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Organização Educação Brasileira

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Prévia do material em texto

O R G A N I Z A Ç Ã O D A E D U C A Ç Ã O B R A S I L E I R A
Rogério de Andrade Córdova
2 
Estado do Acre
Governador
Arnóbio Marques de Almeida Júnior
Vice-Governador
Carlos César Correia de Messias
Secretaria de Estado de Educação do Acre
Maria Corrêa da Silva
Coordenadora de Ensino Superior da SEEA
Maria José Francisco Parreira
Fundação Universidade de Brasília — FUB/UnB
Reitor
Timothy Martin Mulholland
Vice-Reitor
Edgar Nobuo Mamiya
Decano de Ensino e Graduação
Murilo Silva de Camargo
Decano de Pesquisa e Pós-graduação
Márcio Martins Pimentel
Faculdade de Educação — FE/UnB
Diretora
Inês Maria Marques Zanforlin Pires de Almeida
Vice-Diretora e Coordenadora Geral
Laura Maria Coutinho
Coordenadora Pedagógica
Sílvia Lúcia Soares 
Coordenador de Tecnologias
Lúcio França Teles
Coordenação Pedagógica
Maria Madalena Torres
Secretaria do Curso
Antonilde Gomes Bomfim
Maria Cristina Siqueira Mello
Administração da Plataforma
Joviniano Rabelo Jacobina
Setor Financeiro
Francisco Fernando dos Santos Silva
Coordenação Intermediária
Aurecília Paiva Ruela
José Ferreira da Silva
Maria Lucilene Belmiro Melo Acácio
Nilzete Costa de Melo
Robéria Vieira Barreto Gomes
Professores (as) – Mediadores (as)
Adima Jafuri Maia
Adriana Araújo de Farias
Adriana Martins de Oliveira
Aleuda Soares Dantas Tuma
Ana Cláudia de Oliveira Souza
Ana Maria Agostinho Farias
Antonio Aucélio A de Almeida
Antonio do Socorro da Silva Costa
Artemiza Barros Pimentel
Aulenir Souza de Araújo
Carmem Cesarina Braga Pereira
Cátia Maria da Silva Silvano
Cristiano Almeida Barros
Domingas Pereira da Costa Ferreira
Eliana Maia de Lima
Elizete Maia de Lima
Érica Medeiros
Geania Mendonça da Costa
Gercineide Maria da Silveira Fernandes
Hevellin de Figueiredo Félix
Hilda Jordete Marinho
Ivanir Oliveira de Lima
Jocileia Braga de Souza
Jorge Gomes Pinheiro
José Ribamar Gomes Amaral
Leidisséia Alves de Castro
Luciana Mª Rodrigues de Lima
Luciene Nunes Calixto
Lucilene de Andrade Moreira
Luiz Augusto da Costa dos Santos
Márcia da Silva Queiroz
Márcia Maria de Assis Alencar
Maria Cirlene Pontes de Paiva
Maria de Nazaré Ferreira Pontes
Maria do Carmo de Lima Gomes
Maria do Rosário Andrade Sena
Maria Itamar Isídio de Almeida
Maria Izaunira N.da silva
Maria Mirnes Soariano Oliveira
Maria Zenilda de Lima Correia
Marilza da Silva Rodrigues
Miracélia Mª Freire de Moura
Mirna Suelby Martins
Nadir Silva de Souza
Norma Mª da Silva 
Norma Maria Vasconcelos Balado
Pedro Lopes da Silva
Renilda Moreira Araújo
Rita de Cássia Machado Mommerat
Sâmia Gonçalves da Silva
Sonja Priscila Vale de F. Fernandes
Uilians Correia Costa
Vânia Maria Maciel Taveira
Vanucia Nunes Valente Calixto
Vera Mª de Souza Moll
3 
Mo699 Módulo IV: Organização da Educação Brasileira / Ro-
gério de Andrade Córdova – Brasília : Universidade de Brasília, 
2008.
 95 p.
 
1. Educação a distância. 2. Legislação. 3. Situação demográfica. 
4. Programas de Nível Superior para Professores Indígenas. I. 
Córdova, Rogério de Andrade. II. Universidade de Brasília.
CDD 577
ISBN: 978-85-230-0959-5
4 
Sumário
Conhecendo o autor _____________________6
Apresentação ___________________________7
Seção 1
Educação e instituição da sociedade ______ 11
1 Os marcos teóricos _________________________________ 12
2 A institucionalização da educação no Brasil ____________ 17
Seção 2
Conceitos, finalidades e organização da educa-
ção nacional __________________________ 33
1 Conceito, finalidades, objetivos e macro-organização ___ 34
Seção 3
A escola como instituição _______________ 61
1 A escola como instituição e suas instituições ___________ 62
2 Para que serve a escola? ____________________________ 65
3 A escola única e suas armadilhas _____________________ 76
4 Princípios de formação escolar numa perspectiva institucio-
nal _________________________________________________ 77
5 As respostas do sistema ao fracasso ___________________ 79
6 A organização do trabalho educativo no Brasil _________ 81
5 
7 A formação dos quadros docentes ____________________ 87
Bibliografia ___________________________ 94
6 
Conhecendo o autor 
Natural do estado de Santa Catarina, nascido no atual municí-
pio de Painel, o Professor Rogério de Andrade Córdova é licencia-
do em Filosofia pela Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras (FAFI) 
da antiga FIDENE (Fundação para a integração e Educação do Noro-
este do Rio Grande do Sul), atual UNIJUI, universidade localizada na 
cidade de Ijuí, RS. Realizou mestrado em Administração de Sistemas 
Educacionais, no extinto IESAE (Instituto de Estudos Superiores em 
Educação) da Fundação Getúlio Vargas, na cidade do Rio de Janeiro, 
concluído em 1982. Em 1997 obteve o título de doutor em Educa-
ção pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Ingressou 
no magistério em 1965, tendo iniciado como professor do ensino 
superior; que se expandia no interior de Santa Catarina.
Tendo sido sempre politicamente atuante, esteve sempre en-
volvido na vida política dos educandários onde trabalhou, tendo, 
em virtude disso, passado assumir funções de natureza político-
administrativas. Assim exerceu funções administrativas no Colégio 
Industrial de Lages (onde coordenou a implantação da Lei 5692/71) 
e, igualmente, na Faculdade de Ciências e Pedagogia, na mesma 
cidade. Após a conclusão de seus créditos de mestrado no Rio de 
Janeiro, retornando a sua cidade, integrou a equipe dirigente da Se-
cretaria Municipal de Educação, trabalhando as questões ligadas á 
administração da educação de modo geral, mas, sobretudo, traba-
lhando com a educação de jovens e adultos, com a implantação da 
educação infantil, com educação comunitária e, sobretudo, com os 
problemas de uma rede municipal de ensino atuando especialmen-
te em meio rural e na periferia urbana. A convite de seu orientador, 
nomeado Diretor Geral da CAPES (Coordenação de Aperfeiçoamen-
to de Pessoal de Ensino Superior), órgão do Ministério da Educação 
responsável pela política de pós-graduação, veio para Brasília em 
agosto de 1980, integrando sua assessoria. Permaneceu na CAPES 
até dezembro de 1988. Foi professor das Faculdades Católicas entre 
1982 a 1987. Tendo prestado concurso para Professor da Univer-
sidade de Brasília em novembro de 1987, e tendo sido nomeado 
em janeiro de 1988, a partir de 1989 passou a se dedicar exclusi-
vamente a suas atividades acadêmicas na Universidade de Brasília, 
onde igualmente tem ocupado diferentes funções administrativas, 
concomitantemente às suas atividades de docência e pesquisa. Sua 
área de maior interesse acadêmico, atualmente é a área de gestão 
das organizações educativas, abordada dentro da perspectiva de 
complexidade de considerada numa leitura multirreferencial.
Esta leitura procura considerar as múltiplas determinações 
que exercem dentro das organizações educativas, levando em con-
sideração, num pólo, o indivíduo com suas representações, afetos 
e intenções e, conseqüentemente, sua preocupação com o sentido 
de suas ações, e, no outro pólo, o social-histórico, com sua cultura, 
seus valores, suas significativas imaginárias, em resumo, com suas 
“instituições”. O trabalho educativo e administrativo resulta de uma 
ação situada entre esses dois pólos, com mediação de relações in-
terpessoais, grupais, com as exigências organizacionais de eficiên-
cia, eficácia e produtividade, entretanto, a ser orientado por proje-
to, que deve ser ao mesmo tempo projeto de vida para indivíduos, 
7 
grupos e comunidades e um projeto de sociedade. É dentro de tal 
contexto de uma tal perspectiva que deve ser feito o estudo e a 
análise das políticas públicas em educação e das formas que elas 
assumem na organização concreta dos sistemas de ensino: o que 
está em jogo é, cada vez, a instituição da sociedadee a instituição 
dos indivíduos que lhe sejam funcionais. (Ou não!).
8 8 
Apresentação
Este trabalho consta de três seções, elaboradas para servirem 
aos cursos e programas de formação de professores. Visam dar uma 
visão e uma compreensão, o mais ampla e mais completa possível, 
da forma como está organizada a educação escolar no Brasil. 
Preocupado em dar uma visão atual da estruturação de nos-
so sistema de ensino (ou de educação escolarizada), o primeiro 
módulo faz recordar, num primeiro momento, o conceito de edu-
cação e sua função, ou funções, numa dada sociedade. Trata-se de 
um pressuposto básico do curso, no qual a educação é considerada 
um momento do processo mais amplo de institucionalização de 
uma sociedade. Dito em outras palavras: optar por trabalhar com 
educação, ou na educação, muito mais do que simplesmente dar 
umas “aulinhas” disto ou daquilo, é se inserir no processo de consti-
tuição da sociedade em seus valores mais profundos, contribuindo 
para formar ou “formatar” os estudantes segundo tais valores ou 
significações. Nesse mesmo módulo, e logo em seguida, como que 
exemplificando os conceitos anteriormente apresentados, procura-
remos dar uma breve retrospectiva histórica de como esse processo 
de constituição do sistema de educação escolarizada ocorreu no 
Brasil. É importante fazê-lo quando estamos em pleno período dos 
quinhentos anos de construção do Brasil, considerando que Bra-
sil, enquanto esta sociedade e não outra, começa a existir a partir 
da chegada dos portugueses e dos africanos. Os primeiros iniciam 
uma reeducação dos autóctones, impondo seus valores, suas sig-
nificações imaginárias sociais, aos valores e significações imaginá-
rias das sociedades aqui existentes, desencadeando o processo de 
constituição ou de instituição de uma sociedade “outra”, que virá a 
ser nossa sociedade brasileira. E poderemos ver como a educação 
escolarizada desempenhará (ou não!) um papel importante nesse 
processo, de que somos descendentes, herdeiros e continuado-
res...
Feitas estas considerações preliminares, mergulhamos no Bra-
sil. Como está organizada hoje a educação escolar brasileira? Procu-
raremos analisar esta organização e descobrir o que significa o fato 
de ela estar organizada de tal forma e não de outra. Procuraremos 
ser sempre fiéis a nossa orientação teórica e política inicial, sendo a 
educação um momento da instituição de uma sociedade, e sendo 
a organização da educação escolar brasileira um momento funda-
mental dessa instituição, cabe descobrir: a que instituições, ou seja, 
a que valores, a que significações imaginárias sociais remetem os 
dispositivos que regem atualmente nossos sistemas de ensino? 
Fica evidente que o texto da Lei 9394/96, Lei de Diretrizes e 
Bases da Educação Nacional, oferecerá o roteiro de nosso estudo 
atual. Fique bem claro, entretanto, que estamos falando de rotei-
ro. Estudar a “organização da educação brasileira” não é “estudar as 
leis”. É isso também. Mas é mais do que isso. Conhecer e decorar leis, 
decretos, pareceres, e ficar por isso mesmo, nos formaria como bu-
rocratas, amarrando-nos a um formalismo jurídico. Mas se é eviden-
te que precisamos conhecer as leis, pois elas são a presentificação 
da instituição explícita da sociedade tal como a estamos vivendo, 
9 9 9 
deve ficar entendido que é preciso ir mais a fundo, para interpretá-
las, captar o seu “espírito”, ou seja, as tais significações a que reme-
tem e que, em última instância, cabe a nós, educadores, difundir e 
imprimir em nossos educandos. No primeiro caso, ficaríamos estri-
tamente presos a uma postura reprodutora e legitimadora, acrítica, 
do já instituído. No segundo caso, sem desmerecer nossa função 
de educadores e de responsáveis pela permanência de nossa socie-
dade enquanto tal, naquilo que avaliarmos como adequado, fá-lo-
emos numa perspectiva crítica e criadora, sem negar a importância 
das leis, não abdicaremos, igualmente, de analisar a propriedade ou 
a pertinência, a justeza da lei ou das leis vigentes, tendo em vista o 
projeto de sociedade que queremos construir. Faremos, então, uma 
leitura estrutural, mas, igualmente, política e filosófica das normas 
que regem a organização de nossa educação escolar. Esta leitura, 
porém, terá dois momentos, ou módulos. 
Na segunda Seção, consideraremos a organização macro-po-
lítica ou macro-administrativa. Começando pela conceituação de 
educação, pela determinação das finalidades, dos direitos à educa-
ção, pela definição das responsabilidades administrativas relativa-
mente à política e gestão da educação, incorporaremos a definição 
dos níveis e modalidades de educação e ensino, completando-se 
este módulo pela abordagem do financiamento e da formação dos 
professores. 
A terceira Seção, por sua vez, destaca, de maneira abrangente, 
os aspectos relativos à organização pedagógica do trabalho educa-
tivo. Aquilo que aparece como uma simples seção dentro de um 
título recheado de capítulos, seria, na verdade, merecedor de um Tí-
tulo específico, pois é exatamente em tais tópicos que a instituição 
se revela com toda sua força. Ao definir as coordenadas de tempo e 
de espaço do trabalho educativo, ao definir critérios de promoção 
ou reprovação, e assim por diante, a legislação concretiza as signi-
ficações mais efetivas que regem o sistema educativo. Impossível 
passar ligeiramente sobre tais aspectos, como se fossem simples 
detalhes. Eles não são simples detalhes, são aspectos fundamentais 
da organização do trabalho pedagógico, ou do ensino, e, por seu in-
termédio, da instituição da educação escolarizada como momento 
da instituição da sociedade em toda sua profundidade. Sejam, pois, 
bem-vindos ao curso. E que, durante o desenrolar dele, possamos, 
dialogicamente, aperfeiçoá-lo.
10 
11 
1 
Educação e instituição da 
sociedade
OBJETIVOS ESPECÍFICOS
- Conceituar instituição, imaginário, educação, alienação, autonomia e cidadania;
- Apresentar um retrospecto histórico da institucionalização da educação escolarizada no 
Brasil.
12 
Para saber um pouco mais 
a respeito do filósofo Cor-
nélius Castoriadis, acesse: 
pt.wikipedia.org/wiki/
Cornelius_Castoriadis
1 Os marcos teóricos
1.1 A instituição
Segundo Cornélius Castoriadis1, a sociedade humana é auto- 
instituição. Isto quer dizer que a sociedade, enquanto sociedade hu-
mana, diferenciada das demais sociedades animais, é auto-criação. 
E esta auto-criação, ou auto-instituição, se realiza num processo 
efetivado na e pela posição de significações. Tais significações são 
os valores básicos ou fundamentais que dão o sentido, a orienta-
ção básica dessa sociedade, a sua identidade, o amálgama que lhe 
permite reunir-se e dizer-se. Ser brasileiro, por exemplo, é diferente 
de ser argentino ou norte-americano. O que é a “brasilidade”? É um 
“magma” de significações sociais, operantes em nosso agir, como 
um conjunto de representações da realidade, como um conjunto 
de afetos, de gostos, de preferências, e de intencionalidades ou de-
sejos, ou atrações. Cada povo tem suas características, que deno-
minamos “culturais”. Elas são exatamente isso: as marcas identifica-
doras e inconfundíveis de cada sociedade. Se pensarmos no Brasil, 
apenas, ninguém irá confundir um gaúcho com um carioca, ou um 
mineiro com um cearense, por exemplo.
Há traços fundamentais, distintivos, e por isso mesmo identi-
ficadores. Se a seleção de futebol entra em campo, a “pátria de chu-
teiras”, na expressão de Nelson Rodrigues, certas diferenças profun-
das entre pessoas, por exemplo, de natureza ideológica, muito pro-
vavelmente darão lugar a uma profunda identificação, e ninguém, 
em sã consciência, sobretudo se estiver num ambiente coletivo, irá 
“torcer contra” ela. Há significações comuns a várias nações ou pa-
íses. Assim, o capitalismo. Contemporaneamente, ou desde talvezduzentos anos, ou quinhentos anos, na sociedade ocidental, euro-
péia, emergiu uma significação nova, na qual e pela qual as ativida-
des econômicas passaram ao primeiro plano, deixando as questões 
sociais, culturais, religiosas num plano secundário ou complemen-
tar. Simplificadamente, podemos dizer que o “ter” passou a preva-
lecer sobre o “ser”. E o conjunto das relações em sociedade sofreu 
uma profunda torção. O capitalismo, na acepção de Castoriadis (IIS: 
363), se constituiu, objetivamente, como criação da “empresa como 
arranjo complexo de homens e máquinas”, apoiado num sem-nú-
mero de instituições complementares – máquinas, Estados nacio-
nais, escolas, ciências exatas e tecnologia, religiões reformadas – e, 
subjetivamente, ou seja, no plano da formação das consciências, 
como “investimento de uma formação específica: uma entidade em 
expansão e em proliferação incessantes, tendendo a um auto-cres-
cimento contínuo e mergulhado numa solução nutritiva, um ‘mer-
cado’, onde uma oferta e uma demanda sociais, anônimas, devem 
surgir e ser exploradas...” O capitalismo emergiu como uma maneira 
outra de “perceber, sentir, pensar e agir”, na qual, por exemplo, no-
vas “necessidades” são continuamente criadas para, artificialmen-
te, manter um ritmo de “crescimento” dos “negócios”, esgotando-se 
para satisfazê-las. E, como todas as significações, são significações, 
antes de mais nada, “operantes”, ou seja, que se realizam na nossa 
1 Filósofo nascido na Grécia em 1922 e falecido na França, onde viveu 
desde 1945, em dezembro de 1997, autor, entre outras obras, de Instituição imagi-
nária da sociedade e Encruzilhadas do Labirinto (coletânea em seis volumes).
13 
prática efetiva, antes de se tornarem objeto de consciência e de re-
flexão crítica, a realidade das “significações” nunca é captável em si 
mesma, mas indiretamente, pelas “sombras” que projetam no agir 
efetivo, individual ou coletivo, a partir de seus resultados, de seus 
derivados, de suas conseqüências. (Esta concepção será importante 
para entendermos porquê a educação escolar no Brasil se “instituiu” 
da maneira como veremos, e não de outra, e porque está, atual-
mente, “instituída”, formulada, regulamentada, de tal maneira e não 
de outra).
1.2 O imaginário
Tudo que acabamos de dizer acima, principalmente ao final, 
caracteriza o que se pode denominar de “imaginário capitalista”. Que 
quer dizer imaginário? Neste caso, imaginário quer dizer o conjunto, 
(Castoriadis prefere falar em “magma”, para caracterizar o caráter de 
fluidez dessas significações e a profunda imbricação existente entre 
elas, dificultando separar ‘com precisão’ uma dimensão de outra – 
pois economia se mescla com política, que se mescla com religião, 
que se mescla com cultura, e assim sucessivamente, de sorte que 
se é possível destacar uma de outra, demarcando-as, é difícil tra-
çar os limites “precisos” entre uma e outra), das representações, dos 
gostos, “das preferências”, dos interesses e desejos que caracterizam 
uma sociedade em determinado período histórico. Então, em dife-
rentes momentos, cada sociedade define para si o que é e o que não 
é, o que pode e o que não pode, o que vale e o que não vale, o que é cer-
to e o que é errado. (Leiamos, por exemplo, a Carta de Pedro Vaz de 
Caminha e observemos, na leitura, o contraste entre as duas cultu-
ras, a portuguesa e a autóctone. A carta é um precioso documento 
que mostra o contraste que está na nossa origem como “sociedade 
brasileira”). Contemporaneamente, o multiculturalismo atualiza 
essa problemática, num momento em que o desenvolvimento das 
tecnologias da informação e da comunicação, dos transportes e as-
sim por diante, tornam o planeta efetivamente globalizado e põe 
todos os dias, na tela da televisão ou nos jornais, o contraste entre 
diferentes culturas ou civilizações. Por que no Irã as mulheres po-
dem ou não podem fazer determinadas coisas? E no Afeganistão? E 
na Nigéria? E entre nossos indígenas? Por que se diferenciam tanto 
os hábitos alimentares entre nós, sul-americanos? Representações, 
afetos e intenções que formam o imaginário efetivo de um povo ou 
nação ou sociedade. Ele é diferente para cada sociedade porque, 
defende Castoriadis, existe o imaginário radical, entendido como 
capacidade originária profunda, existente nos indivíduos e nas co-
letividades, de fazer ser o que não é, de “criar” efetivamente, de in-
ventar formas, figuras, ou figurações de significações e de sentido. 
O que faz um artista ser “criativo” e “original”? A resposta é: 
“a imaginação radical” que existe nele como capacidade de repre-
sentação, afeto e intenção nas profundezas da psique. Capacida-
de, diga-se de passagem, que existe em todas as pessoas e que se 
expressa nas diferentes esferas da vida, nas diferentes atividades, 
independente do grau de escolaridade, insista-se. (Se o pensamen-
to tradicional aceita a idéia de criação para a arte, mas a nega para 
outras esferas do fazer humano, Castoriadis amplia esse conceito, 
afirmando essa capacidade como constitutiva de cada ser humano, 
Multiculturalismo (ou plu-
ralismo cultural) é um ter-
mo que descreve a exis-
tência de muitas culturas 
numa localidade, cidade 
ou país, sem que uma de-
las predomine, porém se-
paradas geograficamente 
e até convivialmente no 
que se convencionou cha-
mar de “mosaico cultural”.
14 
ainda que se expresse de forma diferenciada: uns são músicos, ou-
tros pintores, mas outros são inventivos no vestuário, outros na culi-
nária, todos na criação das suas instituições sociais, nas suas formas 
de governo, de realizar a justiça, a educação, e assim por diante).
 O que faz um povo, uma sociedade, ou até mesmo comu-
nidades (os mineiros e os cariocas, por exemplo) serem diferentes 
entre si? Resposta: o “imaginário social”. Este imaginário social é a 
capacidade que tem a sociedade, enquanto coletivo anônimo, ins-
tituído, de criar, de inventar, de fazer serem “significações imaginá-
rias sociais”, ou seja, coletivas, e assumir uma postura instituinte. Por 
isso, ainda que inconscientemente, as sociedades também mudam, 
evoluem (tanto para melhor quanto para pior, infelizmente), nunca 
permanecem exatamente iguais, tanto em detalhes menos impor-
tantes quanto em suas significações centrais. Basta falarmos com 
nossos pais, tios e avós e ouvirmos comparações sobre os “seus tem-
pos”, basta observar a forma de sentir, de pensar e de agir de nossos 
filhos, ou alunos, e as comparar com as formas do “nosso tempo”, o 
que nos faz relembrar o filósofo grego Heráclito, conhecido por ter 
afirmado coisas como a impossibilidade de nos banharmos duas 
vezes nas mesmas águas de um rio. Ou salientando, a situação de 
conflito permanente na qual vivemos, lembrando que o conflito – 
inclusive de significações ou valores – é o pai de todas as coisas...
Resumindo: viver numa sociedade humana é viver imerso 
num magma de significações imaginárias sociais que dão sentido 
e orientação a nossas vidas enquanto sociedade. Diante delas, cada 
um de nós tem de encontrar sentido para sua vida pessoal, cons-
truir sua identidade pessoal, constituir-se como sujeito. E é nesse 
processo que a educação desempenha uma função fundamental.
1.3 A educação
Seguindo na mesma linha de exposição teórica, a educação 
é um processo pelo qual uma sociedade “fabrica” ou “modela” os 
indivíduos que a constituem, assegurando sua reprodução ou con-
tinuidade histórica enquanto tal. Por esse longo processo de “esco-
larização” que dura a vida toda, a sociedade repassa a seus mem-
bros as suas instituições, ou seja, suas significações imaginárias, os 
seus valores, os seus saberes (suas interpretações do mundo, seus 
conhecimentos, suas “leis”, suas normas), o seu saber fazer (as suas 
técnicas)2. 
Mas o que importa, aqui e agora, é rememorarmos a centra-
lidade dos processos educativos na institucionalizaçãode uma so-
ciedade, na sua preservação, na sua constituição. E importa termos 
em conta que todos nós, com ou sem escola, somos “escolarizados” 
pelo conjunto da sociedade, através de suas múltiplas organiza-
ções. Platão dizia que os muros da cidade educam. E nós abemos 
da importância não dos muros, mas dos out-doors, das fachadas 
luminosas, da televisão, das rádios, e da própria configuração ur-
banística da cidade. Crescemos ouvindo falar de, e vivenciando, 
uma cidade instituída como “centro” e “periferia”, como áreas mais 
nobres e áreas menos nobres (no caso brasiliense, em Plano Piloto 
e cidades-satélites), entre “cidade” e “morro”, entre conjuntos habi-
2 É notável, neste particular, a contribuição de Edgar Morin, em sua obra O 
Paradigma Perdido: a natureza humana. Há uma outa tradução, brasileira, da mes-
ma obra, com o título O Enigma do Homem.
15 
tacionais e favelas. Em resumo: as formas como as sociedades estão 
materialmente estabelecidas, presentificam as significações imagi-
nárias nas quais e pelas quais a sociedade se auto-institui, se auto-
organiza. O “concreto” é o resultado, a sombra de tais significações, 
derivam delas como suas conseqüências materializadas. E é nestas 
e por estas realizações concretas que aquelas existem. As institui-
ções são redes simbólicas materializadas nas organizações. Basta 
nos perguntarmos porquê todas as escolas são tão iguais, mundo 
afora, e porquê todas têm as mesmas salas de aula e cada sala de 
aula tem exatamente, ou quase exatamente, a mesma configuração 
espacial. E pensarmos nas dificuldades imensas que um educador 
ou uma educadora têm quando, por exemplo, procuram implantar 
uma outra metodologia (baseada, por exemplo, em C. Freinet ou 
Paulo Freire).
Nascidos, então, numa dada sociedade, somos “modelados” 
por ela através da introjeção, em nossa psique, das instituições, das 
significações imaginárias que a constituem, e que nos “ensinaram” o 
que é e o que não é, o que pode e o que não pode, o que vale e o que 
não vale, o que é certo e o que é errado. A partir daí constituímos 
nossa identidade, individual e coletiva, fomos obrigados a investir 
tais instituições e as respectivas significações num longo processo 
de sublimação. Encontramos os nossos “lugares” sociais, inclusive. E, 
ao realizá-lo, mantemos a sociedade em seus pilares fundamentais, 
reproduzindo suas categorias sociais, seus tipos sociais, em sua tipi-
cidade e em sua complementaridade. Numa sociedade capitalista, 
reproduzem-se as camadas dirigentes e reproduzem-se as camadas 
dirigidas.
Como uma sociedade capitalista se conservaria se não repro-
duzisse os tipos que são fundamentais a sua sobrevivência enquan-
to sociedade capitalista, que são os empresários (“os empreende-
dores”, os “dirigentes”) e os proletários (os “subordinados”, os “diri-
gidos”)? Diante disso, coloca-se o desafio: instituir uma educação 
“outra”, uma educação que, permitindo a reflexividade e a delibera-
ção sobre as instituições (significações, valores, leis, regras, normas) 
vigentes, permita abrir caminho dentro do instituído para, num pro-
cesso instituinte, trabalhar na criação ou institucionalização de uma 
sociedade “outra”, ou seja, fundamentada em outras significações, 
em outros valores. Coloca-se o desafio de fazer de um processo re-
produtivista um processo transformador, uma educação para a mu-
dança e não para a simples e pura reprodução de uma sociedade 
tal como existe.
1.4 Alienação, autonomia e cidadania
O processo educativo, pois, dentro da perspectiva assumida, 
não é neutro. Ao contrário, ele é momento decisivo da instituição 
da “polis”, ou seja, da “cidade” ou da sociedade em seu sentido mais 
amplo e genérico. Por isso, é um processo intrinsecamente político. 
E isso acontece com a “maior naturalidade”. Como diz uma certa le-
tra musical: “não sei como aconteceu, quando notei, eu já era eu”. 
Quando ingressamos na escola primária, já falávamos uma 
certa língua, com todo seu vocabulário (que não escolhemos), cada 
vocábulo tendo suas significações (que também independem de 
nós, que as encontramos prontas). Tudo parece, então, muito “natu-
“O homem, diz Casto-
riadis, é um animal in-
conscientemente filosó-
fico, que fez a si mesmo 
perguntas na filosofia 
dos fatos, muito tem-
po antes que a filosofia 
existisse como reflexão 
explícita; e é um animal 
poético, que fornece, 
no imaginário, respos-
tas a essas perguntas” 
(IIS:178). Reflita um pou-
co sobre isso.
16 
ral”. E não nos damos conta de que tudo isso é parte da instituição 
e que, como tal, tudo foi social-historicamente criado, pela espécie 
humana, por nós, seres humanos, em nossas relações com o mun-
do, com a natureza, com nossos semelhantes.
O fato de termos perdido a noção das origens, leva a uma na-
turalização, e até mesmo a uma atribuição de sua origem a fontes 
extra-sociais, até mesmo divinas, extra-terrestres. Nesse caso, que 
é o mais comum, ou o habitual, as instituições, os costumes, “auto-
nomizam-se”, como se tivessem vida própria. Perdendo a noção de 
sua origem “real” (de fato: o imaginário radical), mantemos com elas 
uma relação “imaginária” (aqui no sentido de equivocada, nascida 
de uma fonte que não a nossa real capacidade imaginária). Eis aí a 
origem mais ampla e profunda de todas as alienações: o estranha-
mento, o não reconhecimento das coisas construídas socialmente 
como criações nossas. E, se nós, nos desencontros da vida, não gos-
tamos da forma como a sociedade está organizada, isto é, instituída, 
no caso presente, como dilacerada entre ricos e pobres, proprietá-
rios e despossuídos, e queremos uma outra sociedade, podemos as-
sumir diante da educação uma nova postura: a da indagação crítica 
sobre os fundamentos das instituições que trazemos dentro de nós 
e dentro das quais vivemos. Neste caso, passamos de uma postura 
de educadores reprodutores e mistificadores a uma postura crítica, 
de educadores que estimulam, explicitamente, a reflexão sobre as 
instituições, e estimulam, igualmente, o desenvolvimento da capa-
cidade deliberativa dos educandos sobre as instituições atuais.
A começar pelas próprias instituições escolares nas quais 
trabalhamos e convivemos, que “nos educaram e continuam nos 
educando”, ou seja, nos “modelaram e modelam” para a aceitação 
acrítica do instituído, ou, ao contrário, optar por uma postura re-
ativa e afirmativamente instituinte de outra educação preparató-
ria de uma outra sociedade, moldada segundo um outro projeto, 
fundada em outras significações, e operando o mais possível se-
gundo essas outras significações. Nesse caso, a alienação, postura 
ou condição de quem vê as instituições fora do seu alcance, alheia 
a seu poder e sua vontade, dá passagem à autonomia, que é uma 
postura ou uma atitude de apropriação crítica das instituições. Esta 
apropriação pode resultar ora numa aceitação positiva das leis que 
considerarmos válidas (é ótimo que nossos filhos e netos nasçam 
numa sociedade com leis que humanizem o trânsito, por exemplo, 
e que condenem a prostituição, sobretudo a infantil), ora na rejei-
ção das leis e sua substituição por outras, quando considerarmos 
inadequadas, ou inaceitáveis, ou injustas. E, neste caso, ascedemos, 
como educadores, e ajudamos aos nossos educandos a ascederem, 
à cidadania. Então, cidadania deixa de ser um termo esvaziado e 
mistificador, e recupera seu conteúdo político efetivo e pleno. Te-
mos uma educação que avança para uma postura emancipadora. 
E nos encontramos, de então em diante, na senda aberta por edu-
cadores como Celestin Freinet e Paulo Freire, para citar apenas dois, 
dentre os grandes pedagogos que criaram as pedagogias para a 
autonomia e a emancipação individual e coletiva. Na história da 
humanidade, que se instituiu assimetricamente, emergiu a autono-
mia como uma significação constatadora da heteronomia. E, desdeentão, se constituiu num projeto que se tem expressado social-his-
17 
toricamente como “movimento democratizante”, um projeto sem-
pre tênue (“a democracia, diz Castoriadis, é um regime trágico, pois 
sempre exposto a ser democraticamente comprometido...”). A histó-
ria da constituição dos sistemas de educação escolarizada no Brasil, 
quer no plano macro, da formulação das grandes políticas, quer no 
plano micro, da definição do modo de operar na esfera pedagógi-
ca, na esfera do trabalho educativo propriamente dito, certamente 
acompanha e expressa o vaivém desse movimento e dele depende 
a sorte do projeto de instituição de uma sociedade autônoma, com 
cidadãos emancipados e solidários.
ATIVIDADES SUGERIDAS
1 A propósito do conceito de “educação”, reveja suas anota-
ções de outras disciplinas, notadamente de Filosofia, Psicologia e 
Sociologia, confronte-as e faça seus comentários, destacando os 
pontos de convergência e divergência.
2. Ou faça a mesma coisa a propósito do conceito de “aliena-
ção” e “autonomia”.
3. Faça uma resenha dos capítulos iniciais de O Paradigma Per-
dido: a natureza Humana, de Edgar Morin. Comente as passagens 
que mais diretamente abordam a função educativa na constituição 
da humanidade, no processo de hominização.
4. Leia e resenhe o texto Psicanálise e Política, de Cornelius 
Castoriadis, destacando tudo quanto se aplica à pedagogia e à edu-
cação.
5. Leia (ou releia) o livro Pedagogia da Autonomia, de Paulo 
Freire, e comente-o à luz dos conceitos apresentados neste texto.
2 A institucionalização da educação 
no Brasil
Missionários de Cristo na Terra dos Papagaios
Este subtílulo foi inspirado no título de um livro recente de um 
historiador brasileiro3. Aparentemente jocoso, o teor do título nos 
alerta para uma significação importante, presente no “descobrimen-
to”. É importante registrar, entretanto, que quando os portugueses 
chegaram ao Brasil, não encontraram um território vazio, nem ape-
nas papagaios. O território era ocupado por saudáveis habitantes 
cuja “formosura” e “pureza” encantou os marinheiros adventícios (é 
interessante retornar à Carta de Pero Vaz de Caminha). E, desde en-
tão, os viajantes e missionários passaram a relatar os costumes, as 
crenças, os valores, em suma, a cultura ou o “imaginário efetivo” dos 
povos da terra recém encontrada.
2.1 Educando os curumins e as cunhatãs
Florestan Fernandes, grande sociólogo, educador e militante 
político brasileiro, elaborou, com base em tais relatos, uma interes-
sante reconstituição do imaginário e do processo educativo através 
dos quais os tupinambás se perpetuavam4. De uma tal leitura (e de 
3 Luiz Felipe de Alencastro.
4 FERNANDES, Florestan. Notas sobre a educação na sociedade Tupinambá. In: Educação e 
Sociedade no Brasil, São Paulo: Dominus Editora/Editora da Univrsidade de São Paulo, 1966, pp.144 e 
ss.
18 
outras que o(a) formando(a) interessado(a) poderá fazer), vale des-
tacar as seguintes características:
a) Os processos de transmissão da cultura, (tratava-se, no 
caso, de uma sociedade “tradicionalista”, “sagrada” e “fechada”) pro-
cediam por via oral, através de contatos primários, do face a face, 
segundo as próprias circunstâncias produzidas pelas rotinas da 
vida diária. Todos aprendiam algo em qualquer tipo de relação so-
cial, fazendo de qualquer indivíduo um agente de educação tribal, 
projetando os papéis de “adestradores” ou de “mestres” em todas 
as posições da estrutura social. O valor da tradição se impunha, era 
sagrado, um saber “puro”, capaz de orientar as ações e decisões dos 
homens em qualquer circunstância, reproduzindo a experiência dos 
“ancestrais”. Ela definia os mínimos morais e os graus de honorabili-
dade das ações e do caráter dos seres humanos. O que contava era 
o valor da ação e o valor do exemplo. Aprendia-se fazendo, parece 
ter sido a máxima da “filosofia educacional” entre eles. Os adultos 
envolviam os menores nas atividades e os estimulavam a repetir 
situações determinadas, iniciando-os nas atitudes, nos valores, nos 
comportamentos adequados. O adestramento dos menores não se 
separava da realização das obrigações. E cada qual devia considerar 
suas ações como modelo para os demais. Todos eram “mestres” pelo 
“exemplo”, o comportamento manifesto devia traduzir fielmente o 
sentido do legado dos antepassados, o conteúdo prático das tradi-
ções. A imitação era o processo educativo básico.
b) Quanto às condições de transmissão da cultura, havia va-
riações importantes segundo o sexo e a idade dos envolvidos. Até 
começar a andar, todos dependiam da mãe, esta jamais se afasta-
va dos pequenos, de modo a poder socorrer-lhes em caso de ne-
cessidade. Os curumins (meninos) aprendiam a fazer arco e flecha, 
furavam os lábios entre quatro e seis anos, folgavam com os com-
panheiros, aprendiam cantos e danças, e, mais tarde, com os pais, 
aprendiam a caçar, a pescar, a buscar comida para o grupo domés-
tico. A partir dos quinze anos tornavam-se “unidades produtivas 
da economia doméstica”, trabalhando arduamente em todos os 
setores de atividades masculinas. Eram remadores nas expedições, 
fabricantes de flexas, pescadores, prestadores de serviços nas reu-
niões dos mais velhos. A partir dos vinte e cinco anos tornavam-
se guerreiros, sacrificavam a primeira vítima, renomavam-se, casa-
vam, entravam no círculo dos adultos, aprendiam as tradições, as 
instituições, junto aos mais velhos. Já as cunhatãs (meninas) não 
se afastavam das mães até aos sete anos. Aprendiam a fiar para te-
cer as redes e a modelar para fazer vasilhames de barro. Entre sete 
e quinze anos ficavam apegadas às mães, e aprendiam os servi-
ços caseiros, a fiação, o enodamento das redes, a semeadura e o 
plantio das roças, a preparação do cauim e dos outros alimentos. 
O grande acontecimento era a iniciação, após a primeira menstru-
ação, seguindo-se a perda da virgindade. A partir dos quinze anos 
de idade, preparavam-se para o matrimônio dominando as prendas 
domésticas. As jovens eram introduzidas, paulatinamente, nos pa-
péis e na concepção de mundo das mulheres. A cada fase da vida 
correspondiam novos papéis e atribuições. Aos “professores” cabia 
ensinar pela prática, executando com perfeição as coisas para po-
19 
der bem ensiná-las. Não havia formalismo pedagógico, nem disso-
ciação entre prática e teoria.
c) Os conteúdos da educação afetavam todas as esferas da 
vida social organizada. 
d) As funções sociais da educação, remetiam às relações e aos 
controles sociais do ambiente natural, a transmissão da tecnologia 
levava em conta sexo e idade. O corpo humano era o grande ins-
trumento tecnológico, tratava-se de explorar suas possibilidades, 
trabalhando com o machado de pedra e recursos técnicos corres-
pondentes. O mutirão era importante. “O homem era o principal 
‘meio’ do próprio homem” (Florestan:162). Nas relações interpes-
soais, aprendiam-se as regras de tratamento assimétrico (por idade 
ou sexo), o companheirismo, a solidariedade, a reciprocidade, os 
cerimoniais complexos, os ritos, a guerra, a caça, a unidade tribal. 
Nas relações com o sagrado, aprendiam o conhecimento dos mitos, 
das técnicas mágico-religiosas, dos ritos (de passagem, de sacrifí-
cios), o xamanismo. Em síntese, a educação entre os autóctones era 
informal e assistemática, comparativamente aos padrões europeus, 
mas era eficaz e efetiva. Assegurava a perpetuação da “herança so-
cial” recebida dos antepassados, perpetuando o “imaginário” tribal 
e suas significações, ainda que sem técnicas de educação sistemá-
tica e sem criação de situações caracteristicamente pedagógicas 
(Florestan:153). 
2.2 A sociedade mercantilista
Os homens que chegaram ao novo mundo, chegaram em ca-
ravelas, e não em canoas. Traziam armas de fogo, não usavam arco 
e flecha. Cobriam seus corpos com vestimentas. Bebiam algo muito 
diferentedo cauim. Utilizavam muitos equipamentos, sofisticadíssi-
mos comparativamente à rusticidade dos locais. Eram representan-
tes da mais avançada sociedade européia da época, sua tecnologia 
era de ponta e tão desenvolvida que lhes permitia aventurar-se nas 
navegações mar afora, como cinco séculos depois outras nações 
navegaram pelo espaço sideral. E eram homens que viajavam em 
busca de mercadorias. A Europa vivia o mercantilismo, que, segundo 
o Aurélio, significa “tendência para subordinar tudo ao comércio, 
ao interesse, ao lucro, ao ganho”, ou ainda, “predominância do inte-
resse ou do espírito mercantil”. Em outras palavras, a Europa estava 
criando um outro tipo de sociedade, fundamentada em outros va-
lores, em outras significações, que virá a ser conhecida ou batizada 
como “capitalismo”. Esse é um tipo de sociedade em que o econô-
mico prevalece e, a partir dele, tudo tende a ser transformado em 
“mercadoria”, a assumir a forma mercadoria. E, como tal, a ser ele-
mento de troca. 
Nossos aborígenes faziam prisioneiros nas suas guerras, que 
eram motivadas pela necessidade de buscar novos territórios, ha-
vendo um esgotamento relativo dos territórios anteriormente 
ocupados. Os prisioneiros eram sacrificados em rituais próprios, 
carregados de significações. Mas não eram vendidos. Esta signifi-
cação não existia entre eles. Com os portugueses, chega o espírito 
mercantil, a venda, a exploração mercantil dos recursos naturais (o 
pau brasil foi devastado, e assim começou a devastação da Mata 
Atlântica...), pessoas eram feitas prisioneiras e transformadas em 
20 
mercadorias: escravos eram mercadorias, vendidas e compradas no 
mercado de escravos...(Há um outro livro interessante e recomen-
dável: trata-se de A Nação Mercantilista, de Jorge Caldeira5). Havia 
uma significação imaginária, operante e pesada, que se expressava 
como reificação das relações. Segundo C. Castoriadis, é a captação 
de uma categoria de homens (e mulheres) como assimilável, em 
todos os sentidos práticos, a animais ou coisas, fazendo deles es-
cravos (no caso dos indígenas) ou mercadorias (ou ambas as coisas) 
no caso dos portugueses... Trata-se de uma relação na qual alguns 
homens se vêem e agem, uns em relação aos outros, “não como 
aliados para ajudar, rivais para dominar, inimigos para exterminar 
ou mesmo comer, mas como objetos para possuir”(IIS:185). 
A instituição antagônica e assimétrica das sociedades indí-
genas, onde havia escravidão e canibalismo, conhece uma outra 
forma de desumanização: a reificação mercantilista, que se realiza 
no anonimato da sociedade. Mais do que a troca de homens por 
objetos, o que está presente é a “transformação dos homens ‘em 
objetos’”. E, assim, uma outra pedagogia se instaura.
2.3 A ratio studiorum nos trópicos
Evidentemente, os contatos estabelecidos instauraram um 
novo processo educativo, ou re-educativo. Os autóctones foram 
aprendendo novas formas de ser, de se relacionar, de agir, de pen-
sar. A educação sistemática, porém, irá começar com os jesuítas. A 
ocupação sistemática do novo mundo vai requerer a inculcação de 
nova maneira de ser, de pensar e de agir entre os nativos. O proces-
so dito civilizatório visava “dilatar a fé e o império”. Em resumo: visa-
va fazer viger uma outra civilização, um outro imaginário. De lá para 
cá, sabemos o que aconteceu, pois somos herdeiros desse processo 
dito civilizatório. Processo civilizatório de inspiração cristã, católica, 
ibérica e capitalista, no qual se reitera, de forma renovada, um sis-
tema de poder e de riqueza profundamente assimétrico, no qual, 
adverte Caldeira (p.7 e ss.), “a formulação de política econômica era 
deliberadamente pensada como modo de excluir os interesses da 
maioria dos agentes e satisfazer uma minoria (pouco interessada 
no progresso). Uma cultura e uma política de exclusão, na qual a 
maioria dos agentes não deveria aparecer como sujeitos de desejos 
próprios que devessem ser levados em consideração.”
Pois bem, nossos primeiros educadores formalmente desig-
nados como tal, valendo-se de uma pedagogia específica, elabo-
rada, formalizada, foram os jesuítas. Eles marcaram sua presença 
educacional no Brasil de 1549 a 1759. Serão 210 anos de influência 
religiosa: inculcação dos novos valores, do novo sagrado. 
Na Bahia, criaram as Confrarias dos Meninos de Jesus, que 
mantinham os Colégios dos Meninos de Jesus, onde ensinavam aos 
filhos dos “principais da terra” e, inicialmente, aos filhos dos caciques 
indígenas, com os quais interessava manter bons contatos. O siste-
ma era financiado pela redízima, norma segundo a qual um percen-
tual de dez por cento do quanto ia como tributação ao reino. Eco-
nômica e politicamente, instituiu-se a escolarização como extensão 
do Estado português. Sendo privado, era financiado com recursos 
públicos. Pedagogicamente, em sentido estrito, apoiava-se na ratio 
5 CALDEIRA, Jorge. A Nação Mercantilista – ensaio sobre o Brasil . São Paulo: 
Ed. 34, 1999. 
Conjunto de normas cria-
do para regulamentar o 
ensino nos colégios jesuí-
ticos. Sua primeira edição, 
de 1599, além de susten-
tar a educação jesuítica, 
ganhou status de norma 
para toda a Companhia de 
Jesus. Tinha por finalida-
de ordenar as atividades, 
funções e os métodos de 
avaliação nas escolas je-
suíticas.
21 
studiorum, que eram as disposições da Companhia de Jesus, ordem 
religiosa recém-criada para contrapor-se ao protestantismo refor-
mista e assegurar a defesa da ortodoxia católica. Esta determinava, 
além do elementar “ensinar a ler, escrever e contar”, o ensino das 
Humanidades (Gramática, Literatura (Humanidades) e Retórica), 
das Artes (Filosofia: Lógica, Metafísica e Filosofia Moral) e da Teo-
logia (Ciências Sagradas). Sua base curricular eram o trivium (Gra-
mática, Retórica e Dialética) e o quadrivium (Aritmética, Geometria, 
Música e Astronomia), herança medieval de inspiração escolástica 
e aristotélica, esta profundamente torcionada pelo tomismo. A lín-
gua oficial era latim ou grego. A novidade, no Brasil, foi a introdução 
da língua portuguesa e da própria língua tupi para facilitar a comu-
nicação com os nativos6. Mas o interesse maior, senão exclusivo, era 
o de formar os próprios quadros clericais e os amanuenses para o 
comércio da época. Ao final do período, estima-se que haveria uma 
“rede” profissionalizante com cerca de três mil alunos, espalhados 
pelo Brasil, seguindo as trilhas do processo evangelizador. O que 
não seria, talvez, de pouca importância se nos lembrarmos do que 
foi o trabalho “civilizador” dos jesuítas espanhóis que instituíram os 
Sete Povos das Missões, no noroeste do que hoje é o Rio Grande do 
Sul, a “região missioneira”. Como quer que seja, igualmente, o ensi-
no superior que foi ensaiado pelos jesuítas na Bahia, foi impedido 
de continuar, ainda no século XVI.
2.4 As vozes da África
Os portugueses, tendo viajado muito pela África, conheciam 
os mouros do norte e os negros do interior do continente. Muitos 
desses negros viviam em Lisboa. Por isso, quando chegaram ao Bra-
sil, chamaram os índios de negros da terra. Por serem diferentes dos 
europeus, estes os achavam inferiores. Para que tivessem algum va-
lor para os europeus, era preciso que se tornassem idênticos a eles. 
Era preciso catequizar os indígenas, convertendo-os a qualquer cus-
to ao cristianismo. E era preciso ensiná-los a viver em aldeias como 
as da Europa e trabalhar como os europeus. Como não estavam 
acostumados a viver e trabalhar desse modo, era preciso obrigá-los 
a trabalhar e viver assim. Era preciso transformá-los em escravos dos 
colonos brancos portugueses.
Nos primeiros tempos, a plantação da cana-de-açúcar foi toca-
da assim, com o trabalho dos índios escravizados. Os bandeirantes, 
que saíam pelo sertão afora para procurar ouro e pedras preciosas, 
também buscavam indígenas para apresar e trazerpara o trabalho 
nas plantações. Mas os indígenas, que não estavam acostumados a 
esse modo de vida, rendiam pouco como mão-de-obra nos enge-
nhos de cana. E, depois, os padres jesuítas, que tinham por missão 
convertê-los à religião dos colonizadores, não se conformavam com 
essas práticas dos bandeirantes, porque eram um péssimo exemplo 
da civilização dos brancos cristãos. Foi por isso que os portugueses 
donos dos engenhos de cana resolveram buscar outra gente para 
trabalhar em suas terras. Se os negros da terra não serviam, era me-
lhor ir buscar os negros da África. E é aqui que começa a história da 
presença dos africanos negros no Brasil.
Nossos antepassados negros eram pessoas muito diferen-
6 CHAGAS, Valnir. A preparação de quatro séculos. In: O Ensino de 1º e 2º Graus – 
antes, agora, e depois? São Paulo: Saraiva, 1984.
22 
tes umas das outras, tal como os indígenas que viviam no Brasil 
na época do descobrimento. Aqui não havia índios, simplesmente, 
mas muitos povos indígenas de várias nações, que falavam línguas 
diferentes e viviam de muitas maneiras diversas. E o mesmo aconte-
ceu com os escravos vindos da África. Eles não eram simplesmente 
negros africanos escravos, mas povos que pertenciam a muitas na-
ções. Os primeiros africanos que foram trazidos como escravos para 
o Brasil vinham da costa da África ocidental. Eram povos que aqui 
ficaram conhecidos como negros minas, congos, angolas, guinés, ca-
bindas, rebolos, benguelas, moçambiques e muitos outros nomes, e 
todos eles pertenciam ao grupo dos povos bantu e sudaneses. Os 
países da África que hoje se chamam Angola, Congo, Moçambique 
ou Guiné receberam esses nomes por causa desses povos que lá 
viviam há muito tempo e foi dessas regiões que vieram os primeiros 
escravos. Depois, também vieram como escravos os povos de cul-
tura iorubá, da Nigéria e do Benin, e também eles formavam nações 
distintas, dos nagôs, dos geges, dos ijexás. Muitos deles viviam em 
civilizações altamente desenvolvidas, como no reino de Oyó, onde 
havia grandes cidades. Ali, reis poderosos exibiam o luxo de suas 
cortes e tinham uma cultura muito refinada. Os artesãos sabiam tra-
balhar os metais como ninguém e em sua arte as esculturas de ferro 
e de madeira entalhada eram maravilhosas. Cada um desses povos 
tinha um modo de vida próprio, com costumes diferentes e crenças 
religiosas muito elaboradas. Entre os povos bantu, cada grupo de 
famílias cultuava seus antepassados, pois acreditavam que vinha 
deles a força que sustentava a vida de todos os membros do gru-
po. Os deuses dos iorubá eram os orixás, ligados aos elementos e 
às forças da natureza. Havia divindades do fogo e do ar, da água e 
da terra. Havia deuses e deusas das matas e dos rios, da chuva, da 
tempestade, dos raios, do trovão, do arco-íris. Havia um deus dos 
metais, da agricultura e das armas de guerra e outro que protegia 
as pessoas das doenças. Mas, apesar disso tudo, para os brancos 
europeus eles eram apenas negros que, como os índios da América, 
era preciso civilizar. Os negros eram capturados na África e depois 
vendidos aos comerciantes de escravos. De lá, eram embarcados 
nos navios chamados negreiros e uma enorme quantidade deles 
morria na travessia do oceano Atlântico, por causa das doenças e 
dos maus tratos que sofriam. Às vezes, mesmo antes de embarcar, 
eles eram batizados, recebendo um nome cristão, e isso bastava 
para que fossem considerados “convertidos” à fé dos seus senhores. 
Outras vezes, eram batizados assim que desembarcavam nos por-
tos do Brasil, em Pernambuco e na Bahia, antes de serem levados ao 
mercado de escravos. 
Os escravos que eram comprados nos mercados de Recife ou 
Salvador iam trabalhar nas plantações de cana-de-açúcar do litoral 
ou nas fazendas de gado do interior. Como a cana não se adaptou 
bem na capitania de São Vicente, nas terras do litoral de São Paulo, a 
lavoura ali não foi para frente. Mas ela se deu muito bem com o lito-
ral ensolarado de Pernambuco e da Bahia, e foi aí que se instalaram 
os grandes engenhos de açúcar. E depois, quando o povoamento 
português entrou pelas terras do sertão, foram surgindo as grandes 
fazendas de gado. 
Na casa-grande do engenho ou da fazenda, os escravos fa-
23 
ziam todo tipo de serviços. Era preciso plantar e limpar a cana, de-
pois cortar a cana do pé, moer cada uma e ferver o caldo, para fa-
zer o açúcar que seria vendido lá fora, o melado e a rapadura para 
fazer os doces e adoçar os bolos na casa de fazenda. Os escravos 
faziam as peças da moenda e cuidavam dos bois que faziam a mo-
enda girar. Plantavam a mandioca, o milho, o feijão e a abóbora 
que todos comiam. Nas fazendas do sertão, cuidavam do gado no 
pasto e o recolhiam ao curral e davam para ele comer o bagaço da 
cana quando havia por perto um engenho. Cuidavam das crias e 
aproveitavam o leite das vacas para fazer queijo. Quando o gado já 
tinha engordado bem no pasto, eles matavam os bois, salgavam e 
secavam sua carne no sol, para fazer o charque. Era essa carne seca 
que os escravos levavam para vender nos engenhos e nas cidades 
do litoral. No terreiro dos engenhos e das fazendas, as escravas cria-
vam os frangos que matavam na hora, quando chegava uma visita 
ou para fazer o caldo que a senhora do engenho tomava, quando 
estava de resguardo, depois do nascimento de uma criança. Eram 
elas que engordavam os porcos e com sua carne faziam lingüiça e 
chouriço, guardando a banha para temperar a comida. Cuidavam 
do fogão de lenha, do forno de barro, faziam os doces e assavam as 
broas de milho e os bolos de mandioca que todos comiam na casa-
grande. Muitas teciam no tear o pano de suas roupas, que elas pró-
prias costuravam. Também cuidavam da roupa de cama que todos 
usavam na casa grande. E ainda, como mucamas, tinham de cuidar 
da sinhá. Era preciso lavar, engomar e passar suas roupas, cuidar de 
seus sapatos, pentear seus cabelos. 
As escravas também cuidavam dos filhos pequenos da sinhá. 
Eram elas que amamentavam as crianças, que davam banho nelas, 
que cuidavam de suas roupinhas e preparavam sua comida. Mas o 
filho da escrava já nascia escravo. Assim que crescia um pouco mais, 
o moleque ia ajudar na plantação ou na lida do gado e fazia todo 
tipo de pequenos serviços na casa. E quando o sinhô ou a sinhá 
quisesse, podia vender o moleque, ou dá-lo de presente a algum 
conhecido, sem se importar com sua mãe escrava, que ficava com a 
família do senhor para cuidar dos filhos dele.
Os senhores-de-engenho ou das fazendas de gado também 
costumavam ter uma casa na cidade. Então, era ali que os escravos 
iam cuidar da família de seus senhores, nos grandes sobrados de 
Recife, Olinda e Salvador. E também na cidade faziam todos os ser-
viços: vendiam, pela rua, frutas, doces, a água que se tomava nas 
casas. Levavam as pesadas barricas de madeira onde todo dia se 
despejava a urina e as fezes dos moradores das casas, para esvaziá-
las no rio ou no mar. E na cidade também aprendiam todo tipo de 
ofício. Eram ferreiros, barbeiros, carpinteiros. Aprendiam a construir 
casas e igrejas, e aprendiam também a entalhar na madeira os alta-
res das igrejas, suas colunas, aprendiam a esculpir no barro ou na 
madeira as imagens dos santos, a pintar de ouro suas roupas. Toda a 
arte nesse período foi feita com a contribuição do seu trabalho. Era 
assim a vida dos escravos negros vindos da África, desde os primei-
ros tempos em que a colonização portuguesa se dedicou ao cultivo 
da cana, no final do século XVI. Foi nos engenhos e nas fazendas 
que os escravos africanos construíram a riqueza do Brasil por todo 
o século XVII. Mas continuavam a ser desprezados e maltratados 
24 
pelos senhores brancos, porque eram negros e escravos.
O sofrimento dos escravos começava na África e continuava 
depois no Brasil. Às vezes, eram capturados na África todos os mem-
bros de uma família,mas eles eram separados uns dos outros para 
serem vendidos como escravos no Brasil. Também os que falavam 
a mesma língua e vinham de uma mesma região, como os congos, 
angolas, benguelas ou guinés, por exemplo, eram separados na 
hora da venda. Isso porque os donos dos engenhos tinham medo. 
Pois, se eles pudessem se entender uns com os outros e ficassem 
todos juntos, talvez quisessem defender os parentes e os amigos 
contra os castigos e maus-tratos que sofriam e poderiam organizar 
uma revolta. 
E sobravam motivos para revoltas, porque maus-tratos não 
faltavam. Os escravos moravam amontoados nas senzalas e o fei-
tor, que os vigiava por conta do senhor-de-engenho, por qualquer 
coisa dava a eles todo tipo de castigo. Eram presos no tronco, uma 
grande peça de madeira com buracos onde enfiavam seus pés e 
suas mãos. Quando andavam de um lugar para outro, iam amarra-
dos juntos por uma comprida corrente, chamada libambo. Às vezes 
tinham que carregar no ombro ou apoiada na cabeça uma pesa-
da peça de madeira, o cepo, que era preso no seu tornozelo com 
uma corrente, para impedir que eles pudessem correr e fugir. Ou-
tras vezes, o senhor punha no pescoço do escravo a gargalheira, um 
pesado colar de ferro com três pontas bem altas para impedir que 
ele virasse a cabeça, mal podia andar assim. Outras vezes, ainda, os 
escravos eram castigados com a palmatória, uma prancha de ma-
deira cheia de furos que o feitor batia com força na sua mão. Mesmo 
nas crianças se batia com a palmatória e suas mãozinhas ficavam 
inchadas e cheias de marcas. Por isso as revoltas eram constantes. 
E, apesar da vigilância do senhor e do feitor, muitos conseguiam 
fugir dos engenhos de açúcar e das fazendas. O senhor mandava 
atrás deles o capitão do mato e, quando eram apanhados e trazi-
dos de volta, sofriam ainda maiores castigos. Por isso os escravos 
precisavam fugir cada vez mais para longe, para lugares onde não 
pudessem ser alcançados. E, quando conseguiam se reunir nesses 
lugares, precisavam se organizar muito bem para se defender dos 
brancos, caso eles chegassem até lá. Essas comunidades criadas 
pelos negros eram chamadas quilombos e os que ali viviam eram 
conhecidos como quilombolas. O quilombo mais importante que 
existiu no Brasil foi Palmares, que se organizou no atual Estado de 
Alagoas por volta de 1597. Palmares conseguiu resistir aos brancos 
por quase 100 anos e, no período mais importante de sua história, 
durante 30 anos, conseguiu manter vivendo ali cerca de 30 mil pes-
soas. Os líderes de Palmares que se tornaram mais conhecidos fo-
ram Ganga-Zumba e Zumbi e é por causa da resistência heróica dos 
escravos daquele quilombo que o dia da morte de Zumbi, 20 de 
novembro, passou a ser comemorado no Brasil desde 1978 como 
o Dia da Consciência Negra. O quilombo dos Palmares foi destru-
ído em 1694 por um bandeirante paulista, Domingos Jorge Velho. 
E são os bandeirantes e os quilombos que nos fazem chegar mais 
perto da origem dos atuais remanescentes dos quilombos, espa-
lhados por diferentes cantos do território brasileiro, a exemplo do 
povo Kalunga, em Goiás, território que também foi um quilombo, 
Saiba mais sobre o líder 
Zumbi e o Quilombo dos 
Palmares em: http://www.
historiadobrasil.net/qui-
lombos/
25 
surgido na época em que os bandeirantes paulistas chegaram até 
às terras de Goiás7.
2.5 As reformas pombalinas
A “rede” jesuíta de ensino, este embrião de “sistema de ensi-
no”, cujas características estão sumariamente reproduzidas, foram 
eliminadas em 1759 pelo Marquês de Pombal. Era o “Iluminismo” 
chegando ao Brasil e, entre outras razões de natureza política e 
econômica, declarando a necessidade de lutar contra o atraso filo-
sófico, o aristotelismo, defendo a incorporação de novos ideais filo-
sóficos e científicos, um novo sentido de educação que deveria ser 
implantado por intermédio da escola (nesta época as escolas come-
çavam igualmente a serem criadas na Europa8). O Estado português 
reassume o protagonismo, antes em poder da Igreja, em matéria 
educacional. Mas obtém resultados desastrosos. Apenas treze anos 
depois da expulsão dos jesuítas foi criado o “subsídio literário”, para 
financiar o ensino elementar e de humanidades, que constaria de 
“aulas régias”, isto é, aulas “avulsas”, de latim, grego ou retórica para 
evitar a simples e pura ausência de escola. 
A população beirava os “três milhões” de habitantes. Socie-
dade rígida e escravocrata, nela não poderia haver nem tipografias 
nem manufaturas, nem sequer oficinas de ourivesaria. Os “profes-
sores” passaram a ser improvisados, sem a formação dos jesuítas, 
que era notável. (Talvez daí decorra a expressão de “professor leigo”, 
associando o despreparo ao fato de serem não “religiosos”, como 
até então). 
Vale lembrar algumas premissas da reforma pombalina, tal 
como expressas por Antonio Nunes Ribeiro Sanches (amigo de Luiz 
Antonio Verney, autor de O Verdadeiro Método de Estudar, inspirador 
filosófico da reforma), o mentor político das mudanças: no ensino 
primário, afastar das escolas de ler e escrever os filhos dos pobres 
e das pessoas do campo, porque se estes se alfabetizassem, deixa-
riam o campo, ou quereriam ser outra coisa que não roceiros, pes-
cadores ou ocupar ofícios humildes como seus pais. Para evitar isso, 
deveriam ser eliminadas as escolas, públicas ou particulares, nas 
aldeias e pequenos vilarejos. Quanto às colônias, no caso o Brasil, 
dever-se-ia ter presente que seu único objeto deveria ser “a agricul-
tura e o comércio”, não podendo nelas existirem instrução, cultura, 
elevação científica. Pois fariam frutificar honras, cargos, dinheiro e 
valores humanos que só deveriam frutificar na metrópole. Isso só 
poderia beneficiar pessoas das Colônias “se frutificassem na corte”.9 
Eram proibidas as escolas de latim (ensino médio), pelas mesmas 
razões. Era importante cultivar expressamente a dependência da 
colônia em relação à capital, o reino. No Brasil, da nova proposta, 
apenas no Seminário de Olinda, sob inspiração do bispo D. Azeredo 
Coutinho, aconteceu alguma coisa de tal reforma do ensino médio, 
que consistiu em incluir no currículo o estudo das ciências matemá-
ticas, físicas e naturais, complementando as matérias tradicionais. E 
7 O texto sobre a contribuição trazida da África é de autoria da Prof.ª Dr.ª Maria da 
Glória Moura, da Universidade de Brasília e do Núcleo de Estudos Afro-Brasileiros, 
e integra um livro em fase de conclusão sob o título Uma História Kalunga, que 
trata dos quilombos formados pelos povos Kalunga na região de Goiás.
8 LOBROT, Michel. Para que serve a escola? 
9 SANCHES, Ribeiro. Cartas sobre a Educação da Mocidade, apud José Antônio To-
bias, História da Educação Brasileira, São Paulo: Editora Juriscredi, 1972, p. 120.
26 
o Seminário de Olinda é considerado um centro importante de re-
novação do pensamento filosófico e político no nordeste brasileiro, 
com influência decisiva na história de Pernambuco e da Revolução 
Pernambucana de 1817. 
2.6 A educação de D. João VI
Quando a família real chegou ao Brasil, em 1808, praticamen-
te nada havia em matéria de ensino. Era um total vazio. Ao monarca 
coube várias iniciativas no campo cultural, tais como a criação da 
Imprensa Régia, do Jardim botânico, da Biblioteca, do Museu Na-
cional. Os interesses do Estado aqui implantado requeria médicos, 
engenheiros, oficiais militares. Daí a criação da Escola de Cirurgia na 
Bahia, da cadeira de Ciência Econômica, da Academia de Guardas-
Marinha, da cadeira de Medicina Operatória e Arte Obstétrica, da 
cadeira de Cálculo Integral, Mecânica e Hidrodinâmica em Pernam-
buco, da cadeira de Medicina Clínica no Hospital Real Militar e de 
Marinha, da Academia Real Militar, considerada a primeira faculda-
de brasileira oficialmente criada. Implanta-se o sistema de ensino 
no Brasil, começando pelo ensino superior,instituído em forma de 
ensino profissionalizante em estabelecimentos ou unidades isola-
das.
2.7 O ensino no Império
A situação da educação escolarizada no Brasil não sofrerá 
grandes alterações ao longo do Império. De um modo geral, o en-
sino superior consolida as escolas criadas por D. João VI, acrescen-
tando a elas as Faculdades de Direito de São Paulo e do Recife, e 
já no seu final, a Escola de Minas, de Ouro Preto. No ensino médio, 
surgem os Liceus, tendo como referência “modelar” o Colégio Pedro 
II, criado no Município da Corte, com alguns outros espalhando-se 
pelas províncias. 
O setor privado vai construindo também os seus espaços. A 
grande referência, por exemplo, em Minas Gerais, é o Colégio Ca-
raça. Entretanto, nada de uma rede pública respeitável. No ensino 
primário, então, o panorama é desolador. Com a Independência, a 
educação do povo se exprime de forma genérica e superficial. Na 
Constituição de 1823, o artigo 19 determina “a instrução primária 
gratuita a todos os cidadãos”. Em 1826, surge uma primeira reforma 
do ensino, promovida pelo Cônego Januário da Cunha Barbosa, pro-
pondo a inspeção escolar, e, em 1827, uma lei é promulgada criando 
as escolas de primeiras letras em todas as cidades, vilas e lugarejos, 
e estabelecendo o método Lancaster ou de ensino mútuo. Nos con-
ventos havia escolas para meninos ou meninas, conforme fosse a 
congregação masculina ou feminina. A educação feminina era uma 
raridade. Em 1834, entretanto, o Ato Adicional, estabelecendo uma 
monarquia federativa e descentralizadora, cria as Assembléias Le-
gislativas Provinciais, e descentraliza também a educação, que fica 
sob responsabilidade das Províncias, a cujas Assembléias competi-
ria legislar “sobre a instrução pública e os estabelecimentos próprios 
a promovê-la”. Esta descentralização prosseguirá com a República, 
retomando em nossos dias a forma de municipalização do ensino. A 
escassez de recursos, ou de interesse, deixou o ensino básico a des-
coberto. No ensino médio, as reformas seguiram, numa tensão ora 
27 
estruturante ora desestruturante, haja vista, por exemplo, o caso da 
reforma Leôncio de Carvalho, que, em 1879, estabeleceu o “ensino 
livre”, ou seja, ampliou para todo o Império as medidas que estabe-
leceram, no mesmo ano, no Município da Corte, os exames vagos e 
o regime de freqüência livre. Agora abria ao setor privado a possibi-
lidade de abrir escolas e cursos de todos os tipos e níveis, podendo 
conceder graus acadêmicos e vantagens até então concedidos ex-
clusivamente pelos estabelecimentos públicos. A responsabilidade 
pública era apenas quanto à inspeção para garantir as condições 
“de moralidade e higiene”.10 E é com esse quadro de precariedade 
que entramos na República.
2.8 A política educacional na Primeira República
A primeira reforma educacional no período republicano acon-
teceu em 1890, tendo sido criado o Ministério da Instrução Pública, 
Correios e Telégrafos. Sua ênfase recaiu sobre o ensino médio, refor-
mando o Colégio Pedro II, destacando o ensino das ciências natu-
rais e exatas. Em 1901 (Epitácio Pessoa), depois em 1911 (Rivadávia 
Correia novamente reedita Leôncio de Carvalho desoficializando 
e privatizando o ensino público), depois em 1915 (Carlos Maximi-
liano), depois em 1925 (Luiz Alves/Rocha Vaz) aconteceram novas 
“reformas”. Para Otaíza Romanelli, entretanto, “todas essas reformas 
não passaram de tentativas frustradas e, mesmo quando aplicadas, 
representaram o pensamento isolado e desordenado dos coman-
dos políticos, o que estava muito longe de poder comparar-se a 
uma política nacional de educação”11. 
O mais importante dessa fase da história da sociedade brasi-
leira e da institucionalização da educação escolarizada é um forte 
movimento de reforma nascido entre os educadores que em 1924 
criaram a Associação Brasileira de Educação e realizaram várias re-
formas estaduais, em São Paulo, em Minas Gerais, no Ceará, no Dis-
trito Federal e na Bahia. Nesse contexto aconteceu o movimento da 
Escola Nova e se constituirá o núcleo dos “pioneiros da educação”, 
que terão muita influência na década seguinte.
2.9 A educação a partir dos anos 30: as leis 
“orgânicas”
É a partir dos anos 30 do século XX, no bojo de um movimen-
to de sociedade que culmina na Revolução de 30, que se começará 
um sistema de ensino público segundo uma tal política nacional. É 
a Reforma Francisco Campos que, em 1931, dá a largada do proces-
so. Este processo vai desaguar na Constituição de 1934. Nesta, vão 
se fazer ouvir os ecos do Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova, 
que, assinado por ilustres figuras da vida pública e educacional bra-
sileira, procurara, em 1932, despertar a nação para a importância da 
reforma educacional, dirigindo “ao povo e ao governo” uma propos-
ta de “reconstrução educacional no Brasil”, afirmando a importância 
e a gravidade do “problema educacional” dentro da “hierarquia dos 
problemas nacionais”, afirmando a impossibilidade de “desenvolver 
as forças econômicas ou de produção sem o preparo intensivo das 
10 HAIDAR, Maria de Lourdes Mariotto. O Ensino Secundário no Império Brasileiro. 
São Paulo: Editorial Grijalbo, 1972, p.189.
11 ROMANELLI, Otaíza de Oliveira. História da Educação no Brasil. Petrópolis: Vozes, 
1986, p. 43.
28 
forças culturais e o desenvolvimento das aptidões à invenção e à 
iniciativa que são os fatores fundamentais do acréscimo de riqueza 
de uma sociedade”. Na avaliação dos signatários, após 43 anos de 
República, ainda não se lograra “criar um sistema de organização 
escolar”, permanecendo “tudo fragmento e desarticulado” na esfe-
ra das iniciativas de política educacional. Propunha-se, então, uma 
política com “visão global do problema, em todos os seus aspec-
tos”. Esse “estado antes de inorganização do que de desorganização 
do aparelho escolar, (tem sua causa principal) na falta, em quase 
todos os planos e iniciativas, da determinação dos fins da educa-
ção (aspecto filosófico e social) e da aplicação (aspecto técnico) dos 
métodos científicos aos problemas de educação”12. Propunham um 
“movimento de renovação educacional” para a reconstrução da 
área, buscando “transferir do terreno administrativo para os planos 
político-sociais a solução dos problemas escolares”. 
Essa “campanha de renovação educacional” procurou “formular, em 
documento público, as bases e diretrizes do movimento”. O docu-
mento apresentava, assim, um programa para uma “nova política 
educacional”, formulada a partir de “uma visão global do problema 
educativo”. E, na seqüência, abordaram as finalidades da educação, 
o problema dos valores (valores mutáveis e valores permanentes), o 
papel do Estado em face da educação, caracterizando a esta como 
“uma função essencialmente pública”, propondo o “princípio da es-
cola para todos” – “escola comum ou única” – de sorte a “não admitir 
dentro do sistema escolar do Estado, quaisquer classes ou escolas a 
que só tenha acesso uma minoria, por um privilégio exclusivamen-
te econômico”. 
Afirmam-se, então, os princípios da laicidade, da gratuidade, 
da obrigatoriedade e da coeducação (educação conjunta de estu-
dantes de ambos os gêneros), da unidade da função educacional, da 
sua autonomia, da descentralização. Discutem-se, ainda, importan-
tes elementos metodológicos, fundamentado o “processo educati-
vo” nos conceitos e fundamentos da “educação nova”. Enfatizava-se 
a importância “do estudo científico e experimental da educação” 
por oposição do “empirismo” reinante (e é dessa época a criação do 
Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Tei-
xeira – INEP). Propunha-se um “plano de reconstrução educacional” 
que representasse uma “radical transformação da educação públi-
ca em todos os seus graus”, compreendo “dos jardins de infância à 
Universidade”, passando por uma escola secundária “unificada parase evitar o divórcio entre os trabalhadores manuais e intelectuais”, 
tendo “uma sólida base comum de cultura geral”, para “posterior 
bifurcação em secção de preponderância intelectual (...) e em sec-
ção de preferência manual, ramificada por sua vez em ciclos, esco-
las ou cursos destinados à preparação às atividades profissionais...” 
Propunha-se uma vigorosa reforma da Universidade, dando-se es-
pecial atenção à formação dos “melhores talentos”, indispensáveis 
“à formação das elites de pensadores, sábios, cientistas, técnicos e 
educadores” indispensáveis para “o estudo e solução” dos diferentes 
problemas nacionais.
Finalmente, enfatizava a importância da formação dos pro-
fessores, em todos os níveis, preconizando “o princípio da unidade 
12 GHIRAREDELLI JR., Paulo. História da Educação. 2. ed. São Paulo: Cortez, 1994. 
p.54 e ss.
29 
da função educacional” contra a “tradição das hierarquias docentes 
baseadas na diferenciação dos graus de ensino”, que diferenciava 
“mestres, professores e catedráticos”, fundamental para a “liberta-
ção espiritual e econômica do professor, mediante uma formação 
e remuneração equivalentes que lhes permita manter, com a efi-
ciência no trabalho, a dignidade e o prestígio indispensáveis aos 
educadores”.
Após abordar o “papel da escola na vida e a sua função so-
cial”, o documento conclui afirmando “a disposição obstinada” de 
enfrentar as dificuldades apontadas, a disposição de lutar “na defe-
sa de nossos ideais educacionais”, para realizar “uma nova política 
educacional, com sentido unitário e de bases científicas”. Tratava-se, 
para os signatários, de “uma missão a cumprir”, contra a indiferença 
e a hostilidade, “em luta aberta contra preconceitos e prevenções 
enraizadas”, convictos de que “as únicas revoluções fecundas são 
as que se fazem ou se consolidam pela educação”. Este era, dentre 
todos os deveres do Estado, ”o que exige maior capacidade de de-
dicação e justifica a maior soma de sacrifícios, aquele com que não 
é possível transigir sem a perda irreparável de algumas gerações...” 
 Trata-se de um texto histórico, riquíssimo, que merece ser 
conhecido em detalhes. Seus efeitos se farão sentir na Constituição 
de 1934, que, pela primeira vez, falará em “diretrizes e bases da edu-
cação” e proporá a realização de um plano nacional de educação. E 
então deslancha um processo de reforma e estruturação do sistema 
educacional brasileiro. Esse processo vai prosseguir durante todo o 
período Vargas, completando-se em 1946. Na verdade, serão bem 
quinze anos de reformas, começando com a do ensino superior, em 
1931 (mas que acontecerá de fato na criação da USP em 1934), pas-
sará pelas Leis Orgânicas do Ensino Secundário, Industrial, Comer-
cial e Agrícola entre 1942 e 1943, e terminará com as Leis Orgânicas 
do Ensino Primário e do Ensino Normal, em 1946. Registre-se, consi-
derando o ensino primário, que sua normatização data de 1946, ou 
seja, tem, no ano de 2001, apenas 55 anos de vigência. Foi na Cons-
tituição de 1934 que a expressão “diretrizes e bases da educação 
nacional”, criada pelos pioneiros, se incorporou definitivamente no 
vocabulário educacional brasileiro, enquanto expressão que, na re-
alidade, vai se efetivar através das leis orgânicas, já mencionadas, e 
na própria Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, cujo pro-
jeto, de 1948, após a Constituição de 1946, foi aprovada em 1961, 
para ser reformada em 1971, até chegar à atual Lei 9394/96, sob 
cuja égide nos encontramos.
A institucionalização, pois, de um sistema nacional de educa-
ção, apoiado numa política nacional consistente, democraticamen-
te elaborada, tem apenas cerca de 40 anos no Brasil. Pois foi a partir 
de tal período, 1961, que, efetivamente, se “organizou” o sistema 
de forma consistente e coerente. Os próximos módulos abordarão 
a forma e os termos em que este sistema se organizou, tanto no 
plano filosófico, macro político e administrativo, quanto no plano 
pedagógico propriamente dito, e na esfera micropolítica, o plano 
dos estabelecimentos de ensino.
30 
ATIVIDADES SUGERIDAS
Em função de seu interesse particular, selecione um artigo em 
500 Anos de Educação no Brasil e comente-o, levando em conta os 
conceitos da primeira parte do módulo.
Procure entrar em contato com a Fundação Cultural Palmares 
(www.minc.org.br/fcp/) e pesquise sobre as características das 
culturas africanas que vieram para o Brasil com os escravos.
Atualize seus conhecimentos sobre as culturas indígenas, 
seus povos, sua sabedoria. Busque em www.cimi.org.br e em www.
funai.org.br.
Identifique um tema de seu interesse particular (educação 
fundamental, média, profissional) e pesquise sobre ela, partindo da 
bibliografia apresentada, mas sem se limitar a ela.
Estude e compare a evolução da questão educacional nas di-
ferentes Constituições brasileiras. Interprete as mudanças em fun-
ção dos conceitos apresentados como fundamentação. Comple-
mente com outras leituras e teorias, se o desejar.
31 
32 
33 
2 
Conceitos, finalidades e orga-
nização da educação nacional
OBJETIVOS ESPECÍFICOS
- Analisar os objetivos propostos para cada nível de ensino;
- Analisar tais formulações numa perspectiva filosófico-crítica;
- Identificar a problemática fundamental da organização do sistema de ensino em seus 
diferentes níveis e modalidades;
34 
1 Conceito, finalidades, objetivos e 
macro-organização
Considerando a institucionalização da educação como par-
te do processo de instituição da sociedade, e sendo a sociedade 
auto-instituição, seu destino depende de nós. Dito de outra forma, 
a sociedade não é algo pronto, acabado de uma vez por todas. Ao 
contrário, é algo que se faz e se refaz permanentemente. É algo por-
ser, por-fazer. E que cabe aos cidadãos definirem o rumo que deve 
tomar, antecipando o tipo de sociedade que querem ter, querem 
construir, pro-jetando, isto é, antecipando o futuro que desejam. 
Daí a sociedade poder ser considerada um pro-jeto: algo a ser cons-
truído segundo nossos interesses, desejos e necessidades. Como 
se fora nossa casa. Ou talvez, nosso barco comum, na travessia da 
vida. 
Qual educação, então? Bem, isso depende de qual sociedade 
queiramos. De onde podemos dizer que a cada projeto de sociedade 
corresponde um projeto de educação. Esta postura define o caráter 
da educação: uma educação que assume seu caráter radicalmente 
político, pois que define os valores em torno dos quais a sociedade, 
ou seja a polis, se organiza? Ou uma educação doméstica, serva da 
ordem existente, posta exclusivamente a seu serviço, apenas pre-
paradora da mão-de-obra funcionalmente necessária e, em tem-
pos capitalistas, preocupada com a educabilidade como condição 
da empregabilidade que depende da produtividade que dispensa 
critérios de estabilidade no trabalho?
Dentro de tal perspectiva é que vamos recuperar as disposi-
ções das leis que regeram nossa educação. São elas, principalmen-
te, as leis nº 4024 (de dezembro de 1961), nº 5692 (de agosto de 
1971) e nº 9394/96 (de dezembro de 1996).
1.1 O conceito de educação
A Lei 9394/96 começa situando a educação escolar dentro 
de um quadro no qual aparece a educação como fenômeno an-
tropológico fundamental que se desenvolve “na vida familiar, na 
convivência humana, no trabalho”, nos movimentos sociais, nas or-
ganizações da sociedade civil, nas manifestações culturais (art.1º). 
E, por isso, dispõe que a educação escolar deva estar vinculada ao 
mundo do trabalho e à prática escolar (§ 2º).
1.2 As finalidades da educação escolar
Os últimos cinqüenta anos da educação escolar brasileira 
(pois o projeto da LDB apareceu em 1948) assim apresentam as 
finalidades educacionais. Na Lei n.º 4024/61, nós as encontramos 
assim formuladas:
 “Art.1º: A educação nacional, inspirada nos ideais de liberdade 
e nos ideais de

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