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ROGERS E A PERSPECTIVA CENTRADA NO CLIENTE
							
	Carl Rogers criou uma abordagem popular de psicoterapia conhecida, inicialmente, como não-diretiva ou centrada-no-cliente e, mais tarde, como terapia centrada na pessoa. Essa forma de psicoterapia gerou uma quantidade enorme de pesquisas e é amplamente empregada no tratamento de distúrbios emocionais. A Teoria da Personalidade de Rogers, assim como a de Maslow, têm suas raízes na psicologia humanista, que Rogers usou como sua estrutura para a relação cliente-terapeuta. Rogers desenvolveu sua teoria não a partir de pesquisa experimental de laboratório, mas a partir de sua experiência no trabalho com clientes. Assim, suas formulações sobre a estrutura e a dinâmica da personalidade originam-se em sua abordagem terapêutica.
	A visão de Rogers sobre a situação terapêutica diz muito sobre a sua visão da natureza humana. Considere a frase terapia centrada na pessoa. Sugere que o dom de mudar ou aperfeiçoar a personalidade é centrado no interior da pessoa. Em outras palavras, é a pessoa, e não o terapeuta, quem determina tal mudança. O papel do terapeuta é assistir ou facilitar a mudança (catalizador da mudança). 
	Rogers acreditava que somos seres racionais governados por uma percepção consciente de nós mesmos e de nosso mundo experiencial. Ele não deu muita importância às forças inconscientes ou a outras explicações freudianas e rejeitou a noção de que eventos passados exercem uma influência controladora sobre o comportamento presente. Embora tivesse reconhecido que as experiências da infância afetam o modo como percebemos nosso ambiente e nós mesmos, insistia em afirmar que os sentimentos e emoções presentes têm um impacto maior sobre a personalidade. Devido a essa ênfase na consciência e no presente, sugeriu que a personalidade poderia ser entendida apenas a partir de nosso próprio ponto de vista, ou seja, baseada em nossas experiências subjetivas. Ele trabalhou com a realidade da maneira como ela é conscientemente percebida por nós e notou que essa percepção nem sempre coincide com a realidade objetiva. 
	Rogers propôs uma motivação única, inata e imprescindível: a tendência a atualizar e desenvolver nossa capacidade e nossos potenciais, desde os aspectos biológicos até os aspectos psicológicos mais sofisticados do nosso ser. Esse objetivo essencial é atualizar o self para tornar-se o que Rogers denominou uma pessoa em pleno funcionamento. Sua abordagem à terapia e à teoria e o quadro otimista e humanista que pintou receberam aceitação entusiasmada na psicologia, educação e pesquisa da vida familiar. 
HISTÓRIA PESSOAL
	Carl Rogers nasceu a 8 de janeiro de 1902, em Oak Park, Illinois, numa família cuja religião era rigorosamente fundamentalista. Sua infância foi limitada pelas crenças e atitudes de seus pais e pela assimilação que ele próprio fez de suas idéias. 
	
	Creio que as atitudes em relação às outras pessoas que não faziam parte de nossa família extensa podem ser resumidas esquematicamente da seguinte maneira: Outras pessoas comportam-se de formas duvidosas, não aprovadas em nossa família. Muitas delas jogam cartas, vão ao cinema, fumam, dançam, bebem e mantêm outras atividades – algumas delas não mencionáveis. Sendo assim, a melhor coisa a fazer é ser tolerante, pois talvez não conheçam coisa melhor, e manter-se afastado de qualquer comunicação mais próxima com eles e levar a vida no seio da família. (Rogers, 1973).
	Enquadrado neste sistema de crenças, relata que seus anos de meninice foram vividos em isolamento. No colégio tornou-se um excelente estudante, com ávidos interesses científicos. “Já conseguia perceber que eu era diferente, um solitário, sem um lugar ou possibilidade de encontrar um lugar no mundo das pessoas. Era socialmente incompetente em qualquer tipo de contato que não fosse superficial. Durante esse período, minhas fantasias eram nitidamente bizarras, e se viessem a ser diagnosticadas provavelmente seriam classificadas como esquizóides, mas felizmente nunca cheguei a entrar em contato com nenhum psicólogo” (Rogers, 1973). 
	Suas experiências na Universidade de Wisconsin foram significativas e recompensadoras. “Pela primeira vez em minha vida encontrei aproximação e intimidade reais longe de minha família” (Rogers, 1967). Em seu segundo ano de faculdade, começou a estudar para o ministério religioso. No ano seguinte foi para a China para assistir a uma conferência da Federação Mundial de Estudantes Cristãos em Pequim; a isto seguiu-se uma expressiva excursão pela China Ocidental. A viagem tornou suas atividades religiosas fundamentalistas mais liberais e proporcionou-lhe a primeira oportunidade de desenvolver independência psicológica. 
	Seu primeiro emprego foi em Rochester, Nova Iorque, num centro de orientação infantil. Durante os 12 anos seguintes, a compreensão de Rogers sobre o processo de psicoterapia progrediu de uma abordagem formal e objetiva para o que ele iria denominar mais tarde de terapia centrada no cliente. 
	Em Rochester, Rogers escreveu The Clinical Treatment of the Problem Child (1939). Em 1942 publicou Couseling and Psychoterapy (Psicoterapia e Consulta Psicológica), seu primeiro livro tratando propriamente de sua nova abordagem terapêutica. Em 1951 publicou Terapia Centrada no Cliente; continha sua primeira teoria formal sobre a terapia, sua teoria da personalidade e algumas pesquisas que reforçaram suas conclusões. Neste livro sugere que a maior força orientadora da relação terapêutica deveria ser o cliente, não o terapeuta. Esta inversão da relação usual era revolucionária e atraiu considerável crítica. Atingiu de modo direto a autoridade do terapeuta e a suposta falta de consciência do paciente – suposições na maioria indiscutíveis segundo outros teóricos. As implicações gerais desta posição, além da terapia, foram expressas em Tornar-se Pessoa (1961). 
	Rogers deixou o magistério em 1963 e foi para o recém-fundado Instituto Ocidental da Ciência do Comportamento em La Jolla, Califórnia. Poucos anos depois ajudou a estabelecer o Centro de Estudos da Pessoa, uma livre associação de pessoas em profissões de ajuda, onde passou a dedicar uma parte de seu tempo, além de escrever, fazer conferências e trabalhar em seu jardim. 
	Rogers resume sua própria posição citando Lao-Tsé:
	 
	Se eu deixar de interferir nas pessoas, elas 
		Se encarregarão de si mesmas,
	Se eu deixar de comandar as pessoas, elas se
		Comportam por si mesmas,
	Se eu deixar de pregar às pessoas, elas se
		Aperfeiçoam por si mesmas,
	Se eu deixar de me impor às pessoas, elas se
		Tornam elas mesmas. 
A NOÇÃO-CHAVE
	Na sua expressão mais simples, a idéia mestra da concepção terapêutica de Rogers é a capacidade do indivíduo, que se traduz neste enunciado mais explícito:
	O ser humano tem a capacidade, latente ou manifesta, de compreender-se a si mesmo e de resolver seus problemas de modo suficiente para alcançar a satisfação e eficácia necessárias ao funcionamento adequado.
	Acrescentamos que ele tem igualmente uma tendência para exercer esta capacidade. 
	Enquanto potenciais, esta capacidade e esta tendência são inerentes a todo homem – a menos que este tenha lesões ou conflitos estruturais que não lhe permitam defender-se nas condições ordinárias da vida. Esta capacidade é, pois, entendida como integrante de sua bagagem natural, e não é o produto de alguma educação ou aprendizagem particular, especializada. Contudo, a atualização eficaz desta potencialidade não é automática. Ela requer certas condições, um certo clima interpessoal, indicado na proposição seguinte, que se articula diretamente com a precedente:
	O exercício desta capacidade requer um contexto de relações humanas positivas, favoráveis à conservação e à valorização do “eu”, isto é, requer relações desprovidas de ameaça ou de desafio à concepção que o sujeito faz de si mesmo.
	Juntas, estas duas proposições resumem tudo o que se relaciona com esta terapia, toda hipótese,toda afirmação e toda prática.
	À primeira vista, pode parecer que a noção de capacidade não exprime nada de inovador. A capacidade do indivíduo não é condição sine qua non (sem a qual não) da terapia, seja ela qual for?
	Isto é verdadeiro, para certas capacidades elementares, puramente “instrumentais”. O tipo de terapia por meio de entrevistas exige, evidentemente, que o indivíduo goze de um estado mental que lhe dê condições de empenhar-se num processo, mesmo que elementar, de comunicação e de relação. Por rudimentares que sejam suas capacidades de expressão, ele deve poder usá-las de maneira mais ou menos coerente. Da mesma forma, deve manifestar um mínimo de receptividade e de “reatividade” emocionais. Se está num estado de confusão aguda, desorientado a ponto de ser incapaz de se reconhecer no tempo e no espaço (surto psicótico/demência), se está completamente prostrado ou muito excitado, se sua afecção é principalmente orgânica, ele não se encontra, em princípio – nem em condições necessárias para exercer as capacidades em questão – nem em condições de aproveitar muito qualquer psicoterapia. 
	Por outro lado, a capacidade não tem nada de especial ou de especializado. Não é uma atitude ou traço específico, mas um modo de funcionamento característico e eminentemente humano. Este modo está baseado na capacidade de conhecimento reflexivo; isto é, a capacidade, não somente de saber, mas de saber que se sabe. O conhecimento reflexivo torna possível a auto-avaliação e a autocorreção – operações fundamentais da capacidade em questão. 
	Quanto à capacidade do indivíduo de resolver seus problemas, trata-se, uma vez mais, não de soluções perfeitas e definitivas, mas de soluções ad hoc (para este caso) que permitam uma continuação fecunda do incessante processo de solução de problemas, que é o crescimento para a maturidade. Enfim, notemos que a finalidade para a qual esta capacidade se orienta está formulada, não em termos puramente de felicidade ou de sucesso, de segurança contra os problemas, etc., mas em termos de “funcionamento adequado”, construtivo, satisfatório no conjunto e, coisa essencial: realizável quaisquer que sejam as contingências do meio (desde que estas contingências não representem violações manifestas e persistentes das condições de vida humana).
	
	A tendência à atualização
	O que, em linguagem corrente, se chama capacidade do indivíduo, é a manifestação psicológica do que se chama, em linguagem mais abstrata, tendência à atualização do organismo. 
	A tendência à atualização é a mais fundamental do organismo em sua totalidade. Preside o exercício de todas as funções, tanto físicas quanto experienciais. E visa constantemente desenvolver as potencialidades do indivíduo para assegurar sua conservação e seu enriquecimento, levando-se em conta as possibilidades e os limites do meio. 
	O termo “enriquecimento” deve ser entendido no sentido mais geral, envolvendo tudo aquilo que favorece o desenvolvimento integral do indivíduo pelo crescimento de tudo o que possui e de tudo o que é, de sua importância, seu saber, seu poder, sua felicidade, seus talentos, seu prazer, suas posses e tudo aquilo que aumenta a satisfação que ele obtém disso. Além disso, este termo deve ser entendido no sentido fenomenológico, portanto subjetivo. O que a tendência atualizante procura atingir é aquilo que o sujeito percebe como valorizador ou enriquecedor – não necessariamente o que é objetiva ou intrinsecamente enriquecedor. 
	O termo “organismo" requer também uma explicação. Na sua acepção tradicional, primordialmente médica, refere-se exclusivamente às funções e tecidos físicos. Na concepção rogeriana, e de acordo com o uso cada vez mais difundido nos círculos psicológicos, a significação deste termo não se limita mais aos aspectos ditos “corporais”, mas, sim, ao conjunto das funções constitutivas do homem, numa acepção psicofísica, em que enfatiza o comportamento e a experiência.
	Voltando à tendência à atualização.
	Esta tendência, tal como é aqui entendida, opera tanto na ordem ontogenética (desenvolvimento do indivíduo) como na ordem filogenética (desenvolvimento da espécie). Embora a hipótese da tendência atualizante não tenha de modo algum o seu ponto de partida no desenvolvimento físico do organismo, a compreensão desta hipótese é facilitada quando se estabelece um paralelo entre esse desenvolvimento e o desenvolvimento da personalidade. Como temos ocasião de observar a nossa volta, o desenvolvimento morfológico e o funcionamento fisiológico do organismo (humano ou não) se opera conforme as leis genéticas próprias a cada espécie. Além disso, não existindo fatores perturbadores graves, este desenvolvimento se orienta em direção ao espécime adulto e são. Isto é um fato, não uma hipótese. A hipótese entra em jogo quando se explica o desenvolvimento da personalidade – isto é, do pólo psíquico do “organismo” – como sendo uma tendência semelhante ao conjunto das leis que rege o desenvolvimento do pólo físico. Isso é o que se propõe a hipótese referente à tendência à atualização do organismo. Se a experiência pode se organizar na ausência de fatores perturbadores graves, esta organização – incluída sua expressão no comportamento – se efetuará no sentido da maturidade e do funcionamento adequado, isto é, no sentido de um comportamento racional, social, subjetivamente satisfatório e objetivamente eficaz. 
	A noção do “eu” (self)
	Da mesma forma que a tendência à atualização, a noção do “eu” tem um papel fundamental na síntese teórica de Rogers. Uma representa a idéia mestra de sua teoria da terapia e a outra é o “pivô” de sua teoria da personalidade. 	
	A noção do “eu” é uma estrutura perceptual, isto é, um conjunto organizado e mutável de percepções relativas ao próprio indivíduo. Como exemplo destas percepções citemos: as características, atributos, qualidade e defeitos, capacidades e limites, valores e relações que o indivíduo reconhece como descritivos de si mesmo e que percebe como constituindo sua identidade. Esta estrutura perceptual faz parte, evidentemente – e parte central – da estrutura perceptual total que engloba todas as experiências do indivíduo em cada momento de sua existência. 
	O “eu” faz parte inerente da unidade psicofísica total indicada pelo termo “organismo”, e do que se conclui que está sujeito à operação da tendência à atualização. A conjugação destes dois fatores – a tendência à atualização e a noção do eu – determina o comportamento. A primeira representa o fator dinâmico, a segunda representa o fator regulador. Uma fornece a energia; outra a direção. 
	A tendência à atualização do eu age constantemente e busca, também constantemente, a conservação e o enriquecimento do eu. Isto significa que ela se opõe a tudo o que compromete o eu, seja no sentido da diminuição, da desvalorização ou da contradição. Contudo, o sucesso ou eficácia desta ação depende não da situação “real”, “objetiva”, mas da situação tal como o indivíduo a percebe. Ora, o indivíduo percebe a situação em função da noção de seu eu: aquilo que se relaciona com o eu tende a ser percebido com destaque e é suscetível de ser modificado em função dos desejos e angústias do indivíduo; o que não tem relação com o eu tende a ser percebido mais vagamente ou a ser totalmente negligenciado. De tal modo que é a noção do eu que, em última análise, determina a eficácia ou a ineficácia da tendência atualizante.
	Como exemplo, tomemos o caso de um indivíduo convidado a tomar parte num concurso de artes. Se ele se percebe a si mesmo como desprovido de dotes artísticos, evitará apresentar-se na competição por mais dotado que ele possa ser de fato e por mais vantajosa que seja a ocasião. Para ele, longe de representar uma ocasião de enriquecimento, a participação no concurso aparece como um risco, um perigo em potencial, uma ameaça enfim, à conservação de seu “eu” – tal como ele o percebe. Suponhamos, ainda, que ele se perceba como sendo dotado de um certo bom senso, conhecedor de seus pontosfracos, não suportando fracassos. É fácil perceber que, em presença de uma tal concepção do eu, a tendência à atualização, em vez de incitar o indivíduo a participar do concurso, leva-o a abster-se, defendendo desta forma, a imagem que faz de si mesmo.
	Conclui-se, daí, que a eficácia da tendência à atualização do eu depende do caráter realista da noção do eu. E esta noção é realista quando há correspondência ou congruência entre os atributos que o indivíduo acredita possuir e aqueles que de fato possui.
	Mas, que meios possui o indivíduo para verificar se existe tal correspondência? A possibilidade de verificação da noção do eu não é, naturalmente, absoluta. Parece, porém, que é amplamente suficiente para as necessidades práticas. Para verificar o caráter realista de qualquer percepção relativa à noção do eu, o indivíduo dispõe de duas fontes de critérios. Um destes critérios é de natureza mais ou menos particular; consiste na experiência vivida – sentimentos, desejos, ansiedades, angústias – do indivíduo a respeito do objeto em questão. O outro critério é de natureza mais ou menos pública; consiste no testemunho fornecido pela conduta do indivíduo e pela conduta de outros em relação a ele. Vamos recorrer novamente a um exemplo. O indivíduo que se considera como tendo os dons de orador e de “líder” pode comprovar esta percepção de si mesmo, consultando, por um lado, os dons de sua experiência: Gosta de se dirigir a uma assembléia? Fala com desenvoltura? Procura ocasiões de falar em público? Sente-se à vontade diante de seu auditório? Está geralmente em boa forma física e se esforça por superar os pequenos contratempos eventuais de sua saúde nos dias que deve desempenhar funções públicas? Etc. Por outro lado, ele pode consultar as fontes públicas, mais objetivas. É reconhecido como capaz de conquistar um público e de manter a atenção dos ouvintes? Goza de uma certa prioridade sobre outros candidatos às mesmas funções? É aplaudido, eleito, seguido, etc.?
	Se as respostas a esta dupla série de questões são afirmativas, o indivíduo pode concluir que este aspecto de sua noção do eu tem fundamento, que há congruência entre aquilo que acredita ser e aquilo que é – pelo menos, sob o ângulo em questão. Porém, se as respostas divergem, deve-se concluir que a idéia que ele faz de si mesmo é apenas parcialmente correta e que sua candidatura está comprometida. 
	No caso afirmativo, a operação da tendência atualizante será adequadamente dirigida pela noção do eu, e o indivíduo terá boas chances de atingir os fins a que se propõe. 
	Em resumo, para que a ação diretriz da noção do eu possa exercer-se de maneira eficaz, para que possa conduzir-se à satisfação subjetiva do indivíduo e à eficácia de seu comportamento, é necessário que esta noção seja realista. Para ser realista, ela deve estar fundamentada na experiência autêntica do indivíduo, isto é, naquilo que ele realmente experimenta. A condição essencial deste fundamento autêntico é a liberdade experiencial, a qual vamos discutir agora.
	Noção de liberdade experiencial
	A idéia de liberdade, em suas relações com a psicoterapia ou com a educação, parece representar uma dificuldade imprevista para um bom número de pessoas. Toda teoria que insiste na importância da liberdade do cliente ou da criança corre o risco de se ver repudiada, porque “carece de realismo no que diz respeito à natureza humana”. Parece, com efeito, que existe uma tendência a compreender esta noção como significando que o indivíduo, em particular a criança, deve ter o direito de exprimir todos seus impulsos, onde e quando queira, e que nenhuma ordem ou autoridade deve regular sua conduta. 
	Tal concepção da educação, da terapia e das relações humanas em geral não deixaria, certamente, de ter conseqüências desagradáveis, tanto para o indivíduo quanto para a sociedade. Porém, esta é uma concepção praticamente física da liberdade. 
	A liberdade de que se trata aqui é de uma outra ordem. Relaciona-se essencialmente com a experiência, isto é, com os fenômenos internos. Consiste no fato de que o indivíduo se sente livre para reconhecer e elaborar suas experiências e sentimentos pessoais como ele o entende. Em outras palavras: supõe que o indivíduo não se sinta obrigado a negar ou a deformar suas opiniões e atitudes íntimas para manter a afeição ou o apreço das pessoas importantes para ele (“his significant social others” ou pessoas-critério). 
	Esta liberdade existe quando o indivíduo se dá conta do que lhe é permitido expressar (ao menos verbalmente): sua experiência, seus pensamentos, emoções e desejos tais e quais ele os experimenta e independentemente de sua conformidade às normas sociais e morais que regem seu meio ambiente. Dito de outra forma, o indivíduo é psicologicamente livre quando não se sente obrigado a negar ou a deformar aquilo que experimenta a fim de conservar seja o afeto ou a estima daqueles que representam um papel importante na sua economia interna, seja sua auto-estima. 
	Vamos exemplificar para esclarecer. Tomemos o caso, simples – aliás, perfeitamente típico no fundo – do menino ciumento de seu irmão recém-nascido. Sentindo-se atingido em seus privilégios e em sua importância, ele experimenta sentimentos francamente hostis em relação ao “intruso”. E como os experimenta de modo muito vivo, é plenamente consciente destes sentimentos. Dizemos, então, que ele representa corretamente sua experiência, isto é, de acordo com a maneira pela qual a experimenta. Com a franqueza própria de sua idade, declara a quem queira ouvi-lo que “é preciso jogar fora o bebê”, que ele “não o quer”, que vai “matá-lo” e outros propósitos reveladores. Se os pais são psicologicamente esclarecidos ou possuem a habilidade decorrente da segurança e da maturidade emocionais, saberão como tratar esta reação negativa, em geral breve, sem que haja efeitos nocivos para a criança, e inclusive se servir dela para sua educação social.
	No entanto, nem sempre as coisas se passam assim. Certos pais reagem aos comentários do menino dando-lhe a impressão de que ele é “ruim” ou “malvado” e que não o amam mais. Ora, uma tal reação representa, evidentemente, uma ameaça à imagem (rudimentar e não formulada, mas de qualquer modo real) que o menino faz de si mesmo. Por outro lado, como a reação dos pais é baseada menos nas declarações inocentes da criança do que nas suas próprias atitudes (de intolerância, de insegurança, de rigidez, etc.), sua reação não facilita a situação da criança. 
	Ao contrário. Do ponto de vista da criança, os pais lhe retiram não somente o monopólio de sua atenção e de seu afeto como a punem porque ela sofre com este tratamento e quer reconquistar sua “legítima posição”. O que lhe resta fazer em condições tão desagradáveis? Ou deixa de expressar seus sentimentos ou lhes dá uma aparência indireta, dizendo que o “bebê chora o tempo todo” ou que o “bebê está sujo”, se não recorrer à tática socialmente mais vantajosa, que consiste em dizer que ama seu irmãozinho, isto é, exatamente o contrário daquilo que experimenta. Assim, dissimulando e disfarçando seus sentimentos, para conservar a afeição dos que lhes são caros, a criança chega a não mais reconhecer seus verdadeiros sentimentos.
	Poder-se-ia objetar que a proibição por parte dos pais recairá apenas sobre a expressão verbal, não sobre a percepção dos sentimentos do menino. Isto é exato. Porém, em conseqüência da ação das leis psicodinâmicas (introjeção) esta proibição externa estende-se gradativamente à percepção. Com efeito, o menino aprende não somente que a expressão de certos sentimentos motivam a punição, mas também que certos sentimentos são “maus” e “desonestos” e que eles não poderiam existir num “bom menino”, de quem “papai e mamãe gostam tanto”. Ora, como é precisamente esta a imagem que ele faz de si mesmo – e com razão – acredita-se, muito naturalmente, incapaz de ter tais sentimentos. Além disso, tudo o que tende a desvalorizar a imagem que faz de si mesmo vai diretamente ao encontro desua tendência à atualização. Por isso, o “organismo” os trata como corpos estranhos e tenta, ou eliminá-los “ignorando-os”, ou embelezá-los de maneira a torná-los aceitáveis pela consciência. Assim, o que inicialmente era uma reação ocasional, torna-se uma atitude, isto é, um fator da personalidade e do comportamento. 
	Quando se realizam estas condições, dizemos que a experiência, ou certos elementos da experiência, não têm mais livre acesso à consciência. Este desnível entre a experiência e sua representação consciente pode conduzir a desordens mais menos graves do sistema de comunicação interna, “organísmico”, que forma a base do bom ajustamento. 
	Retracemos rapidamente o essencial da gênese da desordem do sistema de comunicação interna que acaba de ser descrito. Em sua origem, a liberdade experiencial do indivíduo está ameaçada. Não lhe é permitido sentir o que experimenta manifestamente, sob pena de perder as condições das quais depende sua atualização, a saber, o afeto ou a estima dos que representam um papel importante em sua vida (pessoas-critério). A angústia causada por esta ameaça leva-o primeiro a reprimir a exteriorização, em seguida, a existência de seus sentimentos. Se o procedimento se revela “fecundo”, isto é, se lhe restitui as condições da conservação e da revalorização do eu, ele tende a adotar este procedimento como modo de vida. No entanto, escapando a seu conhecimento uma parte de sua experiência vivida, real, o controle de seu comportamento escapa-lhe na mesma medida. A partir daí começam a surgir decepções e dissabores, e o indivíduo torna-se confuso, desorientado, em suma, neurótico. 
	A educação da criança e as relações humanas em geral não podem certamente ser concebidas sem alguma ameaça à integridade (não física ou moral, mas psicológica) do indivíduo. Quando estes atentados à liberdade experiencial são relativamente raros, e se produzem em um contexto de aceitação e de respeito indubitáveis, eles quase não acarretam, aparentemente, conseqüências nocivas. Por outro lado, quando – em qualquer idade que seja – as condições de existência são tais que exigem um divórcio praticamente constante entre a experiência e sua representação, o indivíduo perde sua tranqüilidade, sua autoconfiança e sua eficácia. Fica submetido a uma angústia generalizada, não sabe mais nem o que pensa, nem o que quer. É incapaz de tomar decisões ou de tirar delas as satisfações esperadas. Está desprovido de valores já comprovados, enraizados na experiência pessoal e capazes de servir de base a um comportamento relativamente estável, eficaz e satisfatório.
	Esta alienação do indivíduo em relação à sua experiência vivida é precisamente aquilo que constitui a personalidade neurótica.
	Crescimento Psicológico
	Para melhor compreender o que foi exposto nesses itens anteriores, transcrevemos o texto que se segue, complementando o entendimento sobre o crescimento psicológico do indivíduo e os obstáculos a esse crescimento.
	As forças positivas em direção à saúde e ao crescimento são naturais e inerentes ao organismo. Baseado em sua própria experiência clínica, Rogers conclui que os indivíduos têm a capacidade de experienciar e de se tornarem conscientes de seus desajustamentos. Isto é, você pode experienciar as incoerências entre seu autoconceito e suas experiências reais. Esta capacidade que reside em nós é associada a uma tendência subjacente à modificação do autoconceito, no sentido de estar realmente de acordo com a realidade. Rogers postula, portanto, um movimento natural para a resolução e distante do conflito. Vê o ajustamento não como um estado estático, mas como um processo no qual novas aprendizagens e novas experiências são cuidadosamente assimiladas. 
	Rogers estava convencido de que estas tendências em direção à saúde são facilitadas por qualquer relação interpessoal na qual um dos membros esteja livre o bastante da incongruência para estar em contato com seu próprio centro de autocorreção. A maior tarefa da terapia é estabelecer tal relacionamento genuíno. Aceitar-se a si mesmo é um pré-requisito para uma aceitação mais fácil e genuína dos outros. Em compensação, ser aceito por outro conduz a uma vontade cada vez maior de aceitar-se a si próprio. Este ciclo de autocorreção e auto-incentivo é a forma principal pela qual se minimiza os obstáculos ao crescimento psicológico.
	Obstáculos ao Crescimento
	Rogers sugere que os obstáculos aparecem na infância e são aspectos normais do desenvolvimento. O que a criança aprende em um estágio como benéfico deve ser reavaliado nos estágios posteriores. Motivos que predominam na primeira infância mais tarde podem inibir o desenvolvimento da personalidade.
	Quando a criança começa a tomar consciência do self, desenvolve uma necessidade de amor ou de consideração positiva (aceitação incondicional). “Essa necessidade é universal, considerando-se que ela existe em todo ser humano e que se faz sentir de uma maneira contínua e penetrante. A teoria não se preocupa em saber se se trata de uma necessidade inata ou adquirida” (Rogers, 1959). Uma vez que as crianças não separam suas ações de seu ser total, reagem à aprovação de uma ação como se fosse aprovação de si mesmas. Da mesma forma, reagem à punição de um ato como se estivessem sendo desaprovadas em geral. 
	O amor é tão importante para a criança que ela “acaba por ser guiada, não pelo caráter agradável ou desagradável de suas experiências e comportamentos, mas pela promessa de afeição que elas encerram” (Rogers, 1959). A criança começa a agir da forma que lhe garante amor ou aprovação, sejam os comportamentos saudáveis ou não para ela. As crianças podem agir contra seu próprio interesse, chegando a se perceber em termos destinados a princípio a agradar ou apaziguar os outros. Teoricamente esta situação poderia não se desenvolver se a criança sempre se sentisse aceita e houvesse aprovação dos sentimentos mesmo que alguns comportamentos fossem inibidos. Em tal situação ideal a criança nunca seria pressionada a se despojar ou repudiar partes não atraentes, mas autênticas de sua personalidade.
	Comportamentos ou atitudes que negam algum aspecto do self são chamados de condições de valor. “Quando uma experiência relativa ao eu é procurada – ou evitada – unicamente porque é percebida como mais – ou menos – digna de consideração de si, dizemos que o indivíduo adquiriu um modo de avaliação condicional” (Rogers, 1959). Condições de valor são os obstáculos básicos à exatidão da percepção e à tomada de consciência realista. Há vendas e filtros seletivos destinados a assegurar um suprimento interminável de amor da parte dos parentes e dos outros. Acumulamos certas condições, atitudes ou ações cujo cumprimento sentimos necessário para permanecermos dignos. Na medida em que essas atitudes e ações são idealizadas, elas constituem áreas de incongruência pessoal. De forma extrema, as condições de valor são caracterizadas pela crença de que “preciso ser respeitado ou amado por todos aqueles com quem estabeleço contato”. As condições de valor criam uma discrepância entre o self e o autoconceito. Para mantermos uma condição de valor temos que negar determinados aspectos de nós mesmos.
	Por exemplo, se lhe falaram “Você deve amar seu irmãozinho recém-nascido senão mamãe não gosta mais de você”, a mensagem é a de que você deve negar ou reprimir seus sentimentos negativos genuínos em relação a ele. Se você conseguir esconder sua vontade maldosa, seu desejo de machucá-lo e seu ciúme normal, sua mãe continuará a amá-lo. Se você admitir que tem tais sentimentos você arrisca a perder este amor. Uma solução que cria uma condição de valor é rejeitar tais sentimentos sempre que ocorram, bloqueando-os de sua consciência. Agora, você pode reagir de formas tais como: “Eu realmente amo meu irmãozinho, apesar das vezes em que o abraço tanto até ele gritar” ou, “Meu pé escorregou sob o seu, eis porque ele tropeçou”. Admitir os sentimentos reais e permitir-lhes alguma expressão quando ocorrem é mais saudável,segundo Rogers, do que rejeitá-los ou aliená-los.
	Quando a criança amadurece, o problema persiste. O crescimento é impedido na medida em que a pessoa nega impulsos diferentes do autoconceito artificialmente “bom”. Para sustentar a falsa auto-imagem a pessoa continua a distorcer experiência – quanto maior a distorção maior a probabilidade de erros e da criação de novos problemas. Os comportamentos, os erros e a confusão que resultam dão manifestações de distorções iniciais mais fundamentais. 
	A situação realimenta-se a si mesma. Cada experiência de incongruência entre o self e a realidade aumenta a vulnerabilidade, a qual, por sua vez, ocasiona o aumento de defesas, interceptando experiências e criando novas ocasiões de incongruência. 
	Por vezes as manobras defensivas não funcionam. A pessoa toma consciência das discrepâncias óbvias entre os comportamentos e as crenças. Os resultados podem ser pânico, ansiedade crônica, retraimento ou mesmo uma psicose. Rogers observou que o comportamento psicótico parece ser, muitas vezes, a representação externa de um aspecto anteriormente negado da experiência. Perry (1974) corrobora, apresentando evidência de que o episódio psicótico é uma tentativa desesperada da personalidade de se reequilibrar e de permitir a realização de necessidades e experiências internas frustradas. A terapia centrada no cliente esforça-se por estabelecer uma atmosfera na qual condições de valor prejudiciais possam ser postas de lado, permitindo, portanto, que as forças saudáveis de uma pessoa retomem sua dominância original. Uma pessoa recupera a saúde reivindicando suas partes reprimidas ou negadas. 
 
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	BIBLIOGRAFIA
	Textos compilados a partir da bibliografia citada abaixo:
FADIMAN, J. e FRAGER, R. Teorias da personalidade. São Paulo: Harbra, 1986.
ROGERS, C. e KINGET, G.M. Psicoterapia & relações humanas. Belo Horizonte: Interlivros, 1977.
SCHULTZ, D.P. e SCHULTZ, S.E. Teorias da personalidade. São Paulo: Thomson Learning Edições, 2006. 
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