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INTRODUÇÃO
O presente trabalho evidencia a discussão sobre a inconstitucionalidade do inciso VII, artigo 3º da Lei 8.009/90, tendo por objeto toda a discussão que cerca este instituto, desde os primórdios da humanidade até os embates atuais acerca do tema adotado, passando por toda evolução dos Direitos Humanos no campo nacional e internacional.
Metodologicamente, o trabalho adotou a pesquisa qualitativa e aplicada, objetiva-se buscar conhecimentos e soluções para solucionar problemas específicos estabelecendo relação entre o conteúdo pesquisado e o mundo objetivo. Neste sentido, visa identificar, estudar e explicar os fatores que cerceiam o tema abordado, mediante análise bibliográfica.
Visa-se demonstrar mediante análise jurisprudencial, doutrinária e do sistema jurídico brasileiro e estrangeiro de forma ampla, a influência e importância da noção de Direitos Fundamentais para o desenvolvimento do ordenamento jurídico nacional. A influência de doutrinadores, pensadores e sistemas jurídicos, tanto exteriores como nacionais, sobre o bojo legislativo tupiniquim.
 Mediante a incompatibilidade dos ditos do inciso VII, artigo 3º da Lei 8.009/90 com os Tratados Internacionais ratificados pelo Brasil, com a Constituição Federal, com princípios enraizados no meio jurídico e com parte das Leis infraconstitucionais e da doutrina, há debates calorosos entre os juristas acerca da inconstitucionalidade do dispositivo em epígrafe.
No primeiro capítulo, busca-se inserir o contexto histórico mundial dos Direitos Humanos, sobretudo o Direito à Moradia, a partir da Antiguidade, e sua influência no desenvolvimento no direito brasileiro. No segundo capítulo do trabalho, passa-se a analisar a evolução histórica do instituto no âmbito nacional, desde a época imperial até o contexto atual, visando igualmente apresentar conceitos básicos do instituto objeto da análise. Em um terceiro momento, afunila-se para tratar especificamente da Lei em que está inserido o dispositivo alvo de discussões contemporâneas, passa-se a analisar os institutos do inciso. No último capítulo, busca-se demonstrar a discussão atual sobre o assunto, expondo pareceres jurisprudenciais e doutrinários.
A importância deste trabalho se reflete no fato de, apesar de ter sido objeto de acórdão do Supremo Tribunal Federal no ano de 2006, o tema ainda permanece em discussão. Diversos juristas consideram a decisão do Supremo deveria ter explicitado um entendimento diferente. Assim, a relevância do trabalho pode ser considerada indispensável, uma vez que apesar de pacificar o tema, o STF não calou a discussão no meio jurídico, tornando o acórdão alvo de críticas.
Dessa forma, mediante a importância do assunto, o trabalho busca responder, através de análise histórica, legal, jurisprudencial e doutrinária, a seguinte pergunta: o inciso VII do artigo 3º da Lei 8.009 de 1990 pode ser considerado inconstitucional?
O DIREITO DE MORADIA COMO UM DIREITO HUMANO
Desde os primórdios da humanidade, o homem sempre procurou se abrigar. Na pré-história, precisava de um local seguro para descansar, recuperar as energias, comer, fugir de predadores, do calor, do frio e etc. Apesar de hoje a moradia ser utilizada para inúmeras coisas, não se conseguindo comparar com as suas poucas funções à época, é fato que o conceito de moradia existe desde o inicio dos tempos humanoides.
Com o passar dos anos, ainda na Antiguidade, a questões que envolvem a moradia foram se aperfeiçoando conforme as novas necessidades humanas. Logo, passou a ser crucial, pois além das funções estipuladas, começou a servir como ponto de reunião ou encontro de outros humanos, a representar um local fixo para a constituição familiar. Com o tempo, o homem não era mais nômade, era muito mais fácil se fixar em algum local fértil e nele plantar, criar animais, construir e etc.
Com a ideia de se fixar em um local e começar a construir nele, logo após o sedentarismo humano começaram a surgir as grandes cidades e com elas, consequentemente, pessoas começaram a viver muito próximas uma das outras e assim, para um convívio pacifico, regras deveriam ser criadas.
Logicamente, com o passar do tempo, os hábitos mudam, a tecnologia se desenvolve e assim devem ser estipuladas regras que refletem as necessidades do povo à época. Na Roma antiga, têm-se vários registros que os romanos tinham noção jurídica e se utilizavam de institutos para garantir o seu direito à propriedade. Na época Renascentista, as moradias eram diferentes no que diz respeito à sua forma devido ao avanço do tempo e consequentemente da tecnologia e a diferença de costumes, no entanto, regras e ideias também eram estabelecidas para garanti-la, assim como o era na Revolução Industrial.
É importante destacar, sobretudo, a época da Revolução Francesa e meados do século XVII, onde pensadores como Jean-Jacques Rousseau e John Locke, com suas ideias foram cruciais para a noção de Direitos Humanos que se tem atualmente.
O contrato social estabelecido por Rousseau frisava a natureza individual de cada um:
Na França, os escritos de Rousseau constituíram uma ponte entre o Iluminismo inicial e o intermediário, que se preocupavam com a razão, e o Iluminismo final, que enfatizava a natureza passional do individuo, enaltecendo o instinto, a espontaneidade e a emoção [...] Rousseau alegava que a soberania do cidadão não é um presente de do governante ou de Deus, mas deriva de sua busca de liberdade. SARLET, Ingo Wolfgang. Direitos Humanos: Referências Essenciais - São Paulo, SP, Editora Edusp, 2007.
Em outras palavras, Rosseau buscava dar maior ênfase ao homem como individuo, assim, com uma maior força e em busca da liberdade, poderiam se destacar e ser soberanos, em detrimento dos monarcas, que concentravam o poder.
John Locke teria um pensamento um pouco diferente de Rosseau, porém ambos seguiram o mesmo raciocínio de que a monarquia deveria ser limitada e dessa forma o individuo como tal deveria ter uma maior atenção, influenciando diretamente os Direitos Humanos que viriam posteriormente baseados neste contexto:
O legado de Locke foi substancial para sustentar o caso do que seria mais tarde a teoria dos direitos humanos. Locke acreditava na tolerância religiosa e defendia com paixão o direito dos ingleses de lutar contra a tirania, como tinham feito contra Carlos I. A esperança de Locke era que fossem descobertas leis naturais que embasassem a futura lei humana em torno da qual a sociedade poderia organizar-se. Acreditava que, desse modo, a humanidade poderia melhorar as condições sociais do futuro. Talvez com maior importância para o desenvolvimento dos direito humanos, Locke sustentava que todas as pessoas (com exceção dos escravos) tinham direito à vida, à liberdade e à propriedade [...] Com base nessas crenças, Locke apoiou a liberdade de imprensa, as reformas educacionais, o estudo da família como instituição e a separação dos poderes políticos, ideias tão importantes para o desenvolvimento constitucional na Inglaterra quanto nos Estados Unidos. SARLET, Ingo Wolfgang. Direitos Humanos: Referências Essenciais - São Paulo, SP, Editora Edusp, 2007.
Não importa a época, a noção de moradia sempre esteve lado a lado com a história humana, mudando seu contexto de acordo com o tempo, porém sempre presente.
Um grande marco na história do Direito à Moradia foi o advento da Declaração Universal dos Direitos Humanos, proclamada em 1948, no período pós Segunda Guerra Mundial, a qual colocou o Direito à Moradia no rol dos Direitos Humanos, tutelando-o como tal. 
Os Direitos Humanos são os direitos e liberdades básicas de todos os indivíduos, sendo o seu objetivo proteger o ser humano em sua essência, tratar todos sob a luz da igualdade, é o que afirma a Declaração Universal dos Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas, proclamada em 1948: "Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e em direitos. Dotados de razão e de consciência, devem agir uns para com os outros em espírito de fraternidade."[1:
Disponível em: DECLARAÇÃO UNIVERSAL DOS DIREITOS HUMANOS. Adotada e proclamada pela resolução 217 A (III) da Assembleia Geral das Nações Unidas em 10 de dezembro de 1948. Disponível na Biblioteca Virtual de Direitos Humanos da Universidade de São Paulo: www.direitoshumanos.usp.br. Acesso em: 20 de maio de 2017]
Conceituar Direitos Humanos para então estabelecer uma definição do Direito à Moradia não é uma tarefa simples, apesar da importância destes, a doutrina ainda possui posicionamentos divergentes quanto aos institutos. Alguns autores afirmam que os direitos humanos são direitos naturais, ou seja, integram à essência humana, outros falam que se trata de normas que protegem os direitos dos cidadãos, os tratando como sinônimos de direitos fundamentais. Ainda, há alguns outros que confundem os conceitos de Moradia com o de Habitação, por exemplo.
Em 1979, Karel Vasak, jurista tcheco-francês, baseado nas ideias da Revolução Francesa, propôs uma divisão dos direitos humanos estabelecidos em gerações em uma conferência do Instituto Internacional dos Direitos Humanos. A 1ª geração consistiria basicamente nos direitos de liberdade individual, fundada na ideia do liberalismo, no qual o Estado deveria intervir minimamente dos ditames da vida de seus indivíduos. A 2ª geração seria constituída pelos direitos de igualdade, pois pelo contexto à época, viu-se a necessidade de o Estado passar a controlar a sociedade, a economia e etc. assim, incluíram-se os direitos econômicos, sociais e culturais. A última geração proposta por Vasak foi uma 3ª geração de direitos humanos, aqui foram colocados os direitos de fraternidade, ou de solidariedade, como alguns os chamam, são eles o direito à paz, ao meio ambiente, ao progresso, entre outros. Estes direitos são entendidos como tal, pois após a Segunda Guerra mundial, em meados de 1945, viu-se a imprescindibilidade de proteger a humanidade.[2: Disponível em: http://www.dhnet.org.br/direitos/militantes/tetuliano/dhnaidademoderna.html. Acesso em: 19 de maio de 2017. ]
Pode-se falar ainda em uma 4ª geração dos direitos humanos, mas não proposta por Vasak especificamente, a própria doutrina estabeleceu e incluiu nessa geração os direitos tecnológicos, como o direito de informação e o biodireito, muito devido aos avanços da tecnologia no séc. XX.
Parte da doutrina, como Paulo Bonavides, ainda fala em uma 5ª geração de direitos humanos, incluindo nesta o direito à paz, afirmando que este deveria ter uma maior relevância.
Divergindo do jurista tcheco-francês, Norberto Bobbio em meados dos anos 90 estabeleceu um entendimento que se encontra em consonância com o postulado na Declaração Universal dos Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas, onde para os direitos humanos serem, de fato, garantidos deve haver uniformidade entre os sujeitos e a própria classificação dos direitos humanos, que para o filósofo, podiam ser divididos, não em gerações, mas sim entre civis, sociais e políticos e “devem existir solidários”. (BOBBIO, 1995, p. 353-355)
Divisão esta de Bobbio que trás influencias para a classificação dos Direitos Humanos até os dias atuais, são eles: os direitos civis e políticos como por exemplo: direitos à vida, à propriedade privada, liberdade de pensamento, de expressão, de crença, igualdade formal, ou seja, de todos perante a lei, direitos à nacionalidade, de participar do governo do seu Estado, podendo votar e ser votado, entre outros, fundamentados no valor da liberdade; os direitos econômicos, sociais e culturais como por exemplo: direitos ao trabalho, à educação, à saúde, à previdência social, à moradia, à distribuição de renda, entre outros, fundamentados no valor igualdade de oportunidades; direitos difusos e coletivos como por exemplo: direito à paz, direito ao progresso, autodeterminação dos povos, direito ambiental, direitos do consumidor, inclusão digital, entre outros, fundamentados no valor fraternidade).
Neste sentido atualmente o Direito à Moradia está estabelecido dentro do bojo dos Direitos Humanos, sendo imprescindível e inseparável à pessoa humana, estando estipulado e garantido no Código Civil Brasileiro de 2002 e na Constituição Federal de 1988 (sendo incluído expressamente neste último somente após a Emenda Constitucional n. 26), por meio do reconhecimento dos Tratados Internacionais.
Todo ser humano possui a necessidade de se fixar em um lugar. Criar e estabelecer vínculos em uma determinada circunscrição territorial é essencial, inclusive, para a vida jurídica da pessoa, o local onde se formam tais ligações é crucial para o exercício de direitos e deveres.
O lugar onde a pessoa estabelece sua residência com animus definitivo, ou seja, com a intenção de permanência, é considerado o domicílio, segundo o art. 70 do Código Civil de 2002, in verbis:
 “Art. 70. O domicílio da pessoa natural é o lugar onde ela estabelece a sua residência com ânimo definitivo”. (Código Civil Brasileiro de 2002)
Em outras palavras, o Código Civil expõe que domicílio é a residência por tempo indefinido.
Ao conceituar domicílio, o legislador cria uma dualidade, que permanece bastante clara: residência é diferente de domicílio. Analisando por outro prisma, residência seria “domicilio” sem o animus definitivo, sem a vontade de continuidade, ou seja, um elemento que compõe domicilio.
Washington de Barros faz uma distinção entre esses dois conceitos:
Podemos, pois, da seguinte forma estabelecer a diferenciação entre domicílio e residência: o primeiro é conceito jurídico, criado pela própria lei e através do qual, para efeitos jurídicos, se presume estar presente a pessoa em determinado lugar. Residência, por sua vez, é relação de fato, é o lugar em que a pessoa habita ou tem o centro de suas ocupações. A essência do primeiro é puramente jurídica e corresponde à necessidade de fixar a pessoa em dado local; a segunda é meramente de fato. (Curso de direito civil: parte geral, São Paulo. Saraiva, 1993. p. 125-126.)
Superada a dualidade entre domicílio e residência estabelecida pelo Código Civil brasileiro e uníssona na doutrina, passa-se ao conceito do direito à moradia, contudo, é primordial fazer sua distinção em face do direito de habitação.
O direito à habitação não deve ser confundido com o direito à moradia, entre os dois há dissemelhanças.
Habitação é entendida como o local que a pessoa permanece de forma oportuna, temporária, se confunde com a própria noção sobre residência.
O direito à moradia é muito mais amplo que o direito à habitação, segundo Sergio Iglesias Nunes, é a partir do conceito de moradia que se busca a proteção da função social da propriedade e de outros direitos conexos:
A moradia consiste em bem irrenunciável da pessoa natural, indissociável de sua vontade e indisponível, a qual permite a sua fixação em lugar determinado, bem como a de seus naturais na vida cotidiana, estes, sendo exercidos de forma definitiva pelo indivíduo, recaindo o seu exercício em qualquer pouso ou local, desde que objeto de direito juridicamente protegido. O bem da moradia é inerente à pessoa e independe de objeto físico para a sua existência e proteção jurídica. Para nós, moradia é elemento essencial do ser humano e um bem extrapatrimonial [...] E a habitação é o exercício efetivo a moradia sobre determinado bem imóvel. (SOUZA, Sérgio Iglesias Nunes de. Direito à moradia e de habitação: análise comparativa e sua implicações teóricas e práticas com os direitos da personalidade – 2. Ed. rev., atual e ampl. – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2008. p. 44)
Logo, apesar dos conceitos estarem ligados, possuem conotações diferentes. A moradia é um aspecto da personalidade com ampla proteção do ordenamento jurídico e a habitação, o seu exercício, de forma temporária, sem o animus definitivo.
No entanto, o direito à moradia não recebe apenas a tutela do direito doméstico, recebe, sobretudo, a proteção do direito internacional, inclusive tendo sido considerado a partir deste um direito humano, como visto.
1.1 – A proteção internacional do direito
à moradia 
O direito de moradia, propriamente dito tem repercussão desde a Roma Antiga, alguns autores afirmam, inclusive, que é, nesta época, que surgiram as noções preliminares sobre o instituto do bem de família. Em Roma, a família que acendia fogo para venerar não poderia ser retirada de seu lar enquanto a lareira estivesse acessa, pois era considerado uma profanação. Apesar destes rudimentos, o bem de família como se conhece hoje teve origens no continente americano mediante o Homestead Exception Act, mais precisamente na República do Texas, Estados Unidos, em 20 de maio de 1862.[3: Disponível em: https://drguilhermepinheiro.jusbrasil.com.br/artigos/184227994/penhora-do-bem-de-familia]
Assim, pode-se afirmar que o direito à moradia, assim como, posteriormente o instituto do bem de família, tiveram uma enorme influencia do século XIX com o Homestead Act (em português, a Lei da Propriedade Rural). Este instituto, criado em 20 de maio de 1862 pelo então Presidente Abraham Lincoln, à época, foi importantíssimo para a economia dos Estados Unidos e posteriormente tomou proporções globais, foi um marco na evolução do direito à moradia, pois até então não havia normas sobre o assunto no mundo ocidental.[4: Disponível em: http://mundoeducacao.bol.uol.com.br/historia-america/homestead-act.htm]
Na definição de Caio Mário da Silva Pereira (2010, p. 601), “(...) Na Constituição Texana de 1845 o Homestead era definido como uma porção de terra pertencente aos chefes de família protegida contra a alienação judicial forçada, por quaisquer débitos contraídos por seu proprietário posteriormente à aquisição da propriedade.” (rodapé - PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direitos Civil.18.ed. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2010.)
Assim, o Homestead Act consistia em atrair imigrantes europeus para ocupar as terras ao oeste dos Estados Unidos afirmando que quem cultivasse em um terreno não superior à 160 hectares, tornando-o produtivo, adquiria a posse daquela terra. Este pequeno ato impulsionou visivelmente a economia americana, e ainda, a repercussão internacional do instituto foi gigantesca, apesar de as famílias que marchavam para o oeste encontraram resistência por parte dos nativos indígenas que lá viviam. O bem de família constituído pelo direito brasileiro, bem como as noções contemporâneas sobre o direito à moradia beberam desta fonte.
1.1.2 – A Declaração Universal dos Direitos Humanos 
Observa-se que, foi a partir do direito internacional, com diversos doutrinadores e documentos, que o direito de moradia foi considerado como um direito humano e, indubitavelmente, a Declaração Universal dos Direitos Humanos foi crucial para tal, pois foi a partir dela que o direito à moradia foi efetivamente inserido no rol de Direitos Humanos.
Celebrada em 10 de dezembro de 1948, adotada e promulgada pela Resolução nº 271 da Assembleia Geral das Nações Unidas (quase 100 anos após o Homestead Act) e foi ratificada naquele mesmo momento pelo Brasil, influenciando inúmeros pensadores e teóricos naquela época até hoje.
A Declaração trouxe diversas considerações sobre outros direitos humanos como o direito à igualdade, à liberdade, à vida, à livre religião, à segurança entre outros. No que diz respeito ao direito à moradia, este foi garantido como um direito humano ao ser consagrado no artigo 12º e 25º, item I, da Declaração: 
Artigo 12º - Ninguém sofrerá intromissões arbitrárias na sua vida privada, na sua família, no seu domicílio ou na sua correspondência, nem ataques à sua honra e reputação. Contra tais intromissões ou ataques toda a pessoa tem direito a protecção da lei.
Artigo 25º - 1. Toda a pessoa tem direito a um nível de vida suficiente para lhe assegurar e à sua família a saúde e o bem-estar, principalmente quanto à alimentação, ao vestuário, ao alojamento, à assistência médica e ainda quanto aos serviços sociais necessários, e tem direito à segurança no desemprego, na doença, na invalidez, na viuvez, na velhice ou noutros casos de perda de meios de subsistência por circunstâncias independentes da sua vontade. Disponível em: DECLARAÇÃO UNIVERSAL DOS DIREITOS HUMANOS. Adotada e proclamada pela resolução 217 A (III) da Assembleia Geral das Nações Unidas em 10 de dezembro de 1948. Disponível na Biblioteca Virtual de Direitos Humanos da Universidade de São Paulo: www.direitoshumanos.usp.br. Acesso em: 20 de maio de 2017
A Declaração, apesar de falar expressamente em “domicílio” evidentemente não quis apenas alcançar seu conceito restrito, em seu próprio texto, no artigo 25º pode-se extrair a verdadeira intenção deste tão importante tratado, o qual quis dar amplitude às suas disposições, nesse sentido, tem-se o pensamento de Sérgio Iglesias Nunes de Souza:
Toda pessoa tem direito a um padrão de vida capaz de assegurar a si e a sua família saúde e bem-estar, inclusive alimentação, vestuário, habitação, cuidados médicos e os serviços sociais indispensáveis, o direito a segurança, em caso de desemprego, doença, invalidez, viuvez, velhice ou outros casos de perda dos meios de subsistência em circunstâncias fora de seu controle. (SOUZA, Sérgio Iglesias Nunes de. Direito à Moradia e de Habitação: Análise Comparativa e suas Implicações Teóricas e Práticas com os Direitos da Personalidade. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2004. p. 61- destaques originais)
Diante da extensão do direito à moradia, percebe-se que este se relaciona diretamente com outros direitos fundamentais destacados na Declaração Universal de Direitos Humanos, como o direito à vida, à liberdade, à integridade física e etc., podendo ser estabelecido, a partir desta, como um direito humano, tendo relação inclusive com o princípio da dignidade humana, princípio basilar no ordenamento jurídico brasileiro, pois aquele não alcança apenas domicílio em seu conceito stricto sensu, mas abrange todas as condições do ser humano para viver dignamente, em consonância com este último. Dessa forma, o direito à moradia, assim como os demais direitos ditos na Declaração tem uma ligação direta com o principio da dignidade humana. Neste sentido, ensina Ingo Sarlet:
Mesmo que no texto constitucional a moradia tenha sido tratada de forma genérica, sem adjetivações, tendo em vista à sua proteção nos tratados internacionais como moradia digna, a exemplo do Pacto Internacional de Direitos Sociais, Econômicos e Culturais, de 1966, ou mesmo na sua qualificação em algumas constituições, como a belga, como moradia decente, a ausência de qualquer especificação não abre brecha para que seu conteúdo seja esvaziado a um mínimo apenas fisiológico, abaixo das exigências da dignidade humana e do consequente mínimo existencial. Contudo, não se pode negar que a adjetivação teria valor indiscutível já que não abriria espaço para interpretações excessivamente limitativas desse direito, deixando-o nas mãos do legislador infraconstitucional. 
Em decorrência da sua íntima conexão com a dignidade humana e, claro, com direito à vida, se faz evidente que compõem a definição de direito à moradia o que apreciar os parâmetros básicos para uma vida proveitosa nas exigências impostas pela Organização Mundial de Saúde, as quais abrangem o completo bem-estar físico, mental e social, visto que uma vida com o mínimo de dignidade não pode ser menos que uma vida com saúde, não podendo ficar restrita a reles existência e sobrevivência física. O que se acorda é que a importância do direito à moradia traz a necessidade da intensa conexão entre o direito interno e o internacional e, ainda, dentre os vários direitos e deveres fundamentais. (SARLET, Ingo Wolfgang. Supremo Tribunal Federal, o direito à moradia e a discussão em torno da penhora do imóvel do fiador. In: FACHIN, Zulmar (coord.). 20 anos de Constituição cidadã. São Paulo: Método, 2008. pp. 41-66.)
Assim, pode-se concluir que existe uma conexão intrínseca entre o princípio da dignidade humana com o princípio da moradia, sendo ambos considerados direitos fundamentais e importantíssimos para o desenvolvimento do
direito, principalmente a partir de suas elevações para direitos humanos internacionalmente protegidos.
1.1.3 – A Convenção Americana de Direitos Humanos: Pacto San José da Costa Rica
A Convenção Americana de Direitos Humanos (ou CADH, ou Pacto de San José da Costa Rica) é um tratado de âmbito internacional entre os países que compõem a Organização dos Estados Americanos (OEA). Foi celebrado em 22 de novembro de 1969, na Conferência Interamericana de Direitos Humanos, entretanto, apenas teria entrado em vigor 9 anos depois, em 18 de julho de 1978. (inserir rodapé: https://pt.wikipedia.org/wiki/Conven%C3%A7%C3%A3o_Americana_de_Direitos_Humanos)
E somente em 25 de setembro de 1992, o tratado foi ratificado pelo Brasil (rodapé: http://www.pge.sp.gov.br/centrodeestudos/bibliotecavirtual/instrumentos/sanjose.htm) e posto em vigor mediante o Decreto nº 678, de novembro de 1992 (rodapé: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/d0678.htm), com o seguinte texto: 
        “O VICE-PRESIDENTE DA REPÚBLICA , no exercício do cargo de PRESIDENTE DA REPÚBLICA , no uso da atribuição que lhe confere o art. 84, inciso VIII, da Constituição, e   Considerando que a Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica), adotada no âmbito da Organização dos Estados Americanos, em São José da Costa Rica, em 22 de novembro de 1969, entrou em vigor internacional em 18 de julho de 1978, na forma do segundo parágrafo de seu art. 74;
        Considerando que o Governo brasileiro depositou a carta de adesão a essa convenção em 25 de setembro de 1992;  Considerando que a Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica) entrou em vigor, para o Brasil, em 25 de setembro de 1992 , de conformidade com o disposto no segundo parágrafo de seu art. 74;
        DECRETA:
        Art. 1° A Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica), celebrada em São José da Costa Rica, em 22 de novembro de 1969, apensa por cópia ao presente decreto, deverá ser cumprida tão inteiramente como nela se contém.
        Art. 2° Ao depositar a carta de adesão a esse ato internacional, em 25 de setembro de 1992, o Governo brasileiro fez a seguinte declaração interpretativa: "O Governo do Brasil entende que os arts. 43 e 48, alínea d , não incluem o direito automático de visitas e inspeções in loco da Comissão Interamericana de Direitos Humanos, as quais dependerão da anuência expressa do Estado".
        Art. 3° O presente decreto entra em vigor na data de sua publicação.
        Brasília, 6 de novembro de 1992; 171° da Independência e 104° da República.”
Segundo o próprio texto da Convenção, os países signatários teriam o dever de reafirmar:
 “[...] seu propósito de consolidar neste Continente, dentro do quadro das instituições democráticas, um regime de liberdade pessoal e de justiça social, fundado no respeito dos direitos humanos essenciais; Reconhecendo que os direitos essenciais da pessoa humana não derivam do fato de ser ela nacional de determinado Estado, mas sim do fato de ter como fundamento os atributos da pessoa humana, razão por que justificam uma proteção internacional, de natureza convencional, coadjuvante ou complementar da que oferece o direito interno dos Estados americanos;” (CONVENÇÃO AMERICANA DE DIREITOS HUMANOS. PACTO SAN JOSÉ DA COSTA, adotada e proclamada pela OEA em 22 de novembro de 1969. Disponível em: https://drive.google.com/file/d/0BwbnJ2EXfmcDYzA1YWZhMGYtNTFmNS00OWQyLThkYjgtZGY3MGQ5OWViNDEy/view. Acesso em: 20 de maio de 2017
No que diz respeito ao conteúdo, a Convenção Americana de Direitos Humanos aborda questões de direitos políticos e direito civil, como: direito à vida, à integridade pessoal, à honra, à liberdade religiosa, à liberdade de expressão, entre outros. Neste sentido, muito se assemelha à Declaração Universal de Direitos Humanos.
O Brasil, ao reconhecer o conteúdo da Convenção com o Decreto nº678 de 1992, estabeleceu um compromisso de proteger e resguardar todos os seus dispositivos e, dessa forma, os direitos e princípios que nele estão inseridos.
No que tange ao direito à moradia propriamente dito, a Convenção Americana de Direitos Humanos trás em seus artigos 11, 24 e 26 disposições sobre o assunto:
Artigo 11 - Proteção da honra e da dignidade
1. Toda pessoa tem direito ao respeito da sua honra e ao reconhecimento de sua dignidade.
2. Ninguém pode ser objeto de ingerências arbitrárias ou abusivas em sua vida privada, em sua família, em seu domicílio ou em sua correspondência, nem de ofensas ilegais à sua honra ou reputação.
Disponível em: https://drive.google.com/file/d/0BwbnJ2EXfmcDYzA1YWZhMGYtNTFmNS00OWQyLThkYjgtZGY3MGQ5OWViNDEy/view
No artigo transcrito acima, observa-se que em seu item ´2´, a Convenção estipulou que nenhuma pessoa poderá ser alvo de qualquer ato arbitrário ou abusivo em seu domicilio, em outras palavras, o individuo não pode sofrer qualquer lesão no âmbito de seu domicilio, entende-se domicilio no sentido amplo de seu significado, assim como na Declaração dos Direitos Humanos em 1948.
Aqui, inclusive, pode-se perceber a ampla segurança que se dá ao âmbito domiciliar, influenciando diretamente o instituto do Bem de Família estabelecido por lei no Brasil em meados dos anos 90.
O artigo 24 da Convenção é um complemento ao posto no artigo 11, naquele afirma-se que a proteção estipulada pela lei, inclusive as previsões da própria Convenção, alcança todos os indivíduos, sem qualquer discriminação, dessa forma, o dito no artigo 11 irá abranger a todas as pessoas residentes nos países que ratificaram o postulado no Pacto de San Jose.
Por sua vez, o artigo 26 destaca o seguinte:
Artigo 26 - Desenvolvimento progressivo
Os Estados-partes comprometem-se a adotar as providências, tanto no âmbito interno, como mediante cooperação internacional, especialmente econômica e técnica, a fim de conseguir progressivamente a plena efetividade dos direitos que decorrem das normas econômicas, sociais e sobre educação, ciência e cultura, constantes da Carta da Organização dos Estados Americanos, reformada pelo Protocolo de Buenos Aires, na medida dos recursos disponíveis, por via legislativa ou por outros meios apropriados.
Os Estados que ratificaram o documento devem, sempre, adotar medidas no âmbito interno e externo, para garantir a efetividade dos direitos estabelecidos neste documento e os que constam na Carta de Organização dos Estados Americanos (reformada em 1967, mediante o Protocolo de Buenos Aires).(rodapé http://www.oas.org/dil/port/tratados_A-41_Carta_da_Organiza%C3%A7%C3%A3o_dos_Estados_Americanos.htm)
A carta cria a Organização dos Estados Americanos. Foi celebrada na IX Conferência Internacional Americana de 30 de abril de 1948, ocorrida em Bogotá. Entrou em vigência a 13 de dezembro de 1951. Em seu artigo 1º, o documento trás seu objetivo: “a organização internacional que vêm desenvolvendo para conseguir uma ordem de paz e de justiça, para promover sua solidariedade, intensificar sua colaboração e defender sua soberania, sua integridade territorial e sua independência.” (http://www.oas.org/dil/port/tratados_A-41_Carta_da_Organiza%C3%A7%C3%A3o_dos_Estados_Americanos.htm)
1.1.4 – Outros Tratados Internacionais ratificados e/ou aceitos pelo Brasil
Além dos tratados já mencionados (a Declaração Universal dos Direitos Humanos e o Pacto de San Jose da Costa Rica), também existem diversos tratados importantíssimos para a evolução dos Direitos Humanos e consequentemente para o desenvolvimento do Direito à Moradia, que foram ratificados pelo Brasil.
O primeiro deles é o Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (ou, PIDESC). Foi celebrado em 16 de dezembro de 1966 mediante a Resolução 2.220-A (XXI) da Assembléia Geral das Nações Unidas e entrou em vigor mais ou menos 10 anos depois, em 3 de janeiro de 1976 (rodapé: SOUZA, Sérgio Iglesias Nunes de. Direito à moradia e de habitação: análise comparativa e sua implicações teóricas e práticas com os direitos da personalidade
– 2. Ed. rev., atual e ampl. – São Paulo, SP: Editora Revista dos Tribunais, 2009).
Determinado tratado foi ratificado pelo Brasil em 6 de julho de 1992, por meio do Decreto nº 591, com a seguinte redação:
    O PRESIDENTE DA REPÚBLICA, no uso da atribuição que lhe confere o art. 84, inciso VIII, da Constituição, e
    Considerando que o Pacto Internacional sobre Direitos Econômicos, Sociais e Culturais foi adotado pela XXI Sessão da Assembléia-Geral das Nações Unidas, em 19 de dezembro de 1966;
    Considerando que o Congresso Nacional aprovou o texto do referido diploma internacional por meio do Decreto Legislativo n° 226, de 12 de dezembro de 1991;
    Considerando que a Carta de Adesão ao Pacto Internacional sobre Direitos Econômicos, Sociais e Culturais foi depositada em 24 de janeiro de 1992;
    Considerando que o pacto ora promulgado entrou em vigor, para o Brasil, em 24 de abril de 1992, na forma de seu art. 27, parágrafo 2°;
    DECRETA:
    Art. 1° O Pacto Internacional sobre Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, apenso por cópia ao presente decreto, será executado e cumprido tão inteiramente como nele se contém.
    Art. 2° Este Decreto entra em vigor na data de sua publicação.
    Brasília, 06 de julho de 1992; 171º da Independência e 104° da República.
Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/1990-1994/d0591.htm
O principal objetivo deste Pacto é prestigiar, reconhecer e proteger os direitos estipulados nos outros tratados já efetivados, reconhecendo que estes direitos são inerentes à pessoa e sua respectiva dignidade, como destaca o Preâmbulo do documento: (rodapé https://www.oas.org/dil/port/1966%20Pacto%20Internacional%20sobre%20os%20Direitos%20Econ%C3%B3micos,%20Sociais%20e%20Culturais.pdf)
Os Estados Membros no presente Pacto, Considerando que, em conformidade com os princípios proclamados na Carta das Nações Unidas, o reconhecimento da dignidade inerente a todos os membros da família humana e dos seus direitos iguais e inalienáveis constitui o fundamento da liberdade, da justiça e da paz no mundo, Reconhecendo que esses direitos decorrem da dignidade inerente à pessoa humana, Reconhecendo que, em conformidade com a Declaração Universal dos Direitos Humanos, o ideal do ser humano livre, liberto do temor e da miséria, não pode ser realizado a menos que se criem as condições que permitam a cada um gozar de seus direitos econômicos, sociais e culturais, assim como de seus direitos civis e políticos, Considerando que a Carta das Nações Unidas impõe aos Estados a obrigação de promover o respeito universal e efetivo dos direitos e das liberdades da pessoa humana, Compreendendo que o indivíduo, por ter deveres para com seus semelhantes e para com a coletividade a que pertence, tem a obrigação de lutar pela promoção e observância dos direitos reconhecidos no presente Pacto [...]. Disponível em: https://www.oas.org/dil/port/1966%20Pacto%20Internacional%20sobre%20os%20Direitos%20Econ%C3%B3micos,%20Sociais%20e%20Culturais.pdf
O PIDESC trata de direitos que versam sobre direitos econômicos, sociais, culturais, à educação, à saúde, ao trabalho entre outros. No que diz respeito aos direitos civis, mais precisamente, ao direito à moradia, o pacto trás a seguinte redação em seu artigo 11: 
Artigo 11 §1. Os Estados-partes no presente Pacto reconhecem o direito de toda pessoa a um nível de vida adequado para si próprio e para sua família, inclusive à alimentação, vestimenta e moradia adequadas, assim como uma melhoria contínua de suas condições de vida. Os Estados-partes tomarão medida apropriadas para assegurar a consecução desse direito, reconhecendo, nesse sentido, a importância essencial da cooperação internacional fundada no livre consentimento. §2. Os Estados-partes no presente Pacto, reconhecendo o direito fundamental de toda pessoa de estar protegida contra a fome, adotarão, individualmente e mediante cooperação internacional, as medidas, inclusive programas concretos, que se façam necessários para: 1. Melhorar os métodos de produção, conservação e distribuição de gêneros alimentícios pela plena utilização dos conhecimentos técnicos e científicos, pela difusão de princípios de educação nutricional e pelo aperfeiçoamento ou reforma dos regimes agrários, de maneira que se assegurem a exploração e a utilização 6 mais eficazes dos recursos naturais. 2. Assegurar uma repartição eqüitativa dos recursos alimentícios mundiais em relação às necessidades, levando-se em conta os problemas tanto dos países importadores quanto dos exportadores de gêneros alimentícios. Disponível em: https://www.oas.org/dil/port/1966%20Pacto%20Internacional%20sobre%20os%20Direitos%20Econ%C3%B3micos,%20Sociais%20e%20Culturais.pdf
Com a leitura do artigo, pode-se afirmar que os Estados que reconheceram e ratificaram o Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais também reconhecem o direito de que toda e qualquer pessoa tenha uma vida adequada, tanto para si, quanto para sua família (entendido no sentido amplo). Dessa forma, estes Estados devem tomar as medidas que forem cabíveis, tanto internamente, quanto externamente para que estes direitos sejam alcançados.
Dentre tantas outras preocupações demonstradas pelo PIDESC, uma delas foi a moradia, na qual os Estados-partes devem assegurar e tomar medidas para que este direito seja cumprido.
Um segundo tratado internacional, aceito pelo Brasil, que passou a influenciar a Legislação, sobretudo no que cerne ao instituto do Bem de Família e suas nuances foi a Declaração Americana dos Direitos e deveres do Homem. É uma declaração aprovada em meados de 1948, na IX Conferência Americana, realizada em Bogotá. Com um conteúdo de 38 artigos, a Declaração é anterior, inclusive a Declaração Universal dos Direitos Humanos, se tornando de suma importância e influência para os próximos documentos que iriam por vir tratando deste assunto, apesar de seu valor jurídico ser constantemente discutido, pois não integra a Carta da Organização dos Estados Americanos. (rodapé: SOUZA, Sérgio Iglesias Nunes de. Direito à moradia e de habitação: análise comparativa e sua implicações teóricas e práticas com os direitos da personalidade – 2. Ed. rev., atual e ampl. – São Paulo, SP: Editora Revista dos Tribunais, 2009).
Além dos artigos, a Declaração consta de um preâmbulo, no qual é de relevância destacar: 
 Todos os homens nascem livres e iguais em dignidade e direitos e, como são dotados pela natureza de razão e consciência, devem proceder fraternalmente uns para com os outros.
 
            O cumprimento do dever de cada um é exigência do direito de todos.  Direitos e deveres integram-se correlativamente em toda a atividade social e política do homem.  Se os direitos exaltam a liberdade individual, os deveres exprimem a dignidade dessa liberdade.
 
            Os deveres de ordem jurídica dependem da existência anterior de outros de ordem moral, que apóiam os primeiros conceitualmente e os fundamentam.
 
            É dever do homem servir o espírito com todas as suas faculdades e todos os seus recursos, porque o espírito é a finalidade suprema da existência humana e a sua máxima categoria.
 
            É dever do homem exercer, manter e estimular a cultura por todos os meios ao seu alcance, porque a cultura é a mais elevada expressão social e histórica do espírito.
 
            E, visto que a moral e as boas maneiras constituem a mais nobre manifestação da cultura, é dever de todo homem acatar-lhes os princípios. 
Disponível em: DECLARAÇÃO AMERICANA DOS DIREITOS E DEVERES DO HOMEM (Aprovada na Nona Conferência Internacional Americana Bogotá, 1948)https://www.cidh.oas.org/Basicos/Portugues/b.Declaracao_Americana.htm - grifos originais
A primeira parte do Preâmbulo demonstra claramente a preocupação em definir a dignidade humana como algo que deve ser presente em paridade a todos os indivíduos e, para tal, deve haver a colaboração destes.
No que diz respeito ao direito à moradia, destaca-se o artigo XI
da Declaração:
          Artigo XI.  Toda pessoa tem direito a que sua saúde seja resguardada por medidas sanitárias e sociais relativas à alimentação, roupas, habitação e cuidados médicos correspondentes ao nível permitido pelos recursos públicos e os da coletividade. Disponível em: DECLARAÇÃO AMERICANA DOS DIREITOS
E DEVERES DO HOMEM (Aprovada na Nona Conferência Internacional Americana,
Bogotá, 1948) https://www.cidh.oas.org/Basicos/Portugues/b.Declaracao_Americana.htm - grifos originais
 Na mesma linha de raciocínio dos outros Tratados Internacionais já mencionados no trabalho, A Declaração Americana dos Direitos e Deveres dos homens também coloca o direito a habitação (entenda-se habitação em seu sentido lato, alcançando os conceitos de moradia, lar e etc.) lado a lado com outras necessidades que devem ser garantidas à luz do principio da dignidade humana.
Outro tratado ratificado pelo Brasil é o Pacto Internacional dos Direitos Civis e políticos ou PIDCP. Aprovado em 16 de dezembro de 1966, compondo a Carta Internacional dos Direitos Humanos junto com a Declaração Universal dos Direitos Humanos e o Pacto Internacional dos Direitos Económicos Sociais e Culturais é um Pacto que muito se assemelha com o PIDESC (Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais), ambos os documentos possuem preâmbulo e sua “Parte I” é composto de apenas um artigo, o qual se encontra direcionado à livre autonomia que os povos devem possuir para definir sua politica, sua economia, aspectos de sua sociedade e da sua cultura, sempre observando os institutos que cerceiam a dignidade humana. (rodapé - http://oas.org/dil/port/1966%20Pacto%20Internacional%20sobre%20Direitos%20Civis%20e%20Pol%C3%ADticos.pdf)
O tratado foi recepcionado pelo ordenamento brasileiro mediante o Decreto nº 592 de 6 de julho de 1992:
    O PRESIDENTE DA REPÚBLICA, no uso da atribuição que lhe confere o art. 84, inciso VIII, da Constituição, e
    Considerando que o Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos foi adotado pela XXI Sessão da Assembléia-Geral das Nações Unidas, em 16 de dezembro de 1966;
    Considerando que o Congresso Nacional aprovou o texto do referido diploma internacional por meio do Decreto Legislativo n° 226, de 12 de dezembro de 1991;
    Considerando que a Carta de Adesão ao Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos foi depositada em 24 de janeiro de 1992;
    Considerando que o pacto ora promulgado entrou em vigor, para o Brasil, em 24 de abril de 1992, na forma de seu art. 49, § 2°;
    DECRETA:
    Art. 1° O Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos, apenso por cópia ao presente decreto, será executado e cumprido tão inteiramente como nele se contém.
    Art. 2° Este Decreto entra em vigor na data de sua publicação.
    Brasília, 06 de julho de 1992; 171° da Independência e 104° da República.
Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/1990-1994/D0592.htm
Em se tratando especificamente do direito à moradia e as garantias individuais, tem-se o artigo 17 e o artigo 18 do referido Pacto:
Artigo 17 §1. Ninguém poderá ser objeto de ingerências arbitrárias ou ilegais em sua vida privada, em sua família, em seu domicílio ou em sua correspondência, nem de ofensas ilegais à sua honra e reputação. §2. Toda pessoa terá direito à proteção da lei contra essas ingerências ou ofensas. 
Artigo 18 §1. Toda pessoa terá direito à liberdade de pensamento, de consciência e de religião. Esses direito implicará a liberdade de Ter ou adotar uma religião ou crença de sua escolha e a liberdade de professar sua religião ou crença, individual ou coletivamente, tanto pública como privadamente, por meio do culto, da celebração de ritos, de práticas e do ensino. §2. Ninguém poderá ser submetido a medidas coercitivas que possam restringir sua liberdade de Ter ou de adotar uma religião ou crença de sua escolha. §3. A liberdade de manifestar a própria religião ou crença estará sujeita a penas às limitações previstas em lei e que se façam necessárias para proteger a segurança, a ordem, a saúde ou a moral públicas ou os direitos e as liberdades das demais pessoas. §4. Os Estados-partes no presente Pacto comprometem-se a respeitar a liberdade dos pais - e, quando for o caso, dos tutores legais – de assegurar aos filhos a educação religiosa e moral que esteja de acordo com suas próprias convicções.
Disponível em: http://oas.org/dil/port/1966%20Pacto%20Internacional%20sobre%20Direitos%20Civis%20e%20Pol%C3%ADticos.pdf – grifos originais
O artigo 17, §1º e § 2º encontra-se em sintonia com os ditos nos artigos dos outros Tratados abordados neste capítulo sobre o assunto. Assim como os demais, está no sentido de que nenhuma pessoa será alvo de arbitrariedade, ou abuso, ou excessos, ou ingerências no que diz respeito à sua vida privada, ou sua família, ou seu domicilio e etc. e se por um fato, um desses aspectos vir a ser violado, a lei deve proteger seu direito contra as ofensas. O artigo 18, §1º trata de outras questões que não estão necessariamente ligadas ao direito à moradia, porém se traduzem como garantias pessoais que devem ser observadas à luz do princípio da dignidade humana.
Conclui-se que a noção de moradia e habitação é tão antiga quanto a história da humanidade. Desde a Antiguidade, os homens se utilizam de tais conceitos como forma de proteção, a qual varia de acordo com a época em que se insere. 
Os primeiros registros humanoides que chamam atenção para a questão, se dão à época do desenvolvimento das plantações e da criação de animais, na qual o homem deixou de ser um ser nômade e se tornou uma espécie que começava a se fixar em locais estratégicos determinados, onde se teria acesso facilitado à água, comida e proteção, a partir desse momento, têm o surgimento das habitações e, posteriormente, o das cidades. Nota-se que a ideia de uma habitação, ou moradia, ou lar, surge com a ideia de se fixar para buscar conforto, proteção, segurança.
Nas sociedades posteriores a esse período, tem-se registros que a ideia de moradia estaria ligada à proteção, como por exemplo, na Roma Antiga, onde surgiu a tradição de inviolabilidade do lar quando a lareira estivesse acessa para se venerar os Deuses, apenas podendo ser retirada do recinto quando tal ritual tivesse fim. 
No Renascimento, também existiam direitos e institutos que protegiam como o dito Contrato Social de Rousseau e a Limitação à Monarquia (e consequentemente, ao Absolutismo e suas ideias) de Locke, juntamente com a ideia de Proteção à Propriedade e dos Direitos das Massas com a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão.
O Homestead Act, em 1862 também foi bastante importante para o desenvolvimento e entendimento destas garantias na América.
 Todos esses conceitos influenciaram de forma significativa os tratados e ordenamentos que estariam por vir no século XX, principalmente Pós Guerra Mundial, onde se observou uma necessidade enorme de proteger os direitos humanos. Por causa disso, o século XX foi o chamado Século dos Tratados Internacionais.
A Declaração Universal dos Direitos Humanos, o Pacto San José da Costa Rica, o PIDESC, entre outros tratados escritos em meados do dito século, foram importantíssimos para a evolução dos Direitos Humanos, tornando-os universais, sobretudo o Direito à Moradia, objeto do presente trabalho, o assegurando e o garantindo contra qualquer violação injustificada.
Todo esse processo de desenvolvimento dos Direitos Humanos, sobretudo no que diz respeito ao Direito à Moradia, foi crucial para a noção e proteção destes no ordenamento jurídico brasileiro atual.
1.2– A Teoria do Patrimônio Mínimo de Edson Fachin
Luiz Edson Fachin nasceu no município de Rondinha no Rio Grande do Sul no ano de 1958. Mudou-se para Curitiba e lá cursou direito na Universidade Federal do Paraná, tornou-se advogado e construiu sua vida particular e pessoal na capital paranaense.
Posteriormente, adquiriu os títulos de mestre e doutor pela Pontifica Universidade de São Paulo, ou PUC-SP.
Além disso, possui o título de pós-doutorado fora do país, mais precisamente no Canadá.
Além dos ditos títulos, sua vida profissional internacional acumula funções como: professor convidado do Dickson Poon Law School e na Espanha, lecionou na Universidad Pablo de Olavide, na cidade de Sevilha (rodapé https://medium.com/@FachinSim/luiz-edson-fachin-ae48412949b3). Ainda, segundo o site Medium.com, o atual ministro do STF:
[...] é professor titular de Direito Civil da Universidade Federal do Paraná (UFPR), instituição da qual já foi diretor.
Também exerceu a função de coordenador da área de Pós-Graduação em Direito junto à CAPES/MEC e também de docente do curso Pós-Graduação da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ).
Além da experiência acadêmica e da advocacia atuante, Luiz Fachin se destaca como membro-árbitro de diversas Câmaras Arbitrais, no Brasil e no exterior.
O Jurista integra, ainda, a Academia Brasileira de letras Jurídicas, a Academia Brasileira de Direito Constitucional e a Academia Brasileira de Direito Civil, além do Instituto dos Advogados Brasileiros (IAB).
Ele fez parte, também, da comissão do Ministério da Justiça que discutiu a reforma do Judiciário. Também foi colaborador, no Senado Federal, do grupo que elaborou o novo Código Civil Brasileiro.
É autor de diversas obras, ensaios e artigos jurídicos.
Disponível em: https://medium.com/@FachinSim/luiz-edson-fachin-ae48412949b3
.Desde meados de 1980 atua como advogado e fez seu nome na área de Direito Civil e de Direito de Família. Em 14 de abril de 2015, foi indicado para ser Ministro do Supremo Tribunal Federal pela então Presidente da República Dilma Rousseff. Por ser tão conhecido e renomado, sua indicação havia sido apoiada por diversos Ministros do STF e por vários juristas, entre estes últimos, o constitucionalista Paulo Bonavides (rodapé https://www.conjur.com.br/2015-abr-27/juristas-assinam-carta-apoio-indicacao-fachin-supremo Consultor Jurídico. 27 de abril de 2015. Consultado em 13 de maio de 2015) já citado no presente trabalho.
Sua contribuição para o Direito é inegável, autor de diversas obras e artigos reconhecidos no âmbito nacional e internacional, principalmente no que diz respeito à seara do Direito Civil. Especialmente, a obra Estatuto jurídico do patrimônio mínimo, deve ser levada em consideração em qualquer discussão sobre temas que envolvem “Patrimônio”, “Direitos Humanos” e “Moradia”.
A respeito da Teoria do Patrimônio Mínimo de Edson Fachin, tem-se a opinião do ilustre Alberto de Mendonça Filho:
Esta teoria não tem o interesse de atacar a propriedade privada nem o direito creditício, mas afasta o caráter patrimonial das relações jurídicas privadas. O intuito é remodelar estes institutos e adequá-las às novas premissas do Direito Civil, determinando que os mesmos não se sobreponham à dignidade do indivíduo. ALBERTO DE MENDONÇA DE MELO FILHO https://www.conjur.com.br/2017-fev-08/alberto-mendonca-estatuto-patrimonio-minimo-protege-dignidade
Em suma, em sua obra, Fachin defende a tese de que todo e qualquer indivíduo deve ter garantido um “patrimônio mínimo”, o qual o Estado não pode o alcançar ao invadir a esfera pessoal deste:
A ausência de patrimônio não permite, nem de longe, inferir a invalidade dos postulados aqui sustentados em favor de pessoa. A falta de objeto patrimonial não pode (nem deve jamais) acarretar o não comparecimento da pessoa ao estatuto de sujeito. Não há pecúnia nem patrimônio que mensurem a dignidade, esta é sempre imensurável. A constatação daquela ausência é, por si só, ainda que paradoxalmente, o atestado de uma presença, coerente com uma concepção aberta do fenômeno jurídico. (pág. 310).
Em outras palavras, na sua teoria, o ministro do STF afirma que o Estado, mediante seu ordenamento jurídico, deve garantir um mínimo existencial ao indivíduo, mínimo este que esteja em sintonia com o princípio da dignidade humana e com aqueles que o cerceiam. Apesar de admitir que este conceito de patrimônio mínimo é mutável, de acordo com o patrimônio do individuo, este seria universal no sentido de que atinge e deve ser observado por todos, sem distinção:
A guarida a essa esfera patrimonial básica acentua a consideração de valores que denotam interesses sociais incidentes sobre as titularidades. Tais valores recaem, ainda que de modo diverso, sobre a posse e a propriedade. Não se trata apenas de voltar a reconhecer que o trabalho justifica o patrimônio. T rata-se, isso sim, de ressaltar que a titularidade das coisas não pode ser um fim em si mesmo.
Conferir guarida a patrimônio que, minimamente, garanta a sobrevivência de alguém não é proceder que deva relegar a preocupação com aqueles que, no Brasil, nada ou pouquíssimo tem. Tal estatuto de proteção porta a mesma base de ideias dessa tormentosa questão, ainda que não confunda com os mecanismos de acesso aos bens (p. 305-306)
Conclui-se que, a teoria do Patrimônio Mínimo de Fachin, defende a dignidade humana do individuo mediante a proteção do patrimônio, pois para o autor, este princípio só seria garantido e respeitado se o ordenamento jurídico do Estado assegurasse de alguma forma, um patrimônio mínimo: 
Conexão com a dignidade humana: A tese encontra-se conexionada ao principio da dignidade humana, de foro constitucional, diretriz fundamental para guiar a hermenêutica e a aplicação do Direito, e para nortear o rumo do presente trabalho. A reflexão sobre o patrimônio pode (e deve) estender-se em dois horizontes complementares: o primeiro, aquele que supere o limite individual da guarida e abrace a coletividade; o segundo, aquele que voe do presente para alcançar o futuro, mesmo que em incerta e improvável utopia. (p.308)
Dessa forma, o Estado não teria embasamentos para atingir a totalidade da esfera privada do indivíduo, pois estaria violando um dos princípios mais significativos e protegidos, o já mencionado princípio da dignidade humana, princípio que serve de base para a tese desenvolvida por Fachin.
2. A PROTEÇÃO LEGAL DO BEM DE FAMÍLIA 
A origem do instituto Bem de Família, legalmente, teve início no Texas, Estados Unidos, mediante o mencionado Homestead Act. Também chamado de “Lei da Propriedade Rural”, estabelecida no ano de 1839, pelo então Presidente dos Estados Unidos Abraham Lincoln.
O objetivo primário do ato, não era proteger uma determinada porção de terra cultivada, na verdade, sua preocupação era movimentar a economia americana, aproveitando-se dos interesses de imigrantes como a busca pelo lucro para atrai-los a uma área pouco explorada economicamente até aquele momento, o Oeste do país, mais precisamente no Estado do Texas e, sobretudo, devido a uma crise instalada no país neste período.
O que ocorreu em meados do século XIX foi uma crise sem precedentes, acarretando a falência de vários bancos e um prejuízo gigantesco à época para os cofres americanos. Não apenas os banqueiros sofreram com a crise, mas também diversas famílias que acabaram por ter os seus bens penhorados para o Estado garantir a sua recuperação financeira.
Neste contexto de crise, criou-se o Homestead Exemption Act, com o escopo de resolver os dois problemas que assolavam o norte da América: reverter a crise econômica instaurada no país, atraindo imigrantes de todos os lugares do mundo, pois teriam garantia de que poderiam manter os seus bens e proteger as famílias americanas, que nada tinham a ver com o caos econômico, de terem os seus bens penhorados a favor do Estado para equilibrar as finanças do país. A forma encontrada para proteger tais bens, foi tornando-os impenhoráveis. Entretanto, não era qualquer bem que entraria neste contexto, mas sim apenas aqueles que eram destinados à moradia e suas benfeitorias:
De e após a passagem desta lei, será reservado a todo cidadão ou chefe de uma família, nesta República, livre e independente do poder de um mandado de fieri facias ou outra execução, emitido por qualquer Corte de jurisdição competente, 50 acres de terra, ou um terreno na cidade, incluindo o bem de família
dele ou dela, e melhorias que não excedam a 500 dólares, em valor, todo mobiliário e utensílios domésticos, provendo para que não excedam o valor de 200 dólares, todos os instrumentos (utensílios, ferramentas) de lavoura (providenciando para que não excedam a 50 dólares), todas ferramentas, aparatos e livros pertencentes ao comércio ou profissão de qualquer cidadão, cinco vacas de leite, uma junta de bois para o trabalho ou um cavalo, vinte porcos e provisões para um ano; e todas as leis ou partes delas que contradigam ou se oponham aos preceitos deste ato, são ineficazes perante ele. Que seja providenciado que a edição deste ato não interfira com os contratos entre as partes, feitos até agora (Digest of the Laws of Texas § 3.798).  RAINES, C. W. Enduring Laws of The Republic of Texas. Southwestern Historical Quarterly Online. Vol. 1. Disponível em <http://www.tsha.utexas.edu/publications/journals/shq/online/v001/n2/article_6.html> 
Em outras palavras, tal lei acabou por evitar que o país entrasse em colapso, pois ao garantir um mínimo para aqueles que se encontravam naquela situação de terror econômico, evitou que diversas famílias, literalmente, falissem e, por outro lado, acabou atraindo imigrantes, pois apesar de saber que o país passava por dificuldades, também tinham conhecimento de que, ali, estaria garantido condições para se manter. Condições estas que em muitos dos casos, tais estrangeiros não tinham em seus países de origem.
Estas noções primárias sobre o instituto que viria a ser chamado de Bem de Família acabaram por respingar, posteriormente, no Brasil. Sendo observado, praticamente em todos os ordenamentos que se estabeleceram após este período.
2.1 – Conceito e Princípios e Classificação do instituto Bem de família
O Bem de Família estabelecido no ordenamento jurídico brasileiro, se não teve origem propriamente dita no Homestead Act, este foi, sem sombra de dúvidas, crucial para o instituto no Brasil.
Apesar de, atualmente, estar consolidados as ideias e os conceitos que cerceiam o instituto do “Bem de Família”, seu estabelecimento nas leis tupiniquins se deu de forma gradativa e, sobretudo lenta. 
O primeiro registro do instituto no Brasil, pode-se dizer que foi através do Regulamento 737, em 25 de novembro de 1850 (rodapé AZEVEDO, Álvaro Villaça. Bem de família e a Lei 8.009/90. 5. ed. São Paulo: RT, 2002, p. 25.):
Art. 530. São sujeitos á penhora, não havendo absolutamente outros bens:
§1.º As sagradas Imagens e ornamentos de altar si forem de grande valor.
§ 2.º O vestuario que os empregados publicos usam no exercicio das suas funcções.
§ 3.º Os livros dos Juizes, Professores, Advogados e estudantes.
§ 4.º As machinas e instrumentos destinados ao ensino, pratica ou exercicio das artes liberaes e das sciencias.
§ 5.º Os fructos e rendimentos dos bens inalienaveis.
§ 6.º Os fundos liquidos que o executado possuir na companhia ou sociedade commercial a que pertencer (art. 292 Codigo).
Art. 531. Os bens especificados nos paragraphos seguintes só podem ser penhorados verificando-se as clausulas que nelles se contêm:
§ 1.º Os bens particulares dos socios por dividas da sociedade, depois de executados primeiramente todos os bens sociaes (art. 350 Codigo).
§ 2.º As machinas, escravos, bois, cavallos que forem effectiva e immediatamente empregados nas fabricas de mineração, assucar, lavoura de cannas, sendo penhorados juntamente com as mesmas fabricas (Lei de 30 de Agosto de 1833).
§ 3.º Os navios, guardada a disposição do art. 479 e seguintes do Codigo.
Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/historicos/dim/dim737.htm
No Regulamento, havia registros de artigos que isentavam da penhora alguns bens do devedor executado mediante determinadas condições, porém o Decreto não falava no domicílio especificamente, porém, sem questionamentos, foi o primeiro passo rumo ao “Bem de Família” que se tem nos dias atuais.
Vários autores trabalharam o conceito de Bem de família, Sílvio Venosa deduz que "constitui-se em uma porção de bens que a lei resguarda com os característicos de inalienabilidade e impenhorabilidade, em benefício da constituição e permanência de uma moradia para o corpo familiar" (rodapé VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil, 4.ª edição, Atlas, 2004, p. 356.)
Segundo Álvaro Villaça Azevedo, Bem de família é “um meio de garantir um asilo à família, tornando-se o imóvel onde a mesma se instala domicílio impenhorável e inalienável, enquanto forem vivos os cônjuges e até que os filhos completem sua maioridade”. Ainda, segundo o autor, é “é um patrimônio especial, que se institui por ato jurídico de natureza especial, pelo qual o proprietário de determinado imóvel, nos termos da lei, cria um benefício de natureza econômica, com escopo de garantir a sobrevivência da família, em seu mínimo existencial, como célula indispensável à realização da justiça social” (rodapé AZEVEDO, Álvaro Villaça. Bem de Família. 3. ed. São Paulo: RT, 1996, p. 107)
Maria Helena Diniz afirma que Bem de Família é “um instituto originário dos Estados Unidos, que tem por escopo assegurar um lar à família ou meios para seu sustento, pondo-a ao abrigo de penhoras por débitos posteriores à instituição, salvo as que provierem de tributos relativos ao prédio, ou de despesas condominiais.” (rodapé DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro, 5º vol. 17 ed. São Paulo: Saraiva, 2002.
Para Caio Mário, Bem de Família é:
 [...] uma forma de afetação de bens a um destino especial, que é ser a residência da família e, enquanto for, é impenhorável por dívidas posteriores à sua constituição, salvo as provenientes de impostos devidos pelo próprio prédio. Instituições de Direito Civil. Vol IV. Direito de Família. 2004. P. 557
Assim, Bem de Família pode ser entendido como um instituto, cujo escopo é assegurar meios ao seio familiar para a sua sobrevivência, preservando um mínimo de dignidade humana, sendo seu principal objetivo o de impedir que o imóvel sofra com qualquer constrição judicial, desde que este obedeça os requisitos estabelecidos por Lei.
Ainda segundo Caio Mário (2010, p. 602), no que diz respeito à natureza jurídica “a instituição do bem de família é uma forma de afetação de bens a um destino especial que é ser a residência da família, e, enquanto for, é impenhorável por dívidas posteriores à sua constituição, salvo as provenientes de impostos devidos pelo próprio prédio.” (rodapé - PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direitos Civil.18.ed. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2010).
No que diz respeito aos princípios aplicados ao Bem de Família, o mais importante e o que mais embasou a criação do instituto foi o principio da Dignidade Humana. É tão substancial tal principio que, pode-se dizer que ele é o mais universal de todos os existentes, em outras palavras, é um “macro princípio” no qual estão inseridos todos os demais, como: liberdade, autonomia privada, cidadania, igualdade e diversos outros princípios éticos. (DIAS, 2010) (rodapé: DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. 7.ed. São Paulo: Revistas dos tribunais, 2010.)
O princípio da dignidade humana, segundo Flávia Piovesan é (2004, p. 54): 
A dignidade da pessoa humana, (...) está erigida como princípio matriz da Constituição, imprimindo-lhe unidade de sentido, condicionando a interpretação das suas normas e revelando-se, ao lado dos Direitos e Garantias Fundamentais, como cânone constitucional que incorpora “as exigências de justiça e dos valores éticos, conferindo suporte axiológico a todo o sistema jurídico brasileiro.
Ainda, a autora afirma que (2004, p. 92):
É no valor da dignidade da pessoa humana que a ordem jurídica encontra seu próprio sentido, sendo seu ponto de partida e seu ponto de chegada, na tarefa de interpretação normativa. Consagra-se, assim, dignidade da pessoa humana como verdadeiro super princípio a orientar o Direito Internacional e o Interno. PIOVESAN, Flávia. Direitos Humanos, O Princípio da dignidade da pessoa humana e a Constituição de 1988, 2004.
Ingo Wolfgang Sarlet, em sua obra, também fala a respeito do princípio da Dignidade Humana (2001, p. 60): 
Temos por dignidade da pessoa humana a qualidade intrínseca e distintiva de cada ser humano que o faz merecedor do mesmo respeito e consideração por parte do Estado e da comunidade, implicando, neste sentido, um complexo de direitos e deveres fundamentais que assegurem a pessoa tanto contra todo e qualquer ato de cunho degradante e desumano, como venham a lhe garantir as condições existenciais mínimas para uma vida saudável, além de propiciar e promover sua participação ativa co-responsável nos destinos da própria existência e da vida em comunhão dos demais seres humanos. SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitos fundamentais. 2ª ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2001.
Dessa forma, o princípio da Dignidade Humana, devido à sua importância, acabou sendo considerado com princípio fundamental, sendo gravado como tal pelo artigo 1º, inciso III da Constituição Federal de 1988:
PREÂMBULO
Nós, representantes do povo brasileiro, reunidos em Assembléia Nacional Constituinte para instituir um Estado Democrático, destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução pacífica das controvérsias, promulgamos, sob a proteção de Deus, a seguinte CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL.
TÍTULO I: Dos Princípios Fundamentais
Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:
I - a soberania;
II - a cidadania
III - a dignidade da pessoa humana;
IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa;
V - o pluralismo político.
Parágrafo único. Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição.
Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm - grifos originais
Nesta linha, Alberto Mendonça de Melo Filho afirma que os Direitos Fundamentais são aqueles inerentes ao homem que constam em um ordenamento jurídico. Estas garantias surgiram com o escopo de proteger o indivíduo do Estado, como por exemplo o princípio da Dignidade Humana, no qual deve-se garantir uma vida digna. (MELO FILHO, 2017) rodapé - MELO FILHO, Alberto Mendonça de. Ao equalizar execuções, Estatuto do Patrimônio Mínimo protege dignidade. 2017. Disponível em: . Acesso em 20 ago. 2017.
Dessa forma, a Dignidade Humana é, expressamente, um princípio constitucional fundamental e, assim, deve ser protegido pelo ordenamento jurídico e observado por todos os indivíduos sujeitos a este último. Neste sentido, têm-se os julgados do Supremo Tribunal Federal: 
(...) o postulado da dignidade da pessoa humana, que representa - considerada a centralidade desse princípio essencial (CF, art. 1º, III) - significativo vetor interpretativo, verdadeiro valor-fonte que conforma e inspira todo o ordenamento constitucional vigente em nosso País e que traduz, de modo expressivo, um dos fundamentos em que se assenta, entre nós, a ordem republicana e democrática consagrada pelo sistema de direito constitucional positivo (...). (HC 95464, Relator(a): Min. CELSO DE MELLO, Segunda Turma, julgado em 03/02/2009, DJe-048 DIVULG 12-03-2009 PUBLIC 13-03-2009 EMENT VOL-02352-03 PP-00466)
E do Tribunal Superior do Trabalho:
“AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA. EXECUÇÃO. BEM DE FAMÍLIA. PESSOA SOLTEIRA. ENTIDADE FAMILIAR. NÃO-COMPROVAÇÃO DO BEM COMO ÚNICO IMÓVEL NO PATRIMÔNIO DA PARTE. São impenhoráveis os bens de família, na forma do art. 1º da Lei 8009/90, entendendo-se como bem de família o único imóvel adquirido pelo casal ou entidade familiar para fins de residência permanente. A jurisprudência dominante no ordenamento jurídico, consubstanciada na Súmula 364/STJ, entende que a pessoa solteira, ou a que mora sozinha, constitui unidade familiar, para fins de caracterização do imóvel como bem de família. Constituindo-se a pessoa solteira ou que mora sozinha como entidade familiar, ilegal se torna a execução que recai sobre seu imóvel residencial. Nesse sentido, entende-se por imóvel residencial a única propriedade utilizada pelo casal ou pela entidade familiar para moradia permanente (art. 5º da Lei 8009/90). Portanto, a pessoa solteira, considerada pela jurisprudência como entidade familiar, possui a prerrogativa da impenhorabilidade de seu imóvel residencial, desde que a referida residência seja comprovadamente o único imóvel destinado à moradia em seu patrimônio . Consignando o Tribunal Regional, contudo, que não há nos autos a comprovação de que a residência sobre a qual recai a execução seja utilizada como moradia permanente, não se há falar em impenhorabilidade do bem, nem em violação do direito à moradia insculpido no art. 6º da CF. Assim, ainda que por fundamento diverso do utilizado pelo Tribunal Regional, não merece prosseguimento o recurso de revista. Agravo de instrumento desprovido.” (TST- AIRR: 2054 2054/1998-050 - 01 – 40.8, Relator: Mauricio Godinho Delgado, Data de julgamento: 25/11/2009, 6ª turma, Data de Publicação: 04/12/2009) (BRASIL, 2009).
No julgamento da 6ª Turma do Tribunal Superior do Trabalho, inclusive, além de prestigiar o princípio da Dignidade Humana, faz-se menção ao princípio da Moradia, confirmando que os dois princípios encontram-se intimamente ligados.
Quanto à classificação do Bem de Família, o próprio ordenamento jurídico brasileiro o classifica em: Bem de Família Voluntário e Bem de Família Legal. A lei 8.009/90 dispõe sobre o Bem de Família Legal e o Código Civil de 2002, dispõe acerca do Bem de Família voluntário, ou facultativo em seus artigos 1.711 e 1.712.
O Bem de Família Involuntário surgiu a partir da Lei 8.009 de 1990, em seu artigo 1º:
Art. 1º O imóvel residencial próprio do casal, ou da entidade familiar, é impenhorável e não responderá por qualquer tipo de dívida civil, comercial, fiscal, previdenciária ou de outra natureza, contraída pelos cônjuges ou pelos pais ou filhos que sejam seus proprietários e nele residam, salvo nas hipóteses previstas nesta lei.  
Parágrafo único. A impenhorabilidade compreende o imóvel sobre o qual se assentam a construção, as plantações, as benfeitorias de qualquer natureza e todos os equipamentos, inclusive os de uso profissional, ou móveis que guarnecem a casa, desde que quitados. (http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L8009.htm)  
Conforme Carlos Roberto Gonçalves define-se Bem de Família Obrigatório como uma modalidade criada pelo próprio Estado (2011 p.589):
 [é] instituidor dessa modalidade o próprio Estado, que a impõe por norma de ordem pública em defesa do núcleo familiar, independe de ato constitutivo e, portanto, de registro no Registro de Imóveis. Rodapé GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro: Direito de Família. 8 ed. São Paulo: Saraiva, 2011.
Esta classificação de Bem de Família é definida pelo Estado, ou seja, a própria Lei estabelece o que é Bem de Família independentemente da vontade da entidade familiar. Dessa forma, nenhum imóvel da família poderá ser alvo de penhora, desde que nele residam. Entretanto, tal resguardo não é absoluto, a própria Lei trás exceções para a impenhorabilidade estabelecida por ela:
Art. 2º Excluem-se da impenhorabilidade os veículos de transporte, obras de arte e adornos suntuosos.
Parágrafo único. No caso de imóvel locado, a impenhorabilidade aplica-se aos bens móveis quitados que guarneçam a residência e que sejam de propriedade do locatário, observado o disposto neste artigo.
Art. 3º A impenhorabilidade é oponível em qualquer processo de execução civil, fiscal, previdenciária, trabalhista ou de outra natureza, salvo se movido:
I - em razão dos créditos de trabalhadores
da própria residência e das respectivas contribuições previdenciárias;           (Revogado pela Lei Complementar nº 150, de 2015)
II - pelo titular do crédito decorrente do financiamento destinado à construção ou à aquisição do imóvel, no limite dos créditos e acréscimos constituídos em função do respectivo contrato;
III -- pelo credor de pensão alimentícia;
III – pelo credor da pensão alimentícia, resguardados os direitos, sobre o bem, do seu coproprietário que, com o devedor, integre união estável ou conjugal, observadas as hipóteses em que ambos responderão pela dívida;        (Redação dada pela Lei nº 13.144 de 2015)
IV - para cobrança de impostos, predial ou territorial, taxas e contribuições devidas em função do imóvel familiar;
V - para execução de hipoteca sobre o imóvel oferecido como garantia real pelo casal ou pela entidade familiar;
VI - por ter sido adquirido com produto de crime ou para execução de sentença penal condenatória a ressarcimento, indenização ou perdimento de bens.
VII - por obrigação decorrente de fiança concedida em contrato de locação.         (Incluído pela Lei nº 8.245, de 1991)
Art. 4º Não se beneficiará do disposto nesta lei aquele que, sabendo-se insolvente, adquire de má-fé imóvel mais valioso para transferir a residência familiar, desfazendo-se ou não da moradia antiga.
§ 1º Neste caso, poderá o juiz, na respectiva ação do credor, transferir a impenhorabilidade para a moradia familiar anterior, ou anular-lhe a venda, liberando a mais valiosa para execução ou concurso, conforme a hipótese.
§ 2º Quando a residência familiar constituir-se em imóvel rural, a impenhorabilidade restringir-se-á à sede de moradia, com os respectivos bens móveis, e, nos casos do art. 5º, inciso XXVI, da Constituição, à área limitada como pequena propriedade rural.
Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L8009.htm
Assim, o Bem de Família Legal não atinge os adornos suntuosos, os que moverem processo nas condições do artigo 3º e nem os insolventes.
Pode-se afirmar, então, que o Bem de Família Legal é automático, ou seja, possui uma proteção imediata da Lei, independe da vontade dos titulares e independe de registros para incidir.
O Bem de Família Voluntário (ou facultativo, ou convencional), é aquele que não incorre nas hipóteses da Lei 8.009/90 porém a Lei abre margem para a entidade familiar inserir bens nesta proteção que o instituto oferece, é estabelecido nos artigos 1.711 e 1.712 do Código Civil de 2002 no subtítulo IV, com a seguinte redação:
 SUBTÍTULO.IV
Do Bem de Família
Art. 1.711. Podem os cônjuges, ou a entidade familiar, mediante escritura pública ou testamento, destinar parte de seu patrimônio para instituir bem de família, desde que não ultrapasse um terço do patrimônio líquido existente ao tempo da instituição, mantidas as regras sobre a impenhorabilidade do imóvel residencial estabelecida em lei especial.
Parágrafo único. O terceiro poderá igualmente instituir bem de família por testamento ou doação, dependendo a eficácia do ato da aceitação expressa de ambos os cônjuges beneficiados ou da entidade familiar beneficiada.
Art. 1.712. O bem de família consistirá em prédio residencial urbano ou rural, com suas pertenças e acessórios, destinando-se em ambos os casos a domicílio familiar, e poderá abranger valores mobiliários, cuja renda será aplicada na conservação do imóvel e no sustento da família
Disponível em: http://www.planalto.gov.br/CCivil_03/leis/2002/L10406.htm.
Seguindo o raciocínio, Gonçalves (2012, p. 352) afirma que:
Diante disso, é possível entender que só será possível a instituição do bem de família voluntário quando a entidade familiar ou o casal possuir mais de um imóvel residencial e não deseja que a impenhorabilidade recaia sobre o de menor valor. Assim, deverá estabelecer o bem de família mediante escritura pública e escolher um imóvel de maior valor para se tornarem impenhorável, conforme art. 1714 do CC/2002. (Rodapé GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro. 11.ed. São Paulo: Saraiva, 2012.)
Neste sentido, deduz Azevedo (2010):
O bem de família voluntário é um meio de garantir um asilo para a família, e torna o domicílio onde a família se instala impenhorável e inalienável, enquanto os cônjuges forem vivos e os filhos completarem a sua maioridade (rodapé AZEVEDO, Álvaro Villaça. Bem de família: com comentários a Lei 8.009/90. São Paulo: Atlas, 2010.).
Dessa forma, o Bem de Família Facultativo pode ser definido pelos cônjuges, ou até mesmo a entidade familiar, mediante escritura pública ou testamento. Entretanto o patrimônio, que passará a ser protegido como tal pela Lei especial vigente desde 1990, não pode ultrapassar um terço do patrimônio líquido da entidade familiar. A disciplina ainda abre a possibilidade de um terceiro instituir o Bem de Família:
Art. 1.714. O bem de família, quer instituído pelos cônjuges ou por terceiro, constitui-se pelo registro de seu título no Registro de Imóveis.
Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/2002/L10406.htm
Ainda, o Código Civil de 2002, apesar de trazer uma espécie de Bem de Família que difere a trazida pela Lei 8.009/90, não a exclui, pelo contrário, trás inclusive uma extensão da proteção estabelecida pela última, ao afirmar, em seu artigo 1.712 que o instituto poderia alcançar tanto valores mobiliários como o valor do imóvel. Caio Mario da Silva Pereira, neste sentido, deduz que (2010, p. 609):
Não se pode afastar a incidência dos benefícios da lei especial se o bem tiver sido instituído, também, na forma do Código Civil. Nada obsta que a impenhorabilidade prevista nos dois diplomas legais incida sobre o mesmo imóvel. PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direitos Civil.18.ed. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2010.
Assim, é notório que os dois tipos de Bem de Família existem concomitantes dentro do ordenamento jurídico brasileiro, porém com algumas diferenças.
Além das dissemelhanças já citadas, o STJ, publicou a Súmula 205:
SÚMULA 205-
A LEI 8.009/90 APLICA-SE A PENHORA REALIZADA ANTES DE SUA VIGENCIA.
Data da Publicação - DJ 16.04.1998 p. 43
Disponível em: http://www.coad.com.br/busca/detalhe_16/2051/Sumulas_e_Enunciados
Por meio da Súmula editada em 1998, fica claro que o Bem de Família Legal possui efeito ex tunc, ou seja, poderia atingir penhoras que já estariam realizadas antes mesmo da vigência da Lei 8.009 de 1990. Em contrapartida, o Bem de Família Voluntário teria efeito ex nunc, ou seja, teria a proteção de dividas posteriores à sua instituição, em sintonia com o artigo 1.715 do Código Civil de 2002:
Art. 1.715. O bem de família é isento de execução por dívidas posteriores à sua instituição, salvo as que provierem de tributos relativos ao prédio, ou de despesas de condomínio.
Parágrafo único. No caso de execução pelas dívidas referidas neste artigo, o saldo existente será aplicado em outro prédio, como bem de família, ou em títulos da dívida pública, para sustento familiar, salvo se motivos relevantes aconselharem outra solução, a critério do juiz.
Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/2002/L10406.htm
Neste sentido, o Supremo Tribunal de Justiça também edificou o entendimento de que o Bem de Família deve abranger a entidade familiar em seu sentido lato, mediante a Súmula 364:
Súmula: 364
O conceito de impenhorabilidade de bem de família abrange também o imóvel pertencente a pessoas solteiras, separadas e viúvas.
BRASIL, Superior Tribunal de Justiça. STJ - Súmula 364. Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 31 out. 2008. Disponivel em: <http://www.conteudojuridico.com.br/?artigos&ver=237.21501&seo=1>. Acesso em: 02 mar. 2018.
Assim, não importa a composição familiar, o bem estabelecido como Bem de Família pela Lei ou pela vontade das partes, receberá o resguardo do ordenamento. (CAVALCANTE, 2017) CAVALCANTE, Marcio André Lopes. Site Dizer o Direito. Disponível em: Acesso em: 01 março 2018.
Outra diferença entre os dois tipos de Bem de Família estabelecidos pelo ordenamento é lógica, no

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