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Agressores Sexuais de criança e adolescentes Características biopsicossociais e trajetória de desenvolvimento

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ 
NÚCLEO DE TEORIA E PESQUISA DO COMPORTAMENTO 
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM TEORIA E PESQUISA DO 
COMPORTAMENTO 
 
 
PROJETO DE PESQUISA DE DOUTORADO 
 
Autores de Agressão Sexual de Crianças e Adolescentes: Características 
Biopsicológicas e Trajetórias de Vida 
 
 
 
Proponentes: 
Doutoranda: Daniela Castro dos Reis 
Orientador: Lília Iêda Chaves Cavalcante 
 
 
 
 
Belém – Pará 
2014 
2 
 
Sumário 
Apresentação 05 
1. Aspectos Conceituais: a Violência Sexual e a Concepção de Criança e 
Adolescente 
09 
2. O Agressor sexual de Crianças e Adolescente: Características e Tipologia 20 
3. Áreas de Conhecimento e Teorias sobre a Agressão 28 
3.1 A Antropologia Evolucionista e a Natureza Humana 29 
3.2 A Biologia da Agressão 31 
3.3 A Sociologia e a Influência Social na Agressão 34 
3.4. Perspectivas Teóricas da Psicologia sobre a Agressão 36 
3.4.1 Teorias Clássicas 36 
3.4.1.1 Psicanálise/Psicodinâmica 36 
3.4.1.2 Behaviorismo 38 
3.4.1.3 Aprendizagem Social/Teoria Social Cognitiva 41 
3.4.2 Teóricas integrativas 43 
3.4.2.1 Cognitivismo neoassociacionista 43 
3.4.2.2 Psicologia Evolucionista 45 
3.4.2.3 Cognitivo-comportamental (Distorções Cognitivas) 47 
3.4.2.4 Pensamento sobre informação social 50 
3.4.2.5 Interacionismo social 53 
4. Modelos Teóricos da Agressão Sexual 55 
4.1 Modelo de Finkelhor (Pré-condições) 55 
4.2 Modelo de Abel, Becker e Cunningham-Rathener 59 
4.3 Modelo de Marshall e Barbaree 61 
4.4 Modelo de Hall e Hirschman (Modelo Quadripartite) 65 
4.5 Modelo de Malamuth 69 
4.6 Modelo de Ward e Hudson (Pathway Theory) 71 
5.O Modelo Bioecológico do Desenvolvimento Humano: Fatores de Risco e 
Fatores de Proteção Relacionados à Agressão Sexual de Crianças e Adolescentes 
76 
5.1 O Autor de Agressão Sexual na Perspectiva Bioecológica 89 
6. Objetivos 97 
7. Método 98 
7.1 Fundamentos Metodológicos 98 
7.2 Delineamento da Pesquisa 98 
7.3 Considerações Éticas 99 
Estudo I - Instrumentos de Avaliação Psicológica do Autor de Agressão Sexual de 
Criança e Adolescente: Uma Revisão Sistemática da Literatura 
100 
Estudo II - As Características Sociodemográficas e Biopsicológicas de Autores de 
Agressão Sexual de Crianças/Adolescentes: Um Estudo Documental Sociojurídico 
107 
Estudo III – As distorções cognitivas de Autores de Agressão Sexual de Crianças e 
Adolescentes 
114 
Estudo IV - Autores de Agressão Sexual de Crianças e Adolescentes: Estudo dos 
Fatores de Risco e Proteção em sua Trajetória de Vida. 
118 
3 
 
Cronograma 125 
Referência 127 
Anexo I- Termo de Autorização das Instituições 140 
Anexo II- Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) 141 
Anexo III- Formulário para Caracterização Biopsicossocial 143 
Anexo IV- Questionário Sociodemográfico de Caracterização do Sistema Familiar 
(QSCSF) 
144 
Anexo V- Entrevista Semiestruturada 156 
Anexo VI-Checklist de Distorções Cognitivas para Ofensores Sexuais (CDCOS) 158 
 
 
4 
 
Lista de figuras 
Figura 1 Quadro com os termos que orientaram a busca preliminar e exploratória 
do tema da pesquisa 
101 
Figura 2 Quadro com o critério de inclusão e exclusão dos artigos 102 
Figura 3 Quadro demonstrativo dos descritores e suas combinações 102 
Figura 4 Teste de relevância (Fonte: Azevedo, 2010, adaptado pelo pesquisador). 103 
Figura 5 Quadro demonstrativo das variáveis a serem consideradas na 
caracterização dos artigos selecionados 
105 
Figura 6 Quadro demonstrativo dos dados analisados nos artigos 105 
Figura 7 Quadro exemplificando as categorias a serem analisadas 106 
Figura 8 Diagrama do fluxo de execução da Revisão Sistemática da Literatura 106 
Figura 9 Mapa do Estado do Pará mostrando a três municípios alvo da pesquisa 108 
Figura 10 Quadro com as categorias dos CDCOS (2004) 116 
Figura 11 Quadro com os núcleos teóricos do Modelo da Bioecologia do 
Desenvolvimento Humano, as categorias relacionadas, suas definições e 
exemplos. 
122 
 
 
 
 
5 
 
Apresentação 
A violência sexual é um fenômeno complexo, polissêmico, controverso e multifatorial, 
perpetrada por indivíduos contra outros indivíduos, assumindo diferentes contornos em razão 
das relações pessoais, sociais, políticas ou culturais que a constituem. Entre outros aspectos 
relacionados ao fenômeno, a violência sexual tem ensejado a realização de estudos sobre a 
identidade e a condição psicossocial dos protagonistas das diversas formas de agressão que a 
definem. Estes são aspectos, contudo, pouco relatados na literatura científica, sobretudo 
quando se considera a extensão e a complexidade das questões por eles suscitadas. 
Com esse propósito, este estudo pretende contribuir com o debate atual acerca do 
desenvolvimento biopsicossocial do autor de agressão sexual de crianças e adolescente, as 
características que o descrevem e os fatores de risco e proteção em seus contextos de 
convivência, dando início às atividades do EASCA (Estudos do Agressor Sexual de Criança e 
Adolescente), grupo de pesquisa do qual participam alunos e professores do Laboratório de 
Ecologia do Desenvolvimento (LED), vinculado ao Programa de Pós-Graduação em Teoria e 
Pesquisa do Comportamento (PPGTPC) da Universidade Federal do Pará (UFPA). 
O interesse inicial pelo tema da pesquisa remete às inquietações disseminadas pela 
discussão sobre a violência sexual de crianças e adolescentes nas últimas décadas, no Brasil e 
no mundo, e suas particularidades no contexto local, acompanhadas de perto pela autora a 
partir de sua atuação profissional no Centro de Referência Especializado da Assistência Social 
(CREAS), um serviço socioassistencial voltado ao atendimento à vítima de violência sexual 
na Região Metropolitana de Belém, assim como da sua participação no debate sobre os 
desafios colocados ao Sistema de Garantia de Direito da Criança e do Adolescente (SGD) no 
enfretamento dessa problemática. Destas experiências ficou a impressão de que a condição 
psicossocial da vítima era sempre privilegiada e pouco se considerava a perspectiva do autor 
da agressão sexual, secundarizando até certo ponto a necessidade de se conhecer melhor quem 
6 
 
era a pessoa por trás do comportamento em questão. Desse modo, pouco eram questionadas as 
características biosociodemográficas e psicológicas relacionadas ao perfil do autor de 
agressão sexual de criança e adolescente e muito menos os distintos fatores de risco e de 
proteção ao desenvolvimento humano comumente presentes em sua trajetória de vida. 
Contudo, a partir da década de 80, em termos mundial, observou-se uma mudança 
gradual dessa forma de ver autor de agressão sexual. Especialmente, no Brasil, na década de 
90, diferentes delineamentos de pesquisa e estudos realizados em Psicologia começaram a 
despertar para a importância de se conhecer de forma aprofundada não apenas aspectos 
sociodemográficos do perfil dos autores de agressão sexual em contextos diversos, mas 
também evidências de uma população que se destaca pela diversidade e heterogeneidade dos 
seus traços clínicos e psicológicos. 
Entende-se que esse debate colocou em destaque as inquietações colocadas por 
profissionais e autoridades sobre o tema e apontou para a pouca clareza dos pesquisadores 
sobre como investigar quem são os autores de agressão sexual e quais as características 
biopsicológicas prevalentes nessa população em contextos diversos do país. E mais: a 
compreensão de que desconhecimento das características biopsicológicas dos autores de 
agressão sexual e os aspectos desenvolvimentais comuns e decisivos em suas trajetórias de 
vida podemdificultar ou impedir o entendimento das condições necessárias ao rompimento 
com os mecanismos de reprodução da violência sexual. Em razão disso, essa lacuna parece 
contribuir ainda para mascar ou camuflar a natureza humana dos autores de agressão sexual, 
podendo aumentar o preconceito social e minimizar as chances de sua reinserção na 
sociedade, sobretudo a partir da reestruturação do meio familiar e social. 
Em termos teóricos, a produção de pesquisas como esta aqui proposta pode trazer 
novos elementos para pensar o problema nos limites do contexto pesquisado e fora dele. 
Afinal, hoje novos saberes sobre o tema são exigidos e outros se consolidam, principalmente 
7 
 
ao se considerar as especificidades contextuais. A ideia é que este e outros estudos com 
propósitos semelhantes possam contribuir para tornar mais claro o debate social, político, 
histórico e cultural acerca do problema em foco. É preciso buscar formulações que possam 
dar conta de ler a realidade da violência sexual de crianças e adolescentes e da condição 
psicossocial do agressor sexual de forma mais complexa, como a realidade exige. Tais saberes 
podem se transformar em ações efetivas como protocolos de atendimento e formas de 
tratamento a essa população, aspectos ainda tão pouco explorados na literatura nacional. Ou 
seja, a proposição de estudos como este pode favorecer a apresentação e a consolidação de 
políticas públicas que subsidiem atendimentos especializados para a população em questão. 
No âmbito acadêmico, espera-se, pois, que estudos como este podem abrir mais espaço para 
esse tipo de demanda social e assim incentivar a produção de dados e análise que possam 
encontrar respostas para tantos dilemas que fazem parte do cotidiano dos profissionais que 
precisam lidar com essa realidade. 
Pelas razões mencionadas, este projeto de pesquisa propõe olhar o autor de agressão 
sexual de crianças e adolescentes a partir do Modelo da Bioecologia do Desenvolvimento 
Humano, focalizando as suas características biopsicológicas e a sua trajetória de vida. O 
projeto traz como problematização proposta entender como as características biopsicológicas 
foram construídas na trajetória de vida do indivíduo, conduzindo-o à adultez. Como 
proposição de pesquisa compreende-se que estudar as características biopsicológicas do autor 
de agressão sexual a partir da sua história de vida permitirá entender melhor as condições 
ecológicas que o conduziram até a vida adulta. Dessa forma, propõe-se a tese de que uma 
variedade de fatores de risco interagindo concomitantemente vivenciados no decorrer da vida 
do indivíduo, neste caso, autor de agressão sexual, pode torná-lo mais vulnerável às condições 
adversas, levando-o ao cometimento do ato sexual contra crianças e adolescentes. Em resumo, 
8 
 
este estudo investigará as características biopsicológicas de autores de agressão sexual de 
crianças e adolescente, e os fatores de risco e proteção presentes em sua trajetória de vida. 
O método proposto obedecerá a questões de pesquisa derivadas do Modelo da 
Bioecologia do Desenvolvimento Humano, que permite a combinação de abordagens 
qualitativa e quantitativa dos dados coletados e a realização de análises integradas dos 
aspectos e processos investigados. Esta orientação metodológica procura deixar clara a 
natureza sistêmica do presente estudo. Para tanto, o projeto prevê a realização de quatro 
estudos independentes, porém interligados, no sentido de promover uma compreensão 
abrangente e integrada dos múltiplos aspectos, pessoais e contextuais, destacados na 
bioecologia do desenvolvimento dos autores de agressão sexual pesquisados. 
O primeiro estudo se apresenta como uma proposta de Revisão Sistemática da 
Literatura (RSL) que terá como objetivo de mapear a produção científica que aponta medidas, 
instrumentos e variáveis de avaliação psicológica do autor de agressão sexual utilizados em 
pesquisas nacionais e em outros países; o segundo terá como fonte de informação processos 
jurídicos dos autores de agressão sexual, identificando a partir dos dados extraídos desses 
documentos, as características biopsicológicas e sociodemográficas prevalentes na população 
considerada; o terceiro analisará as distorções cognitivas a partir da percepção do autor de 
agressão sexual sobre criança (infância), adolescente (adolescência), agressão e violência 
sexual; e o quarto e último será um estudo de casos múltiplos, que procurará analisar as 
características biopsicológicas desenvolvidas por seus protagonistas no decorrer da vida e 
identificar os fatores de risco e proteção nas trajetórias analisadas. 
 
 
 
 
 
 
9 
 
Aspectos Conceituais: a Violência Sexual e a Concepção de Criança e Adolescente 
A violência sexual contra crianças e adolescentes acompanha a trajetória histórica da 
humanidade, manifestando-se de múltiplas formas em diferentes épocas e contextos sociais, 
conforme concepções e práticas culturais também diversas (Costa, Carvalho, Bárbara, Santos, 
Gomes & Sousa, 2007; Krug, Dahlberg, Mercy & Zwi, 2002). Para se entender a 
configuração histórica e os significados sociais que fazem da violência sexual um fenômeno 
tão antigo quanto atual, é necessário compreender os comportamentos que a definem como 
tal, quais as suas formas mais comuns de expressão no cotidiano de famílias e instituições, 
além dos indivíduos envolvidos nessas relações abusivas. 
Na acepção mais comum e geral do termo, o conceito de violência está associado à 
expressão concreta dos diferentes métodos de coerção e dominação utilizados com a 
finalidade de conquistar, reter poder ou obter privilégios (Ribeiro, Ferriani & Reis, 2004). No 
que diz respeito à etimologia da palavra, violência vem do latim violentia, que remete ao 
abuso da força que desrespeita as medidas sociais e culturalmente estabelecidas (Muller, 
2006). Estas medidas podem ser dada pelo outro e sua constituição psicológica, definição do 
que a sociedade define como justo e adequado em suas leis, regras sociais, costumes e crenças 
por ela instituídos. 
Um dos conceitos amplamente utilizado sobre o termo violência é da Organização 
Mundial da Saúde (OMS): 
O uso intencional da força física ou do poder, real ou em ameaça, contra si próprio, 
contra outra pessoa, ou contra um grupo ou uma comunidade, que resulte ou tenha 
grande possibilidade de resultar em lesão, morte, dano psicológico, deficiência de 
desenvolvimento ou privação (OMS, 2002, pp. 05). 
Esse conceito vislumbra a noção de relação de poder assimétrica existente nos vários 
tipos de violência. A relação de poder assimétrica implicada na violência associa-se à 
10 
 
intencionalidade do ato, com a sua prática propriamente dita, independentemente do resultado 
produzido. A relação de poder pode levar à ocorrência de um ato violento, uma vez que 
envolve aqueles comportamentos e práticas que resultam de uma relação de abuso, incluindo 
as ameaças e as intimidações. A relação de poder assimétrica também serve para promover a 
negligência ou atos de omissão, além de atos violentos mais óbvios de perpetração. 
O uso do poder deve ser entendido de forma a incluir a negligência e todos os tipos de 
abuso físico, sexual e psicológico. Essa definição cobre uma ampla gama de consequências, 
inclusive dano psicológico, privação e déficits no desenvolvimento. Ela reflete um 
reconhecimento cada vez maior por parte dos pesquisadores e profissionais acerca da 
utilidade de incluir a violência que não resulta necessariamente em lesões ou morte, mas que 
oprime as pessoas, as famílias e as comunidades no mundo todo. 
Muitas formas de violência contra mulheres, crianças e idosos, por exemplo, podem 
resultar em problemasfísicos, psicológicos e sociais que não necessariamente levam a lesões 
físicas, invalidez ou morte (Echeburúa & Corral, 2006; Rogers, Titterington & Davies, 2009). 
Essas consequências, porém, podem ser imediatas, bem como latentes, e tendem a perdurar 
por anos após o abuso inicial. Portanto, definir os resultados somente em termos de lesões ou 
mortes limita a compreensão da totalidade do impacto da violência sobre as pessoas, a 
comunidade e a sociedade como um todo (OMS, 2002). 
Particularmente, em relação às formas de apresentação da violência contra criança e 
adolescente, Cabral, Reis e Garcia (2010) lembram que as categorias mais utilizadas em 
estudos sobre o tema são: violência física, violência psicológica, negligência, violência 
institucional e estrutural, violência social e sexual. Entretanto, em função de que essas 
tipificações da violência são amplas demais e nenhuma delas parece conseguir captar a 
complexidade do fenômeno envolvido, a OMS (2002) propôs diversificar esse conceito e 
11 
 
relacionar a tipificação da violência à sua forma particular de manifestação em vários 
contextos. 
Pela OMS (2002), a violência autoinfligida é aquela que é direcionada a si própria 
(intrapessoal), já a interpessoal envolve o contexto familiar, intrafamiliar; a comunitária é 
aquela que ocorre entre pessoas sem parentesco, portanto, extrafamiliar; e a coletiva 
compreende redes e/ou organizações terroristas ou de guerras. Aliado a esses conceitos, 
classifica-se ainda violência conforme sua natureza, em geral por atos violentos que envolvem 
negligência ou privação, além dos abusos físicos, psicológicos e sexuais. Essa distinção, 
mesmo sem a pretensão de esgotar os problemas com a sua conceituação, enfatiza que em 
todas as tipologias da violência o caráter intencional do ato se faz presente em alguma 
medida. 
No caso específico dos atos abusivos e agressivos de natureza sexual, a conceituação, 
a tipificação e a compreensão dos processos que envolvem essa temática exigem uma 
discussão ainda mais abrangente e sensível às suas múltiplas determinações e configurações. 
A violência que envolve o ato sexual é um fenômeno multifatorial, complexo, polissêmico, 
multideterminado e controverso que se manifesta ou se materializa nas ações individuais ou 
coletivas, assumindo formas próprias de relações pessoais, sociais, políticas ou culturais. 
Nessa direção, Chauí (1999) define violência sexual como a relação de poder entre o algoz 
que impõe seu desejo sobre seus objetos, conduzindo a discussão para o campo da ética e da 
sociedade contemporânea. Nessa perspectiva, a violência sexual pode ser explicada através 
das relações de poder assimétricas que possibilitam o uso da força para obtenção ou 
manutenção de privilégios sexuais. 
De maneira geral, Leal e Leal (2002) discutem violência sexual a partir de dois 
grupos: o abuso sexual, caracterizado por manifestações no âmbito intrafamiliar (doméstica) e 
extrafamiliar, e a exploração sexual, representada pela comercialização mercantilista de 
12 
 
pessoas. Similar classificação é apontada pelo Centro de Referência Técnica em Psicologia e 
Políticas Públicas – CREPOP (2009): 1) o abuso sexual é compreendido por uma série de 
situações que estão localizadas em um continuum que muitas vezes dificulta o 
estabelecimento dos limites entre o aceitável e o inaceitável, especialmente em uma cultura 
capitalista que sexualiza a infância; 2) a exploração sexual comercial de crianças e 
adolescentes, que se caracteriza pela obtenção de vantagem ou proveito, por pessoas ou redes, 
a partir do uso (abuso) do corpo de crianças ou adolescentes, com base em relação 
mercantilizada e de poder. Para as pesquisadoras, a violência sexual deve, contudo, ser 
contextualizada e compreendida em função da cultura, do padrão ético e legal, do trabalho e 
do mercado. 
Especificamente sobre o mercado de exploração sexual comercial de crianças e 
adolescentes, Faleiros (2004) sistematiza quatro modalidades, em consonância com as 
deliberações mundiais estabelecidas no Congresso de Estocolmo (1996). São elas: 1) 
exploração sexual infantil, que é definida como a atividade na qual atos sexuais são 
negociados em troca de pagamento não apenas monetário, mas que podem também incluir a 
satisfação das necessidades básicas (alimentação, vestuário, abrigo) ou o acesso ao consumo 
de bens e de serviços (restaurantes, bares, hotéis, shoppings, diversão); 2) turismo sexual, 
caracterizado pelo comércio sexual em regiões turísticas, envolvendo turistas nacionais e 
estrangeiros e principalmente mulheres jovens, de setores pobres e excluídos. O principal 
serviço comercializado no turismo sexual é a prostituição, incluindo nesse comércio a 
pornografia (shows eróticos) e o turismo sexual transnacional, que acoberta situações de 
tráfico de pessoas para fins sexuais; 3) a pornografia, por tratar-se de produção, exibição, 
divulgação, distribuição, venda, compra, posse e utilização de material pornográfico; e 4) o 
tráfico para fins sexuais definidos como o movimento clandestino e ilícito de pessoas através 
de fronteiras nacionais, principalmente dos países em desenvolvimento e de outros países com 
13 
 
economias em transição, com objetivo de forçar mulheres e adolescentes a se envolver em 
situações sexualmente ou economicamente opressoras e exploradoras, para lucro de 
aliciadores, traficantes e crime organizado ou outras atividades (por exemplo, trabalho 
doméstico forçado, emprego ilegal ou falsa adoção). 
É importante destacar que apesar dos esforços históricos da sociedade civil organizada 
e das instâncias públicas no sentido de resolver o grave problema da violência sexual e da 
exploração sexual comercial de crianças e adolescentes, ainda paira sobre nós o desafio 
quanto à definição de conceitos mais precisos, que contemplem as inúmeras tentativas de 
categorização dos comportamentos em torno daquilo que pode ou não ser considerado normal 
ou patológico (Felipe, 2006). 
As razões são muitas para essa dificuldade em formular conceitos e tipologias mais 
precisas no que se refere à violência sexual. Uma delas é a demanda crescente por estudos 
direcionados a vítimas sem, contudo, incluir o tema do autor de agressão sexual. Hoje, 
teóricos e pesquisadores de diferentes pontos de vista consideram que a questão central desse 
debate parece estar relacionada à definição dos papéis sociais e de características 
biopsicossociais próprios da figura da vítima (criança, adolescente, mulher), mas também do 
autor de agressão sexual. 
O fato de a criança ter características físicas e psíquicas que a definem como um ser 
vulnerável em sociedades que legitimam valores adultocêntricos acaba por promover um 
processo de ocultação da infância, fazendo com que a criança esteja sempre associada às 
formas de abuso e agressão sexual na condição de vítima (Labadessa & Onofre, 2010). 
Provavelmente, por esta e outras razões tem-se privilegiado a realização de pesquisas que 
analisam comportamentos, práticas e relações, assim como investigam percepções e 
representações sociais que abordam a condição social e o ponto de vista da vítima. 
14 
 
Há de se considerar, entretanto, que a centralidade da condição e do papel social da 
vítima nos estudos sobre o tema reflete o fato de que em várias épocas da humanidade, 
crianças e mulheres costumavam ser tratadas de maneira periférica diante das situações 
cotidianas, ou seja, eram vistas como mercadorias ou objetos de troca. No século IV a.C. na 
antiga Grécia, por exemplo, crianças eram sacrificadas e seus corpos colocados em muros, 
paredes e pontes a fim de dar-lhes maior sustentação (Bass & Thornton, 1985). A concepção 
de que a criançanão tinha valor era recorrente nessa época histórica, o que a levava a viver 
situações de violência permanente nessa fase da vida. 
A violência contra criança e adolescente está presente desde a época bíblica 
(Labadessa & Onofre, 2010), que pela Lei Talmúdica aceitava a relação sexual do adulto com 
crianças desde que o pagamento fosse apropriado e justo. A Lei Canônica da igreja católica 
do século IX determinava, por exemplo, que a relação sexual definia a posse, ou seja, o 
estupro era um meio indissolúvel de se contrair matrimônio (Bass & Thornton, 1985). 
Todavia, na Idade Moderna, o adulto passou, pouco a pouco, a preocupar-se com a criança, 
compreendendo-a enquanto ser dependente e frágil. De acordo com Levin (1997), a palavra 
infância passou a designar desde então a primeira idade de vida: a época em que fica mais 
clara a necessidade de proteção, ideia esta que perdura até os dias de hoje. 
Embora a concepção de infância tivesse ampliado, subsistia a ambiguidade entre a 
infância e a adolescência. Assim como a infância ou a concepção de criança, a ideia de 
adolescência ou adolescente em épocas remotas também tiveram várias acepções, mudando 
em função de cada época histórica vivenciada pela humanidade. Conforme Ariès (1981) foi 
somente a partir do século XVIII que a concepção de adolescência começou a surgir como se 
conhece hoje, com características próprias, com uma mistura de pureza e força física, 
espontaneidade e alegria de viver. 
15 
 
Na idade média a primeira infância iria desde o nascimento até os sete anos, a segunda 
idade se estenderia dos sete aos quatorzes anos e a terceira idade a adolescência (15 aos 20/28 
anos), nesta fase a pessoa seria considerada apta para procriar. Nessa idade o indivíduo 
cresceria em toda a sua grandeza devida a sua natureza (Grossman, 1998). Similar como 
aconteceu com a infância, a adolescência também sofria um série de mazelas sociais. A 
responsabilidade crescia conforme a idade aumentava, tornando-se adulto cada vez mais cedo, 
casando, assumindo responsabilidades financeiras e trabalhando para o sustento seu e de sua 
família. 
A principal mudança da concepção da adolescência se deu na transição da idade média 
para a modernidade, onde foi observada mudança comportamental na sociedade, com o 
advento da educação e a passagem da cultura coletivista para a privativa, colocando a 
instituição familiar em outro papel, não somente como provedora dos bens materiais, mas 
como protetora dos seus membros. Este novo movimento deu início a moralidade o que 
inspirou a necessidade de proteger as crianças e os adolescentes (Ariès, 1981). 
No decorrer da história social, a adolescência vai assumindo cada vez menos 
responsabilidades ganhando um novo espaço e se preparando para a vida adulta. Assim a 
adolescência vai se expandindo e empurrando a infância para trás e a maturidade para frente. 
Para Ariès (1981) a humanidade passou de uma época em que não havia adolescência para 
outra época em que a adolescência era a idade favorita, desejando-a que ela chegasse cedo e 
nela permanece por muito tempo. 
Vasconcellos e Sarmento (2007) consideram que mais do que a ausência da 
consciência da infância e da adolescência entre a idade média e a pré-modernidade, conforme 
explica Philippe Áries sobre o adultocentrismo da infância, existiram à época concepções que 
foram profundamente alteradas pela emergência do capitalismo, pela escola pública e pela 
vasta renovação das ideias com a crise do pensamento teocêntrico e o advento do 
16 
 
racionalismo. No entanto, essa mudança conceitual não evitou que a violência continuasse a 
ser perpetrada contra a criança e o adolescente. Pode-se afirmar que todas essas manifestações 
históricas, em épocas distintas da humanidade, demonstram que a violência foi desde o início 
tratada de maneira desconectada do princípio da garantia dos direitos humanos, 
principalmente a respeito dos direitos da criança e do adolescente. 
Na psicologia, na modernidade, assim como em outras áreas, a adolescência foi 
institucionalizada, foi apresentada a partir do conceito de moratória e caracterizou-a como 
uma fase especial no processo de desenvolvimento, na qual a confusão de papéis, as 
dificuldades para estabelecer uma identidade própria a marcavam como um modo de vida 
entre a infância e a vida adulta. Para Becker (1989) um caráter universal e abstrato foi dado a 
adolescência; inerente ao desenvolvimento humano, a adolescência não só foi naturalizada 
como foi tomada como uma fase difícil. Uma fase do desenvolvimento, semipatológica, que 
se apresenta carregada de conflitos “naturais”. 
Becker (1989) sinaliza ainda que a adolescência é uma passagem de uma atitude de 
simples espectador (infância) para outra fase mais ativa, questionadora. A adolescência, 
concebida como transformação, toma, da sociedade e da cultura, e manifesta-se nas varias 
formas de expressão. A concepção de adolescência na atualidade parece enfatizar que esta 
fase é singular para o desenvolvimento humano, pois não é criança nem são adultos, o que 
traz uma necessidade preeminente de proteção, presente até hoje nas leis vigentes. 
Mesmo com o avanço na concepção da infância e de adolescência, não há como 
desconsiderar o fato de que a violência contra crianças e adolescentes permaneceu presente 
nas sociedades seguintes, chegando até a contemporaneidade. Bass e Thornton (1985) 
pontuam que, mesmo na era contemporânea, em vários países africanos, como em outros 
continentes no passado, apresenta-se o costume da mutilação do órgão genital (clitóris) das 
meninas. Essa mutilação tinha e ainda tem a intenção de evitar que mulheres sintam prazer na 
17 
 
relação sexual. No Brasil, assim como em outros países das Américas, as práticas de agressão 
à criança a ao adolescente tem sido diferente, conforme Azevedo e Guerra (2000). A 
inquisição da supressão da heresia na igreja católica no período colonial foi responsável por 
reprimir os desvios sexuais e atos de bruxaria. Mulheres e crianças foram castigadas e mortas 
por uma suposta prática sexual não permitida. Esses costumes têm em comum o fato dos 
homens ditarem as normas sobre os atos sexuais, julgando seus limites, proibições, castigos. 
Portanto, quanto mais se retroage na história maior é a chance de se deparar com 
situações hoje definidas como de violação de diretos e o fracasso de medidas de proteção 
integral, que foram incapazes de conter a escalada dos casos de abandono, espancamento, 
morte e violência física, psíquica e sexual (Faleiros & Faleiros, 2001). Portanto, o 
reconhecimento do sentido da infância como uma fase singular do desenvolvimento humano e 
com um olhar diferenciado para a violência que impõe riscos e ameaças à integridade física, 
mental, espiritual e social à criança e adolescente é uma preocupação política relativamente 
recente no mundo e no Brasil. 
É importante destacar que mesmo com o aparecimento das organizações internacionais 
que promoveram a discussão sobre os direitos humanos, a exploração sexual de mulheres e 
crianças não foi colocada em primeiro plano. Lima (2004) destacam que a primeira 
preocupação da Comunidade Internacional foi com a escravidão. Primeiramente, houve a 
repressão ao tráfico de pessoas e depois a preocupação com os raptos de crianças e mulheres 
que eram submetidas a abusos e prostituição. 
No século XX, precisamente em 1924, foi realizada a primeira Declaração dos 
Direitos da Criança em Genebra, entretanto não se tratou sobre a questão específica da 
exploração sexual infantil e nem sobre o comércio sexual de criança. Em 1948, na Assembleia 
Geral das Nações Unidas, houve a proclamação da Declaração Universal dos Direitos 
Humanos.Nela, os direitos e liberdades das crianças e adolescentes estavam implicitamente 
18 
 
incluídos. Foi, entretanto, somente após o fim da segunda Guerra Mundial que a ONU - 
Organizações das Nações Unidas e sua subsidiária específica para a infância, a UNESCO, 
deram início ao debate sobre a situação da criança e adolescente. 
Em 21 de março de 1959, na Cidade Lake Sucess, Nova York, foi instituída a 
penalização da prostituição, sem, contudo, especificar a proteção de crianças e adolescentes. 
No dia 20 de novembro do mesmo ano, na Assembleia Geral da ONU proclamou-se a 
Declaração dos Direitos da Criança, que continha dez princípios e um deles defendia o direito 
à proteção especial para as crianças. 
Outro marco relevante foi a criação, em 1948, da Organização Mundial de Saúde 
OMS, subordinada a ONU. Em 1977, pela gravidade da situação de violência no mundo a 
Organização Mundial da Saúde (OMS) dedicou-lhe prioridade na Assembleia Mundial de 
Saúde. Embora não haja dúvida que acidentes e violências sejam problemas que afetam a 
saúde, a Organização Pan-Americana da Saúde, a partir de 1993, passou a recomendar 
insistentemente aos países membros a inclusão do tema nas agendas de intervenção. Em 2002, 
a OMS publicou assim um extenso informe: Relatório Mundial sobre Violência e Saúde, 
trazendo para a área uma reflexão sobre responsabilidades específica e intersetorialidade. 
(Pereira, Lira, Xavier, & Vieira, 2007). Cabe citar ainda, nessa conjuntura histórica, a 
Convenção Internacional dos Direitos da Criança, em 1989, como uma relevante contribuição 
no enfrentamento a violência, como um tratado que visa à proteção de crianças e adolescentes 
de todo o mundo. 
É relevante mencionar que, no Brasil, a violência, especificamente a sexual, contra 
crianças e adolescentes só no final do século XX começa a ser incluída como preocupação 
efetiva na agenda da sociedade civil, através da Constituição Federal Brasileira (1988), que 
antecipou princípios legitimados pela Convenção Internacional dos Direitos da Criança, em 
1989, conforme explica Lima (2011). 
19 
 
A sociedade civil brasileira despertou para uma mobilização intensa em favor da 
criança e adolescente, pela gravidade do fenômeno da violência. Nesse período, fóruns e 
debates pressionaram a formulação de leis de amparo à infância, na perspectiva da garantia de 
direito e de proteção integral. Surge, assim, no Brasil, em 13 de julho de 1990, o Estatuto da 
Criança e Adolescente (ECA). Neste documento, os interesses superiores da criança foram 
priorizados sob todas as formas de medidas de proteção por instituições de bem-estar social, 
públicas ou privadas. 
Pelo exposto, a visibilidade das características específicas de crianças e adolescentes e 
a consagração de interesses que são derivados da sua condição de pessoa em condição 
peculiar de desenvolvimento, são temas que vêm ganhando destaque nas últimas décadas, 
sendo fruto de profundas transformações sociais e políticas públicas. Todas essas 
transformações sociohistóricas mantém uma relação de mútua influência com as mudanças 
percebidas no conceito de infância, família, instituições educativas e, consequentemente, a 
forma como as crianças vêm sendo educadas e assistidas nas suas necessidades (Castro, 
Ribeiro & Busson, 2010; Landini, 2003; Leal, 2010; Maio & Vasconcelos, 2010; Melo, 2010; 
Neto, 2010; Silva & Hutz, 2002) 
No entanto, o desafio de coibir o abuso e a exploração sexual comercial de crianças e 
adolescentes, apesar de todos os esforços que têm sido feitos até agora no sentido de melhor 
compreender a incidência desse problema no Brasil e no mundo, vem sofrendo recuos e 
oscilações. As razões se concentram na criação de programas e leis mais implacáveis, 
campanhas de conscientização, centrais telefônicas de denúncia e demais estratégias de 
contenção do problema. 
Todavia, percebe-se que, em geral, as medidas de prevenção e enfrentamento da 
agressão sexual em suas diferentes facetas e contextos adotadas por governos e sociedades de 
forma isoladas ou integradas parecem não ter conseguido dar conta de compreender toda a 
20 
 
extensão do problema e a forma como efetivamente este afeta as suas vítimas. Além disso, as 
ações interventivas têm deixado em aberto várias questões relacionadas que parecem ter 
relação direta com a efetividade e eficácia dos seus resultados e impactos, qual seja a 
condição biológica, psicológica e social do autor de agressão sexual, ou seja, do responsável 
por perpetrar a violência sexual contra a criança e o adolescente. 
2. O Autor de Agressão Sexual de Crianças e Adolescentes: Características e Tipologias 
O autor de agressão sexual de criança e adolescente é um dos protagonistas que 
constitui o fenômeno da violência sexual e que precisa ser aqui abordado. Em detalhe pode-se 
dizer que, somente a partir dos meados deste século, sobretudo na última década, a atenção do 
público em geral e dos acadêmicos, em particular, se concentrou neste tema (Silva, 1998). Em 
razão disso, era de se esperar que a discussão sobre a condição biopsicossocial do autor de 
agressão sexual pudesse ter progredido nos últimos anos, aproximando em volume de 
pesquisas e qualidade das ações similares as voltadas às vítimas, permitindo uma 
compreensão maior do seu sentido e das possibilidades de intervenção governamental nessa 
problemática. Entretanto, essa expectativa não se concretizou e continua a exigir estratégias 
de intervenção eficazes e adequadas, e a busca de fundamentos teóricos sobre o tema, assim 
como a implementação de ações interdisciplinares e multidisciplinares com vista à superação 
desse desequilíbrio (Barbosa, Macedo, Melo, & Piola, 2010; Esber, 2009; Pereira, Lira, 
Xavier & Vieira, 2007; Smallbone & Wortley, 2004). 
A discussão sobre a identidade e as características biopsicossociais do autor de 
agressão sexual de crianças e adolescentes ainda é um tema marginal e obscuro sob o véu da 
ciência, até hoje pouco explorado e, que traz um ranço histórico e social dos múltiplos 
preconceitos que marcaram a pesquisa antropológica, sociológica, psicológica, entre outras 
áreas do conhecimento (Esber, 2009; Morais, Santos, Moura, Vaz & Koller, 2007, Moura, 
2007). Os trabalhos nessa temática ainda são insuficientes, já que o tema tem uma dimensão 
21 
 
ampla e um grau de complexidade que requer estudos em diversas áreas. Em termos teóricos, 
há uma produção literária embrionária, pode-se dizer emergente, nas neurociências (Doin, 
2005), nas ciências comportamentais (Almeida, 2003) e do desenvolvimento humano 
(Morais, Santos, Moura, Vaz & Koller, 2007), que faz com este seja um assunto que, hoje, 
comece a ganhar força no cenário brasileiro. 
Para Serafim, Saff, Rigonatti, Casoy e Barros (2009), a maioria dos estudos sobre 
violência sexual tem investigado as vítimas, com poucos trabalhos sobre autor de agressão 
sexual. Talvez isso se deva em função da maior visibilidade social e da importância, como 
violação de direito da vítima. A preocupação central das pesquisas até hoje tem sido 
compreender quem são as crianças e os adolescentes vítimas da violência sexual, qual o seu 
perfil, quais os contextos em que têm ficado mais expostas, quais as estratégias de 
atendimento entre outras (Costa, Cordeiro, Kalil & Brandão, 2007). Comparativamente, pode-
se dizer que existem mais pesquisas com as vítimas de violência sexual que com do autor de 
agressão sexual, apesar de uma ampla literatura internacional (Marques, 2005; Moura, 2007) 
Os autores de agressão sexual são menos estudados, quando comparadas com as 
pesquisas sobre as vítimas de violência sexual (Marques, 2005; Moura, 2007; Padilha & 
Santos, 2007), aspecto observadono âmbito internacional e nacional. As pesquisas 
internacionais priorizam estudos com as vítimas como o observado nos trabalhos de Kapadia, 
Saleem, Karim (2009) e também, Kelsall e Stepakoff (2007). Aspecto semelhante é observado 
no cenário nacional. As pesquisas empíricas dão ênfase às vítimas como encontrado em vários 
estudos (Costa, Carvalho, Santos, Barbará, Gomes & Sousa, 2007; Costa, Cordeiro, Kalil & 
Brandão, 2007; Dossi, Saliba, Garbin & Garbin, 2008; Habigzang, Koller, Azevedo & 
Machado, 2005; Jong, Sadala & Tanaka, 2008; Pereira, Lira, Xavier e Vieira, 2007). 
No âmbito da discussão conceitual que envolve a questão sobre quem é e que pode ser 
reconhecido e responsabilizado por atos que denotam violência sexual contra crianças e 
22 
 
adolescentes, verifica-se uma série de nomenclaturas que até hoje são utilizadas para 
descrever as pessoas que cometem violência sexual contra crianças e adolescentes, sendo 
frequentemente confundidos os vários termos e, em alguns casos, chegam a ser tomados como 
sinônimos. 
Libório e Castro (2010), ao analisarem as pesquisas empíricas que investigaram os 
autores de agressão sexual nos Estados Unidos, fazem referência ao fato de que as categorias 
que os pesquisadores adotaram para estudo foram propostas em função dos recortes feitos 
pelos autores a partir dos objetivos dos trabalhos originais revisados. Isso significa que, em 
geral, os estudos privilegiam a abordagem de aspectos de cunho social-legal ou 
psicopatológico (Esber, 2009). No recorte social-legal, a discussão baseia-se no tipo de crime 
cometido e no psicopatológico está centrada em categorias de procedimentos diagnósticos, 
revelando as psicopatologias mentais (Echeburúa & Corral, 2006; Franc, Vaughan, 
Hambleton, Fox & Brown, 2008). 
No Brasil, as pesquisa empíricas seguem na mesma direção, de maneira que os 
recortes são feitos em geral focalizando apenas os aspectos sociais (ou socioeconômicos), na 
perspectiva da garantia dos direitos humanos (Drezett, Caballero, Juliano, Prieto, Marques, 
Fernandes, 2001; Faleiros & Faleiros, 2001; Leal & Leal, 2002) e do recorte psicopatológico 
como observado nos trabalhos de Felipe (2006), Landini (2003), Verhoeven (2007), Furniss 
(2002). Por sua vez, Serafim, Saff, Rigonatti, Casoy e Barros (2009) demonstram que, com 
significativa frequência, as pesquisas sobre violência sexual e a condição do autor de agressão 
sexual se concentram na área social e médica. Portanto, o termo perfil psicológico das pessoas 
que cometem violência sexual contra crianças e adolescentes acaba por enfocar os aspectos 
específicos das áreas do conhecimento em que foram gerados. 
A partir do material bibliográfico analisado, identifica-se que os trabalhos sobre os 
autores de agressão sexual que perpetraram alguma forma de abuso sexual apresentam a 
23 
 
violência vista sob vários olhares e formas conceituais distintas. Identificou-se na literatura 
revisada e aqui relatada, uma variação de olhares acerca da violência sexual, que vai desde 
aqueles que discutem a violência sexual como crime (Verhoeven, 2007) ou patologia (Aded, 
Dalcin, Moraes & Cavalcante, 2008; Camões, 2010; Felipe, 2006; Landini, 2003), passando 
pelos que enfatizam a sua definição como problema social (Barbosa, Macedo, Melo, & Piola, 
2010), até os que privilegiam o estudo como violação de direito (Cavalcante, Magalhães & 
Pontes, 2009; Costa, Carvalho, Bárbara, Santos e Souza, 2007; Hazeu, 2004; Lima, Pontes, 
Silva, Maluschke, Magalhães & Cavalcante, 2008; Martins & Jorge, 2010). Como se pode 
perceber, as formas de abordagem da problemática das características da agressão sexual são 
variadas, mas, em termos bioecológicos, poucos trabalhos foram encontrados no 
levantamento preliminar aqui resgatado, fazendo com que essa forma de olhar o fenômeno 
possibilite com uma possibilidade de integrar perspectiva. 
Nesse sentido, a literatura sobre as características biopsicossociais, a identidade e a 
voz do autor de agressão sexual é incipiente e produziu muitas vezes descrições simplistas 
baseadas em dados sociodemográficos (Moura, 2007). Falta um olhar mais abrangente (que 
integre bio-psico-social) e a percepção dos vários agentes e da própria pessoa que cometeu 
violência sexual contra crianças e adolescentes sobre quem são e quais foram seus contextos 
de desenvolvimento desde a infância. Esta parece ser uma demanda que, hoje, mais do que 
antes, se apresenta como necessária à pesquisa em torno das características dos autores de 
agressão sexual, suas definições conceituais e as respostas possíveis quanto aos aspectos que 
circundam a formação da sua identidade social e psicológica. Entretanto, a literatura, apesar 
de incipiente, já traz alguns dados importantes para a investigação dessa questão (Esber, 
2009; Marques, 2005; Moura, 2007). 
Quanto às características do autor de agressão sexual, estudos apontam que, de 
maneira geral, os autores de violência sexual não apresentam pelo menos aparentemente, 
24 
 
comportamentos diferentes de uma pessoa comum ou por uma característica estereotipada que 
tornaria fácil a tarefa de reconhecê-los à primeira vista, sendo comum, contudo, que possuam 
histórias de violência em suas vidas, seja no presente seja no passado (Moura 2007). Por outro 
lado autores como Hall (1990); Hall e Hirschman (1991); Hall, Shondrick e Hirschman 
(1993) sinalizar que os autores de violência sexual contra criança e adolescente são 
heterogêneos e multimodais, isto é, com amplo e multivariado repertório dos aspectos 
psicológicos e comportamentais. 
Para contribuir com a pesquisa desse tema, Furniss (2002) aponta que o autor da 
violência sexual apresenta determinadas características. São elas: 1) a pessoa tem consciência 
de que a violência sexual contra crianças e adolescentes é errada e que esta forma de agir se 
constitui crime; 2) os indivíduos que abusam sexualmente de crianças e adolescentes sabem 
que o abuso é prejudicial à criança, apesar disso, o ato é perpetrado; 3) os homens e as 
mulheres que abusam sexualmente de crianças e adolescentes tendem a negar, para eles 
próprios e para os outros indivíduos, a de compulsão por criança. 
Para Associação Portuguesa de Apoio à Vítima (APAV) (2010) há traços de 
personalidade que podem ser comuns entre as pessoas que cometem violência sexual contra 
crianças e adolescentes, como por exemplo, a imaturidade emocional; a baixa autoestima; a 
baixa tolerância à frustração; a impulsividade e o baixo autocontrole; dificuldades de relação 
com os outros; desejo de poder/controlar os outros; uma história pessoal que pode envolver 
uma infância em que foi vítima de maus tratos físicos e psicológicos ou violência sexual. 
Estes traços, contudo, não são determinantes, ou seja, nem todos os indivíduos que 
apresentem estas características de personalidade ou comportamentos são ou se tornam 
autores de agressão sexual. 
Quanto à definição do termo dos autores de agressão sexual, observa-se uma tendência 
a englobar a violência sexual contra criança no contexto geral da pedofilia e não da 
25 
 
criminalidade. O termo pedofilia, apesar de ser importante para esse tipo de discussão, se 
torna restrito, muito limitado em sua aplicação, uma vez que é encontrado fortemente na 
literatura própria da Psiquiatria, estreitando a visão do conceito do perfil psicológico e 
comportamental, e os processos do desenvolvimento humanos envolvidos (Felipe, 2006). 
Em função da confusão entre os conceitos do termo sobre o autor de agressão sexual, 
alguns estudiosos qualificam como abusador/agressor/ofensor e outros como pedófilo. Neste 
projeto de pesquisa será apresentada a distinção entre eles e os demais conceitos que os 
circundam.Apesar de a distinção conceitual ser necessária para fundamentar a discussão do 
objeto de pesquisa, este projeto tratará a pessoa que comete violência sexual contra crianças e 
adolescentes, para obtenção da satisfação sexual, como autor de agressão sexual, de maneira, 
que exprima o ato em si e não como característica pessoal indissolúvel, minimizando o 
sentido rotulador da palavra agressor sexual. 
No entanto pela literatura levantada há uma heterogeneidade na tipologia e 
características de autores de agressão sexual. Conforme já sinalizado anteriormente, os 
indivíduos que utilizam criança/adolescente para fins comerciais apresentam nomenclaturas 
diversas. Os indivíduos que utilizam a criança e o adolescente para obtenção da satisfação 
sexual têm várias características específicas, que podem se diferenciar claramente daqueles 
que tem fins mercantilistas. 
Em termos comerciais, os que se beneficiam com o mercantilismo de crianças e 
adolescentes a partir do aliciamento direto ou indireto, são os chamados aliciadores Para 
Davidson (2001) há a figura do explorador, aquele que usa a criança ou o adolescente para 
fins sexuais, mas com objetivos comerciais. Em razão disso, Felipe (2006) insere outra figura 
na rede sexual de crianças e adolescentes, o denominado de angariador, que serve de 
observador e/ou sequestrador com hábitos de frequentar parques, praças, escolas, locais onde 
há grande concentração de crianças e/ou adolescentes. Após a entrega do “pacote”, como é 
26 
 
referida a criança pelos autores de agressão sexual, entra o monitor, o qual tem a função de 
cuidar do local onde ela é fotografada e filmada. 
O abusador sexual, segundo Libório e Castro (2010), é aquele que exerce algum tipo 
de vantagens sobre a criança ou o adolescente, geralmente está em um nível hierárquico maior 
que a vítima e tem acesso facilitado à ela, podendo ser uma pessoa próxima, como um parente 
ou amigo íntimo da família. Uma característica marcante do autor de agressão sexual é que 
nem sempre sente um forte e contínuo interesse por crianças, diferentemente do pedófilo. 
Outra diferença é que não usa a criança ou o adolescente no contexto comercial se 
distinguindo do aliciador. 
Um dos conceitos mais difundido na mídia e mais associado à figura do autor de 
agressão sexual é o pedófilo, que, na literatura especializada, diz respeito a todo aquele que 
pode ser "caracterizado pela atração por crianças, com os quais os portadores dão vazão ao 
erotismo pela prática de obscenidades ou de atos libidinosos” (Croce, 1995, p. 30). O termo 
pedofilia vem de parafilias que envolvem os distúrbios sexuais. Entre as práticas de pedofilia 
mais comuns, pode-se citar voyeurismo, fetichismo, zoofilia e necrofilia (Kaplan, Sadock & 
Grebb, 1997). A pedofilia é uma categoria diagnóstica clínica com um significado específico 
e limitado. Há pedófilos que nunca abusaram diretamente de uma criança, que obtém a 
saciação do prazer olhando crianças nuas, porém, considera-se que isso não os coloca em uma 
situação mais favorável que os outros abusadores, apenas exigem que estes sejam olhados de 
forma diferenciada pela ciência e pelo poder público constituído. 
Para Seto (2008) existem duas categorias de autor de agressão sexual, o que talvez 
possa explicar a confusão conceitual no emprego dos termos abusador situacional e pedófilo. 
O autor propõe que há abusadores sexual pedófilos e abusadores sexual não pedófilos, sendo 
que, estes últimos, manifestariam tendências antissociais claras ou obteriam a desinibição 
com o uso de álcool ou outras drogas, ou ainda porque agem orientados por valores culturais 
27 
 
adquiridos no decorrer de seu ciclo de vida. Nesse sentido, pode-se afirmar que nem todo 
autor de agressão sexual é pedófilo, mas o contrário não seria verdadeiro. Ou seja, todo 
pedófilo é um autor de agressão sexual, pelo menos, em potencial. 
Serafim, Saff, Rigonatti1, Casoy e Barros (2009), em uma revisão sistemática da 
literatura sobre a definição do pedófilo, apresentam a classificação do que tem sido publicado 
nos últimos 20 anos. Os autores identificaram que os trabalhos citam frequentemente: 1) 
pedófilo abusador e 2) pedófilo molestador, sendo este último dividido em molestador 
situacional (pseudopedófilo) e molestador preferencial. O molestador situacional divide-se, 
ainda, em molestador situacional regredido; molestador situacional inescrupuloso (moral ou 
sexual) e molestador situacional inadequado. Já o pedófilo molestador preferencial pode ser 
classificado em pedófilo molestador preferencial sedutor, pedófilo molestador preferencial 
sádico e pedófilo molestador preferencial introvertido. Porém, apesar de interessante os 
resultados obtidos com essa revisão da literatura, deve-se considerar que o objetivo dos 
autores à época não consistia exatamente em traçar e definir categorias capazes de desenhar 
os vários perfis de agressor sexual ou muito menos discutir aspectos específicos do processo 
de desenvolvimento biopsicossocial associado a cada tipo identificado, por isso, entende-se 
que novos estudos podem e devem ser realizados com esta intenção específica. 
A relevância social e teórica para esse tipo de pesquisa reside no fato de que, em razão 
da visibilidade que esse fenômeno começa a ganhar nos últimos anos, tem-se observado 
vários equívocos na compreensão sobre as diferenças entre os conceitos de exploradores, 
abusadores sexuais e pedófilos, o que acaba por colocá-los no mesmo patamar conceitual e 
instruindo a formulação de estratégias de enfrentamento e conhecimento iguais para públicos 
diferentes. Embora se saiba que todos cometem violência contra a criança e/ou adolescente e 
na essência assim o fazem, a ausência dessa distinção prejudica uma compreensão efetiva da 
problemática e a sua configuração atual, ao mesmo tempo em que simplifica as análises, as 
28 
 
formas de tratamento e as políticas de intervenção ao incluir indivíduos com motivações e 
característica psíquicas distintas em uma mesma e ampla categoria social e teórica. 
Apesar da discussão sobre as características do autor de agressão sexual ter tido início 
há pouco tempo, algumas áreas do conhecimento e teorias clássicas tentaram explicar a 
agressão como um fenômeno unifatorial. Apenas recentemente a agressão, entre outras a 
sexual, passou a ser entendida a partir de uma série de fatores que interagem 
concomitantemente e de maneira interinfluente, permitindo estudar a agressão como um 
fenômeno multideterminado e sistêmico. 
3. Áreas do Conhecimento e Teorias sobre a Agressão 
Conforme foi discutido até agora, existem diversos conceitos, tipologias e 
características que são habitualmente associados às agressões e aos seus protagonistas, vítima 
e autor de agressão. Tais conceitos são construções teóricas que permeiam as teorias e os 
modelos que tentam descrever ou explicar o fenômeno da agressão. 
Uma ampla literatura sobre a agressão tem demonstrado que tantos as teorias clássicas 
como os mais atuais estão condicionados diretamente as concepções de um período histórico 
em que surgiram. Em determinada época, algumas teorias tentavam explicar o fenômeno por 
meio de um único fator. Destas tentativas de explicação, algumas em maiores proporção e 
outras em menores, apoiavam o debate de que o comportamento agressivo era determinado 
por um único fator, ora considerando o fator biológico como determinante (Pereira, 2007), ora 
considerando os aspectos sociais como motivadores essenciais para a agressão (Bandura, 
2008). 
Com o advento de novas concepções integracionistas e menos deterministas, novos 
estudos e novas pesquisas se solidificaram, as teorias deterministas foram sendo reformuladas 
e outras foramperdendo lugar para novas concepções, consolidando modelos e teorias mais 
29 
 
integrativos teoricamente. Nessa direção, a agressão começava a ser estuda a partir de uma 
nova concepção a de que é um fenômeno multideterminado e heterogêneo. 
Porém, importante considerar que o fenômeno da agressão não tem sido estudado de 
forma exclusiva pela Psicologia, várias áreas de conhecimento também abordaram e 
contribuíram para a discussão dessa temática. Assim, de maneira breve, serão apresentadas as 
principais áreas de conhecimento: a Antropologia evolucionista, a Biologia, a Sociologia e a 
Psicologia. Na Psicologia serão expostas as suas principais teorias, desde as clássicas até as 
mais atuais, e em, seguida os modelos teóricos da agressão sexual, explicando o 
comportamento dos autores de agressão sexual e suas motivações. Ressalta-se que não existe 
a pretensão de fazer uma discussão exaustiva das contribuições das várias ciências, por isso 
apresentar-se-á um resumo de diferentes abordagens, no sentido de fornecer um conjunto de 
informações que possam, minimamente, promover ou subsidiar a reflexão sobre a agressão, 
em particular sobre a sexual. 
3.1 A Antropologia Evolucionista e a Natureza Humana 
Os estudos atuais tem demonstrado que cada cultura designa quais são os 
comportamentos sexuais são considerados desviantes ou apropriados. Na Austrália, por 
exemplo, algumas tribos aprovam relações homossexuais entre adultos e crianças do sexo 
masculino; no Iêmen são permitidas cerimônias que envolvem casamento com noivas 
crianças e maridos três vezes mais velhos que as noivas; os nativos de Caroline Islands 
permitem que os homens idosos tenham relação sexual com meninas pré-adolescentes de 
forma a melhorar seu desempenho sexual (Diário de Notícia, 2013). 
Todas essas características, ou seja, a relação entre homem e humanidade, 
exemplificada no relato acima são identificas em diversas culturas, sendo objeto de estudo da 
Antropologia. A divisão clássica da Antropologia distingue a Antropologia Cultural da 
30 
 
Antropologia Biológica. Cada uma destas, em sua construção, abrigou diversas correntes de 
pensamento, entretanto aqui a ênfase será dada a Antropologia biológica (evolucionista). 
Pode-se afirmar que há poucas décadas a Antropologia conquistou seu lugar entre as 
ciências. Primeiramente, foi considerada como a ciência que estuda a história natural, física e 
do processo evolutivo do homem, no espaço e no tempo. Isso marcou e limitou os estudos 
antropológicos por longo tempo, privilegiando a antropometria ou ciência que trata das 
mensurações do homem fóssil e do homem vivo. 
Segundo a Antropologia evolucionista o processo que levou o ser humano a torna-se o 
que ele é hoje surgiu a partir de inúmeras mudanças climáticas, geográficas e 
comportamentais que ocorreram há milhões de anos (Leakey, 1999). Todas estas mudanças 
evolucionárias podem ser entendidas a partir de três leis fundamentais elaboradas por Charles 
Darwin em 1859, na publicação a Origem das espécies: a primeira diz respeito ao princípio da 
variabilidade em que os indivíduos de uma determinada espécie apresentam diferenças 
genéticas no seu fenótipo (características morfológicas, fisiológicas e comportamentais); o 
segundo princípio é o da hereditariedade, em que a variante dos fenótipos é hereditária, ou 
seja, os descendentes dos indivíduos carregam e transmitem os genes que determinam as 
alterações morfológica, fisiológica e/ou comportamental; e terceiro é o principio da 
adaptação, em que os indivíduos que possuem determinada variação no fenótipo ficam mais 
propícios para aquele ambiente do que os que não possuem essa constituição biológica (Izar, 
2009). A seleção natural, portanto: 
Ocorre quando os indivíduos que carregam genes codificadores de certas 
características físicas e comportamentais conseguem, por exemplo, obter mais recursos 
alimentares, ou apresentar maior capacidade de evitar predação, ou atrair mais parceiros 
reprodutivos do que os indivíduos que não possuem tais características (Izar, 2009, p.23). 
31 
 
Dessa forma, indivíduos com determinadas caraterísticas tendem a deixar mais 
descendentes do que outros, permitindo que os genes que foi selecionado para uma habilidade 
específica seja repassado para as gerações seguintes. Por exemplo, as características 
fenotípicas foram selecionadas e tornaram os indivíduos (mais) capazes de responderem e 
resistirem às pressões do meio. Entre as características está a habilidade de se defender e/ou 
atacar de forma agressiva, assegurando a sua sobrevivência e de seu grupo (ou espécie, em 
termos filogenéticos) e ampliando o seu domínio. Dessa forma, o comportamento agressivo 
foi selecionado uma vez que no palco evolucionário, as pressões seletivas que se tinha há 
milhões de anos, selecionou essa habilidade/característica favorecendo a adaptação do homem 
na terra e sendo transmitido para toda população ao longo do tempo. A partir desses 
princípios pode-se tentar entender como o processo da evolução humana se deu e quais os 
mecanismo foram selecionados em função de sua adaptação, como o ser humano se tornou o 
que é hoje e como o comportamento agressivo foi selecionado (Izar, 2009). 
Porém, enfatiza-se que as abordagens evolucionistas são muito controversas, definindo 
a agressão como um reflexo da necessidade de sobrevivência da espécie (Pereira, 2007), isto 
é, a agressão, e inclusive a sexual, é um comportamento que serve para garantir o território, a 
hierarquia no grupo e a descendência. Porém, não se quer aqui dizer que a agressão é 
explicada somente pelas pressões filogenéticas, mas que mecanismos próprios da espécie 
humana atuam nessa direção. Além disso, a cultura, presentes em todas as sociedades, tem um 
papel fundamental, pois modela e medeia as formas de agressão, como a sexual, as quais 
podem ser denominadas de desempenho sexual. (Izar,2009) 
3.2 A Biologia da Agressão 
Para Gauer (2008) a origem da conduta agressiva é multifatorial e ainda não se 
encontra completamente elucidada. Dessa forma, a compreensão dos fatores biológicos 
associados à conduta agressiva é apenas uma parte para o entendimento da violência como um 
32 
 
todo. Segundo Gauer (2008), no caso da agressão sexual pode estar relacionada, em parte, por 
alterações nas estruturas anatômicas, nas alterações dos neurotransmissores, nos esteroides 
sexuais e outros hormônios além de fatores genéticos. 
Nas alterações das estruturas anatômicas, estudos com pacientes que sofreram lesões 
cerebrais proporcionaram indícios importantes quanto à neurobiologia do comportamento 
agressivo. Há relatos na literatura de que pacientes com histórias de raiva descontrolada 
sofreram trauma encefálico, e a de que a ocorrência de lesão cerebral é significantemente mais 
comum em homens que espancam suas companheiras do que em homens não violentos 
(Rosenbaum, Hhohe, Adelman, 1994). Algumas pesquisas sobre as principais estruturas 
cerebrais possivelmente envolvidas na mediação da agressão tem indicado o hipotálamo, a 
amígdala cerebral e o córtex pré-frontal como estruturas ligadas a agressão. Pesquisas também 
têm demonstrado que há outras áreas do cérebro implicadas na agressão envolvendo a linha 
média talâmica, região pré-optica lateral, corpos mamilares e hipocampo (Cherkasky & 
Hollander, 1997). 
Além das lesões cerebrais, tem sido investigadas as alterações em neurotransmissores 
relacionados com a agressão sexual. Estudos evidenciam a participação principal da 
serotonina e noradrenalina e outros neurotransmissores secundários com funções inibitórias 
da agressão sexual, sobre o funcionamento de neurônios, como a dopamina e o GABA (ácido 
gama aminobutírico)(Gauer, 2008), demonstrando que os neurotransmissores podem inibir 
ou ativar o processo agressivo. 
Assim como as lesões cerebrais e os neurotransmissores, algumas pesquisas em seres 
humanos, bem como estudos em animais, têm sugerido que os andrógenos (termo genérico 
para qualquer composto natural ou sintético, geralmente um hormônio esteroide, que estimula 
ou controla o desenvolvimento e manutenção das características masculinas) podem ter um 
papel na agressão (Rosenbaum, Hhohe, Adelman, 1994). Mesmo em indivíduos considerados 
33 
 
normais, há relação entre os diferentes níveis de testosterona e o desenvolvimento de conduta 
agressiva. Embora os níveis de testosterona possam estar elevados em adolescentes infratores 
agressivos, o uso de antiandrógenos tem tido benefício limitado, talvez porque haja outras 
influências hormonais sobre o desenvolvimento da agressividade até então descoberto ou 
pouco explorado (Gauer, 2008). 
Entretanto, verifica-se que a testosterona não tem sido apontada como exclusivamente 
responsável pela agressividade. (Gauer, 2008). Especificamente sobre o acetato de 
medroxiprogesterona e o acetato de ciproterona parecem diminuir tanto a atividade como o 
impulso sexual desviante e não desviante em homens com parafilías, e esta melhora 
comportamental está associada aos níveis de testosterona (Kravitz, Haywood, Kelly, 1996). 
Quanto aos níveis hormonais, apesar da maioria das investigações se centrarem no papel 
principal da hormona masculina, eles são utilizados com frequência para explicar a compulsão 
por sexo, bem como a influência que podem desempenhar no desencadear do comportamento 
agressivo. Dai resulta a importância em se atribuir o uso de fármacos antiandrógenos no 
tratamento (por exemplo, castração química) dos comportamentos sexuais desviantes, já 
iniciados em alguns países (Pereira, 2007). 
Quanto aos aspectos genéticos, alguns estudos sugerem uma relação entre fatores 
genéticos e conduta antissocial, bem como a associação entre a baixa atividade 5-HT cerebral 
(receptores para o neuromodelador e mediador de sinais periféricos, serotonina, também 
conhecida como 5-hidroxitriptamina ou 5-HT) com a impulsividade e agressão (Coccaro, 
Gabriel & Siever, 1990). Aliado a esses estudos, outras pesquisas têm mostrado que os 
cromossomos têm influência de anormalidades cromossômicas na agressão, particularmente 
na síndrome XYY (Stalenheim, Knorring & Wide, 1998), conhecida como Síndrome do 
Supermacho, embora, a ligação entre XYY e violência não tenha sido confirmada (Gauer, 
2008). 
34 
 
As anomalias nos autossomas têm implicações no desenvolvimento mental ou noutras 
manifestações gerais. Porém, se ocorrerem nos cromossomas sexuais, podem verificar-se 
repercussões comportamentais da personalidade, nomeadamente maior propensão para 
personalidade antissocial. Por exemplo, cromossomas X supranumerários 1 tendem a surgir 
associados a um quociente de inteligência inferior, a comportamentos sexuais agressivos, 
entre outros transtornos psíquicos. Por outro lado, cromossomas Y supranumerários foram 
associados a maior impulsividade, agressividade, tendência para o comportamento antissocial, 
etilismo (alcoolismo), tendo recebido inclusive o apelido de “o cromossoma do crime” no 
século passado (Stalenheim, Knorring & Wide, 1998). No entanto, a associação destas 
anomalias à criminalidade pode não estar diretamente correlacionada com o aumento 
significativo da agressividade (Sousa,1999). 
3.3 A Sociologia e a Influência Social na Agressão 
A partir da Escola de Chicago, onde se destacou a influência escola do funcionalismo 
em Psicologia, da Sociologia Urbana, da Ecologia Humana, enfatizou-se a discussão sobre a 
relação de poder em diversos contextos (Charlot, 2002). Especificamente na Sociologia 
destacou-se no período a primeira importante tentativa de estudo dos centros urbanos, 
combinando conceitos teóricos e pesquisa de campo de caráter etnográfico (Charlot, 2002). 
Como subcampo pode-se citar a Sociologia da Violência e da Criminalidade que também 
estuda as principais teorias criminológicas e as diversas escolas formadas a partir do século 
XX. (Charlot, 2002). 
Para a Sociologia, as manifestações da agressividade constituem um fenômeno que 
através dos tempos têm afetado todas as sociedades históricas. Hoje, a violência é fruto e 
resultante de estruturas, relações e contradições sociais da vida urbana e rural. Aspectos estes 
 
1 Falta um conceito (suprenumemários) 
35 
 
que são temas centrais presente na mídia nacional e internacional e objeto de atenção no 
mundo acadêmico, interessando particularmente à área da Sociologia. (Sirota, 2001) 
A abordagem da moral e os valores das diversas sociedades e culturas a respeito da 
conduta sexual é particularmente o objeto de estudo da Sociologia. Em cada sociedade e 
cultura o poder vigente define o que é sexualmente permitido e o que é aceitável. Na história 
das violações, como numerosas violências antigas, é severamente decidida pelos detentores 
do poder, entre estes o poder religioso, por exemplo. Dessa forma, para a Sociologia, o social 
determina as formas de expressão da agressão, contribuindo para que a discussão da agressão 
sexual perpassasse pela situação vigente da sociedade atual (Zaluar ,1999). 
A ênfase da Sociologia para a explicação da agressão era que esta se caracterizava 
apenas como um elemento numa constelação de outros elementos comportamentais, os quais 
estavam associados atitudes, desejos e valores da sociedade. Sendo assim toda agressão estava 
ligada a masculinidade, demografia social, economia, corrupção política, crenças e atitudes. 
Tanto os homens quanto as mulheres, internalizavam esse tipo de pensamento, levando os 
homens a assumirem os papéis de violador e por outro lado tornando as mulheres passivas, 
levando a aceitação das violações (Zaluar ,1999). 
Misse (2011) argumenta que a Sociologia foi influenciada também pelo paradigma 
marxista, após a revolução industrial, que entusiasmou diversos cientistas sociais brasileiros e 
mostrou-se particularmente fecundo e inovador justamente na crítica feita aos crimes do 
capital e aos dispositivos de violência do Estado. Além disso, desde o final dos anos 70, a 
influência da obra de Foucault sobre os cientistas sociais brasileiros teria deslocado o enfoque 
para os dispositivos de poder. 
A violência em relação à análise do poder torna explícito que tipo de poder está em 
questão na análise genealógica e esclarece que não se trata de pensar o poder como 
capacidade ou aptidão inscrita no corpo e também não se trata de entender o poder como algo 
36 
 
que pudesse ser concentrado, acumulado ou distribuído. O poder seria então pensado como 
relação, ou seja, relação de poder. (Zaluar ,1999) 
Tais explicações, apesar de relevante hoje em dia, fez com que a sociologia pudesse 
rever seus conceitos e ampliar para uma visão mais integradora e não justificando o fenômeno 
da agressão sexual embasado somente pelas condições sociais, econômicas e demográficas, 
apesar de sua grande parcela de influência nesse tipo de comportamento (Misse (2011)). 
3.4 Perspectivas Teóricas da Psicologia sobre a Agressão 
Apesar das diversas áreas do conhecimento terem contribuído com a discussão sobre a 
agressão, a Psicologia, ciência que estuda o comportamento, trouxe uma variedade de teorias 
com diversas abordagens nos mais variados contextos. 
Entre as formas de explicação encontram-se desde as perspectivas teóricas 
consideradas clássicas (Psicanálise/Psicodinâmicas, Behaviorismo e Aprendizagem Social), 
como modelos integrativos mais recentes (Psicologia evolucionária,Cognitivo Neo-
associassionista, Distorção cognitiva, Teoria cognitivo-comportamental, Pensamento sobre 
informação social, Interacionismo social) que embasam as pesquisas científicas até os dias 
atuais. 
3.4.1 Teorias clássicas 
3.4.1.1 Psicanálise/Psicodinâmica. 
A teoria da Psicanálise fundada por Sigmund Freud em 1895, no fim do século XIX e 
início do século XX (Roza, 1997), traz as discussões sobre agressividade e que esta tem 
origem instintiva e é produzida pelo inconsciente o qual é formado por dois conjuntos de 
pulsões. Pulsão de Vida (Eros) e Pulsão de Morte (Tanatos), ambos causadores dos 
comportamentos agressivos. Portanto, pode-se dizer que para a Psicanálise clássica, os 
principais mecanismos psíquicos que atuam na agressão são as motivações inconscientes; os 
37 
 
mecanismos de defesa e o entendimento de que a agressividade é inata ao ser humano (Roza, 
1997). 
O livro, Os Três Ensaios sobre a Teoria da Sexualidade de 1905, é discutida a ideia de 
que a criança na fase sádico-anal desenvolve um componente de crueldade característicos da 
pulsão. Tal crueldade não teria a finalidade do sofrimento dirigido à outra pessoa, mas o 
sentimento de crueldade nessa fase simplesmente seria desconsiderado pela criança, como se 
ela não levasse em conta o sofrimento da outra pessoa. Por isso, para a Psicanálise a crueldade 
é um traço normal na infância, um tipo de pulsão, que faria com que a criança não 
reconhecesse a dor do próximo. Com isso, Freud concluiu que a agressividade começa a se 
formar junto ao desenvolvimento do indivíduo. Para a teoria psicanalítica algumas situações 
vivenciadas ainda na infância, tais como o Complexo de Édipo e a inabilidade para 
ultrapassar esta etapa, bem como outros eventos traumáticos podem explicar o 
comportamento abusivo na fase adulta (Santos & Teixeira, 2006). 
A problemática da agressividade então estaria relacionada à constituição do conceito 
de pulsão. Para Freud a Pulsão é “um conceito situado na fronteira entre o mental e o 
somático ou ainda é representante psíquico dos estímulos que se originam dentro do 
organismo e alcança a mente” (Roza, 1997, p.116). Vale dizer, o discurso freudiano não 
enunciou a existência de uma pulsão de agressão, mas sim a agressividade como parte da 
pulsão sexual e da autoconservação. Ao se falar de agressividade em psicanálise, pode-se citar 
o texto de 1929, Mal-estar na Civilização, no qual Freud reconhece que a agressividade é 
inata ao homem, sendo o principal fator de ameaça à vida em sociedade (Adamo, 1999). 
A partir de 1920, após a formulação da segunda teoria pulsional, a agressividade seria 
reconhecida como uma pulsão específica, funcionando, desde então, com outro nome: pulsão 
de morte, cuja finalidade é a destruição. Por outro lado tem a pulsão de vida cujo objetivo é 
manter (manutenção) da vida. Para Freud a pulsão de vida se subdividia em pulsões sexuais e 
38 
 
pulsões de autoconservação (Kristensen, Lima, Ferlin, Flores & Hackmann, 2003). Segundo 
Freud (Roza, 1997) uma parte importante é desempenhada pela inegável oposição entre as 
pulsões que favorecem a sexualidade, a consecução da satisfação sexual, e as demais pulsões 
que têm por objetivo a autopreservação do indivíduo como as pulsões do ego. 
A pulsão de morte torna-se pulsão de agressão, a serviço da autopreservação, quando é 
desviada para o mundo externo (social), fazendo com que o indivíduo seja notado por meio da 
agressividade e da destrutividade. Sendo assim, essa pulsão está a serviço de Eros, pois o 
organismo (pessoa), quando exprime esta energia para o externo (social), destrói ou lança 
energia para outro objeto ou pessoa, ao invés de destruir seu próprio eu (self), como poderia 
acontecer se desenvolvesse um comportamento autoagressivo. Inversamente, se houvesse 
qualquer restrição dessa agressividade dirigida para o mundo externo (social), só aumentaria a 
autodestruição. Por isso, Freud acreditava na necessidade de atividades sociais que servissem 
como válvula de escape para toda a energia armazenada (Santos & Teixeira, 2006). Neste 
caso, pode-se dizer que a ato agressivo serve como uma válvula de escape da energia 
armazenada que em determinado momento torna-se incontrolável. 
A Psicanálise Clássica assume que a agressividade é o maior impedimento de uma 
civilização, mas, ao mesmo tempo, defende que é inútil tentar eliminar as inclinações 
agressivas do ser humano, pois é uma característica psicológica da civilização humana. A 
psicanálise enfatiza ainda que o comportamento sexual agressivo pode ser resultado de traços 
de personalidade patológicos do agressor. É necessário, entretanto, atentar para o fato de que 
os casos que apresentam perturbações graves somam apenas 10% do total de registros dos 
casos de abuso sexual (Santos & Teixeira, 2006). 
3.4.1.2 Behaviorismo 
Como precedentes do Comportamentalismo os fisiólogos russos Vladimir 
Mikhailovich Bechterev
 
e Ivan Petrovich Pavlov
 
foram os primeiros a propor uma Psicologia 
39 
 
cuja pesquisa se baseia no comportamento, em uma Psicologia Objetiva. Pavlov, por sua vez, 
foi o primeiro a propor o modelo de condicionamento do comportamento conhecido 
como reflexo condicionado, e tornou-se conceituado com suas experiências de 
condicionamento com cães. Seus estudos inspirou a publicação, em 1913, do 
artigo Psychology as the Behaviorist views it, de John B. Watson (Baum, 1999). 
O Behaviorismo, movimento da psicologia do comportamento influenciado pelo 
avanço filosófico objetivista e mecanicista russo, e, sobretudo, pela psicologia animal, surge 
na no início do século XX nos Estados Unidos, com a obra de John Broadus Watson e atinge 
o ápice na década de 70, sobretudo devido aos estudos de Burrhus Frederik Skinner (Baum, 
1999). A Psicologia behaviorista é uma ciência do comportamento e se ocupa unicamente de 
atos observáveis de conduta, que podem ser objetivamente descritos em termos de estímulo e 
resposta. O comportamento é compreendido então nesses termos e também no sentido da 
formação de aprendizagem. 
O Behaviorismo tem como ponto de partida o fato observável de que os organismos, 
tanto humanos quanto animais, ajustam-se ao meio ambiente a partir dos mecanismos 
hereditário e da aprendizagem. Em segundo lugar, alguns estímulos levam os organismos a 
apresentar determinadas respostas. Conhecendo a resposta, portanto, é possível predizer o 
estímulo; dado o estímulo, é possível predizer a resposta (Skinner, 1974). 
O objetivo fundamental do Behaviorismo clássico, portanto, é obter conhecimentos 
precisos sobre os ajustamentos (adequação ao ambiente por aprendizagem individual ou 
respostas hereditárias) e os estímulos que os provocam. Os aspectos do comportamento que 
parecem instintivos são, na verdade, respostas socialmente condicionada, negando à 
existência de habilidades, temperamentos ou talentos hereditários. A influência do ambiente é 
enfatizada. Se não há habilidades ou talentos herdados, o indivíduo adulto é produto do 
40 
 
condicionamento do comportamento durante a infância, assumindo, portanto, posição 
fundamental na aprendizagem (Staats, 1980). 
Sendo assim, a concepção do Behaviorismo enfatiza a ideia de que a agressão é a 
expressão de práticas sociais aprendidas e não a expressão comportamental de um instinto 
agressivo. A agressão seria causada pelo fato da criança ter sido recompensada no passado 
para esse determinado comportamento e, outros comportamentos que não envolvem agressão 
seriam causados por experiências punitivas (Baum, 1999). 
Aplicado à criminologia, considerando os conceitos discutidos acima se pode dizer 
que se modificar o comportamento criminoso, a partir de esquemas

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