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PRECEDENTE JUDICIAL 1. NOÇÕES FUNDAMENTAIS Precedente é a decisão judicial tomada à luz de um caso concreto, cujo elemento normativo pode servir como diretriz para o julgamento posterior de casos análogos. (Didier) É composto por três elementos: circunstâncias de fato que embasam a controvérsia, a tese ou o princípio jurídico assentado na motivação (ratio decidendi) do provimento decisório e argumentação jurídica. A ratio decidenti é o fundamento jurídico que sustenta a decisão e pode ter caráter obrigatório ou persuasivo. É importante assentar o seguinte: ao decidir um caso, o magistrado cria duas normas jurídicas. Uma, de caráter geral, que é fruto da sua interpretação dos fatos envolvidos na causa e da sua conformação ao Direito positivo: Constituição, leis, etc. Outra, de caráter individual, constitui a sua decisão para aquela situação específica que se lhe põe para análise. A luz de uma situação concreta, o julgador termina por criar uma norma que consubstancia a tese jurídica a ser adotada naquele caso. Essa tese jurídica é o que chamamos de ratio decidendi. Ela decorre da fundamentação do julgado, pois é com base nela que o juiz chegará, no dispositivo, a uma conclusão acerca da questão em juízo. Trata-se então de uma normal geral, construída mediante raciocínio indutivo, a partir de uma situação concreta. Geral porque a tese jurídica (ratio) se desprende do caso específico e pode ser aplicada em outras situações concretas que se assemelhem àquela que foi originariamente construída. 1.2 Obiter dictum Trata-se de colocação ou opinião jurídica adicional, paralela e dispensável para a fundamentação e conclusão da decisão. Também se enquadram as manifestações sobre questão que não objeto da causa, que é hipoteticamente ali considerada, ou, ainda, sobre questão irrelevante, bem como a menção a referenciais normativos impertinentes e inaplicáveis à espécie e, até mesmo, o quanto constante no voto vencido da decisão colegiada. Embora não sirva como precedente, não é desprezível. Pode sinalizar ma futura orientação do tribunal, por exemplo. Tem a sua relevância para que se aplique a técnica de julgamento da apelação, do agravo de instrumento contra decisão de mérito e da ação rescisória, cujo resultado não seja unânime, bem como tem eficácia persuasiva para uma tentativa futura de superação do precedente. Pode ser erigido à condição de ratio, bem como a ratio pode ser “rebaixada” a condição de obiter. 1.3 Identificação da ratio Para estudar a força vinculativa dos precedentes judiciais, é preciso investigar a ratio dos julgados anteriores, encontrável em sua fundamentação. Assim, as razões de decidir do precedente é que operam a vinculação: extrai-se da ratio decidendi, por indução, uma regra geral que pode ser aplicada a outras situações semelhantes. Só se pode considerar uma ratio a opção hermenêutica que, a despeito de ser feita para um caso concreto, tenha aptidão para ser universalizada. Em uma decisão, o órgão judicial não indica, ou não precisa indicar, expressamente, qual é a ratio. “Cabe aos juízes, em momento, posterior, ao examinarem-na como precedente, extrair a ‘norma legal’ (abstraindo-a do caso) que poderá ou não incidir na situação concreta.” Algumas observações: a. Se uma decisão traz mais de um motivo como fundamento de sua decisão, tem-se entendido que todas obrigam, não podendo o tribunal, em caso posterior, escolher simplesmente uma dentre elas como obrigatória e relegar a(s) outra(s) à qualidade de dictum; b. Num julgamento proferido por órgão colegiado, se, a despeito de chegar a um mesmo resultado, os membros do colegiado o fazem por razões diversas, tem se entendido que falta radio discernível e portanto, está a corte do caso posterior livre para decidir com base em outro parâmetro; c. Por fim, se for difícil identificar a ratio de uma decisão, seja porque a sua fundamentação é insuficiente, seja porque não há uma tese jurídica bem delineada, entende-se que ela deve ser considerada desprovida de ratio e, por conseguinte, de autoridade obrigatória. 1.3.1 Métodos de identificação do precedente a. “Teste de Wambaugh”: pauta-se em uma técnica de inversão, segundo a qual se constata que dado enunciado é razão de decidir quando, invertido, implicar uma mudança de conclusão final (do julgamento, a norma concreta). A ratio é aquela razão jurídica sem a qual o julgamento final do caso seria diferente. Se a inversão ou exclusão do enunciado não afetar o comando decisório final, não se estará diante da ratio, mas sim, de dictum. É criticada por sua falibilidade e insuficiência. Isso porque não permite a identificação da ratio nos casos em que o julgador adota duas diferentes razões jurídicas que são suficientes por si sós e, separadamente, para conduzir àquela mesma conclusão. Excluída ou invertida uma delas, a outra bastará para sustentar e manter a mesma conclusão, não permitindo definir se aquela primeira era, de fato, núcleo normativo (razão de decidir), ou simples dictum. b. Método de Goodhart: dá atenção aos fatos subjacentes à causa. Sustenta que a definição da ratio pressupõe que se identifiquem e se separem os fatos materiais ou fundamentais, bem assim a decisão neles embasada. A ratio se encontra na análise dos fatos destacados e considerados como importantes na causa e na decisão que neles se funda. Se a base fática fundamental for a mesma, o precedente vincula, se não for a mesma (com fatos materiais a mais ou a menos), não vincula. c. Método eclético: o melhor método é aquele que considere as duas propostas anteriores. A ideia é que a ratio deve ser buscada a partir da identificação dos fatos relevantes em que se assenta a causa e dos motivos jurídicos determinantes e que conduzem à conclusão. 1.4 Espécies de decisão e precedente 1.4.1 Decisão de admissibilidade, decisão de mérito e o precedente A decisão pode tornar-se precedente para questões de admissibilidade do processo – questões processuais, portanto. Não fosse assim, seria difícil explicar a existência de enunciados de súmula sobre matéria processual, abundantes tanto no STF quanto no STJ. 1.4.2 Decisão que homologa autocomposição e precedente Nesse caso, o precedente diz respeito aos pressupostos para a homologação do negócio jurídico e não à solução negocial definida pelos conflitantes. A ratio será uma regra jurídica geral que prescreve que, em casos como aquele, o órgão jurisdicional está autorizado a homologar a autocomposição. O precedente relaciona-se com os pressupostos para a homologação da autocomposição – núcleo da fundamentação da decisão homologatória. O raciocínio é o mesmo quando a decisão nega a homologação. Ex: o autor de uma ação de interdição desiste do processo e pede que o juiz homologue essa desistência. O juiz não a homologa, ao fundamento de que não se pode desistir de um processo de interdição – esse é o precedente. 2. A NORMA DO PRECEDENTE A norma em que se constitui o precedente é uma regra. A ratio é o fundamento normativo da solução de um caso; necessariamente, será uma regra. 3. EFICÁCIA JURÍDICA DO PRECEDENTE 3.1 Precedentes como ato fato jurídico O precedente é um fato. Seus efeitos produzem-se independentemente da manifestação do órgão jurisdicional que o produziu. São efeitos ex lege, pois são anexos da decisão judicial. 3.2 Generalidades São seis os efeitos jurídicos que um precedente pode ter: 1. Precedente com eficácia vinculante/obrigatória Quando tem eficácia vinculativa em relação aos casos que, em situações análogas, lhe forem supervenientes. Ao falar em efeito vinculante do precedente, deve-se ter em mente que, em certassituações, a norma jurídica geral (tese jurídica, ratio) estabelecida na fundamentação de determinadas decisões judiciais tem o condão de vincular decisões posteriores, obrigando que os órgãos jurisdicionais adotam aquela mesma tese jurídica na sua própria fundamentação. Os precedentes com força vinculante estão enumerados no art. 927, NCPC. O efeito vinculante abrange os demais efeitos, sendo o mais intenso de todos eles. 2. Precedente com eficácia persuasiva Possui apenas força persuasiva, na medida em que constitui indício de uma solução racional e socialmente adequada. Nenhum magistrado está obrigado a segui-lo. É a eficácia mínima de todo precedente. 3. Precedente com eficácia de obstar a revisão de decisões Há precedentes que têm a capacidade de obstar a revisão de decisões judiciais, seja por recurso ou, por remessa necessária. Esse impedimento pode ser tanto no sentido de não admitir a demanda, o recurso ou a remessa necessária, como no sentido de negar, no mérito, de plano, a postulação. 4. Precedente com eficácia autorizante Quando é determinante para a admissão ou acolhimento de ato postulatório (como recurso, demanda ou incidente processual). Observe-se que, a rigor, existem muitos precedentes que têm mais de um dos efeitos acima comentados. O enunciado de súmula do STF, por exemplo, tem, concomitantemente, eficácia obrigatória, obstativa, denegatória e autorizante. 5. Precedente com eficácia rescindente ou deseficacizante Tem aptidão para rescindir ou retirar a eficácia de uma decisão judicial transitada em julgado. Pode-se ainda cogitar uma revisão criminal com base em precedente mais favorável ao condenado. 6. Precedente que permite revisão da coisa julgada Pode autorizar a ação de revisão de coisa julgada que diga respeito a uma relação jurídica sucessiva, como a tributária, por exemplo. 3.3 Precedentes obrigatórios no direito brasileiro O art. 927 do NCPC inova ao estabelecer um rol de precedentes obrigatórios, que se distinguem entre si pelo seu procedimento de formação. Os precedentes cujo entendimento é consolidado na súmula de cada um dos tribunais tem força obrigatória em relação ao próprio tribunal e aos juízes a eles vinculados. Daí a previsão do art. 926, NCPC, quanto ao dever genérico de os tribunais brasileiros uniformizarem sua jurisprudência, mantendo-a estável, integra e coerente; isso permitirá a edição de súmula que consolide sua jurisprudência dominante, observando-se o procedimento traçado em seu regimento interno. Antes mesmo de produzir e seguir a sua própria súmula, os tribunais devem seguir seus próprios precedentes, para que haja sólida jurisprudência a ser sumulada.
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