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Universidade de São Paulo Instituto de Relações Internacionais A tentativa de consolidação de uma instituição neoliberal: o Sistema Interamericano de Direitos Humanos Carolline Silva Soier Número USP 8928909 Professora Janina Onuki São Paulo 2017 Introdução A globalização é uma ligação sistemática concebida pela integração econômica entre Estados-nação, culturas nacionais e o próprio Direito. É um fenômeno que abarca diversas esferas das relações sociais, tais como cultura e trabalho. Por atender aos anseios da política econômica, é um acontecimento de fácil adesão pelas diversas sociedades, que passou a inseri-la nos diplomas nacionais com respaldo para a segurança jurídica. O direito positivo vem sofrendo as consequências das novas formas de organização econômica capitalista, da transnacionalização dos mercados, da mobilidade quase ilimitada alcançada pela circulação dos capitais e da compressão do tempo e do espaço, graças ao avanço da informática, das telecomunicações e dos transportes, que influenciam em sua estrutura 1 . Ainda, esse fenômeno multidimensional da globalização também pode afetar as já cunhadas bases do Direito liberal do Estado Social Democrático de Direito, haja vista o surgimento de novos bens a serem tutelados até a flexibilização das garantias fundamentais dos indivíduos. Faz-se, assim, necessária uma atividade de cooperação jurídica transnacional, tendo em vista a debilidade dos Estados em lidar isoladamente com tais atividades de ampla incidência e de difícil controle. No entanto, apesar de tais atividades criminosas carecerem de uma jurisdição sem fronteiras minimamente aplicável, as divergências no grau de evolução dos ordenamentos jurídicos nacionais bem como os problemas regionais enfrentados por cada nação constituem um intempérie ao fomento de tal organização internacional combatente. Trata-se, por isso, de uma evolução das bases liberais jurídicas pelo advento de configurações neoliberais. Como tentativas de remediação dessas barreiras, os Estados têm aderido a políticas de redução da amplitude de sua atividade jurisdicional, cedendo parcela de sua competência na tutela do processo penal e nos julgamentos de crimes que ultrapassam-lhe as fronteiras. Dessa forma, a globalização fomenta o advento à assinatura de Tratados e Convenções, que modificam, muitas vezes, o ordenamento jurídico nacional. O objetivo desse trabalho, portanto, consiste justamente em tratar e esclarecer sobre o funcionamento de um desses sistemas jurídicos transnacionais disponíveis: o Sistema Interamericano de Direitos Humanos. Busca-se, assim, não só delimitá-lo sob a óptica de uma 1 DA SILVA, Ivan Luís Marques. O Direito Penal como garantia fundamental (o novo enfoque decorrente da globalização). Dissertação (Mestrado em Direito Penal) – Faculdade de Direito, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2007, p.43. instituição neoliberal, mas também de trazer à tona suas limitações no âmbito de jurisprudencial, decorrentes das recentes modificações do próprio sistema neoliberal internacional. Além disso, pretende-se trazer o embate temático dos Direitos Humanos como norte principal da discussão sobre sucessos e falhas do Sistema Interamericano e da própria teoria neoliberal. 1. A teoria neoliberal das Relações Internacionais A teoria neoliberal das Relações Internacionais, cujas origens remontam para o final da década de 1980 e início da década de 1990, insere-se como tese argumentativa para corroborar os novos aspectos do sistema internacional, desenvolvidos no período pós Guerra Fria e no ambiente efervescente da globalização. Delibera sobre um sistema internacional anárquico, descentralizado, tendo os Estados como principais atores. No entanto, ao contrário da teoria antecessora – o liberalismo –, que possuía a economia como área de concomitância de interesses, tem como ponto de convergência e enfoque de atuação o papel das instituições, atenuantes de um iminente estado de guerra ou insurgências. Segundo Keohane 2 , os conceitos gerais para completo entendimento do Sistema Internacional são a descentralização e a institucionalização. Nesse ponto, tais conceitos seriam simbióticos, uma vez que, dado a profusão constante de uma descentralização de instâncias de decisões, o ambiente das instituições serviria para justamente convergir interesses comuns. Dessa forma, os atores estatais, cientes em possuírem interesses comuns, tendem a cooperar, apesar da emergência ocasional de divergências. 1.1. A institucionalização do Sistema Internacional Keohane 3 insere como pauta principal do neoliberalismo a relevância das instituições como atores supraestatais dos processos decisórios de relevância nacional e mundial. O grau de institucionalização resvalaria diretamente no comportamento decisório individual e único de cada Estado. Ainda segundo o autor, as “instituições como grupos de regras (formais e 2 NYE JR., Joseph, KEOHANE, Robert. Power and Interdependence Revisited. International Organization, vol. 41, nº 4, pp. 725-727, 1987. 3 NYE JR., Joseph, KEOHANE, Robert. Power and Interdependence Revisited. International Organization, vol. 41, nº 4, p. 728, 1987. informais) persistentemente conectadas que prescrevem o comportamento, constrangem as atividades e definem as expectativas”. Há ao todo três diferentes formas de arranjos institucionais que coabitam o sistema internacional e influenciam o processo decisório dos Estados. Em primeiro lugar, temos o formal intergovernamental ou organizações não-governamentais internacionais, instituições fundamentadas pelos Estados com algum propósito específico, uma organização burocrática sedimentada e regras específicas de aplicação. Tais seriam, por exemplo, a ONU, a OMC, a UNASUL e o Greenpeace, instituições de atuação ampla em termos supraestatais, bem definidas do ponto de vista jurídico e burocrático. Em segundo lugar, têm-se os regimes internacionais, instituições com regras explícitas acordadas entre os governos para determinado e especifico assunto das relações internacionais. Nesse âmbito, pode-se citar justamente esferas de atividades que envolvem a cadeia internacional como um todo, tais como o regime monetário internacional (Breton Woods, 1944), que visou exatamente a conciliação de interesses de uma atividade de interlocução mundial. Por fim, a última instância de institucionalização e também pauta de enfoque desse trabalho consiste justamente na elaboração de Tratados e Convenções, que em um último momento, levam a inauguração de cortes jurídicas infranacionais, instituições informais com regras e entendimentos implícitos que incentivam a coordenação. As convenções nascem espontaneamente, como nos casos da tradição da imunidade diplomática e da ideia de reciprocidade na relação entre os Estados, pautando-se na deliberação de assuntos, por vezes, determinados como pauta de insurgência e tratamento comum justamente pela amplitude de sua relevância, como Direitos Humanos. 2. Um exemplo de institucionalização: o Sistema Interamericano de Direitos Humanos O Sistema Interamericano de Direitos Humanos (SIDH ou Sistema Interamericano) teve como estopim de formação o fluxo internacional voltado para uma tutela especial e supranacional dado a relevância consagrada aos Direitos Humanos, após o cenário devastador deixado pela Segunda Guerra Mundial. Desenhado logo após a formação do semelhante Sistema Europeu, no começo da segunda metade do século XX, atualmente compõe-sepor dois órgãos: a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH, ou Comissão) e a Corte Interamericana de Direitos Humanos (CtIDH, ou Corte). A Comissão, primeiro órgão do SIDH, foi fundada em 1959, em Santiago do Chile4. No entanto, somente entrou em vigor no ano de 1978, com sua décima primeira ratificação5. Atualmente, 25 Estados americanos já aceitaram o texto da Convenção Americana6, mas dois deles a denunciaram7. Destes, 22 aceitaram a jurisdição contenciosa da Corte. A Corte, por outro lado, foi criada dez anos depois pela Convenção Americana sobre Direitos Humanos (CADH, Convenção Americana, ou Pacto de San José) e instituída como sua supervisora. A função norteadora do Sistema Americano consiste na proteção e supervisão dos direitos humanos nas Américas, quando os Estados nacionais falham em fazê-las. Cabe à Corte e à Comissão, portanto, analisar a adequação dos agentes estatais às garantias de direitos humanos determinados pela Convenção e jurisprudência do Sistema. Deriva dessa responsabilização preconizada pelo Sistema Interamericano o papel do Estado como garantidor positivo, no sentido de obrigação assumida de agir para que se promova um ambiente propício à consecução total dos direitos humanos, e possuidor de um dever negativo, pautado na obrigação assumida de não violar, por ações próprias, os direitos humanos. No entanto, o continente americano encontra-se sobre jurisprudência ambivalente de instituições supranacionais, configuradas no sistema da Organização dos Estados Americanos (OEA) e o Sistema Interamericano. Ambos obrigam os Estados-parte a respeitar os direitos nela consagrados. Contudo, um dos percalços percorridos pela responsabilização de Direitos Humanos consiste justamente na existência de uma não universalidade de diplomas normativos. Isto é, os países da OEA não são obrigados a ratificar todos os diplomas de direitos humanos, fazendo com que a proteção no continente seja descontínua. Diferentes países ratificaram instrumentos distintos, dentre os tratados vinculados ao Sistema. Os Estados Unidos da América e o Canadá são exemplos de países que ratificaram poucos dos instrumentos interamericanos, em contraposição à Argentina, Colômbia, Costa Rica e Peru. Essa discrepância em relação às ratificações reflete uma distinta carga de obrigação internacional entre esses países. (FICO, pp. 25-26, 2016) 4 CARVALHO RAMOS, André de. Direitos Humanos em Juízo. São Paulo: Max Limonad, 2001. p. 57. 5 CARVALHO RAMOS, André de. Direitos Humanos em Juízo. São Paulo: Max Limonad, 2001. p. 58. 6 Argentina, Barbados, Bolívia, Brasil, Chile, Colômbia, Costa Rica, Dominica, El Salvador, Equador, Grenada, Guatemala, Haiti, Honduras, Jamaica, México, Nicarágua, Panamá, Paraguai, Peru, República Dominicana, Suriname, Trinidad e Tobago, Uruguai e Venezuela. 7 Venezuela e Trinidad Tobago. Assim, emerge o primeiro obstáculo quanto à consolidação de instituições neoliberais como o Sistema Interamericano como figura central e unificadora de processos decisórios. A coexistência de sistemas jurídicos distintos e em constante discordância coloca em pauta as razões justificadoras desse processo de institucionalização conjunta. 2.1. A Convenção Americana sobre Direitos Humanos A Convenção Americana sobre Direitos Humanos compõe-se de 82 capítulos, em que, logo nos artigos 1º e 2º, conclamam os dois papéis assumidos pelo Estado, como garantidor de proteção dos Direitos Humanos e como ator não agente em quesito de agressão a estes direitos. Em artigo único, o Capítulo terceiro aborda os direitos econômicos sociais e culturais (ESC). O Capítulo quarto provê as suspensões de garantias, interpretação e aplicação da Convenção Americana, compreendendo os Arts. 27 a 31. O Capítulo quinto apresenta os deveres das pessoas, apontando a limitação mútua de direitos entre os indivíduos em uma democracia. O Capítulo sexto discrimina os órgãos responsáveis pela apuração de violações de direitos humanos no Sistema Interamericano: a Comissão Interamericana de Direitos Humanos e a Corte Interamericana de Direitos Humanos. O Capítulo sétimo discorre sobre a organização, funcionamento, e processo da Comissão. O Capítulo oitavo aborda a organização, funções, e procedimento da Corte. O Capítulo nono é dedicado às disposições comuns entre ambos os órgãos. O Capítulo décimo, já inserido nas disposições gerais e transitórias do tratado, aborda as questões de assinatura, ratificação, reserva, emenda, protocolo e denúncia da Convenção Americana. Ficam a cargo do Capítulo décimo primeiro as determinações transitórias acerca do funcionamento da Comissão e da Corte. (FICO, p. 29, 2016). A Convenção estabelece em seu próprio texto, no artigo 29, seu dever em acompanhar a evolução dos tempos e condições de vidas atuais, tal como também estabelece a Convenção de Viena sobre Direito dos Tratados (CVDT), em seu artigo 31. Considera, ainda, na interpretação evolutiva, as jurisprudências nacionais como principal forma de se utilizar do sistema comparado para evoluir a interpretação de certos dispositivos. No entanto, preconiza a existência de uma barreira, no artigo 29, em termos de proibição de retrocesso em relação a direitos já garantidos, dado que não possuir esta trava colocaria a Corte como refém das diversas interpretações locais dos direitos da Convenção, pois permitiria que os Estados freassem a evolução desses direitos. Uma das principais críticas reiteradas pelo suposto não funcionalismo do sistema baseia-se na permissão em se fazer reservar parte(s) do instrumento em questão para fins de ratificação. Contudo, cabe destacar que não se trata de uma tese fundamentada de um suposto mal funcionalmente, já que a própria Convenção delibera que não podem ser formuladas reservas a direitos que não permitem derrogação. Este é o caso das proibições à tortura e à discriminação, que compõe o rol de jus cogens. 2.2. A Comissão Interamericana de Direitos Humanos A Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) foi elaborada em conjunto com a Organização dos Estados Americanos (OEA). Define-se no art. 106 da Carta da OEA a função principal da CIDH pautada em “promover o respeito e a defesa dos direitos humanos e servir como órgão consultivo da Organização”8. A Comissão, portanto, trabalha em diversos eixos dos sistemas em questão: elaborando relatórios temáticos, visitas aos países americanos, e comunicados à imprensa; edição de recomendações aos Estados quando houver violações de direitos humanos; e, por fim, a submissão desses casos à Corte, se não for cumprida a recomendação – possibilidade exclusiva do sistema da Convenção Americana. Podem submeter denúncias à Comissão qualquer indivíduo, grupo de pessoas, ou ONG legalmente reconhecida em ao menos um Estado da OEA, em nome próprio ou em nome de terceiro. Estas petições devem versar sobre presumidas violações de direitos humanos positivados na Convenção Americana, com indicação do Estado o qual o peticionário considera responsável pelas ações ou omissões que acarretaram tal violação. O Estado em questão deve ser signatário do Pacto de San José para que esta petição seja feita em relação a direitos garantidos na CADH, e não podem os mesmos fatos terem sido apresentados a outro organismo internacional, sendo proibida a duplicidade do processo. O caso deve ainda ser apresentado dentro de 6 meses após a data em que a vítima tenha tido ciência do esgotamento dos recursos internos do país em questão. (FICO, pp. 36-37, 2016) A deliberação acerca do mérito dos casos ocorrem em âmbito privado, constando na ata apenas os votos fundamentados, o objeto da decisão ea própria decisão tomada. Em caso de responsabilização estatal, a Comissão elabora um relatório em relação ao mérito, com recomendações e propostas de resolução ou reparação da situação descrita. Não havendo o cumprimento dessas recomendações ou propostas, cabe à Comissão decidir quanto à elaboração de um relatório público ou em remeter o caso à jurisdição da Corte Interamericana. 2.3. A Corte Interamericana de Direitos Humanos A Corte Interamericana de Direitos Humanos surgiu com a adoção do Pacto de San José em 1969. A jurisdição consultiva da Corte baseia-se na análise não vinculante por parte da Corte em relação a uma questão que lhe seja enviada – podem requerer consultas até mesmo os países que não tenham aceitado a jurisdição contenciosa da Corte de maneira 8 OEA. Carta da Organização dos Estados Americanos, 1948. obrigatória. A jurisdição contenciosa, por sua vez, consiste na análise de casos individuais remetidos a ela pela Comissão, quando do descumprimento por parte dos Estados que aceitaram sua jurisdição. Dessa forma, enquanto a jurisdição contenciosa pode ser aplicada aos Estados que a ela anuíram, como é o caso do Brasil, a jurisdição consultiva pode ser utilizada por qualquer Estado-parte da OEA que a requeira. Também possui como atribuição a elaboração de pareceres consultivos, dando origem às Opiniões Consultivas (OC). Tais versam sobre temas como direito de migrantes, liberdade de expressão, direito das crianças, dentre outros. Em relação a cada uma das alegadas violações de direitos humanos, pode-se absolver ou condenar o Estado. Caso seja absolvido de todas as alegações, não há que se discutir consequências outras que não o término do processo. Na hipótese de o Estado ser condenado em ao menos uma das acusações, cabe à Corte analisar quais são as medidas de reparação mais adequadas. Ressalta a jurisprudência da Corte que as reparações devem guardar relação estreita com a violação causada para que seja de fato uma forma de compensação dos direitos que sofreram ingerência. (FICO, p. 40, 2016) A elaboração de sentenças da Corte configura-se sob uma aplicação de gamas diversas e distintas de reparação, tendo em vista justamente a restituição plena (restitutio in integrum), ou seja, fazer com que se restabeleça o momento anterior à violação. Para isso, a CtIDH determina e aprecia a construção de monumentos 9 , constituição de organismos (como as comissões da verdade) 10 , reversão de sentenças condenatórias (com efeitos práticos, quando há um indivíduo que se encontre preso, ou efeitos morais, quando, por exemplo, do falecimento da vítima) 11 ,entre outros. 3. Aplicações e obstáculos da essência contramajoritária dos Direitos Humanos A evolução no tratamento dos mencionados Direitos Humanos configura-se mais como uma tese não linear de um panorama histórico, configurado por constantes situações de avanços e retrocessos consecutivos e intercalados 12 . Assim, destaca-se o fato de haver decisões divergentes e polêmicas dispensada aos Direitos Humanos no âmbito do Sistema Americano. 9 CtIDH. La Cantuta vs Peru, serie C nº 162, 29 de novembro de 2006. § 236 10 CtIDH. Gomes Lund vs Brasil, serie C nº 219, 24 de novembro de 2010. §§ 294-297; Goiburú y otros vs Paraguay, serie C nº 153, 22 de setembro de 2006. § 169 11 CtIDH. Kimel vs Argentina, serie C nº 177, 2 de maio de 2008. § 123 12 HUNT, Lynn. A invenção dos Direitos Humanos. Tradução Rosaura Eichenberg.— São Paulo: Companhia das Letras, 2009. Essas divergências reinauguram as criticas acerca das funcionalidades ativas do neoliberalismo, pautadas justamente na configuração de decisões conjuntas sobre assuntos comuns no cenário de instituições, tais como a Corte Interamericana. Para exemplificar, cabe trazer para análise o caso de Karen Atala Riffo 13 . A mulher mencionada teve a guarda de seu filho retirada pela jurisprudência chilena tendo como súmula justificativa o fato de estar em um relacionamento homossexual, que, pelo entendimento da corte chilena, levaria a uma afetação maléfica no quesito de desenvolvimento pessoal e interpessoal da criança mencionada. No entanto, quando da análise do caso pela Corte Interamericana, proclamou-se diretamente uma violação de direitos referentes à liberdade e à não discriminação, dando parecer favorável ao reestabelecimento da guarda da criança em favor de Karen. Portanto, evidencia-se que, no aspecto jurídico, apesar de haver temas de interesse comum e convergente entre os Estados, tais como economia e Direitos Humanos, há um nítido embate metodológico e doutrinário quanto à eficácia das decisões provindas de instituições supranacionais, tais como a Corte Interamericana, decorrido justamente de entendimentos diversos de circunstâncias comuns. Conclusão Desse modo, a dimensão da globalização sobre as interações humanos, como processo conciliatório e conflituoso, deu margens ao surgimento da tese neoliberal, para conclamar as instituições como vertentes derivadas dos atores Estatais que derrogam e estabelecem a ordem internacional em um cenário de anarquia. O surgimento do Sistema Interamericano e todos os seus órgãos compostos pauta-se justamente nessa definição de instituição favorável à solução de divergências e interesses comuns entre nações. No entanto, evidenciado o seu funcionamento e analisado a sua jurisprudência, percebe-se, nitidamente, que se pode levá-lo também como exemplo conciso da não aplicação efetiva da teoria neoliberal das Relações Internacionais. Assim, ainda se tem em foco a soberania jurisprudencial das nações sobre seu Estado como vertente norteadora, o que fragiliza as premissas neoliberais e os próprios sistemas interestatais. 13 CtIDH. Atala Riffo vs Chile, serie C nº 239, 24 de fevereiro de 2012. § 167 Bibliografia CAMARGO, Alan Gabriel, JUNQUEIRA, Cairo Gabriel Borges. A teoria neoliberal nas relações internacionais: o tripé institucional e o papel do Estado. O Debatedouro. Belo Horizonte, v. 83, 2013. CARVALHO RAMOS, André de. Direitos Humanos em Juízo. São Paulo: Max Limonad, 2001. DA SILVA, Ivan Luís Marques. O Direito Penal como garantia fundamental (o novo enfoque decorrente da globalização). Dissertação (Mestrado em Direito Penal) – Faculdade de Direito, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2007. ESTENSSORO, Luis. Capitalismo, desigualdade e pobreza na América Latina. Tese (Doutorado em Sociologia) – Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2003. FICO, Bernardo de Souza Dantas. O suscetível de ser decidido: Análise jurisprudencial do Sistema Interamericano de Direitos Humanos sobre legitimação popular e o direito de minorias. Tese (Graduação em Direito) – Faculdade de Direito, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2016. HUNT, Lynn. A invenção dos Direitos Humanos. Tradução Rosaura Eichenberg.— São Paulo: Companhia das Letras, 2009. MORAVCSIK, Andrew. Taking Preferences Seriously: a Liberal Theory of International Politics. International Organization, vol. 51, nº 4, pp. 513-553, 1997. NYE JR., Joseph, KEOHANE, Robert. Power and Interdependence Revisited. International Organization, vol. 41, nº 4, pp. 725-753, 1987. ZACHER, Mark W., MATTHEW, Richard A. Liberal International Theory: Common Threads, Divergent Strands. Kegley, Charles (ed.). Controversies in International Relations Theory. Belmont, CA: Wadsworth Group, pp. 107-150, 1995.
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