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747 S E Ç Ã O V I O S I S T E M A U R I N Á R I O Capítulo 33 • Organização do Sistema Urinário ...... 749 Capítulo 34 • Filtração Glomerular e Fluxo Sanguíneo Renal ...... 767 Capítulo 35 • Transporte de Sódio e Cloreto ...... 782 Capítulo 36 • Transporte de Ureia, Glicose, Fosfato, Cálcio, Magnésio e Solutos Orgânicos ...... 797 Capítulo 37 • Transporte de Potássio ...... 821 Capítulo 38 • Concentração e Diluição da Urina ...... 835 Capítulo 39 • Transporte de Ácidos e Bases ...... 851 Capítulo 40 • Integração do Balanço de Água e Sal ...... 866 747 Página deixada intencionalmente em branco 749 C A P Í T U LO 3 3 O R G A N I Z A Ç Ã O D O S I S T E M A U R I N Á R I O Gerhard Giebisch e Erich Windhager Os rins desempenham três funções essenciais. Primeiro, eles removem produtos do metabolismo e toxinas do sangue e os eliminam na urina e, por essa razão, funcionam como filtros. Segundo, eles regulam o estado dos fluidos corporais, o balanço de eletrólitos e o equilíbrio acidobásico. Terceiro, os rins produ- zem ou ativam hormônios que estão envolvidos na eritropoiese, no metabolismo do Ca2+ e na regulação da pressão e do fluxo sanguíneos. ANATOMIA FUNCIONAL DO RIM Essa seção apresenta inicialmente uma visão macroscópica da estrutura renal e, em seguida, descreve o néfron, a unidade fun- cional microscópica que se repete aproximadamente um milhão de vezes em cada rim. Os rins são órgãos retroperitoneais pareados, formados por uma complexa associação de elementos vasculares e epiteliais Os rins humanos são estruturas pares, em forma de feijão, localizados atrás do peritônio em cada lado da coluna verte- bral (Fig. 33-1A). Eles se estendem desde a XII vértebra torá- cica até a III vértebra lombar. Os dois rins juntos perfazem menos de 0,5% do peso corporal total; nos homens, cada rim pesa entre 125 e 170 g, ao passo que nas mulheres cada rim pesa entre 115 e 155 g. Cada rim é coberto por uma cápsula fibrosa, praticamente não distensível (Fig. 33-1B). A região medial da superfície côncava renal apresenta uma fenda na cápsula, chamada hilo, que serve como porta de entrada para a artéria renal e nervos e como saída para a veia renal, vasos linfáticos e ureter. O hilo se abre para um espaço superficial chamado seio renal, que é completamente cercado por parênquima renal, exceto onde se conecta com a extremidade superior do ureter. O seio renal inclui os espaços preenchidos pela urina: a pelve renal propriamente dita, suas extensões e os cálices maior e menor. Os vasos sanguíneos e os nervos também passam pelo seio. A cápsula se dobra no seio renal, na região do hilo, de forma que suas camadas internas revestem o seio e suas camadas externas dão suporte aos vasos sanguíneos e à pelve renal. Uma secção do rim (Fig. 33-1B) revela basicamente duas camadas, o córtex (região granular externa) e a medula (região interna mais escura). A granulosidade do córtex se deve à pre- sença de tufos de capilares microscópicos chamados glomérulos e a um grande número de estruturas epiteliais altamente convo- lutas em forma de túbulos. A medula não possui glomérulos e consiste em um arranjo em paralelo de túbulos e pequenos vasos sanguíneos. A medula é subdividida em oito a 18 pirâmides renais côni- cas, cujas bases estão voltadas para a fronteira corticomedular e as extremidades terminam na pelve renal. No ápice de cada pirâmide, existem perfurações, praticamente invisíveis a olho nu, pelas quais a urina flui para os cálices menores do seio renal. Os rins são únicos por possuírem alto fluxo sanguíneo e capilares glomerulares ligados a arteríolas em ambas as extremidades Apesar de os rins perfazerem menos de 0,5% do peso corporal total, eles recebem ≈20% do débito cardíaco. Esse alto fluxo san- guíneo fornece o plasma sanguíneo necessário para a formação de um ultrafiltrado no glomérulo. A circulação renal tem uma sequência única de elementos vasculares: uma arteríola de alta resistência (a arteríola aferente), seguida por uma rede de capila- res glomerulares de alta pressão para filtração, seguida por uma segunda arteríola de alta resistência (a arteríola eferente), seguida por uma rede de capilares de baixa pressão que cerca os túbulos renais (capilares peritubulares) e retoma o fluido absorvido por esses túbulos. As principais características do sistema vascular renal estão ilustradas na Figura 33-1B e C. Uma única artéria renal entra no hilo e se divide em ramos anteriores e posteriores, que dão origem às artérias interlobares e, em seguida, às artérias arquea- das. As artérias arqueadas margeiam a junção corticomedular e se ramificam em artérias interlobulares ascendentes que entram no córtex e dão origem a numerosas arteríolas aferentes. Essas arteríolas se ramificam e dão origem aos capilares glomerulares, os quais se unem novamente para formar as arteríolas eferen- tes. As arteríolas eferentes dos néfrons corticais originam uma densa rede de capilares peritubulares que suprem de oxigênio e nutrientes os túbulos do córtex. As arteríolas aferentes e eferentes determinam a pressão hidrostática nos capilares glomerulares 750 Seção VI • O Sistema Urinário que se situam entre elas. O tônus de ambas as arteríolas está sob controle de uma rica inervação simpática e uma ampla variedade de mediadores químicos. Ramos muito pequenos da artéria arqueada (ou da porção proximal da artéria interlobular) suprem uma subpopulação de glomérulos justamedulares que estão localizados na junção corticomedular ou próximos dela. As arteríolas eferentes desses néfrons seguem em direção à papila renal, dando origem a vasos em formato de tubos em U, chamados de vasos retos, que for- mam uma rede de capilares que irrigam os túbulos na medula. Aproximadamente 90% do sangue que entra no rim perfunde os glomérulos superficiais e o córtex, ao passo que apenas ≈10% perfundem os glomérulos justamedulares e a medula. Os vasos linfáticos drenam o fluido intersticial do córtex e deixam o rim seguindo as artérias em direção ao hilo. A linfa presente no interior desses vasos pode conter altas concentrações de hormônios renais, como a eritropoietina (EPO). A ausência de vasos linfáticos na medula renal evita a drenagem da alta osmola- lidade do fluido intersticial medular, cuja existência é necessária para a produção de urina concentrada (Capítulo 38). A unidade funcional do rim é o néfron Cada rim contém entre 800.000 a 1.200.000 néfrons. Cada néfron é uma entidade independente até o ponto em que seu ducto coletor se funde com o ducto coletor de um ou mais néfrons. Figura 33-1 Estrutura do sistema urinário. B, Visão posterior do rim direito. 751Capítulo 33 • Organização do sistema urinário Um néfron é formado por um glomérulo e um túbulo. O glomérulo é um aglomerado de vasos sanguíneos a partir do qual se origina o filtrado de plasma. O túbulo é uma estrutura epitelial formada por muitas subdivisões, que converte o fil- trado glomerular em urina. Essas duas entidades — vascular e epitelial — se encontram no fundo cego do epitélio tubular, que é chamado de cápsula de Bowman ou de cápsula glome- rular. Essa cápsula circunda o glomérulo e contém o espaço de Bowman, o qual é contíguo com o lúmen tubular. É nesse espaço que o filtrado passa do sistema vascular para o sistema tubular. O restante do néfron consiste em subdivisões do túbulo (Fig. 33-2). Os elementos epiteliais do néfron incluem a cápsula de Bowman, o túbulo proximal, os ramos delgados descendente e ascendente da alça de Henle, o ramo espesso ascendente da alça de Henle, o túbulo convoluto distal e o túbulo conector. O túbulo conector, por sua vez, leva ao túbulo coletor inicial, túbulo coletor cortical e ductos coletores medulares. No interior do córtexrenal, como citado anteriormente, é possível distinguir duas populações de néfrons (Fig. 33-2). Os néfrons superficiais, que possuem alças curtas que se estendem até o limite entre a medula externa e interna, e os néfrons jus- tamedulares, que desempenham um papel especial na produção de urina concentrada e possuem alças longas que se estendem até a extremidade da medula. O corpúsculo renal possui três componentes: elementos vasculares, o mesângio e a cápsula e o espaço de Bowman O corpúsculo renal, local de formação do filtrado glomerular, é constituído pelo glomérulo, pelo espaço e pela cápsula de Bow- man. Durante o desenvolvimento do rim, a interação entre o botão uretérico — que dá origem ao sistema urinário desde os ductos coletores até os ureteres — e o mesênquima frouxo que o cerca (Fig. 33-3A) leva à ramificação do botão uretérico e à Figura 33-2 Estrutura do néfron. 752 Seção VI • O Sistema Urinário Figura 33-3 A-G, Desenvolvimento do glomérulo e da cápsula de Bowman. H, Lúmen capilar. As quatro principais camadas da barreira de filtração glomerular. I, Modelo de pedicelos (prolongamentos dos podócitos) e da membrana fenestrada. O diagrama mostra a nefrina e as outras proteínas da fenda diafragmática. (A-E modificada de Ekblom P: In Seldin DW, Giebisch G: The kidney, 2nd ed, pp 475-501. New York: Raven Press, 1992; H modificada de Kriz W, Kaissling B: In Seldin DW, Giebisch G [eds]: The kidney: Physiology and Pathophysiology, 3rd ed, pp 587-854. New York: Raven Press, 2000.) 753Capítulo 33 • Organização do sistema urinário condensação do mesênquima (Fig. 33-3B). Essas células conden- sadas se diferenciam em um epitélio que forma uma estrutura tubular oca em forma de S (Fig. 33-3C) e dá origem aos elementos tubulares do néfron entre a cápsula de Bowman e o segmento conector. A porção distal da estrutura tubular em forma de S se alonga e se conecta com ramificações do botão uretérico em desenvolvimento (Fig. 33-3D) ao mesmo tempo em que a extre- midade proximal cega desse túbulo em forma de S se une ao feixe vascular arterial, que, posteriormente, se desenvolve no tufo de capilares glomerulares. O adelgaçamento do epitélio em uma das extremidades do túbulo em forma de S leva à emergência da futura camada parietal da cápsula de Bowman. Em contraste, a camada visceral oposta se torna espessa e se une aos capila- res glomerulares (Fig. 33-3D). Essas células epiteliais viscerais aumentam de tamanho e se tornam os podócitos (Fig. 33-3E). No rim maduro, os capilares glomerulares são cobertos por prolongamentos dos podócito denominados de pedicelos (Fig. 33-3F). Esses podócitos são células epiteliais modificadas e representam a camada visceral da cápsula de Bowman. Além disso, essas células são contínuas com a camada parietal dessa mesma cápsula, a partir do polo vascular. O filtrado glomerular é drenado para o interior do espaço entre essas duas camadas (espaço de Bowman) e flui para o túbulo proximal no polo uri- nário do corpúsculo renal. A barreira de filtração glomerular formada entre o lúmen dos capilares glomerulares e o espaço de Bowman compreende quatro elementos com diferentes propriedades funcionais (Fig. 33-3G): (1) camada de glicocálice, que cobre a superfície luminal das células endoteliais; (2) células endoteliais; (3) membrana basal glomerular e (4) os podócitos epiteliais. O glicocálice possui glicosaminoglicanos carregados negativamente (Capítulo 2) que podem prevenir o vazamen- to de macromoléculas carregadas negativamente. As células endoteliais dos capilares glomerulares são quase que com- pletamente cercadas pela membrana basal glomerular e por uma camada formada pelos pedicelos, prolongamentos dos podócitos (Fig. 33-4). A exceção se encontra apenas em uma pequena região em direção ao centro do glomérulo, onde as células endoteliais não possuem membrana basal nem podócitos e ficam em contato direto com células mesangiais que possuem características similares às do músculo liso. A filtração ocorre longe das células mesangiais, na porção periférica da parede do capilar, a qual é coberta pela membrana basal e pelos podócitos. As células endoteliais contêm grandes fenestrações, fendas de 70 nm que não restringem o movimento de água e pequenos solutos — incluindo proteínas ou outras moléculas grandes — para fora do lúmen capilar (Fig. 33-5). Dessa maneira, as células endoteliais provavelmente limitam apenas a filtração dos elementos celulares (p. ex., eritrócitos). A membrana basal está localizada entre as células endoteliais e os pedicelos (Fig. 33-3G) e separa a camada endotelial da epi- telial em todas as partes do tufo glomerular. A membrana basal possui três camadas (Fig. 33-3H): (1) camada delgada interna (lâmina rara interna); (2) camada espessa (lâmina densa) e (3) camada delgada externa (lâmina rara externa). A membrana basal contribui de modo importante para as características de per- meabilidade da barreira de filtração por restringir a passagem de solutos de tamanho intermediário ou grande (peso molecular > 1 KDa). Essa membrana restringe especialmente solutos grandes carregados negativamente devido à existência de proteoglicanas contendo heparan sulfato em sua constituição (Fig. 34-4). Figura 33-4 Capilares glomerulares cobertos pelos pedicelos dos podócitos. Essa eletromicrografia de varredura mostra a visão dos capilares glomerulares da perspectiva do espaço de Bowman. A super- fície externa das células endoteliais dos capilares é coberta por uma camada de pedicelos interdigitados. O corpo celular do podócito se liga aos pedicelos por conexões em forma de perna. (Cortesia de Don W. Fawcett.) Figura 33-5 Aspecto interno dos capilares glomerulares, mostrando as fenestrações e as células endoteliais (setas). Essa eletromicrografia de varredura mostra uma visão da parede do capilar glomerular da perspectiva do lúmen capilar. Múltiplas fenestrações, cada uma com ≈70 nm de diâmetro, perfuram as células endoteliais. (De Brenner BM: Brenner and Rector’s The kidney, 7th ed, vol 1, p 10. Philadelp- hia: Saunders, 2004.) 754 Seção VI • O Sistema Urinário Os podócitos possuem prolongamentos (pedicelos) que se interdigitam cobrindo a membrana basal (Fig. 33-4). Entre as interdigitações estão localizadas as fendas de filtração (Fig. 33-3H). Essas fendas são conectadas por uma estrutura diafragmática delgada, chamada de fenda diafragmática, que possui poros de tamanho entre 4 e 14 nm. Glicoproteínas carre- gadas negativamente cobrem os podócitos, as fendas de filtração e as fendas diafragmáticas, o que restringe a filtração de grandes ânions (Fig. 33-4). As fendas diafragmáticas são formadas por nefrina, neph1, podocina e outras proteínas organizadas em pontes lipídicas nos podócitos (Fig. 33-3I). Regiões conservadas reconhecidas por fosfotirosinas presentes nos domínios intrace- lulares de algumas dessas proteínas podem recrutar outras molé- culas envolvidas na sinalização que controla a permeabilidade da fenda. Os domínios extracelulares da nefrina, neph1 e FAT1 de podócitos adjacentes podem-se unir para ajudar na formação da fenda de filtração. A ausência genética de nefrina leva a uma severa proteinúria, como observado em pacientes com nefrose Finnish-type As alças dos capilares glomerulares são amparadas por uma rede de células mesangiais contráteis que secretam a matriz extracelular, a qual se estende até as células mesangiais extraglo- merulares (Fig. 33-3F). Essa rede de células mesangiais é contínua com as células musculares lisas das arteríolas aferente e eferente. O aparelho justaglomerular (AJG) inclui as células mesangiais extraglomerulares, a mácula densa e as células granulares. A mácula densa é uma região de células epiteliais especializadas do ramo espesso ascendente onde há contato com o glomérulodo mesmo néfron (Fig. 33-3F). Essas células possuem núcleos nota- damente grandes e se apresentam bem compactadas, o que as faz adquirir uma aparência de placa. As células granulares, também conhecidas como células justaglomerulares ou epitelioides, são células musculares lisas especializadas, presentes nas paredes das arteríolas aferentes que produzem, estocam e liberam renina (Capítulo 40). O AJG faz parte de um complexo mecanismo de feedback que regula o fluxo sanguíneo renal e o ritmo de filtração (Capítulo 34), além de modular indiretamente o balanço de Na+ (Capítulo 40) e a pressão sanguínea sistêmica (Capítulo 23). Os componentes tubulares do néfron incluem o túbulo proximal, a alça de Henle, o túbulo distal e o ducto coletor A Figura 33-6 ilustra a ultraestrutura das células dos diferentes segmentos tubulares. A Tabela 33-1 lista esses segmentos e suas abreviações. Com base em seu aspecto em menor aumento, o túbulo proximal pode ser dividido em túbulo proximal convo- luto (Fig. 33-6A) e túbulo proximal reto (Fig. 33-6B). Entretanto, com base em sua ultraestrutura, o túbulo proximal pode ser alternativamente subdividido em três segmentos: S1, S2 e S3. O segmento S1 tem início no glomérulo e inclui a primeira porção do túbulo proximal convoluto. O segmento S2 tem início na segunda metade do túbulo proximal convoluto e se estende até a primeira metade do túbulo proximal reto. Finalmente, o seg- mento S3 inclui a metade distal do túbulo proximal reto, que se estende até a medula. Tanto a membrana apical (luminal) como a basolateral (peri- tubular) das células do túbulo proximal são extensamente ampli- ficadas (Fig. 33-6A, B). A membrana apical possui invaginações bem desenvolvidas na forma de borda em escova. Esse aumento da área da superfície apical está relacionado com a principal função desse segmento do néfron, que é reabsorver a maior parte do fluido filtrado e devolvê-lo para a circulação. Um cílio cen- tral, que pode participar como um sensor do fluxo de fluido, projeta-se a partir do polo apical das células do túbulo proximal em praticamente todas as células tubulares. As membranas basolaterais de células adjacentes do túbulo proximal formam numerosas interdigitações, as quais possibili- tam a presença abundante de mitocôndrias em contato próximo com a membrana plasmática. As interdigitações das mem- branas laterais também formam um extenso compartimento extracelular ligado pelas junções de oclusão (tight junctions) por um lado e pela membrana basal do epitélio pelo outro lado. As células do túbulo proximal contêm lisossomos, vacúolos endo- cíticos e um retículo endoplasmático bem desenvolvido. Essas células também são caracterizadas por possuírem um complexo de Golgi bastante proeminente (Capítulo 2), importante na síntese, classificação e direcionamento de muitos componentes da membrana para regiões específicas da superfície da célula. A diminuição progressiva da complexidade celular do segmento S1 para o S3 está relacionada com o declínio gradual da taxa de reabsorção ao longo do túbulo. Assim, as células exibem uma membrana de borda em escova progressivamente menos desenvolvida, interdigitações laterais com menor complexidade, uma área de membrana basolateral diminuída e uma redução no número de mitocôndrias. As células que revestem os ramos delgados descendente e ascendente da alça de Henle são muito menos complexas em comparação com as células do segmento S3 do túbulo proximal (Fig. 33-6C, D), com poucas mitocôndrias e poucas amplifica- ções da membrana celular. Os ramos delgados ascendentes são extremamente curtos nos néfrons superficiais (Fig. 33-2). Entre- tanto, eles formam a maior parte das alças longas dos néfrons justamedulares. As células epiteliais do ramo espesso ascendente da alça de Henle até a região da mácula densa apresentam interdigitações altas e numerosas mitocôndrias localizadas nas extensas invagi- nações das membranas basolaterais (Fig. 33-6E). Essa maquinaria complexa está relacionada com o importante papel desempe- nhado por essas células em tornar o interstício medular hiperos- mótico. Até o final do século XX os morfologistas definiam o túbulo distal clássico — com base em estudos de microscopia de luz — como o segmento do néfron que se alonga a partir da mácula densa até a primeira confluência de dois néfrons no sistema de ductos coletores. Hoje, o túbulo distal clássico é subdividido em três segmentos, fundamentados em estudos de ultraestru- tura: o túbulo convoluto distal (com início na mácula densa), o túbulo conector (ou de conexão) e o túbulo coletor inicial. O que era considerado túbulo distal inicial no sistema clássico é principalmente o túbulo convoluto distal, ao passo que o termo túbulo distal final no sistema clássico é considerado atualmente o túbulo coletor inicial. O túbulo convoluto distal se estende desde a mácula densa até a transição para o túbulo conector (Fig. 33-6F). As célu- las do túbulo convoluto distal são similares em estrutura àquelas do ramo espesso ascendente. Entretanto, uma heterogeneidade significativa caracteriza o segmento tubular que se segue. O túbulo conector, que termina na transição com o túbulo coletor inicial, é formado por dois tipos celulares: células do túbulo conector e células intercaladas. As células do túbulo conector são únicas por produzirem e liberarem a calicreína 755Capítulo 33 • Organização do sistema urinário Figura 33-6 Estrutura das células tubulares ao longo do néfron. As secções transversais do túbulo não estão em escala devido à variabilidade entre os segmentos tubulares. 756 Seção VI • O Sistema Urinário renal, um hormônio local cuja função específica ainda não está determinada. As células intercaladas serão discutidas adiante. Os dois segmentos posteriores ao túbulo conector, o túbulo coletor inicial (até a primeira confluência) e o túbulo coletor cortical (após a confluência), são idênticos. Eles são compostos por células intercaladas e principais, as quais exibem diferenças morfológicas e funcionais impressionantes. As células intercala- das, estruturalmente similares às células intercaladas do túbulo conector, perfazem cerca de um terço do revestimento desses segmentos de túbulos coletores (Fig. 33-6H, I). Elas são inco- muns entre as células tubulares por não possuírem cílio central. Uma subpopulação dessas células (células intercaladas A ou a) secretam H+ e reabsorvem K+, ao passo que outra subpopulação (células intercaladas B ou b) secretam HCO–3. As células princi- pais perfazem cerca de dois terços do total de células dos túbulos coletores inicial e cortical (Fig. 33-6H, I). Comparadas com as células intercaladas, as células principais possuem menos mito- côndrias, apenas invaginações modestas da membrana basolateral e um cílio central na membrana apical. As células principais reabsorvem Na+ e Cl– e secretam K+. O ducto coletor medular é revestido principalmente por um tipo celular que se torna mais alto em direção à medula (Fig. 33-6J, K). O número de células intercaladas diminui, fenô- meno que tem início no ducto coletor medular externo. As células desse segmento também transportam eletrólitos e participam na regulação hormonal do transporte de água e ureia. As células são extremamente altas no extremo final do ducto coletor medular (p. ex., no ducto coletor papilar ou ducto de Bellini). A resistência do epitélio tubular aumenta do túbulo proximal até o túbulo coletor medular O epitélio pode ser “firme” ou “frouxo”, dependendo da permea- bilidade de suas junções de oclusão (Capítulo 5). De modo geral, a resistência do epitélio tubular aumenta do túbulo proximal até o túbulo coletor medular. Como demonstrado em estudos de criofratura, no túbulo proximal, que é um epitélio frouxo (muito permeável), os complexos juncionaissão superficiais e apresentam apenas poucos filamentos de proteínas de membrana (Capítulo 2). Em contraste, no túbulo coletor as junções de oclusão se estendem profundamente em direção ao espaço intracelular e consistem em múltiplos filamentos de proteínas de membrana. Os segmentos tubulares cujas junções de oclusão consistem em apenas um fila- mento apresentam baixa resistência elétrica e alta permeabilidade aos solutos, ao passo que os túbulos que possuem vários filamentos tendem a apresentar alta resistência elétrica e baixa permeabilidade. As junções comunicantes (gap junctions) (Capítulo 6) pro- porcionam vias de baixa resistência entre algumas, mas não entre todas, células vizinhas de um túbulo. Essas junções estão localiza- das em vários pontos ao longo das membranas celulares laterais. Há acoplamento elétrico entre as células do túbulo proximal, mas não entre tipos celulares heterogêneos, como aqueles encontrados nos túbulos conector e coletor. PRINCIPAIS ELEMENTOS DA FUNÇÃO RENAL Os néfrons formam um ultrafiltrado a partir do plasma sanguíneo e posteriormente reabsorvem de forma seletiva o fluido tubular ou secretam solutos nesse fluido Assim como ocorre nos capilares em outros locais do organismo, as forças de Starling governam o fluxo de fluidos através das paredes dos capilares no glomérulo, e o resultado da ação dessas forças é a filtração. Entretanto, no caso dos capilares glomerulares, o filtrado não flui para o interstício, mas sim para o espaço de Bowman, o qual é contíguo com o lúmen do túbulo proximal. A principal função dos túbulos renais é recuperar a maior parte dos fluidos e solutos filtrados pelo glomérulo. Se o fluido não fosse recuperado, o rim excretaria o volume total de plasma sanguíneo em menos de meia hora. A recuperação da maior parte do filtrado glomerular ocorre no túbulo proximal, o qual reabsorve NaCl, NaHCO3, nutrientes filtrados (p. ex., glicose e aminoácidos), íons divalentes (p. ex., Ca2+, HPO4 2– e SO4 2–) e água. Finalmente, no túbulo proximal ocorre a secreção, em direção ao lúmen, de NH4 + e uma série de outros solutos, tanto endógenos quanto exógenos. A principal função da alça de Henle (i.e., o ramo delgado descendente da alça de Henle [RDAH], o ramo delgado ascen- dente da alça de Henle [RDAAH] e o ramo espesso ascendente da alça de Henle [REAAH]) é participar na formação da urina concentrada ou diluída. A alça realiza essa tarefa bombeando NaCl para o interstício da medula sem fluxo considerável de água, o que torna o interstício hipertônico. À jusante, o ducto coletor medular explora essa hipertonicidade permitindo ou não a passagem da água por osmose para o interstício. Nos seres humanos, apenas ≈15% dos néfrons são justamedulares, com alças longas que descem até a ponta da papila. Contudo, essa subpopulação de néfrons (Fig. 33-2) é extremamente importante para a criação dos gradientes osmóticos no interior da papila, o que permite o movimento da água para fora do lúmen de toda a população de ductos coletores medulares. Como resultado desse movimento de água, a osmolalidade da urina nos ductos coletores pode exceder, e muito, a osmolalidade do plasma. Tabela 33-1 Segmentos Tubulares do Néfron Segmento Tubular Abreviação Túbulo convoluto proximal TCP Túbulo reto proximal TRP Ramo delgado descendente da alça de Henle RDDAH Ramo delgado ascendente da alça de Henle RDAAH Ramo espesso ascendente da alça de Henle REAAH Túbulo convoluto distal TCD Túbulo conector TC Túbulo coletor inicial TCI Túbulo coletor cortical TCC Ducto coletor medular externo DCME Ducto coletor medular interno DCMI 757Capítulo 33 • Organização do sistema urinário As células do REAAH secretam a glicoproteína Tamm-Horsfall (THP). Indivíduos normais excretam de 30 a 50 mg/dia de THP na urina, o que perfaz — junto com a albumina (< 20 mg/dia) — a maior parte da proteína normalmente presente na urina. A THP adere a certas linhagens de Escherichia coli e pode ser parte da defesa inata contra infecções no trato urinário. A THP também constitui a matriz de todos os cilindros urinários, definidos como fragmentos cilíndricos presentes na urina que assumem a forma do lúmen tubular no qual foram formados. O túbulo distal clássico e o sistema de ductos coletores realizam o controle fino da excreção de NaCl e água. Embora apenas pequenas frações do filtrado glomerular alcancem esses segmentos mais distantes do néfron, são nesses segmentos que vários hormônios exercem seus principais efeitos na excre- ção dos eletrólitos e da água (p. ex., aldosterona e arginina vasopressina). O aparelho justaglomerular é a região onde o ramo espesso ascendente tem contato com o glomérulo Os elementos do AJG desempenham dois papéis regulatórios importantes. Primeiro, se a quantidade de fluido e NaCl que alcança a mácula densa (Fig. 33-3F) de um néfron aumenta, a taxa de filtração glomerular (TFG) desse néfron diminui. Esse fenômeno é chamado de feedback tubuloglomerular e será dis- cutido no Capítulo 34. O segundo mecanismo regulatório é acionado durante uma queda na pressão da artéria renal que distribui sangue para as várias arteríolas aferentes. A queda da pressão sanguínea reduz o estiramento da parede da arteríola aferente, que percebe a alteração como um barorreceptor (Capítulo 23), estimulando diretamente as células granulares a aumentar a liberação de reni- na para a circulação sistêmica. O eixo renina-angiotensina-aldos- terona, importante para o controle da pressão arterial sanguínea sistêmica em longo prazo, será discutido no Capítulo 40. Fibras nervosas simpáticas regulam o fluxo sanguíneo renal, a filtração glomerular e a reabsorção tubular A inervação autonômica renal é inteiramente simpática; os rins não possuem fibras nervosas parassimpáticas. O suprimento simpático para os rins se origina no plexo celíaco (Fig. 14-3) e geralmente segue os vasos arteriais em direção ao interior do rim. As varicosidades das fibras simpáticas liberam norepinefrina e dopamina no tecido conjuntivo frouxo próximo às células mus- culares lisas da vasculatura (i.e., da artéria renal, assim como das arteríolas aferentes e eferentes) e próximo aos túbulos proxi- mais. A estimulação simpática renal possui três maiores efeitos. Primeiro, as catecolaminas causam vasoconstrição. Segundo, as catecolaminas aumentam intensamente a reabsorção de Na+ pelas células do túbulo proximal. Terceiro, em virtude do denso acúmulo de fibras simpáticas próximo às células granulares do AJG, o aumento da atividade nervosa simpática estimula de maneira dramática a secreção de renina. Os nervos renais também incluem fibras aferentes (i.e., senso- riais). Poucas fibras nervosas mielinizadas conduzem os impulsos dos barorreceptores e quimiorreceptores originados no rim. O aumento da pressão de perfusão estimula os barorreceptores renais nas arteríolas interlobulares e aferentes. A isquemia renal e a composição anormal do fluido intersticial estimulam os quimiorreceptores localizados na pelve renal. Esses quimiorre- ceptores pélvicos provavelmente respondem à alta concentração extracelular de K+ e H+ e podem provocar mudanças no fluxo sanguíneo capilar. Os rins também são órgãos endócrinos: eles produzem renina, a forma biologicamente ativa da vitamina D, eritropoietina, prostaglandinas e bradicinina Além da produção de renina pelas células granulares do AJG (Capítulo 40), os rins desempenham uma série de outras funções endócrinas. As células do túbulo proximal conver- tem a 25-hidoxivitamina D em seu metabólito ativo, a 1, 25-di-hidroxivitamina D. Esse hormônio controla o metabolis- mo do Ca2+ e do fósforo e age no intestino, nos rins e nos ossos (Capítulo 52), além de ser importante para o desenvolvimento e manutenção da estrutura do osso.Células semelhantes a fibroblastos no interstício do córtex e da medula externa secretam eritropoietina (EPO) em resposta à queda tecidual local de PO2 (ver PÁG. 453). A EPO estimula o desenvolvimento de eritrócitos por agir em células-tronco hematopoiéticas na medula óssea. Na falência renal crônica, a deficiência de EPO resulta em severa anemia que pode ser tratada com EPO recombinante. Os rins liberam prostaglandinas e várias cininas, agentes parácrinos que controlam a circulação no interior do rim. Essas substâncias geralmente são agentes vasodilatadores e podem desempenhar uma função protetora quando o fluxo sanguíneo renal está comprometido. As células tubulares também secretam angiotensina, bradicinina, AMPc e ATP em direção ao lúmen, mas a função exata dessa secreção local não é totalmente com- preendida. MEDIDA DA DEPURAÇÃO RENAL E DO TRANSPORTE TUBULAR Muitos testes podem acessar a função renal. Alguns são aplicáveis apenas em animais de experimentação, já outros são úteis no cenário clínico e se enquadram em duas categorias gerais: 1. Técnicas modernas de imagens que fornecem excelentes visões macroscópicas do fluxo sanguíneo renal, da filtração e da função excretora. 2. Medidas da assim chamada depuração (clearance) renal de várias substâncias que avaliam a capacidade dos rins de mane- jar solutos e água. Esta seção foca nas medidas de depuração, que compara a taxa (ou ritmo) em que o glomérulo filtra uma substância (água ou soluto) com a taxa em que os rins excretam essa substância na urina. Medindo-se a diferença entre a quantidade filtrada e a quantidade excretada de uma substância em particular, é possível estimar a quantidade total reabsorvida ou secretada pelos túbu- los renais e avançar na compreensão de três funções básicas do rim: a filtração glomerular, e a reabsorção e secreção tubulares. Embora amplamente utilizados, os métodos de depuração pos- suem a limitação inerente de medir a função total do néfron. Essa função é total em dois diferentes sentidos. Primeiro, a depuração soma várias operações individuais de transporte que ocorrem de 758 Seção VI • O Sistema Urinário forma sequencial ao longo de um néfron. Segundo, a depuração soma o resultado de todos os dois milhões de néfrons em paralelo. Dessa maneira, a depuração não fornece informação dos sítios precisos nem dos mecanismos de transporte. Esse tipo de infor- mação pode, entretanto, se tornar conhecida por meio do estudo individual dos néfrons, de células tubulares ou mesmo de mem- branas celulares isoladas. O conceito de depuração também pode ser aplicado em outras questões, como a depuração da bile pelo fígado (Capítulo 46) ou a depuração dos hormônios do sangue. A depuração de um soluto é o volume virtual de plasma que estaria totalmente livre desse soluto em um determinado intervalo de tempo Todos os solutos excretados na urina vêm, em última análise, do plasma sanguíneo que perfunde os rins. Assim, a taxa em que os rins excretam um soluto na urina é igual à taxa em que esse soluto desaparece do plasma, desde que o rim não produza, consuma ou armazene o soluto. Imagine que, em 1 minuto, 700 mL de plasma fluirá pelos rins. Esse plasma contém 0,7 L × 142 mM ou ≈100 mmol de Na+. Desse Na+, os rins removem e excretam na urina apenas uma pequena quantidade, ≈0,14 mmol. Em princípio, essa quantia de 0,14 mmol de Na+ poderia ter sido originada em apenas 1 mL de plasma, o qual teria todos os seus íons Na+ removidos desse volume (i.e., depurados). A depuração de um soluto é definida como o volume virtual de plasma sanguíneo (por unidade de tempo) necessário para fornecer a quantidade do soluto que aparece na urina. Dessa maneira, no nosso exemplo, a depuração de Na+ foi 1 mL/min, ainda que 700 mL de plasma tenha passado pelos rins. Os métodos de depuração renal são baseados no princípio do balanço das massas e na anatomia especial do rim (Fig. 33-7). Para qualquer soluto (X) que o rim não sintetiza, degrada ou acumula, a única rota de entrada no rim é a artéria renal, e as duas únicas rotas de saída são a veia renal e o ureter. Assim, a entrada de X será igual à saída de X, upcurlybracketleft upcurlybracketmid� upcurlybracketright� upcurlybracketleft upcurlybracketmid�� upcurlybracketright�� � upcurlybracketleft upcurlybracketmid� upcurlybracketright� ��� �� �⋅ = ⋅ + ⋅ P FPR P FPR U VX,a mmol mL a mL min Entrada arterial de X X,v mmol mL v mL min Saída venosa de X X mmol mL mL min Saída de X na urina (33-1) PX,a e PX,v correspondem às concentrações plasmáticas de X na artéria renal e na veia renal, respectivamente. FPRa e FPRv correspondem às taxas de fluxo plasmático renal (FPR) na artéria renal e na veia renal, respectivamente. Ux corresponde à concen- tração de X na urina. �V corresponde ao fluxo urinário (o ponto representa a derivada do tempo pelo volume). O produto Ux. �V corresponde à taxa de excreção urinária, ou seja, a quantidade de X excretada na urina por unidade de tempo. No intuito de desenvolver o conceito de depuração renal, a Equação 33-1 é transformada de duas maneiras, ambas baseadas na suposição de que os rins depuram todo X que chega no plasma arterial. Primeiro, o FPRa será substituído pelo influxo do volume virtual — a depuração de X (CX) — que fornece exatamente aquela quantidade de X que aparece na urina. Segundo, será atri- buído à saída virtual venosa um valor de zero. Assim, a Equação 33-1 se transforma na equação a seguir: upcurlybracketleftupcurlybracketmid� upcurlybracketright� � upcurlybracketleftupcurlybracketmid� upcurlybracketright�� ( )⋅ = + ⋅P C O U VX,a X Entradaarterial virtual Saída venosa virtual X Saídarealdeurina (33-2) Para o cálculo da depuração, temos: � C U V PX X X = ⋅ (33-3) Essa é a clássica equação da depuração, que descreve o volume virtual de plasma que ficaria totalmente livre de um soluto em determinado intervalo de tempo (Tabela 33-2A). É necessário saber apenas três parâmetros para calcular a depuração de um soluto X: 1. a concentração de X na urina (UX); 2. o volume de urina produzido em determinado intervalo de tempo ( �V) ; e 3. a concentração de X no plasma sanguíneo sistêmico (PX), igual a PX,a na Equação 33-1. Px,a︸mmolml⋅FPRa︸mlmi- n︸Entrada arterial de X=- Px,v︸mmolml⋅FPRv︸mlmin︸- Saída venosa de X+U- x︸mmolml⋅V˙︸mlmin︸Saí- da de X na urina V˙ V˙ Px,a⋅Cx︸Entrada arterial vir- tual=O︸Saída venosa virtual+Ux⋅- V˙︸Saída real de urina CX=UX⋅V˙PX V˙ Figura 33-7 Balanço das massas de solutos no rim. Os detalhes estão descritos no texto. Tabela 33-2 Depuração Renal A. Depuração de uma Substância Qualquer X � C U V P (mgoumol / mL) (mL / min) mgoumol / mL mL minX X X = × = ⋅ = CX pode variar entre zero, para uma substância que não aparece na urina (p. ex., glicose), e ≈700 mL/min (i.e., o FPR total) para uma substância que é totalmente removida do sangue em apenas uma passagem pelo rim (p. ex., PAH). B. A depuração de PAH se aproxima do FPR (em baixas concentrações plasmáticas de PAH) � C FPR U V PPAH PAH PAH = = ⋅ C. A depuração de inulina é igual à TFG � C RFG U V PIn In In = = ⋅ C, depuração (do inglês, clearance); FPR, fluxo plasmático renal; In, inulina; P, plasma; PAH, p-amino-hipurato; TFG, taxa de filtração glomerular; U, urina; �V , volume por unidade de tempo ou fluxo urinário. CX=UX×V˙PX=(mg ou mol/mL)⋅(mL/min)mg ou mol/mL=mLmin CPAH=FPR=UPAH×V˙PPAH CIn=RFG=UIn×V˙PIn V˙ 759Capítulo 33 • Organização do sistema urinário Juntas, as três funções básicas do rim — filtração glomerular, reabsorção e secreção tubulares— determinam a depuração renal de um soluto. No caso especial em que os rins limpam completamente X do plasma durante uma única passagem (PX,v = 0 na Equação 33-1), a depuração renal de X é igual ao FPRa na Equação 33-1. Devido ao fato do p-amino-hipurato (PAH) se enquadrar nas características descritas anteriormente, sua depuração é uma boa estimativa do FPRa, o qual pode ser simplificado em FPR (Tabela 33-2B). O FPR será discutido no Capítulo 34. Para todos os solutos que não se comportam como o PAH, o plasma na veia renal ainda contém certa quantidade de X. Dessa maneira, o volume virtual depurado de X em um certo intervalo de tempo é menor do que o FPR. Para a maioria dos solutos, então, a depuração descreve um volume virtual de plas- ma que seria totalmente depurado de um soluto, ao passo que, na realidade, um volume muito maior de plasma é parcialmente depurado desse soluto. É possível usar uma abordagem baseada nas informações de depuração para estimar outro parâmetro renal importante: a TFG, que corresponde ao volume de fluido filtrado em direção à capsula de Bowman por unidade de tempo. Imagine um soluto X que satisfaz dois critérios. Primeiro, X é livremente filtrado (i.e., a concentração de X no espaço de Bowman é a mesma que aquela no plasma sanguíneo). Segundo, os túbulos não absor- vem, secretam, sintetizam, degradam ou acumulam X. Assim, a quantidade de X que aparece na urina por unidade de tempo (UX. �V) é a mesma que a quantidade de X que o glomérulo filtra por unidade de tempo (PX. TFG): upcurlybracketleftupcurlybracketmid� upcurlybracketright� � upcurlybracketleftupcurlybracketmidupcurlybracketright P RFG U VX Entrada noespaçodeBowman X Saída na urina ⋅ = ⋅ (33-4) A entrada no espaço de Bowman também é conhecida como carga filtrada de soluto e é geralmente dada em milimoles (ou miligramas) por minuto. Após rearranjar a Equação 33-4, temos: � RFG U V P X X = ⋅ (33-5) A Equação 33-5 está na forma exata da equação clássica da depuração (Equação 33-3). Em outras palavras, a TFG corres- ponde ao CX (ou clearance de X) se X possuir as propriedades necessárias. Como será discutido no Capítulo 34, a inulina é exatamente um desses solutos (Tabela 33-2C). A excreção urinária de um soluto é a soma algébrica de sua carga filtrada e sua reabsorção e/ou secreção pelos túbulos A homeostasia dos fluidos corporais depende de forma crítica da capacidade dos rins em determinar a quantidade de um dado soluto que será excretado na urina. A taxa de excreção renal (EX) depende de três fatores (Fig. 33-8): 1. a taxa de filtração de X (FX): a carga filtrada (FX = TFG. PX); 2. a taxa de reabsorção de X (RX) pelos túbulos; e 3. a taxa de secreção de X (SX) pelos túbulos. Essas inter-relações são expressas quantitativamente da seguinte forma: � �� � E F R SX Carga excretada por unidadede tempo X Carga filtrada por unidadede tempo X Carga reabsorvida por unidadede tempo X Carga secretada por unidadede tempo = − + (33-6) Entretanto, para certas substâncias (p. ex., inulina), não ocorre nem reabsorção nem secreção. Para a maioria das substâncias, ou a reabsorção ou a secreção determina a quantidade presente na urina final. Porém, para algumas substâncias, tanto a reabsorção quanto a secreção determinam a excreção. Se um soluto é apenas reabsorvido, mas não secretado, é pos- sível rearranjar a Equação 33-6 para se obter a taxa de reabsorção: upcurlybracketleftupcurlybracketmid� upcurlybracketright� � � � = ⋅ − ⋅R RFG P U VX Taxa de reabsorção (mg/min) X Carga filtrada (mg/min) X Taxa de excreção (mg/min) (33-7) De forma inversa, se um soluto é apenas secretado, mas não reabsorvido, a taxa de secreção se obtém da seguinte maneira: � upcurlybracketleftupcurlybracketmid� upcurlybracketright�� � = ⋅ − ⋅S U V RFG PX Taxa de secreção (mg/min) X Taxa de excreção (mg/min) X Taxa de filtração (mg/min) (33-8) V˙ PX⋅RFG︸Entrada no espaço de Bow- man=UX⋅V˙︸Saída na urina RFG=UX⋅V˙PX EX︸Carga excretada porunida- de de tempo=FX︸Carga filtra- da porunidade de tempo−RX︸Car- ga reabsorvida porunidade de tem- po+SX︸Carga secretada porunida- de de tempo RX︸Taxa dereabsorção(mg /min)=RX︸Carga filtrada(mg/- min)−UX⋅V˙︸Taxa deexcreção(mg /min) SX︸Taxa desecreção(mg/min) =UX⋅V˙︸Taxa de excreção(mg /min)−RFG⋅PX︸Taxa de filtração(mg /min) Figura 33-8 Fatores que contribuem para a excreção final de uma substância na urina. 760 Seção VI • O Sistema Urinário Ao aplicar as Equações 33-7 e 33-8, é necessário estar ciente de duas limitações importantes. Primeiro, ao se estimar a taxa na qual uma substância aparece no filtrado — a carga filtrada — a partir do produto TFG. PX, parte-se do pressuposto que PX é a concentração livremente filtrada de X. De fato, muitas subs- tâncias, principalmente eletrólitos univalentes, ureia, glicose e aminoácidos são livremente filtrados. Entretanto, se um soluto se liga a uma proteína, por exemplo, então ele não será livremente filtrado. Para esses solutos, incluindo o Ca2+, fosfato, Mg2+ e PAH, é necessário medir a ligação plasmática e corrigir para a fração não filtrável do soluto. Segundo, para aplicar a equação do balan- ço das massas (Equação 33-6), o rim não pode sintetizar, degradar ou acumular o soluto. Um exemplo de soluto que é sintetizado pelos rins é o amônio. Exemplos de solutos degradados pelos rins incluem glutamina e glutamato (os quais são deaminados para produzir amônio), assim como vários outros aminoácidos e ácidos mono e dicarboxílicos. Quando o rim reabsorve e secreta uma determinada subs- tância, os dados da depuração são inadequados para descrever o manejo renal. Por exemplo, se o túbulo proximal reabsorve com- pletamente um soluto que em um segmento posterior é secretado, apenas os dados da depuração sugeririam que ocorreram fil- tração e alguma reabsorção. Não teríamos motivo para envolver a secreção. Combinações complexas de reabsorção e secreção acontecem com o K+, o ácido úrico e a ureia. Outro parâmetro útil para aferir como os rins lidam com um soluto livremente filtrado é a fração de excreção (FE), que é a razão da quantidade excretada na urina (UX. �V ) pela carga filtrada (PX. TFG): � FE U V P RFGX X X = ⋅ ⋅ (33-9) De acordo com a Equação 33-3, entretanto, o termo (UX. �V/PX) é simplesmente a depuração de X (CX): FE C RFGX X = (33-10) Como será discutido no Capítulo 34, é possível estimar a TFG medindo-se a depuração da inulina (CIn). Portanto, a excreção fracionada de um soluto livremente filtrado é igual à razão da depuração: FE C CX X In = (33-11) Técnicas de microscopia tornam possível a medida da taxa de filtração, reabsorção e secreção em néfron único Devido ao fato de os métodos de depuração tratarem o rim como uma “caixa preta”, por refletirem a atividade de muitos néfrons individuais e segmentos de néfrons, é muito difícil de determinar quais segmentos do néfron são responsáveis por quais processos de transporte. Também é impossível deter- minar quais néfrons são responsáveis pela excreção urinária total. Para aprender como funciona um único néfron, e para entender como segmentos individuais dos néfrons contribuem com a sua função global, os fisiologistas desenvolveram uma série de técnicas invasivas para estudar células renais nos labo- ratórios de pesquisa (Fig. 33-9). Para aplicar o conceito de depuração para um único segui- mento do néfron, é possível usar a abordagem da micropunção de fluxo livre (Fig. 33-9A) e medir a concentração do soluto no fluido tubular naquele seguimento (FTX), volume do fluxo naque- le seguimento (i.e., a taxa de coleta) e a concentração plasmática (PX). Por analogia com a equaçãoda depuração macroscópica, é possível escrever uma equação de depuração para néfron único: C FT taxadevolumecoletado PX X X = × (33-12) Comparada com a equação 33-3, FTX substitui UX e “taxa de volume coletado” substitui �V . É possível usar essa equação bási- ca para computar a quantidade de fluido que um único néfron filtra, assim como a quantidade de fluido e solutos que um único segmento tubular maneja. Ritmo de Filtração Glomerular de Néfron Único Se X na Equação 33-12 for um marcador da TFG (p. ex., inulina ou In), é possível calcular a taxa de filtração de néfron único (TFGNU) usando uma equação parecida com aquela descrita na Tabe- la 33-2C para calcular a TFG total: RFGNU TF taxadevolumecoletado P In In = × (33-13) Se forem utilizados os valores numéricos obtidos em expe- rimentos usando rins de ratos apresentados na Figura 33-10, é possível usar a Equação 33-13 para calcular a TFGNU: RFGNU (3mg/mL) (10nL/min) 1mg/mL 30nL/min= × = (33-14) Manejo da Água pelos Segmentos Tubulares de Néfron Único É possível utilizar a mesma informação que foi usada para calcular a TFGNU para calcular a taxa de reabsorção de água entre o glomérulo e o sítio da micropunção. A fração de água fil- trada que resta no local da micropunção é calculada como se segue: Fraçãorestantedaágua filtrada= taxadevolumecoletado RFGNU (33-15) Ao substituir a expressão para a TFGNU (Equação 33-13) na Equação 33-15, temos: Fraçãorestanteda água filtrada = taxadevolumecoletado (FT taxadevolumecoletado)/P P FT In In In In × = (33-16) V˙ FEX=UX⋅V˙PX⋅RFG V˙ FEX=CXRFG FEX=CXCIn CX=FTX×taxa de volume coleta- doPX V˙ RFGNU=TFIn×taxa de volume cole- tadoPIn RFGNU=3 mg/ml×10 nl/min1 mg/ ml Fração restante da água filtra- da=taxa de volume coletadoRFGNU Fração restante da água fil- trada=taxa de volume coleta- do(FTIn×taxa de volume coletado) /PIn=PInFTIn 761Capítulo 33 • Organização do sistema urinário Assim, para saber a fração da água filtrada que resta no sítio de coleta, não é necessário conhecer a taxa de coleta, mas apenas as concentrações de inulina no plasma sanguíneo e no local da coleta. No exemplo da Figura 33-10, no qual o túbulo reabsorve dois terços do fluido, a fração de água filtrada restante no local da coleta é (1 mg/mL)/(3 mg/mL) ou ≈0,33. A fração da água filtrada que foi reabsorvida é 1 menos a fração de água filtrada que resta no local da coleta: Fraçãoreabsorvidadaágua filtrada 1 P FT In In = − (33-17) No exemplo utilizado, a fração da água filtrada que foi reab- sorvida é 1 – 0,33 ou ≈0,67. Manejo de Solutos pelos Segmentos Tubulares de Néfron Único É possível usar os mesmos conceitos de depuração de néfron único para quantificar a reabsorção ou secreção de qualquer soluto ao longo do néfron. O primeiro passo é estimar a fração do soluto filtrado que resta no sítio da punção. Esse parâmetro — a excreção fracionada de soluto — é a razão entre a quantidade de soluto que aparece no sítio da micropunção e a quantidade de soluto filtrada no glomérulo (i.e., carga filtrada de néfron único): Excreçãofracionada desoluto taxadeexcreçãodosolutono sítiodamicropunção carga filtradadenéfronúnico = (33-18) O numerador é o produto entre a taxa de volume coletado e a concentração tubular do soluto (FTX) e o denominador é o produto entre a TFGUN e a concentração do soluto no plasma (PX): Excreçãofracionadadesoluto taxadevolumecoletado FT RFGNU P X X = × × (33-19) Fração reabsorvida da água filtra- da=1−PInFTIn Excreção fracionada de solu- to=taxa de volume coleta- do(FTIn×taxa de volume coletado) /PIn=PInFTIn Excreção fracionada de solu- to=taxa de volume coleta- do×FTXRFGNU×PX Figura 33-9 Métodos para o estudo da função renal em laboratórios de pesquisa. 762 Seção VI • O Sistema Urinário Foi visto nas Equações 33-15 e 33-16 que a razão (taxa de volume coletado/TFGNU) é (PIn/FTIn). Ao fazer essa substituição na Equação 33-19, obtém-se uma expressão alternativa para a excreção fracionada de soluto: Excreçãofracionadadesoluto FT /P FT /P X X In In = (33-20) A vantagem da Equação 33-20 em relação à Equação 33-19 é que não há necessidade de medir as taxas de volume coletado. A Equação 33-20 é importante para o entendimento do trans- porte de um soluto ao longo do néfron. Se (FTX/PX)/(FTIn/PIn) for maior que 1, é possível concluir que houve secreção. O simples fato de a concentração do soluto no fluido tubular aumentar ao longo do néfron não significa necessariamente que houve secre- ção do soluto; a concentração desse soluto também aumentaria se a água tivesse sido reabsorvida. É possível concluir que ocorreu secreção apenas na situação em que a concentração do soluto no fluido tubular relativa à sua concentração no filtrado for maior do que a concentração da razão da inulina. Se (FTX/PX)/(FTIn/PIn) for menor que 1, significa que houve reabsorção. Também é possível fazer referência à reabsorção fracionada de soluto no ponto da micropunção, em vez de fazer referência à excreção fracionada de soluto (i.e., restante) até o ponto da micropunção. Por analogia à Equação 33-17 descrita para a água, esse parâmetro analisado para o soluto é apenas 1 menos a excreção fracionada de soluto: Reabsorçãofracionadadesoluto 1 FT /P FT /P X X In In = − (33-21) Assim, os princípios da depuração e do balanço das mas- sas podem ser aplicados para um único néfron e, a partir daí, a TFGNU e as reabsorções fracionadas de água e solutos podem ser calculadas no sítio da micropunção. OS URETERES E A BEXIGA Como será discutido nos Capítulos 44 e 45, o epitélio do trato gastrointestinal modifica o seu conteúdo continuamente até o ponto em que o conteúdo deixa o corpo. A situação é bem diferente no sistema urinário de mamíferos. A partir do momento em que o fluido deixa a parte mais distal dos ductos coletores, ele possui a constituição da urina final. Assim, a pelve renal, os ureteres, a bexiga e a uretra não modificam de forma substancial o volume ou a composição da urina. Os ureteres impulsionam a urina da pelve renal para a bexiga por meio de ondas peristálticas conduzidas ao longo de um sincício de células musculares lisas Os ureteres servem como um canal para a passagem da urina da pelve renal para a bexiga urinária (Fig. 33-1A). Localizados no retroperitônio, cada ureter enlaça a parte superior da artéria e veia ilíaca comum do mesmo lado do corpo e segue em direção à pelve. Os ureteres entram na parte inferior da porção posterior da bexiga (junção ureterovesical), passam obliquamente pela sua parede muscular e se abrem para o lúmen 1 a 2 cm acima e lateralmente ao orifício da uretra (Fig. 33-11A). Os dois orifícios ureterais (conectados por uma elevação de tecido) e o orifício da uretra formam os ângulos de um triângulo (trígono da bexi- ga). Uma válvula do tipo oscilatória constituída de membrana mucosa cobre cada orifício ureteral. Essa válvula anatômica, em conjunto com o efeito da válvula fisiológica criado pela passagem oblíqua dos ureteres pela parede da bexiga, previne contra o refluxo da urina em direção aos ureteres durante a contração da bexiga. O lúmen de cada ureter é revestido por um epitélio de transição, o qual está sobre uma camada submucosa de tecido conjuntivo, além de uma camada interna longitudinal e uma camada externa circular de músculo liso. O músculo liso ure- teral funciona como um sincício e é considerado um exemplo de músculo liso unitário (Capítulo 9). As junções comunicantes (Capítulo 6) conduzem a atividade elétrica célula a célula em uma velocidade de 2 a 6 cm/s. Estímulos químicos ou mecânicos Excreção fracionada de soluto=FTX /PXFTIn/PIn Reabsorçãofracionada de solu- to=1−FTX/PXFTIn/PIn Figura 33-10 Medida da taxa de filtração glomerular de néfron único. Os dados apresentados são valores encontrados em ratos. 763Capítulo 33 • Organização do sistema urinário (p. ex., estiramento) ou uma despolarização da membrana aci- ma do limiar pode deflagrar um potencial de ação (Fig. 33-11B) do tipo platô (Capítulo 9). A contração do músculo liso ureteral é similar à de outros músculos lisos (Capítulo 9), na qual a Ca2+-calmodulina ativa a quinase da cadeia leve da miosina (MLCK, do inglês, myosin light chain kinase). A proteína quinase dependente de AMPc (PKA) pode fosforilar a MLCK, o que diminui a afinidade da MLCK pela Ca2+-calmodulina e prejudica a fosforilação das cadeias leves da miosina. Esse mecanismo pode, pelo menos em parte, contribuir para o efeito relaxante do AMPc no músculo liso. As ondas peristálticas ureterais são originadas a partir de marca-passos elétricos localizados na porção proximal da pelve renal e impulsionam a urina ao longo dos ureteres em direção à bexiga em uma série de pulsos com frequências entre dois e seis por minuto. A pressão hidrostática intraureteral basal é de 0 a 5 cm H2O e aumenta para 20 a 80 cm H2O durante as ondas peristálticas. O bloqueio do fluxo ureteral para a bexiga, como ocorre em casos de pedras no rim, gera dilatação do ureter e aumento da pressão hidrostática basal para 70 a 80 cm H2O em um período entre 1 e 3 horas. Essa pressão é transmitida de uma maneira retrógrada para os néfrons e cria uma situação de fluxo interrompido na qual a filtração glomerular praticamente para. A hidronefrose, que consiste na dilatação da pelve e dos cálices renais, pode evoluir entre horas e dias. Os pacientes acometidos por essa patologia se queixam de dores severas (cólicas renais) devido à distensão das estruturas envolvidas. Se não for liberada, a obstrução pode causar uma disfunção renal importante e gerar até mesmo a doença renal aguda. Em casos de obstrução persis- tente, a pressão dentro dos ureteres diminui para valores apenas um pouco mais elevados do que o nível basal. Embora, nesses casos, os pacientes não produzam urina (anúria), a filtração glomerular continua, ainda que com um fluxo marcadamente reduzido, uma condição que reflete um balanço entre a filtração e a reabsorção de fluido pelos túbulos. O sistema nervoso autônomo pode modular a peristalse ure- teral, embora ela possa ocorrer sem inervação. Como em outros músculos lisos que formam sincícios, o controle autonômico dos ureteres ocorre por liberação difusa dos transmissores a partir de múltiplas varicosidades formadas devido ao axônio pós-ganglionar seguir sobre as células do músculo liso. Eferências simpáticas (por meio dos plexos aórtico, hipogástrico e ovaria- no ou espermático) modulam a contratilidade ureteral, pois a norepinefrina atua em receptores excitatórios a-adrenérgicos e inibitórios b-adrenérgicos. Eferências parassimpáticas aumentam a contratilidade ureteral devido à liberação da acetilcolina, tanto por estimulação direta dos receptores muscarínicos colinérgicos (Capítulo 3) quanto por liberação de norepinefrina pelas fibras simpáticas pós-ganglionares, a qual pode estimular adrenorrecep- tores a. Algumas das fibras autonômicas que inervam os ureteres são fibras de dor aferentes. De fato, a dor da cólica renal associada às violentas contrações peristálticas próximas a uma obstrução é uma das mais severas encontradas na prática clínica. Fibras simpáticas, parassimpáticas e somáticas inervam a bexiga urinária e seus esfíncteres A bexiga urinária consiste em uma porção principal (corpo) que coleta a urina e uma extensão em forma de funil (pescoço) que se conecta com a uretra (Fig. 33-11A). O lúmen da bexiga é revestido por um epitélio de transição. O músculo detrusor é composto por três camadas de músculo liso fracamente definidas que constituem a maior parte da parede da bexiga. Na extremidade inferior do trígono, o lúmen da bexiga se abre para a uretra posterior (i.e., a parte distal do pescoço da bexiga), a qual se estende por 2 a 3 cm. O esfíncter interno é formado por fibras de músculo liso (do mús- culo detrusor) contidas na parede posterior da uretra intercaladas com tecido elástico (Tabela 33-3). Imediatamente adjacente ao esfíncter interno está o esfíncter externo, formado por fibras de músculo estriado de contração lenta e voluntária. Figura 33-11 A e B, Anatomia dos ureteres e da bexiga. B, Potencial de ação do músculo liso; o potencial de membrana das células musculares lisas dos ureteres em repouso é de ≈ –60mV, determinado princi- palmente pela alta permeabilidade da membrana ao K+. Os canais para Na+ aceleram a fase ascendente do potencial de ação, embora os canais para Ca2+ sejam os principais responsáveis pelo potencial de ação propriamente dito. 764 Seção VI • O Sistema Urinário Nos seres humanos, o músculo liso da bexiga parece não pos- suir junções comunicantes, um achado que sugere a ausência de acoplamento elétrico entre as células. Dessa maneira, o músculo liso da bexiga é provavelmente uma “multiunidade” (Capítulo 9), com uma razão de 1:1 entre as terminações nervosas e as células musculares lisas. A contração do músculo liso da bexiga é típica de outras células de músculo liso. A bexiga e os esfíncteres recebem tanto inervação simpática e parassimpática (autonômica), como somática (voluntária) (Fig. 33-12). A inervação simpática da bexiga e do esfíncter Tabela 33-3 Visão Geral dos Esfíncteres Ureterais Característica Esfíncter Interno Esfíncter Externo Tipo de musculatura Lisa Esquelética Nervo que chega à estrutura Hipogástrico Pudendo Natureza da inervação Autonômica Somática Figura 33-12 Inervação autônoma e somática da bexiga. 765Capítulo 33 • Organização do sistema urinário interno é proveniente de neurônios da coluna intermediolateral, com origem a partir do segmento T10 torácico até o segmento L2 lombar da coluna vertebral (Capítulo 14). As fibras pré-gan- glionares passam pelos nervos esplâncnicos lombares até o plexo superior hipogástrico, onde elas dão origem aos nervos hipo- gástricos esquerdo e direito. Esses nervos seguem até o plexo hipogástrico/pélvico, onde fibras simpáticas pré-ganglionares fazem sinapses com fibras pós-ganglionares, que continuam em direção à parede da bexiga por meio da porção distal do nervo hipogástrico. Essa porção distal também contém os axônios pré -ganglionares parassimpáticos discutidos no próximo parágrafo. A inervação parassimpática da bexiga é originada a partir da coluna de células intermediolateral entre os segmentos S2 e S4 da coluna vertebral sacral. As fibras parassimpáticas que se aproximam da bexiga via nervo pélvico esplâncnico ainda são pré-ganglionares e só realizam sinapses com neurônios pós-ganglionares no corpo e pescoço da bexiga urinária. A inervação somática se origina a partir de neurônios motores oriundos dos segmentos S2 a S4. Esses motoneurônios inervam e controlam o músculo estriado esquelético voluntário do esfíncter externo via nervo pudendo (Fig. 33-12). O enchimento da bexiga ativa receptores sensíveis ao estiramento que iniciam o reflexo da micção, um arco reflexo espinal também sob o controle de centros superiores do sistema nervoso central O tônus da bexiga é definido pela relação entre o volume da bexiga e sua pressão interna (intravesical). É possível medir a relação volume-pressão inserindo um cateter através da uretra e esva- ziando a bexiga. A pressão deve ser registrada enquanto ocorre o enchimento da bexiga em incrementos de 50 mL de água. O regis- tro da relação entre volume e pressão é chamado de cistometro- grama (Fig. 33-13, curva azul). O aumento do volume da bexiga de 0 para ≈50 mL gera um aumento moderado na pressão. Aumentos adicionais devolume até ≈300 mL quase não produzem aumento na pressão. Essa alta complacência reflete o relaxamento da mus- culatura lisa da bexiga. Após alcançar volumes maiores que 400 mL, se houver incrementos adicionais no volume haverá aumento da pressão “passiva”. O tônus da bexiga é independente da inervação extrínseca até o ponto em que é deflagrado o reflexo de micção. Os centros cortical e suprapontino no cérebro normalmen- te inibem o reflexo da micção, o qual é coordenado pelo cen- tro pontino da micção. Esse centro controla tanto o músculo detrusor da bexiga quanto os esfíncteres urinários. Durante a fase de armazenagem, receptores sensíveis ao estiramento presentes na bexiga enviam sinais aferentes para o cérebro via nervos pélvicos esplâncnicos. O desejo voluntário de esvaziar a bexiga é sentido inicialmente com volume de ≈150 mL, e a sensação de enchimento completo se dá com volumes entre 400 e 500 mL. Entretanto, enquanto uma oportunidade socialmente aceitável de esvaziar a bexiga não ocorre, impulsos eferentes vin- dos do cérebro, em um reflexo condicionado, inibem neurônios pré-sinápticos parassimpáticos na coluna espinal sacral, os quais, Figura 33-13 Representação de um cistometrograma. Fisiopatologia da Micção Lesões no sistema nervoso podem levar à disfunção da bexiga, cujas características dependem da região neural lesada. É possível distinguir três classes principais de lesões: 1. Lesão combinada das vias aferente e eferente. Vários nervos, tanto aferentes quanto eferentes, iniciam a distensão e flacidez da bexiga. No estado crônico da con- dição chamada “bexiga descentralizada”, várias pequenas contrações dos músculos progressivamente hipertrofiados da bexiga substituem os eventos coordenados da mic- ção. Embora pequenas quantidades de urina possam ser expelidas, um volume residual de urina continua na bexiga após a micção. 2. Lesões aferentes. Quando apenas as raízes dorsais sacrais (fibras aferentes) são interrompidas, os reflexos de contração da bexiga em resposta ao estímulo dos recep- tores sensíveis ao estiramento são totalmente abolidos. A bexiga frequentemente se torna distendida, suas paredes se estreitam e seu tônus diminui. Entretanto, alguma contração residual continua devido à resposta contrátil intrínseca do músculo liso ao estiramento. Geralmente, um volume urinário residual fica na bexiga após a micção. 3. Lesões da medula espinal. Os efeitos da transecção da medula espinal (p. ex., pacientes paraplégicos) incluem o estado inicial do choque espinal, no qual a bexiga se torna demasiadamente cheia e exibe esvaziamento esporádico (“incontinência por excesso de fluxo”). Com o tempo, o reflexo do esvaziamento é restabelecido, porém sem controle voluntário. A capacidade da bexiga é geralmente reduzida, e a hiperatividade do reflexo pode levar a um estado conhecido como “bexiga espasmódica neurogênica”. Nesse caso, a bexiga também não se esvazia completamente, o que resulta na presença de um volume residual significativo de urina. Infecções no trato urinário são frequentes, visto que o volume residual de urina na bexiga serve como meio incubador para bactérias. Além disso, durante o período de “incontinência por excesso de fluxo” (antes do restabelecimento do reflexo de esvaziamento) esses pacientes frequentemente são cateterizados, o que também favorece a infecção do trato urinário. 766 Seção VI • O Sistema Urinário sem essa inibição, estimulariam o músculo detrusor. A contração voluntária do esfíncter urinário externo provavelmente também contribui para a armazenagem da urina. A fase de esvaziamento se inicia com o relaxamento voluntário do esfíncter urinário externo seguido do relaxamento do esfíncter interno. Quando uma pequena quantidade de urina alcança a uretra proximal (posterior), impulsos aferentes sinalizam para o córtex que o esvaziamento é iminente. O reflexo da micção agora prossegue, pois os centros pontinos não mais inibem os neurônios pré-ganglionares parassimpáticos que inervam o músculo detrusor. Como resultado, ocorre a contração da bexiga, que expele a urina. Uma vez que esse reflexo da micção tenha se iniciado, as contrações iniciais da bexiga promovem uma sequência de impulsos sensoriais provenientes de receptores sensíveis ao estiramento, estabelecendo um processo de autorregeneração (Fig. 33-13, picos vermelhos que se deslocam para a esquerda). Ao mesmo tempo, os centros corti- cais inibem os músculos do esfíncter externo. A micção voluntária também envolve a contração voluntária dos músculos abdominais, o que provoca aumento da pressão da bexiga e contribui para o seu esvaziamento completo. Embora o reflexo básico da bexiga discutido no parágrafo anterior seja inerentemente um reflexo autonômico da coluna espinal, ele pode ser facilitado ou inibido por centros superiores do sistema nervoso central que ajustam o limiar para que o esva- ziamento ocorra. O sistema urinário completo é normalmente estéril devido a três fatores: o fluxo contínuo de urina vindo dos rins para a bexiga, o funcionamento dos vários esfíncteres e o quase completo esvaziamento da bexiga durante a micção. REFERÊNCIAS Livros e Resenhas Benzing T: Signaling at the slit diaphragm. J Am Soc Nephrol 2004; 15:1382-1391. Kriz W, Bankir L: A standard nomenclature for structures of the kidney. Kidney Int 1988; 33:1-7. Seldin DW, Giebisch G (eds): The Kidney: Physiology and Pathop- hysiology, 3rd ed. Philadelphia: Lippincott Williams & Wilkins, 2000. Smith H: The Kidney: Structure and Function in Health and Disease. New York: Oxford University Press, 1951. Weiss RW: Physiology and pharmacology of the renal pelvis and ure- ter. In Walsh PC, Rettig AB, Vaughan E, Wein AJ (eds): Campbell’s Urology. 7th ed, pp 839-870. Philadelphia: WB Saunders, 1998. Artigos de Periódicos Maxwell PH, Osmond MK, Pugh CW, et al: Identification of the renal erythropoietin-producing cells using transgenic mice. Kidney Int 1993; 44:1149-1162. Shannon JA: The excretion of inulin by the dog. Am J Physiol 1935; 112:405-413. Smith HW, Finklestein N, Aliminosa L, et al: The renal clearances of substituted hippuric acid derivatives and other aromatic acids in dog and man. J Clin Invest 1945; 24:388-404. Tamm I, Horsfall FL Jr: A mucoprotein derived from human urine which reacts with influenza, mumps, and Newcastle disease viru- ses. J Exp Med 1952; 95:71-97. Walker AM, Bott PA, Oliver J, MacDowell MC: The collection and analysis of fluid from single nephrons of the mammalian kidney. Am J Physiol 1941; 134:580-595. 767 C A P Í T U LO 3 4 F I LT R A Ç Ã O G L O M E R U L A R E F L U X O S A N G U Í N E O R E N A L Gerhard Giebisch e Erich Windhager FILTRAÇÃO GLOMERULAR Uma alta taxa de filtração glomerular é essencial para a manutenção dos níveis extracelulares de soluto e água estáveis e ideais Qualitativamente, a filtração do plasma sanguíneo pelos glo- mérulos renais é a mesma que a filtração do plasma sanguíneo através dos capilares de outros leitos vasculares (Capítulo 20). A ultrafiltração glomerular resulta na formação de um fluido — o filtrado glomerular — com concentrações de solutos similares àquelas encontradas na água do plasma. Entretanto, proteínas, outros compostos de alto peso molecular e solutos ligados a proteínas estão presentes em concentrações reduzidas. O filtrado glomerular, assim como os filtrados formados através de outros capilares do corpo, é livre de elementos sanguíneos, como as hemácias e os leucócitos. Quantitativamente, o taxa de filtração que ocorre nos glo- mérulos excede e muito aquele que ocorre em todos os outros capilares da circulação somados, devido às maiores forças de Starling (Capítulo 20) e à maior permeabilidade capilar. Com- parado com outros órgãos, osrins recebem uma quantidade extraordinariamente maior de fluxo sanguíneo — normalizado pela massa do órgão — e filtram uma fração especialmente alta desse fluxo. Em condições normais, a taxa de filtração glomerular (TFG; Capítulo 33) dos dois rins é de 125 mL/min ou 180 L/dia. Essa alta taxa de formação de filtrado é necessária para expor por várias vezes todo o fluido extracelular (>10 vezes/dia) ao escrutínio do epitélio tubular renal. Se não houvesse essa alta rotatividade do volume extracelular, apenas pequenos volumes de sangue seriam “depurados” por unidade de tempo (Capítulo 33) de certos solutos e água. Essa depuração baixa teria duas conse- quências prejudiciais à excreção renal de solutos que os túbulos renais não seriam capazes de secretar adequadamente. Primeira, na presença de um aumento repentino dos níveis plasmáticos de um material tóxico — originado tanto do meta- bolismo como da ingestão de alimentos ou fluidos — a excreção desse material seria lenta. O alto fluxo sanguíneo e a alta TFG permitem aos rins eliminar materiais nocivos rapidamente por meio da filtração. A segunda consequência da baixa depuração seria o aumen- to da concentração estacionária de substâncias residuais que dependem da filtração para sua excreção. O exemplo a seguir de Robert Pitts, um dos principais colaboradores na área da fisiologia renal, ilustra a importância desse conceito. Considere dois indivíduos que ingerem uma dieta que contém 70 g/dia de proteína, uma pessoa com função renal normal (p. ex., TFG de 180 L/dia) e a outra, um paciente renal com nítida redução da filtração glomerular (p. ex., TFG de 18 L/dia). Cada indivíduo produz 12 g/dia de nitrogênio na forma de ureia (ureia nitro- genada) derivada da dieta proteica e deve excretá-los na urina. Porém, esses dois indivíduos alcançam um balanço para ureia em níveis de ureia sanguíneos muito diferentes. Pode-se assumir de forma simplificada que os túbulos não reabsorvem nem secretam ureia, assim, apenas a ureia filtrada pode ser excretada. Além disso, supõe-se que toda a ureia filtrada é excretada. O indivíduo fisiologicamente normal pode excretar 12 g/dia de ureia prove- nientes de 180 L de plasma sanguíneo e apresentar um valor de ureia no sangue de 12 g/180 L, ou 6,7 mg/dL. No paciente em que a TFG está reduzida a 10% do normal, excretar 12 g/dia de ureia requer que cada um dos 18 L de plasma sanguíneos fil- trados possuam um valor de ureia 10 vezes maior, ou 67 mg/dL. Portanto, a excreção da mesma quantidade de ureia — para a manutenção do estado estacionário — requer uma concentração de ureia muito maior no plasma sanguíneo do paciente renal do que no do indivíduo normal. A depuração (ou clearance) de inulina é uma medida da taxa de filtração glomerular O marcador glomerular ideal para a medida da TFG seria uma substância X que tem a mesma concentração no filtrado glome- rular e no plasma e que não é reabsorvida, secretada, sintetizada, degradada ou acumulada nos túbulos (Tabela 34-1). Na Equação 33-4, foi visto que: P TFG U VX mg mL mL min EntradanacápsuladeBowman X mg mL mL min Saídanaurinaupcurlybracketleftupcurlybracketmid� upcurlybracketright� � upcurlybracketleftupcurlybracketmidupcurlybracketright �� ��⋅ = ⋅ (34-1) PX é a concentração do soluto no plasma, TFG é a soma do fluxo de volume do plasma que se deslocou para o espaço de Bowman, PX︸mgmL⋅TFG︸mLmin︸En- trada na cápsula de Bowman=- UX︸mgmL⋅V˙︸mLmin︸Saída na urina 768 Seção VI • O Sistema Urinário UX é a concentração do soluto na urina, e V� é o fluxo urinário. Ao rearranjar essa equação, tem-se: TFG U V P mL min (mg /mL) (mL /min) mg /mL x x � = × = × (34-2) A Equação 34-2 está na mesma forma da equação da depuração (Equação 33-3) e é idêntica à Equação 33-5. Dessa maneira, a depuração plasmática deste marcador glomerular é a TFG. A inulina é um polímero de frutose semelhante ao amido, extraída da alcachofra de Jerusalém, e possui peso molecular de 5.000 Da. A inulina é livremente filtrada pelo glomérulo e não é nem reabsorvida nem secretada pelos túbulos renais (Fig. 34-1A). Essa substância também preenche todos os outros requerimen- tos listados na Tabela 34-1 para ser considerado um marcador glomerular ideal. Assumindo-se que a TFG não se altera, três testes provam que a depuração da inulina é um marcador preciso da TFG. Primeiro, como demonstrado na Figura 34-1B, a taxa da excreção de inulina (UIn.V� ) é diretamente proporcional à concentração de inulina no plasma (PIn), como implícito na Equação 34-2. A inclinação da função na Figura 34-1B corresponde à depuração de inulina. Segundo, a depuração de inulina é independente da concentração plasmática de inulina (Fig. 34-1C). Essa conclusão já estava implícita na Figura 34-1B, na qual a inclinação (i.e., a depuração da inulina) não varia de acordo com a PIn. Tercei- ro, a depuração da inulina é independente do fluxo urinário (Fig. 34-1D). Dado um valor particular de PIn, após o corpúsculo V˙ TFG=UX×V˙PXmLmin=(mg /mL)×(mL/min)mg/mL V˙ Figura 34-1 Depuração da inulina. Tabela 34-1 Critérios para a Utilização de uma Substância para a Medida da Taxa de Filtração Glomerular 1. A substância deve ser livremente filtrada nos glomérulos. 2. A substância não pode nem ser reabsorvida nem secretada pelos túbulos renais. 3. A substância não pode ser sintetizada, degradada ou acumulada pelo rim. 4. A substância deve ser fisiologicamente inerte (não tóxica e sem efeito na função renal). 769Capítulo 34 • Filtração glomerular e fluxo sanguíneo renal renal filtrar a inulina, a excreção total de inulina na urina não muda. Então, diluir esse marcador glomerular em uma grande quantidade de urina ou concentrá-lo em um pequeno volume, não afeta a quantidade total de inulina excretada (UIn.V� ). Se o fluxo urinário é alto, a concentração de inulina na urina será proporcionalmente baixa, e vice-versa. Devido à estabilidade de (UIn.V� ), (UIn.V� )/PIn também é estável. Duas linhas de evidência fornecem provas diretas de que a depuração de inulina representa a TFG. Primeira, ao coletar o filtrado de um único glomérulo, Richards et al. mostraram, em 1941, que a concentração da inulina no espaço de Bowman no rim de mamíferos é a mesma que a sua concentração no plasma. Assim, a inulina é livremente filtrada. Segunda, ao perfundir túbulos individuais com quantidades conhecidas de inulina marcada, Marsh e Fraiser demonstraram que os túbulos renais não secretam nem reabsorvem inulina. Embora a depuração da inulina seja o método mais confiável de medir a TFG, esse método não é utilizado na prática clínica, porque é necessário administrar inulina por via intravenosa para alcançar uma concentração plasmática de inulina razoável. Além disso, a análise química para determinação dos níveis de inulina no plasma e na urina é tão complexa que torna o uso rotineiro da inulina inadequado em laboratórios clínicos. O valor normal da TFG em um homem de 70 kg é de ≈125 mL/ min. Estudos populacionais mostraram que a TFG é proporcio- nal à área de superfície corpórea. Devido à área de superfície média de um homem de 70 kg ser 1,73 m2, a TFG normal em homens é geralmente relatada como 125 mL/min/1,73 m2 de área de superfície corpórea. Nas mulheres, esse valor é de 110 mL/ min/1,73 m2. A idade é a segunda variável. A TFG é muito baixa no recém-nascido, devido ao desenvolvimento incompleto das unidades glomerulares funcionais. A partir de ≈2 anos de idade, a TFG é normalizada com relação à área de superfície corpórea e cai gradualmente com o envelhecimento, em consequência da perda progressiva de néfrons funcionais. A depuração da creatinina é um índice clínico eficiente da taxa de filtração glomerular Devido ao
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