar o paradigma A partir do observatório do manicômio em Gorizia nos anos 60, um grupo de psiquiatras inovadores percebeu que a Psiquiatria, desde sempre, não consegue adequar os seus métodos de trabalho "aos princípios abstratos" que a gover- nam, assim como às outras i::stituições do Estado Moderno que dividem entre si as competências de interpretações e de intervenções nos problemas sociais (em particular a medici- na, a justiça e a assistência, que fazem fronteira com a Psi- quiatria). Estas instituições funcionam (ao menos assim se legitimam) com base em uma relação codificada entre "defi- nição e explicação do problema e resposta (ou solução) racional", tendencialmente ótima3. Para esclarecer melhor a 3 A reflexão crítica sobre o teorema racionalista problema-solução é um campo que se abriu muito recentemente no âmbito das ciênéias sociais e politolágicas. Para uma concretização no terreno das políticas sociais ver Nelson (1977), Bardach, Kegan (1982), Boudon (1984), March (1978, 1981); para as implicações na vertente terapêutica ver Watzla- wick et al 1974. Esta temátiézté,mentretpnto um ernbasainento teórico de maior alcance nos. studos sobre rc2ion:.1cladc c, cm particular, sobre racionalidade limitada — ver por exempto Elster .'1979). 24 25 ação deste paradigma racionalista problema-soluçao é sufi- ciente referir-se à terapia no âmbito da medicina. A terapia entendida não tanto como uma relação individual entre mé- dico e paciente mas sobretudo como um sistema organizado de teoria, normas, prestações — é em geral o processo que liga o diagnóstico ao prognóstico, que conduz da doença à cura. Este é portanto um sistema de ação que intervém em relação a um problema dado (a doença) para perseguir uma solução racional, tendencialmente ótima (a cura). Entretan- to, apesar dos pressupostos científicos e dos fins terapêuticos que pretendia ter, a Psiquiatria constitui uma primeira práti- ca desconfirmadora deste paradigma racionalista. Esta des- confirmação apresenta-se em primeiro lugar no objeto da competência psiquiátrica: a doença mental. De fato, desde suas origens, a Psiquiatria está condenada a se ocupar de um objeto, a doença mental, que na realidade é bastante "não conhecível" e freqüentemente incurável (Blculer 1983); mal- grado os enormes esforços para dar-lhe uma explicação e definição racional, ampliando e tornando mais complexo o quadro das causas (com as contribuições da psiquiatria social e relacional, as pesquisas epidemiólogicas, biológicas, imu- nológicas etc...) ao final da cadeia causal a doença continua largamente indeterminada c indefinida; e ainda, apesar do desenvolvimento das terapias de "choque", das farmacológi- cas, das psiCoterapias etc... a cronicidade continua a ser o objeto por excelência, o problema e o sinal mais evidente da impotência da Psiquiatria cm alcançar a solução-cura (e os manicômios são a evidência concreta de tudo isto). A desconfirmação do paradigma racionalista está presente também na forma assumida pela instituição psiquiátrica: o manicômio efetivamente se constitui sobretudo como local de descarga e de ocultamento de tudo aquilo que, como sofrimento, miséria ou distúrbio social, resulta incoerente frente aos códigos de interpretação c de intervenção (de problema-solução) das instituIções que fazem fronteira com a Psiquiatria, oo seja, a medicina, a justiça e a assistência. E por isso a Psiquiatria se constitui em ..última instância na fronteira, no cruzamento dessas instituições e assume o dever de absorver no seu interior tudo aquilo que resta da lógica problema-soluçá que a governa e, portanto, todos os pro- blemas que ao resultarem incoerentes, insolúveis e irredutí- veis são por isso expulsos. Neste sentido a Psiquiatria revela ser uma instituição que mais do que qualquer outra coisa administra aquilo:que sobra, isto é, uma instituição, residual ela mesma, que detém, em relação ao sistema institucional em sua totalidade, um poder tanto vicário quanto insubs- tituível. Por isso, a crítica ao manicômio desenvolvida na Itália fez deste um ponto de verdade, não tanto pelo atraso da Psiquia- tria, quanto de sua própria (a dos aparatos contíguos) iden- tidade; um ponto dcvcrdadc que ilumina também o presente. De fato, como se pode depreender do balanço crítico esbo- çado anteriormente, a Psiquiatria nascida das reformas faliu, seja no objetivo de superar a cronicidade, seja no objetivo de liberar-se da sua "função" de coação e internação. No seu conjOnto,.a. impüssibilidade de conhecei• o proble- • ma e de construir uma solução aparece como uma falta constitutivada Psiquiatria que, uma vez cnfocada, lança uma luz crítica sobre o' acúmulo de códigos diagnósticos, aparatos organizalivos e administrativos, especializações terapêuticas. Isso tudo aparece como uma moldura feita mais para encobrir c remover aquela falta constitutiva da Psiquiatria e talvez também através da separação do problema não resolvido, para manter a salvo, paralelamente, a credibilidade do teore- ma racionalista problema-solução. Em outras palavras, os psiquiatras inovadores italianos (em Gorizia, nos anos 60, e depois cm Trieste, nos anos 70 e atualmente) trabalham com a hipótese dc que o mal obscuro da Psiquiatria está em haver separado um objeto fictício, a "doença", da global 26 27 7 roilinlext: e cona e!:, -4 dos pueiciiks cie,/ ;‘)o •obre esta separação artificial se construiu um conjunto de aparatos científicos, legislativos, administrativos (precisamente a "ins- tituição"), todos referidos à "doença". E este conjunto que é preciso desmontar (desinstitucionalizar) para retomar o con- tato com aquela existência dos pacientes, enquanto "existên- cia" doente. Todavia, o caráter radical desta crítica do manicômio co- mo ponto de verdade da Psiquiatria e de seu papel no sistema ínstitucional não leva os psiquiatras inovadores italianos a tomar o atalho da antipsiquiatria; o percurso que se coloca é mais complexo e indireto: é preeisamente o percurso da decinstitucionalizacão. Neste se continua a realizar o objeti- vo e a "função" terapêutica (portanto não se faz "pci e ao mesmo tempo utiliza-se o poder, residual mas insubsti- tuível, que a Psiquiatria tem no sistema institucional como poder de transformação (e portanto se faz "política"). O primeiro passo nesta direção, ou seja, o primeiro passo da desinstitucionalização, foi o de começar a desmontar a relação problema-solução, renunciando a perseguir aquela solução racional (tendencialmente ótima) que no caso da Psiquiatria é a normalidade plenamente restabelecida. Isto, comoveremos, não significa, em absoluto, renunciar a tratar, a cuidará. Esse "rejeitar" a solução posSibilita uma mudança de ótica profunda e duradoura que atinge o conjunto das ações e interações institucionais. Não se está mais diante de um problema dado em relação ao qual se formulam e se 4 N.T. - A palavra italiana complessivo literalmente diz respeito a algo considerado em seu conjunto, em sua totalidade, mas que no texto tem também o significado de complexo e concreto. Neste sentido quando há referência à existência complessiva traduzimos por existência global, complexa e concreta. 5 Esta qualidade de "renúncia" pertence de fato à família das assim chamadas "estratégias indiretas" de que fala Ester (198,1) a propósito daqueles objetivos que, ramo a saúde, se ttlo somente como bypro(hicts (ver também nota 10).. 28 experimenti soluções; ao contrário, estamos irai): ;Lados :1-3 confronto com uma estrutura de respostas científicas, tera- pêuticas, normativas, organizativas, que se autolegitimaram como soluções racionais, definindo, plasmando e reproduzin- do o problema à sua própria imagem e semelhança. A partir da observação do manicômio (e não é assim também, em muitos sentidos, para o hospital geral?) se torna evidente que na relação que liga o problema à solução é a solução que formula o problema, no sentido de que é ela que lhe dá nome e forma. Por isso este primeiro passo da desinstitucionaliza- ção consiste no fato de que não se pretende enfrentar a etiologia da doença (ao contrário, renuncia-se efetivamente a qualquer intenção de explicação causal), mas, ao contrário, se adota a direção de unia intervenção prática que remonte a cadeia das determinações normativas, das definições cien- tíficas, das estruturas institucionais, através das quais a doen- ça mental — isto é, o problema — assumiu aquelas formas de existência e de expressão6. Por isso, a reproposição da solu- ção reorienta de maneira global, complexa e concreta a ação terapêutica como ação de transformação institucional. Retomando e precisando o título desta seção podemos então afirmar que a desinstitucionalização é um trabalho prático de transformação que, a começar pelo manicômio, desmonta a solução institucional existente para desmontar (e remontar) o problema. Concretamente se transformam os modos nos quais as pessoas são tratadas (ou não tratadas) para transformar o seu sofrimento, porque a terapia não é mais entendida como a perseguição da solução-cura, mas como um conjunto complexo, e também cotidiano e elemen- tar, de estratégias indiretas e mediatas que enfrentam o problema em questão através de um percurso crítico sobre os modos de ser do próprio tratamento. O que é, portanto, 6 Esta mudança de ótica foi provisoriamente definida ;las elaborações do movin-;eMo de transfarrnação da psiquiatt ia "epidemuilc,f,ia ção"; ver Basaglia 1982, Mauri 1983, 1.° Capítulo. 29 Lesse sentido "a instituição" nesta nova acepção? É o con- junto de aparatos científicos, legislativos, administrativos, de códigos de referência e de relações de poder que se estrutu- ram em torno do objeto "doença". Mas se o objeto ao invés de ser "a doença" torna-se "a existência-sofrimento dos pa- cientes" e a sua relação como corpo social, então desinstitu- cionalização será o processo crítico-prático para a reorienta- ção de todos os elementos constitutivos da instituição para ,este objeto bastante diferente do anterior. A ruptura do paradigma (fundante dessas instituições) se refere à passagem da pesquisa causal à reconstrução de uma concatenação possibilidade-probabilidade; rompe-se a rigi- dez mecanicista constitutiva do procem de "doença". O processo de desinstitucionalizaçao torna-se agora re- construção da complexidade do objeto. A ênfase não é mais colocada no processo de "cura" mas no projeto de "invenção de saúde" e de "reprodução social do paciente". Alude-se à pouca verossimilhança da nossa ciência. Se não existe mais um mundo produtivo definido no qual estar, não existe mais uma saúde, mas existem mil. Trata-se de decidir que é possível reproduzir-se cm mil modos, mas que estes devem ser praticáveis. Trata-sede utilizar a riqueza infinita dos papéis sociais possíveis, mas é imprescindível promover ativamente estas possibilidades. O problema não é cura (a vida produtiva) mas a produção de vida, de sentido, de sociabilidade, 'a utilização das formas (dos espaços coletivos) de convivência dispersa. E por isso a festa, a comunidade difusa, a reconversão contínua dos re- cursos institucionais, e por isso solidariedade e afetividade se tornarão momentos e objetivos centrais na economia tera- pêutica (que é economia política) geie está inevitavelmente na articulação entre materialidade do espaço institucional e potencialidade dos recursos subjetivos. Neste ponto; a partir da ruptura do paradigma clínico se institui, o papel central das seniços_moderngs, do Welfare verdadeiro, como multiplicador institucional de energia. E aqui se coloca num nível não formal o problema das fontes de energias a serem mobilizadas no processo de implantação da Lei 180 — falaremos disto mais adiante. Permanecendona "clínica", a questão colocada pela desinstilucionaliza ção é que não poderemos imaginar uma psicopatologia e uma clínica que não incorporem na análise, e depois na prática terapêutica e de transformação, as estruturas existentes, os operadores, o campo psiquiátrico. A emancipação terapêutica (que se toma o objetivo substituto da "cura") só pode ser (cientemente) a mobilização de ações e de comportamentos que emancipem a estrutura inteira do campo terapêutico. Este trabalho de desconstrução, sobretudo a partir do interior do manicômio, apresenta alguns aspectos cruciais que contribuem para enfatizar melhor o significadoda de- sinstitucionalização italiana e a modalidade da sua evolução sucessiva. 2.2. A desinstitucionalização mobiliza todos os atores envol- vidos no sistema de ação institucional Os principais atores do processo de desinstitucionalização _ são antes de tudo os técnicos que trabalham no interior das instituições, os quàis transformam a organização, as relações e as regras do jogo exercitando ativamente o seu papel terapêutico de psiquiatras, enfermeiros, psicólogos etc... So- bre esta base também os pacientes se tornam atores e a relação terapêutica torna-se uma fonte de poder que é utili- zada também para chamar à responsabilidade e ao poder os outros atores institucionais, próximos ou não, os administra- dores locais responsáveis pela saúde mental, os técnicos das estruturas sanitárias locais, os políticos etc... Em outras pala- vras, os técnicos da saúde mental ativam toda a rede de relações que estruturam o sistema de ação institucional e dinamizam as competências, os poderes, os interesses, as demandas r.ociais (Crozier, Friedberg 1977), Por iso 30 31 eles fazem também, indiretamente, política. Mas apenas in- diretamente, ou seja, permanecendo ligados a seu papel, que é uma fonte de poder e uma condição para praticar concre- tamente os objetivos de mudança. Este é um aspecto impor- tante da desinstitucionalização italiana, que a diferencia das outras experiências, as quais têm sido projetadas por políti- cos reformadores, aplicadas por administradores, ou procla- madas como objetivo político de grupos e movimentos radi- .,cais. Na Itália, ao contrário, a desinstitucionalização se con- figurou como um trabalho concreto e cotidiano dos técnicos que produziram degrau por degrau as mudanças. A nova política de saúde mental vem sendo: construída from the bottom up (Thrashcr, Dunkley 1982), no concreto, no local e a partir do interior da instituição (e também a política é usada como meio ou como recurso). Por isso aí se encontram investindo, envolvidos e mobilizados, os sujeitos sociais como atores da mudança: os pacientes, a comunidade local, a opinião pública, os sujeitos políticos institucionais e não institucionais. Esta maneira de praticar a desinstitucionaliza- ção suscita e multiplica as relações, isto é, produz comunica- ção, solidariedade e conflitos, já que mudança das estruturas e mudança dos sujeitos e de suas culturas só podem acontecer conjuntamente (Rotelli 1981, Melucci 1982, Balbo, Bianchi 1982, De Leonardis 1986). O O objetivo prioritário da desinstitucionalização é trans- formar as relações de poder entre instituição e os sujei- tos e, em primeiro lugar, os pacientes. Inicialmente, isto é, no trabalho dei desconstrução do ma- nicômio, esta transformação é prodUzida através de gestos elementares: eliminar os meios de contenção; restabelecer a relação do indivíduo com o próprio corpo; reconstruir o direito e a capacidade de uso dos objetos Pe-s-soa'is; recons- truir o direito e a capacidade de palavra; eliminar a ergotera- pia; abrir as portas; produ -iir relações, espaços e objetos de interlocução; liberar os sentimentos; restituir os direitos civis eliminando a cpação, as tutelas jurídicas e o estatuto de periculosidade; reativar uma base de rendimentos para poder ter acesso aos intercâmbios sociais. Trata-sede mudanças simples mas bastante visíveis; volta- mos a propô-las aqui por duas razões: em primeiro lugar, porque o nosso conhecimento direto dos locais de internação hoje existentes na Europa, na Psiquiatria reformada, e nossas análises sobre as normas que as regulam nos demonstram que estas mudanças estão ainda, em grande parte, por serem efetivadas. Em segundo lugar, porque a simplicidade destas mudanças ajuda a compreender .c.oznaa-desinstitucionaliza- ção é_sobretudo um trabalho terap"euticovoltudo paro (lir- constituição das pessoas, enquanto pessoas que sofrem como sujeitos. Talvez não se "resolva "por hora, não se "cure" agora, mas rio entanto seguramente "se cuida". Dej55is cré ter descar- lado "a solução-cura" se descobriu que cuidar significa ocu- par-se, aqui e agora, de fazercoun que se transformem os modos de viver e sentir o sofrimento do 'paciente" e que, ao mesmo tempo, se transforme sua vida concreta e cotidiana, que ali- menta este sofrimento. Uma existência mais rica de recursos, de possibilidades e de experiências' é também uma existência em mudança. Cer- to, o sofrimento psíquico talvez não se anule, mas se se começa a remover-lhe os motivos, mudam as formas e o peso com que estesofrimento entra no jogo da vida de uma pessoa. E igualmente, não se anula a necessidade desta pessoa de ser ajudada, isto é," precisamente tratada, nos termos que fala- mos. Mas isto nos faz recordar o valor dessas necessidades e a necessidade de valor. Isto significa n por exemplo que não se dá um trabalho a um paciente psiquiátrico como um resultado e um reconheci- mento do fato deyue ele esteja melhor (um prêmio), nem om.o terap,P.. mas como uma condição preliminar para que possa estar melhor (um direito); c o ajudamos também a fazer 32 33 e a viver o trabalho. Conseguirá? "Mas nâo é um teste ao qual o submetemos, mas é um espaço de vida a mais no qual o ajudamos a viver. Em todo caso é um teste para nós"6. Este é então outro aspecto de trabalho terapêutico entendido como "tomar encargo",7 de cuidar de uma pessoa: é desenvol- vido de tal modo a evitar o abandono do paciente a si mesmo, em nome de sua liberdade abstrata, mas também de modo tal a evitar impor-lhe objetivos pré-constituídos. E por isso o trabalho terapêutico é um percurso dinâmico em contínua transformação, feito de tentativas, erros e aprendizagens, no qual os objetivos mudam durante o percurso porque são modificados pelo sujeito em jogo. É necessário salientar outro ponto: 411e a transformação da relação de poder entre os pacientes e a instituição é um processo que intervém em longa escala e deve incidir no sistema jurídico; quem conduziu as experiências de desinsti- tucionalização desenvolveu uma atenção "obsessiva" à pro- gressiva objetivação dos novos estatutos, passo a passo de- terminados, e para fazer com que fossem reconhecidas pri- meiro as legitimidades administrativas, depois as jurídicas, até a Lei 180 de 1978. De fato, a desinstitucionalização muda progressivamente o estatuto jurídico do paciente (de pacien- te coagido a paciente voluntário, depois o paciente como "hóspede", depois a eliminação dos diversos tipos de tutela jurídica, depois o restabelecimento de todos os direitos civis). Em síntese, o paciente se torna cidadão de pleno direito e muda com isto a natureza do contrato com os serviços. 6 De uma entrevista a um operador psiquiátrico de Bari; de forma geral ver Rotelli 1981, Mauri 1983. Parece paradoxal mas não é: o "trabalho" é "terapêutico" se é o reconhecimento de um direito, não o é se é "técnica de tratamento"; no primeiro caso é o sujeito que realiza uma possibilidade sua, no segundo é a instituição que "o decide". 7 N.T. — "presa in carico" foi traduzido pOr "tomar encargo"; cabe ressaltar que esta expressão se constitui numa premissa fundamental na organização dos serviços territoriaist significa o "fazer-se responsável", isto é, a impossibilidade de delegar a Mita tiotra estai:ti:á" a issislência à população da região de referência. 34 2.4. A dcsinstttucionalização é um trabalho homeopáik.o que usa as energias internas da instituição para des- montá-la. As transformàções institucionais são então produzidas a partir de dentro, trabalhando com aquilo que existe. A começar pelo manicômio, o trabalho de desinstituciona- lização usa os mesmos espaços, os mesmos recursos, o mesmo pessoal, os mesmos pacientes, mas mudando e decompondo os sistemas de ação e interação nos quais cada elementoestá inserido: uma porta feita para estar fechada é usada, mas ativamente usada, para estar aberta — a abertura cria proble- mas, a gestão desses problemas modifica a cultura dos atores em jogo. Novamente encontramos aqui uma diferença fun- damental da desinstitucionalização italiana: ela está baseada na utilização dos recursos e dos problemas internos da estru- tura em decomposição para construir pedaço por pedaço as novas estruturas externas. Essas nascem para "acompanhar" de perto os pacientes fora do manicômio e construir as "alternativas" (e a cultura necessária): os serviços territoriais, os plantões psiquiátricos noturnos no hospital geral, as coo- perativas, as casas para os pacientes, ps bares e os refeitórios de bairro, os jogos, os laboratórios de teatro etc... Em suma, as estruturas e os modos de trabalhar nos quais se concretiza o novo sistema de saúde mental nascem não do externo, ao lado e de suporte ao manicômio, mas através da reciclagem, da reconversão e da transformação progressiva das possibilidades financeiras, do pessoal, das competências existentes, dos espaços físicas etc... E é exatamente graças a esta gênese da desmontagem do manicômio que essas estru- turas externas conseguem ser, em relação a ele, inteiramente substitutivas e a suprimir (substituindo) as práticas preexis- tentes. 8 S,:bre as r'ad: pF e rcconvc.Tsão dos recursos e dos gastes Oblices • daremos outras indicações nos parágrafos seguintes. 35 Em síntese, o processo de desinstitucionalização é carac- terizado por estes três aspectos que vão tomando corpo, pouco a pouco, à medida que o manicômio vai se desmon- tando, e que representam sua conotação de fundo: a) A construção de uma nova política de saúde mental a partir da base e do interior das estruturas institucionais através da mobilização e participação, também conflitiva, de todos os atores interessados; b) A centralização do trabalho terapêutico no objetivo de enriquecera existência global, complexa e concreta dos pacien- tes, de tal forma que eles, mais ou menos "doentes", sejam sujeitos ativos e não objetos na relação com a instituição. A palavra de ordem é: do manicômio, lugár zero dos intercâm- bios sociais, à multiplicidade extrema das relações sociais; c) A construção de estruturas externas que são totalmente substitutivas da internação no manicômio, exatamente porque nascem do interior de sua decomposição e do uso e transfor- mação dos recursos materiais e humanos que estavam ali depositados. Estes três aspectos da dcsinstitucionalização representam, entre outras coisas, condições graças às quais é possível eliminar a internação do conjunto das estruturas e compe- tências psiquiátricas. Ou, mais precisamente, podemos dizer que através deste percurso a dcsinstitucionalização suprime a internação liberando a Psiquiatria e seu objeto (e definiti- vamente a sociedade) da necessidade da própria internação. A desinstitucionalização transforma as necessidades dos do- entes, dos operadores e da comunidade, às quais a internação correspondia, construindo respostas inteiramente substituti- vas9. 9 A este propósito pode-se aplicar o estudo cfp Elstcr sobre estratégias , indiretas (1981, pág. 438): "Para dar uma imagem sintética, não se pode querer o fechamento do manicômio como solução e não se pode perse- gui-la diretamente: porque neste caso "o fato de querer a ausência é incompatível com a ausência desejada". A ausência de manicômio é po:lanto.tipiwmente um estado que é•essenclalmente um by-produd alcançável ao longo de estratégias indiretas (De Leonardis 1985). 36 2.5. A dcsinstitucionalização libera da necessidade da inter- nação construindo serviços inteiramente substitutivos. Para explicar este ponto usaremos o exemplo da organiza- ção dos serviços de saúde mental de Trieste, a experiência italiana mais conhecida a nível internacional e que orientou o processo glolial da transformação institucional na Itália". Em Trieste: a) estes serviços têm a responsabilidade de responder à totalidade das necessidades de saúde mental de uma população determinada; b) mudam as formas de admi- nistrar os recursos para a saúde mental; c) multiplica-se e torna-se mais complexa a profissionalidade dos operadores. No conjunto, a organização do novo sistema de saúde mental se fundamenta em uma hipótese clara: que a instituição responde mais às próprias necessidades de auto-reprodução que às necessidades dos usuários e que desinstitucionalizar significa inverter esta lógica de funcionamento. 2.5.1. Os serviços têm a reponsabilidade de responder à to- talidade das necessidades de saúde mental de uma população determinada. Em Trieste, entre 1971 e 1978, o hospital psiquiátrico foi progressivamente esvaziado dos 1.200 pacientes que ali esta- vam internados'(a maior parte obrigatoriamente), completa- mente reconvertido e oficialmente abolido em 1980. Atual- mente não existe nenhum outro lugar de internação: não existem clínicas psiquiátricas privadas, nem enfermarias psi- 10 Sobre experiência de Trieste ver: Scabia (1974), Bennett (1978), Har- tung (1981), Rotelli (1981a, 1981b, 1983), Basaglia (1982), Galho, Giannichedda (1982), Mauri (1983), Realli et al (1983), Dell'Acqua (1985), Pastore (1984). E ainda ver Quaderni di Documentazione dei Pensicro Sdengco, put.11uidatios cuidados de C.N.R. (cm particular Os volürries 3. 8 e. 16) r a revista Fogli di Infonnazicne. Tnmhftn, o recente livro de A Topor. 37 quiátricas no hospital geral, nem pacientes psiquiátricos transferidos para cronicários — no lugar dessas estruturas de internação se desenvolveu uma grande variedade de serviços e espaços de intervenção. a) Os Centros de Saúde Mental. Os Centros de Saúde Mental são o eixo de todo o sistema de saúde mental e coordenam uma série de outras possibilidades e estruturas colaterais que depois examinaremos. 'SãO sete centros, co3respondentes às sete zonas de descentralização adminis- trativa de Trieste, cobrindo em média urna faixa de clientela de 40.000 habitantes cada um. Estão abertos 24 horas por dia e estão portanto em condições de acolher as pessoas a qual- quer momento do dia e da noite. Os centros são constituídos por casarões ou apartamentos grandes nos quais a distribui- ção de espaço e a mobília não recordam nenhuma das ima- gens conhecidas de um ambulatório médico ou psiquiátrico, ou seja, têm todo o aspecto de uma casa. Os centros têm alguns leitos para dormir (uma média de oito em cada centro) onde são hospedados (naturalmente não hospitalizados) os pacientes que têm necessidade de ser particularmente acom- panhados, ou aqueles que têm necessidade de separar-se do próprio ambiente de vida por um període de tempo variável. Em geral existe também uma cozinha e uma grande sala de almoço na qual comem juntos operadores, pacientes, visitan- tes, pessoas do bairro — algumas vezes são utilizados restau- rantes do bairro conveniados. O pessoal de cada centro é constituído em média por três psiquiatras, 28 enfermeiros e um assistente social. A organização do trabalho nos centros é pouco hierarquizada e com pequena divisão do trabalho entre os diversos papéis, no sentido de flue as responsabili- dades dc decisão e as competências executivas não são sepa- radas entre si e são assumidas ao mcsmd tempo por mais de um operador. A organização do trabalho do dia não é forma- lizada eni um fichário e, a não ser para uma breve reunião diária (na qual participam também os Pacientes, que tenham vontade), o trabalho c organizado e distribuído conforme as exigências que se apresentam. A esta elevada flexibilidade da organização do trabalho corresponde a mesma elevada elas- ticidade e permeabilidade no uso do centro e na relação com os pacientes. O centro está sempre aberto e qualquer um pode ter acessoa ele quando quiser. Não existem consultas por agenda e muito menos lista de espera. Por isso os pacien- tes usam o centro também como espaço de encontro, de socialização e de vida cotidiana. Como não existe qualquer tipo de subdivisão ou seleção de pacientes, no centro convi- vem figuras sociais de todos os tipos: os velhos e os novos crônicos, as donas-de-casa deprimidas, os jovens marginais etc... Todavia, grande parte do trabalho dos operadores se de- senvolve fora do centro, porque tende-se a ir ao encontro dos pacientes em casa, ou ainda, a fazê-los viver na cidade c com as pessoas. O trabalho terapêutico usa todos os instrumentos à dispo- sição: medicação, colóquios, subsídios, ocasiões de trabalho, estadias de férias na praia ou na serra etc... Além disso, exatamente por essa razão, o centro tem também a responsa- bilidade de buscar recursos através de contato com outras estruturas institucionais: por exemplo, conseguir da adminis- tração local um apartamento para alguns pacientes. b) O Plantão Psiquiátrico no Hospital Geral. Este serviço é constituído por dois médicos fixos e dezessete enfermeiros dos centros em rodízio. Foi criado para atender os casos de emergência que, sobre- tudo durante a noite, chegam ao hospital geral. Sua função é a de fornecer uma primeira resposta em situação de mal- estar agudo e, se necessário, chamar imediatamente o centro de saúde mental competente ou, se isto não for possível, hospedar o paciente por uma noite. Para este objetivo tem oito leitos ruas. miuá se peictle, não funciona como uma enfermaria ps;qu;áirica hospitalar. 38 39 Além disso, o plantão psiquiátrico intervém quando cha- mado por enfermarias do hospital, quando algum paciente expressa sofrimento psíquico'[. c)As Estruturas e os Espaços do Ex-Hospital Psiquiátrico. O que era o hospital psiquiátrico tornou-se um grande par- que municipal no qual as velhas estruturas foram esvaziadas ou destinadas a outros objetivos. Existem: vinte apartamen- tos para ex-internados, uma unidade de reabilitação para dpficientes muito graves (onze pessoas) e uma unidade para idosos dependentes (45 pessoas), que estão sob a responsa- bilidade do centro de saúde mental da região. Existem ainda: uma escola maternal, uma escola primária e laboratórios da universidade; existe sobretudo uma série de estruturas desti- nadas às atividades dos centros e das cooperativas: um bar, um laboratório de teatro, um laboratório artístico, de música, pintura, de vídeo, uma sala de ginástica, uma sala de estética etc... Existem também os alojamentos — com refeitório — para os voluntários italianos e estrangeiros que trabalham nas diversas estruturas (em média estão presentes entre trinta e quarenta voluntários, um total de duzentos por ano). O dado mais significativo de todas estas atividades, e em particular dos laboratórios, é o fato de que são utilizadas conjuntamente por "normais", por pacientes psiquiátricos, por tóxico-dependentes (e sobretudo por jovens). Este é um exemplo concreto da tendência de não compartimcntalizar e, ao contrário, multiplicar as trocas sociais, que são essen- ciais ao processo de desinstitucionalizaão. d) As Cooperativas. As cooperativas de trabalho promovi- das e organizadas pelos centros são: — a "Cooperativa Agrícola" (38 membros) com uma loja anexa para venda dos produtos; 11 Respondendo dessa forma às demandas de émergéncia, o plantão psi- quiátrico intervém nos confrontos seja com serviços de ordem pública (em particular a policia) seja com médicos (hospitais gerais e médicos . base).piga aliviar o medo de comportamentos estranhos ou dist u bádores e ativar nesses serviços a capacidade de novas respõstás..- 40 — a "Cooperativa Trabalhadores Unidos" (cerca de 121 participantes) que compreende serviços de limpeza e manu- tenção, marcenaçia, um cabeleireiro e os laboratórios artísti- co, de costura e de teatro; — a "Cooperativa Posto delle Fragolle" (cerca de 65 mem- bros) da qual depende um bar, o barco a vela e uma coope- rativa de assistência. Das cooperativas fazem parte não apenas pacientes psi- quiátricos mas também jovens desocupados, tóxico-depen- dentes, ex-presidiários ou presidiários em regime de semili- berdade. Elas constituem uma estrutura importante de auto- organização das' pessoas, na qual cresce a autonomia e a capacidade de ajuda recíproca. Um exemplo, para dar uma idéia concreta: no âmbito das atividades da cooperativa uni grupo de jovens, entre os quais ex-presidiários e tóxico-de- pendentes, organizaram um ginásio no qual eles oferecem cursos de ginástica às crianças da escola do bairro, aos pacien- tes lobotomizados de longa internação, aos operadores dos centros. e) O Centro para Tóxico-Dependentes. Este serviço é formado por uni psiquiatra, urna assistente social e cinco enfermeiros, e ao lado dos centros assume competências específicas cm relação aos tóxico-dependentes. Além dos tratamentos farmacológicos este centro tem a responsabili- dade de construir soluções de trabalho e de socialização utilizando sobretudo as redes das cooperativas e as atividades de trabalho, culturais e recreativas que elas promovem. Este serviço atende também os tóxico-dependentes no cárcere. f) O Serviço Psiquiátrico territorial no interior do cár- cere. Este serviço é formado por dois médicos e dois psicólo- gos dos centros" que, duas vezes por semana, intervêm no interior do presídio, seja para acompanhar os pacientes dos centros que estejam presos, sc;a para seguir presidiários nos quais o estado de detenção fez cinergii distúrbios psíquicos. 41 ÇsÇRJ-k`r 434 Este serviço tem como competência melhorar tanto quanto possível as condições de vida da pessoa no presídio, constituir para ela um ponto de referência externa e tentar todas as possibilidades legais para obter medidas de redução da pena ou alternativas à pena. Este serviço tem tido também um papel importante na construção de relações de colaboração entre os centros e a justiça local; através dessas relações os centros assumem a competência de ajudar os pacientes na sua relação com a justiça e ao mesmo tempo de assegurar ao juiz que a pessoa que tem comportamentos perturbadores está de fato sendo adequadamente acompanhada e "contro- lada". Por este caminho foram interrompidos de forma deci- siva vários encaminhamentos aos manicômios judiciários. Este rápido resumo das possibilidades e das atividades nas quais foi reorganizado globalmente o sistema de saúde men- tal em Trieste não é exaustivo, mas Ode dar, sem dúvida, uma idéia da forma como funciona. Pode-áe dizer, para sintetizar, que este modelo dc serviço é inteiramente substi- tutivo da internação porque responde de modo totalmente transformado, isto é, em positivo, à complexidade das neces- sidades que o velho asilo absorvia no seu interior. Este modelo dc serviço — que não por acaso é dcfinidá como "forte" — não seleciona de nenhuma forma necessidades, demandas ou conflitos, mas, ao contrário, elabora estraté- gias dinâmicas e individualizadas de resposta que tentam salvaguardar e ampliar a riqueza da vida das pessoas, doentes ou sãs. Trata-se de negar o hospital psiquiátrico salvaguar- dando o direito de assistência, de negar "a política de setor" salvaguardando a unicidade dc responsabilidade sobre um território determinado, de negar a comunidade terapêutica em favor de uma comunidade difusa, de negar o monopólio dos técnicos utilizando ao máximo suas potencialidades para ativar os recursos das pessoas. Esta linha de atuação é o que se entende eiu Trieste concretamente por desinstitucionali- zaçaó. Mudam as toi mas de administrar os recursos públicos para a saúde mental. Como já dissentes, a desmontagem do manicômio se pro- cessou através dá diferente utilização c da reconversão dosrecursos existentes; as novas possibilidades nascem com o deslocamento material de pessoas, pacientes e verbas do hospital para a comunidade. Muda portanto a gestão finan- ceira e administrativa dos recursos públicos, com êxito seja de eficácia seja dc eficiência. O ponto fundamental consiste no fato de que os recursos de que a administração local dispõe não são mais utilizados para alimentar uma estrutura institucional, o hospital, que mede seus custos essencialmente cora base nos leitos e na sua utilização ótima sobre a maximização de leitos ocupados. Ao contrário, estes recursos vêm sendo utilizados para fornecer serviços diretos às pessoas, com base nos seguintes critérios: a) a mobilidade do pessoal, no sentido também físico, uma vez que não são mais os pacientes que vão em busca do serviço, é o serviço que vai até as pessoas; b) a individualiza- ção do serviço, no sentido de que a quclidade e a quantidade dos recursos disponíveis se adaptam às exigências dos pacien- tes individualmente e varia de acordo com essas exigências; c) o aumento doi recursos geridos diretamente pelos pacientes e que mais diretamente se referem à sua vida (ver o curso dos gastos com medicação e com subsídios); d) o uso produtivo dos recursos, no sentido de que se investe em medida crescen- te para financiar o trabalho dos pacientes que desenvolvem atividades socialmente úteis (por exemplo, são oferecidas "bolsas de trabalho" ou uma contribuição financeira às coo- perativas); e) o uso crescente de recursos ativados e organiza- dos pela agregação dos pacientes e da comunidade, o que significa também promover e proteger a capacidade de auto- ajuda e de autonomia dasjessoas. Estes critériá são Priori tiritirnen te definidos com o obje- tivo de enriquecer a eficácia terapêutica. Esta é avaliada com 42 43 base na capacidade que este sistema oferere de não selecio- nar e não excluir e, portanto, com base na capacidade de evitar e inverter processos de cronificação destas necessida- des12. O indicador mais evidente para avaliar a eficácia deste sistema está no fato de que ele não reproduz a necessidade de internaçãon. Esta forma de administrar os recursos públicos tem tam- bém o efeito indireto de racionalizar a despesa: são reduzidos os desperdícios, os automatismos da despesas fixas e os custos que caracterizam tipicamente as organizações buro- cráticas. O novo sistema, considerado globalmente, não é mais caro, e este é um dado importante em tempos de redu- ção de despesas públicas". Todavia, este e um efeito indireto de'um sistema orientado para investir os recursos nas pessoas (e possivelmente sempre mais recursos), mais que nas instituições. 2.5.3. A profissionalidade dos operadores é enriquecida e torna-se mais complexa. As características da organização c do trabalho terapêuti- co que emergiram do processo de desconstrução do manicô- mio trouxeram um enriquecimento das competências profis- sionais e dos espaços de autonomia de decisão dos operado- res e transformaram tanto a modalidade da formação profis- sional quanto os critérios para avaliá-la. O crescimento da :12 Sobre este ponto cm particular ver Dcll'Acqua 1985 e WII0 1985. 13 Um outro indicador é o baixíssimo número de Tratamentos Sanitários Obrigatórios, que alem do mais são desenvolvidos sem internação, por exemplo, na casa do paciente ou no Centro Territorial. 14 A despesa histórica para a Psiquiatria não aumentou em termos reais entre 1971 e 1985; a despesa com o pessoal, em particular, permaneceu relativamente constante (se confrontada coá a taxa de inflação e o custo de vida). Um exemplo de reconversão da despesa: decresce aquela com as psicofármacos, enquanto aumenta a com os subsídios. Sobre adespe- sa psiquiátrica antas e depois da reforma ver Bennctt 1978; Torcsini. Trebiciani 1985. . 44 profissionalidade não é entretanto uma aquisição estática, uma vez que a partir da desconstrução do manicômio os operadores, acima de tudo, "aprenderam a aprender". Com as informações que, já descrevemos em relação à organização do trabalho em trieste torna-se evidente que a profissiona- lidade se explica menos em termos de competências técnicas especialistas e codificadas e muito mais como capacidade de escolher, utilizarle combinar uma ampla variedade de moda- lidades e recursos de intervenção. Vejamos cm detalhe: a)A centralidade no trabalho de equipe. O papel da equipe não se expressa tanto nas reuniões periódicas, mas mais no costume de trabnlhar junto e na colaboração e confronto cotidianos entre todos os operadores de cada centro e entre os diversos centros. Este trabalho de equipe serve para socia- lizar as experiências, para enfrentar juntos os problemas e para avaliar, compartilhar e corrigir as decisões que cada operador toma; a equipe funciona portanto também como uma espécie de supervisor coletivo. b)A auto-avaliação. A profissionalidade de cada operador em particular não é avaliada separadamente, mas no interior do trabalho operativo da equipe e integrado na reponsabili- dadc de auto-avaliação que ela desenvolve (às vezes também se desencadeiam tensões e dinâmicas conflitivas). Esta avá: fiação interna, obviamente entrelaçada ao trabalho, refere-se sobretudo à capacidade de autotransformação e aprendiza- gem da equipe e de cada operador. Mas é o elevado grau de contratualidade do usuário que imprime contínuos elemen- tos de "crise" e de crítica frente à auto-avaliação; assim, pouco a pouco torna-se mais radicalmente presente a voz crítica dos familiares e dos cidadãos. c) A formação. Além da base profissional definida pelo título acadêmico, a formação também é estreitamente anco- rada no trabalhd operativo nos centros; às vezes são organi- zados seminários sobre temas específicos = por exemplo sobre medicação. sobre "self-help" ^agi crises do Welfare State; mas a formação se dá principalmente através da coser- 45 ção dos novos operadores e tios voluntários no trabalho cotidiano. E é no trabalho cotidiano que se abrem, pouco a pouco, outros campos de intervenção que requerem a aqui- sição de novas competências (e o caso, por exemplo, das competências em matéria de psiquiatria forense e criminolo- gia que se desenvolveram a partir das relações com o sistema da justiça penal)'s. No conjunto a ênfase é colocada na aquisição de conheci- mentos, teóricos e operativos, sobre o modo de funciona- mento da rede institucional na qual as pessoas estão inseri- das; tais conhecimentos são constituídos através do trabalho cotidiano de análise crítica e de intervenção operativa, para contrastar os efeitos dc empobrecimento, invalidez, de "la- beling" que aquele modo de funcionar institucionalizado produz na vida das pessoas. (1) O "case management". Neste ponto age a peculiaridade mais profunda da ação de desinstitucionalização. De fato, em primeiro lugar, os diversos tipos codificados de "terapia" (médica, psicológica, psicoterapêutica, psicofarmacológica, social etc...) são considerados como momentos também im- portantes, mas redutivos e parciais, sobretudo se isolados e codificados. Por isso trata-se de demolir a compartimentali- zação entre estas tipologias de intervenção. Além disso, e por conseqüência, a relação terapêutica tende a ocupar-se de questões afetivas, econômicas, jurídicas, relacionais, dos ní- veis de estatutos, da família, do trabalho etc... sem cindir estas questões, sem confiá-las a profissionalidades separadas. Se se trata de pensar que "a liberdade é terapêutica", cada ato em liberdade pode ser terapêutico. Se se trata de desinstituir a doença como awriência que não é separável da existência, trata-se de valorizar, mais que o sintpina (sobre o qual se constrói a instituição), o conjunto de recursos positivos do 15 E ainda um efeito indireto desta forma deprofissionalidade e mais cm geral desta forma de trabalhar é o fato que também os operadores (como 05 pacientes) vivem melhor. Não se encontram aqui as síndromes de "burn-out" dos operadores. 46 serviço e da demanda. É possível intuir o enorme espaço dc profissionalização que esta prática tende a requerer; o tra- balho terapêutico, deve enfrentar efetivamente um campo de ação complexa. - 1. Se, por exemplo, eliminar a dimensão afetiva na relação terapêutica parece ser um código para a medicina e seus serviços, aqui, ao contrário, se valoriza esta dimensão. 2. Se é práxis consolidada separar do contexto mais amplo a relação médico-paciente (o setting), aqui se busca cada instrumento para contextualizá-la. 3. Se a presença de figuras não profissionais no campo é vista muitas vezes com suspeita, aqui se fazem vários esforços para colocá-las como elementos críticos e desinstitucionali- zantes do serviço. 4. Se as regras de funcionamento do serviço ordenado são em geral pretendidas, aqui, ao contrário, são vistas tenden- cialmente como um empobrecimento na possibilidade de tro- cas sociais e terapêuticas e, nos limites do possível, criticadas e removidas. 5. Se os espaços sanitários são habitualmente bem separa- dos, aqui se procura cada ocasião para que sejam, ao invés disso, abertos ao bairro e "atravessados" pelas pessoas. 6. Se a relação com "a doença" tem sempre como referên- cia um hospital, ambulatório etc..., a relação de desinstitucio- nalização requer , a relação com um "território". 7. Uma coisa da qual todos os operadores de Trieste estão convencidos é, enfim, que não se dcsinstitucionaliza dividin- do os agudos dos crônicos, uma vez que o parâmetro conti- nuaria sendo a forma "de doença", constituindo áreas de fragmentação (e dessa forma reconstruindo cronicidade e tornando ineficaz o serviço), mas assumindo a demanda co- mo uma totalidade indivisível. Tudo isto é desinstitucionali- zação, que representa um trabalho complexo para os opera- dores e para os administradores, mas que permite uma parti- cipação essencial dos recursos da comunidade e, potencial- mente, uma enorme mobilização de energias. A ênfase na 47 desinstitucionalização é aqui vinculada a um projeto também de natureza econômica, que considera a velha (mas genera- lizada) organização das instituições psiquiátricas fruto do atraso e produtora de gastos, uma vez que se priva das energias e dos recursos da demanda ampliada e muitas vezes até faz desta privação o seu objetivo. Por tudo isso pode-se enfatizar que a desinstitucionaliza- ção como entendida em Trieste é exatamente o oposto de soda prática de abandono. Hoje, todos os recursos econômi- cos e humanos que em 1971 eram absorvidos por um grande hospital psiquiátrico são utilizados na' comunidade (e pela comunidade). 05 TRABALHO DE DESINSTITUCIONALIZAÇÃO TAMBÉM É LEI QUE NÃO SE COMPLETA COM A APROVAÇÃO DA RE- FORMA E, SIM, PROSSEGUE COM SUA IMPLANTAÇÃO. A reforma psiquiátrica (Lei 180) foi votada por todos os partidos e aprovado pelo parlamento' italiano em maio de 1978. Esta lei acolhe o processo de desinstitucionalização praticado até então e sanciona as inovações por ele produzi- das: 'a eliminação da intervenção psiquiátrica e a construção de serviços de comunidade inteiramente substitutivos da in- tervenção. Detalhadamente, os pontos centrais da lei são os seguintes (Misiti et a11981, Mosher 1982): a) É proibida a construção de novos hospitais psiquiátricos e a internação de novos pacientes psiquiátricos; são dadas as diretrizes às administrações regionais para que estabeleçam os períodos para um gradual processo de alta dos pacientes internados nos hospitais psiquiátricos.] b) Os serviços territoriais são responsáveis pela saúde mental de uma determinada população e coordenam o con- junto das estruturas necessárias; entre essas podem existir enfermarias psiquiátrico em hospitais gerais regionais com o máximo de quinze leitos. c) São abolidos o &afta° ele periculosidade social do doente mental, as tutelas jurídicas, a internação coagida e o tratamento coagido; o doente mental é um cidadão para todos os efeitos, com os respectivos direitos civis e sociais, incluindo o direitb ao tratamento. Estes princípios são man- tidos também no caso de Tratamento Sanitário Obrigatório (T.S.O.), que a lei prevê; este instituto estabelece que: 1. o paciente mantém todos os seus direitos pessoais e no papel do juiz é prevista a tutela desses direitos; 2. o tratamento é decidido pela autoridade sanitária local e define a responsabilidade do serviço sanitário competente; 3. isto é previsto somente em casos excepcionais, por um tempo breve e quando estiverem esgotadas todas as• outras possibilidades. E não requer necessariamente a internação no hospital geral (pode ser desenvolvido na casa do pacien- te). É importante observar que o Tratamento Sanitário Obri- gatório prevê e compreende dois elementos em geral toma- dos separadamente: o direito do paciente a recusar o trata- mento e a obrigação do Serviço Sanitário de não abandonar o paciente a si mesmo. E por isso a obrigação de que se fala fixa uma responsabilidade terapêutica do serviço e não uma sanção legal do paciente. Não existem dúvidas de que esta lei é um — o mais alto em sentido formal — dos atos de desins- titucionalização. Este elenco muito sintético dos pontos centrais da Lei 180 deixa entrever como as inovações que ela introduz no sistema de saúde mental são concretas e operativas, mas ao mesmo tempo de uma qualidade tal que suscita muitas dinâmicas de conflito e de transformação. Como diria Basaglia, no dia seguinte ao da aprovação da reforma: "por sua lógica interna e pelas características do terreno na qual age, esta lei abre mais contradições do que as que resolve". Mas isto não significa que não seja uma boa lei — ao contrário. Esta característica da reforma já se coloca no texto legisla- tivo - pensemos por exemplo naquilo qt, já r-m-innarrins a propósito do Tratamento Sanitário Obrigatório Como 48 49 dissemos anteriormente, ele coloca junto duas dimensões em geral separadas porque são contraditórias e conflitantes en- tre si: as garantias jurídicas e os direitos da pessoa junto com sua necessidade, também urgente, de ajuda, à qual o serviço deve dar uma resposta; a proibição de internação e de coação junto com a obrigação de intervir; a responsabilidade do serviço, que implica uma intervenção de "tomada do encar- go" mas que ao mesmo tempo deve respeitar a liberdade do „paciente (Giannichedda 1985, De Leonardis 1986). Sem dúvida não é fácil praticar estas duas dimensões em conjunto e, uma vez estabelecendo e compreendendo isto no Trata- mento Sanitário Obrigatório, a lei retonhece que também este, como todas as intervenções terapêuticas, é uma relação conflitiva, problemática, entre dois atores, ambos respon- sáveis16. Este caráter dinâmico, conflitivo, não resolvido da relação terapêutica, que a lei explicita no caso do Tratamento Sani- tário Obrigatório, constitui entretanto o elemento de fundo da fisionomia do serviço de comunidade, enquanto inteira- mente substitutivo da internação. Com efeito isto significa que: a) este serviço trabalha sem a possibilidade de descarregar em outros os problemas, necessidades, comportamentos que são incoerentes, problemáticos e também ativamente conflui- vos nos seus confrontos; b) tensões, contradições e mudança começam a fazer parte do modo de trabalhar, tornando-se o terreno efetivo da ação terapêutica; 16 Na Itália o campo da justiça civil e penal é particularmente rico de inovações, sejam teóricas ou operativas. O Cato de que o doente mental seja sujeito de direito, e que portanto lhe seja contemporaneamente garantido o direito ao tratamento, colocaeM discussão as possibilidades de utilizar instrumentos paralelos e não garantidos de tutela da ordem pública (tipicamente a ierternaçãO por periculosidade) e abre transfor- mações no sistema penitenciário porque requer intervenções para ga- rantir a saúde mental dos detentos — ver Cendon 1984, Pavarini 1984. 50 c) por isso, como já vimos, este serviço não pode fixar-se em um modelo estável, mas permanece dinâmico e em trans- formação. Em suma, o serviço territorial se configura como ator de mudança social, como propulsor de transformações concretas em nível local de mudança social nas instituições e na comunidade. Poder-se-ia dizer, em síntese, que a reforma tem uma conotação dinâmica, conflitiva, não resolutiva, mesmo por- que ela estabelece e promove o objetivo de abolir a interna- ção psiquiátrica. Ou melhor, dizendo de outro modo, exata- mente este ponto de fundo que caracteriza a reforma italiana, e a diferencia das outras reformas psiquiátricas, faz com que ela não fixe uma solução institucional positivamente concluí- da e não estabeleça um quadro normativo — mas, ao contrá- rio, suscite dinâmicas, conflitos e transformações, e mante- nha dessa forma aberto um campo de incerteza no qual continuam a ser relevantes as ações operativas concretas, as experimentações, as aprendizagens etc... A Lei 180 ativou todos os "jogos de implementação" co- nhecidos pela "politologia" (Bardach 1977), manobras polí- ticas, boicotes administrativos, resistência de interesses eco- nômicos e profiásionais que se sentiram ameaçados. Apesar disso é importante precisar que dentro deste tecido conflitivo emerge um balanço não Negativo da sua implementação. Duas "pesquisas" (uma de 1980 e outra de 1984) mostram de fato um quadro diversificado em quantidade e qualidade das inovações produzidas, variável em cada região, da realidade metropolitana a contexto de interior, e em cada cidade, de bairro a bairro. E sobretudo que se trata de um quadro em mudança no qual os padrões da atuação- da reforma cres- cem'''. 17 Esta investigação mais recente foi conduzida em quatro regiões (Pie- monte, Úmbria, Puglia eBasilicata) e compreende dados sobre os tipos de serviços existentes, a quantidade e caracterstiws de primcal, a r1,-!- manda, enfim, os tipos de prestação e osimetodes de trabalho. 51 Desta investigação se depreende, por exemplo, que não foram produzidos os efeitos de "dumping" dos hospitais psiquiátricos, mesmo porque os efeitos da lei se inseriram em um "trend" mais geral à diminuição dos internados e dos leitos. Os números de internados nessas quatro regiões pas- sou de 16.575 em 1971 a 12.972 em 1977 e 6.516 em 1984; e os leitos entre 1977 e 1983 se reduziram em 41,2%. Por outro lado crescem as estruturas territoriais, o'arco dos serviços que fornecem e o porcentual dos pacientes que os usam. Por exemplo, entre 1981 e 1983 o número médio dos pacientes nos serviços de comunidade cresceu em 25%. Em 1983 a participação porcentual média dos pacientes dos serviços territoriais foi 72,3% (77,6% no Piemonte, 51,8% na Puglia), em relação a 11,3% dos pacientes nos S.D.C.18 e 16,4% ainda internados (13,9% no Piemonte, 27,2% na Puglia). A inves- tigação assinala também a lentidão e carência: por exemplo, entre os centros são poucos os abertos nos sete dias da semana e ainda menos aqueles abertos 24 horas por dia — poucas as estruturas reabilitativas e as cooperativas. Espera- mos os novos dados desta investigação, que no período de 1985 foi ampliada para todo o território nacional e foi publi- cada em janeiro de 1986. Entretanto é ainda mais importante ter presente que um balanço da implementação, um confronto entre objetivo e resultados, se isolado, é inadequado para apreender o signi- ficado mais profundo da implementação da reforma psiquiá- trica italiana. Como os recentes estudos politológicos sobre 'a implementação das reformas sociais têm mostrado, esta consideração vale em geral. No campo das políticas sociais, a implementação abre um tenrnoconflitivo no qual a "política prossegue com outos meios; e no qual sobretudo os sistemas de ação e internação se dinamizam produzindo renegocia- ção, transformações e inovações nos objetivos (Bardach 18 S.D.C. = Servi2.iu Diapese e Cara,- da seja, o Plantão Psiquidir ice no Hospital Geral (ver neste texto p. 39). 1977, May, Wildavsky 1978, Nelson, Yates 1978, Pressmau, Wildavsky 1984). Em outras palavras, a implementação de uma reforma social é sobretudo um processo social complexo e contraditório, no qual se produzem inovações nas caracte- rísticas e nas forrhas de presença dos atores, nos conteúdos e nos modos de conflito. Isto vale com mais razão para a reforma psiquiátrica italia- na, devido aos nós institucionais que atinge e à consciência destas implicações que deriva do percurso de desinstitucio- nalização na qual está inserida. Ou melhor, neste percurso a reforma não é um objetivo finalmente alcançado, não signi- fica a finalização da desinstitucionalização. Ao contrário, no momento no qual ela anuncia o objetivo da eliminação da internação psiquiátrica, ela confirma e amplia o campo de ação da desinstitucionalização. De fato, a realização deste objetivo não pode ser outro senão um percurso social com- plexo que suscita conflitos, crise e transformações dentro da rede mais ampla das estruturas institucionais (e suas normas, poderes e competências) nas quais o sistema psiquiátrico está inserido. Este objetivo suscita problemas e requer mudanças na organização sani tária, na justiça, nos modos de administra- ção, dos recursos públicos etc... E verdade que, corno já salientamos, a eliminação da internação psiquiátrica é um resultado indireto de um processo social mais amplo de transformação, que libera da necessidade da internação por- que transforma as necessidades sociais e as respostas institu- cionais. E, por isso, o trabalho de desinstitucionalização con- tinua através da implementação da lei ou, mais precisamente, a implementação da reforma psiquiátrica italiana é um pro- cesso social de desinstitucionalização. É um processo que se coloca na ordem do factível e não do ideal (Majone 1975a, 1975b). Esta forma de pretender e praticar a implementação da reforma conquistou todo seu significado no momento em que se abriu, também na Itália. nos primeiros anos Crã década de 80, o período da "crise do Welfare State", com suas respecti- 52 53 vas políticas de restrição dos gastos públicos e as críticas das políticas de reforma precedentes. Nestç contexto político- cultural, no qual os fantasmas do desequilíbrio financeiro do Estado produzem reações de ordem e efeitos regressivos de "endurecimento" normativo das instituições, a política da defesa da reforma psiquiátrica aparece logo prejudicada: a reutilização do hospital psiquiátrico parece o mal menor. Mas, se se observa a implementação desta reforma como terreno operativo no qual continua e se amplia a desins- trtucionalização, aparecem algumas inovações importantes, que têm uma potência de mais longo alcance e oferecem indicações em positivo para uma perspectiva de pós-Welfare State. Assinalaremos brevemente dois pontos de observa- ção": a) Frente às crises das instituições, que a crise fiscal e as críticas aos desperdícios e à burocratização colocam em evi- dência, a desinstitucionalização sugere um percurso evoluti- vo que pode tornar esta crise produtora de um aumento de eficácia. A experiência já realizada e sedimentada de des- montagem do manicômio ensinou que essa organização era também uma resposta institucional ineficaz frente às neces- sidades de saúde mental, e que, ao contrário, uma transfor- mação qualitativa dos recursos existentes, uma sua reconver- são, é não apenas possível mas também produtora de eficácia. Em resumo, como já dissemos,
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