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PROCESSOS DE APRENDIZAGEM Ana Lucia Gomes O que é aprendizagem? Quais fatores são importantes para este processo? Como sabemos que houve aprendizagem? Expressões da aprendizagem O que é aprendizagem? Aprender consiste em uma atividade comum ao homem e a outros seres vivos. A frequência , intensidade e duração da aprendizagem, portanto, varia entre as espécies, onde cada uma possui seu conjunto específico de fatores determinantes, bem como, possui um funcionamento particular. No que diz respeito à aprendizagem humana, observa-se que ela se inicia com o nascimento, sendo uma atividade presente ao longo de todo o ciclo de vida do indivíduo, sendo vivenciada no curso de todas as fases do desenvolvimento, ocorrendo na infância, adolescência, fase adulta e terceira idade. Dessa forma, as experiências de aprendizagem somente cessam com o advento da morte do indivíduo. De modo geral, podemos definir aprendizagem como sendo a atividade que possibilita ao indivíduo ampliar o padrão de comportamento que possui, permitindo-o agir de forma mais eficiente no meio em que se encontra inserido. Por exemplo, ao aprender a escrever o indivíduo deixa de sobrecarregar a sua memória, anotando tudo aquilo que precisa fazer ao longo do dia. A aprendizagem consiste em um processo: a) complexo, pois é influenciada por múltiplos fatores; b) contínuo, em função de ocorrer ao longo de toda a vida; c) dinâmico, por integrar diferentes fatores, internos e externos ao indivíduo; d) pessoal, pois cada um aprende a seu modo, levando em consideração suas experiências anteriores e, f) intransferível, porque aquilo que foi aprendido diz respeito à forma como o indivíduo compreendeu, sendo um processo exclusivo. Características da aprendizagem • Complexa • Contínua • Dinâmica • Pessoal • Intransferível. Quais fatores podem influenciar o processo de aprendizagem? Diversos fatores influenciam, de forma positiva ou negativa, o processo de aprendizagem. Importante destacar, que esses fatores de forma isolada, não garantem a ocorrência da aprendizagem. Ela ocorre na interseção entre diferentes fatores, onde observamos a predominância de um ou outro aspecto no desenvolvimento do processo. Por exemplo, imagine a seguinte situação de aprendizagem: Aprender a falar um novo idioma. Nesta situação, podemos verificar a influência dos seguintes fatores: cognitivo (pensamento, memória, atenção, linguagem) e afetivo (valores sociais e afetivos). Como ocorreria a integração desses processos nessa situação de aprendizagem? Aline* decidiu aprender um novo idioma e optou pelo francês, pois planeja dentro de dois anos fazer uma viagem para a França. Conforme os dias avançam, o aprendizado torna-se mais complexo. Muitas dúvidas surgem, Aline comete muitos erros e se sente desanimada achando que “não está aprendendo”. Por isso, começa a faltar ao curso, o que por vez, aumentou suas dúvidas, tendo em vista ter perdido muitas explicações. Toda vez que recebia seus exercícios corrigidos pelo professor com vários erros sinalizados, ela ficava extremamente chateada e várias vezes pensou em abandonar o curso. Um dia, Aline descobre que seu francês não era tão ruim quanto pensava. Ao dar uma informação a um turista na rua, ela compreendeu que pode entender o francês e ser entendida quando o fala. Isso fez com que ela ficasse muito contente e mais animada para aprender o francês. Aline, então, decidiu investir mais tempo nos seus estudos, buscando fazer os exercícios com mais atenção e tirando suas dúvidas com seu professor. Seu desempenho aos poucos foi melhorando fazendo com que Aline ficasse cada vez mais motivada em ir às aulas. Hoje, Aline terminou o curso de francês e se programa para passar uma temporada de três meses na França para estudar História da Arte. *História fictícia. A história da Aline nos mostra que em todo em qualquer processo de aprendizagem há um nível de dificuldade. Dependendo das condições cognitivas e afetivas, por exemplo, essa dificuldade pode ter o seu nível variável. No caso de Aline, tudo indica que ela não tinha nenhuma dificuldade específica, decorrente de algum problema de ordem cognitiva, no entanto, quando ela se depara com seus erros de forma sistemática, ela acha que “não consegue aprender” e entra em um círculo vicioso que passa a “alimentar” sua crença de “não ser capaz de aprender”, menosprezando o seu potencial para aprender. Assim o fator afetividade passa a ser o maior entrave à sua aprendizagem, pois na medida em que Aline se julga “inapta” ela começa a faltar ao curso ou a não realizar as tarefas propostas, buscando sempre uma desculpa para não se envolver com o aprendizado da língua francesa. No entanto, um novo fator se mostra relevante em sua experiência de aprendizagem: a interação social com um nativo. Ao perceber que pode falar o francês, uma nova perspectiva se abre para Aline levando-a a se autoavaliar positivamente fazendo com que ela se sentisse segura e confiante de que pode aprender, resgatando a motivação que teve quando decidiu aprender o francês. Dessa maneira, Aline encarou suas dificuldades e conseguiu concluir com êxito o seu curso, permitindo- a construir novos e maiores projetos. Através da história da Aline verificamos como os fatores que influenciam a aprendizagem podem se articular, mostrando o impacto que produzem na experiência de aprendizagem. Fatores influentes da aprendizagem: Maturação do organismo - É necessário um mínimo de desenvolvimento para que o indivíduo possa aprender algo, por exemplo: para que a criança aprenda a jogar bola é necessário que ela seja capaz de coordenar minimamente dois movimentos, correr e chutar. No entanto, o fato de ter sua coordenação motora bem desenvolvida, não é condição para que seja uma boa jogadora. Desenvolvimento das funções psicológicas superiores, como: pensamento, linguagem, atenção memória - Tais fatores são imprescindíveis para a organização e compreensão das situações de aprendizagem. A experiência anteriormente vivida e a “novidade” são importantes para o processo de aprendizagem, pois tendem a gerar no indivíduo uma reação, ou seja, produzem efeitos que tendem a retirá-lo de uma posição de conforto, levando-o a agir, seja reproduzindo um padrão ou através de uma ação que indique a compreensão do indivíduo (criativa). Fatores de ordem subjetiva, tais como: a motivação e afetividade - Indicam o motivo que leva o indivíduo a agir pró ou contra o fluxo da aprendizagem. Esses fatores possuem natureza interna, sendo constituídos a partir da compreensão que o indivíduo possui acerca da sua realidade, levando-o a investir valores positivos ou negativos, que podem impactar de forma variada a sua aprendizagem. Como sabemos que houve aprendizagem? Aprendemos quando falamos, identificamos, reconhecemos ou fazemos algo que antes, não sabíamos fazer. Por esse motivo, dizemos que a aprendizagem tem como produto a aquisição de um determinado padrão de comportamento, que promove mudanças no indivíduo, possibilitando ampliar a forma como age no mundo (Lefrançois, 2015). Por comportamento entendemos as ações: explícitas - como andar ou manipular objetos concretos; implícitas – que ocorrem internamente ao sujeito, como o pensamento e a linguagem. O padrão de comportamento aprendido é potencialmente observável pelo outro, sendo passível de verificação, ou seja, o que o indivíduo aprendeu pode ser “mostrado” através de suas ações. Por exemplo: quandouma criança está aprendendo a ler é bastante comum que seus pais peçam que ela leia algo ou em uma reunião de amigos, se alguém diz que sabe falar alemão, sempre tem alguém que vai “testar” esse conhecimento pedindo que traduza algo ou fale um pouco e assim, sucessivamente. Observa-se que, nesta situação, a negativa em “traduzir” ou “falar” em alemão, para os amigos, é indicativo de não saber. Importante destacar, que apesar da aprendizagem poder ser verificada. Nem sempre a forma como esta verificação ocorre favorece a produção da ação do indivíduo, de modo que ele tenha sucesso naquilo que supostamente aprendeu. Logo, uma prova cuja dificuldade não é compatível com o nível de aprendizagem do aluno; cobranças excessivas; metodologia empregada, relação entre aluno-professor, são alguns elementos que podem interferir negativamente na aprendizagem, levando o aluno a ter um desempenho não condizente com o seu potencial, ou seja, abaixo do que pode expressar. Tal fato, denota mais uma vez, a complexidade da aprendizagem, que requer do educador um olhar atento não apenas para o conteúdo a ser ensinado, mas principalmente, para as relações que se estabelecem na sala de aula, envolvendo aluno- metodologia- professor- turma- disciplina pedagógica. Expressões da aprendizagem A aprendizagem possui três formas de expressão: cognitiva, automatizada e afetiva. Essas expressões encontram-se presentes em toda e qualquer forma de aprendizagem. Cada aprendizagem requer o predomínio de uma ou outra forma de expressão, deixando as outras em segundo plano, em prontidão para atuarem a qualquer momento. Por exemplo, Luiza* sabe fazer muito bem as continhas de matemática (expressão automatizada), no entanto, não vai muito bem em problemas (expressão cognitiva). Sempre que tem problemas para resolver, Luiza fica muito nervosa (expressão afetiva) e diz que nunca vai conseguir ser boa em matemática (expressão afetiva ). Sua professora, atenta às necessidades de Luiza, ao final da aula, refaz os problemas com ela, explicando passo a passo como deve fazer. Luiza, então, aprende a organizar os dados do problema, de forma a compreender o que é pedido, se é para somar, subtrair, ou multiplicar (expressão cognitiva). Assim, aos poucos Luiza vai se sentindo segura em resolver os problemas, minimizando o sentimento que tinha de que “nunca seria boa em matemática” (expressão afetiva). Nesta situação verificamos, dentre outros aspectos, que Luiza aprende: a fazer contas, a organizar os dados dos problemas, a lidar com sua frustração diante do erro, a valorizar a relação com sua professora e a restabelecer uma relação positiva com o aprendizado da matemática. Dessa forma, verificamos a integração entre essas expressões, onde uma influencia a ocorrência da outra. No que consiste essas expressões? Como se caracterizam? Expressão cognitiva – relacionada à compreensão, ao entendimento e atribuição de sentido à experiência vivida. • Permite a construção/organização de conceitos • Refere-se ao saber-fazer, ou seja, por compreender o conceito, o aluno sabe como proceder de forma independente do contexto. Por este motivo, a expressão cognitiva torna a aprendizagem mais duradoura, fazendo com que o aluno não esqueça facilmente o que aprendeu. Ex. O aluno acerta o exercício independentemente da forma como o professor pergunta, pois ele, de fato, sabe, compreende o conteúdo. Também torna-se capaz de ler uma notícia e de relacioná-la com o que aprendeu, por exemplo, na aula de história. Expressão afetiva – atribuição de valores • Formada a partir das relações que o indivíduo estabelece com diferentes pessoas/situações que fazem parte da sua experiência de vida (professor, colegas de turma, família, disciplinas, escola) • Responsável pela atribuição de valor positivo ou negativo às experiências e a si mesmo, envolvendo a adequação de sentimento e comportamento. • Influência na construção da crença de autoeficácia: conhecimento que o indivíduo possui acerca daquilo que sabe fazer. Expressão automatizada – relacionada à execução, à prática repetitiva. • Implica no domínio de padrões de comportamento, cuja ação não envolve grande esforço cognitivo, ou seja, uma vez que tenha aprendido a produzir uma resposta, o indivíduo age automaticamente, sem precisar de muito esforço. Ex. Quando se sabe dirigir a coordenação das ações: pisar na embreagem, passagem de marcha, acelerar, frear, verificar espelhos e ter atenção ao trânsito, flui de modo automático. O indivíduo nem percebe que essas ações estão ocorrendo enquanto dirige. No entanto, enquanto não ocorre a automatização, o aspirante a motorista fracassa na coordenação dessas ações, deixando o carro “morrer”, não passando a marcha adequadamente, não usando as setas de sinalização, etc. • Dependente de treino, prática, repetição e sistematização. • Importante para “liberar” a mente do indivíduo para ações mais complexas. Ex. quando o aluno já sabe escrever, ao ter que fazer uma redação, ele volta a sua atenção , predominantemente, para os aspectos mais complexos dessa atividade, relacionados por exemplo, ao encadeamento lógico e coeso de suas ideias. Isso se torna possível, pois não precisa investir sua atenção nos aspectos ortográficos da língua, ou seja, como sabe escrever, não precisa “pensar” a palavra que vai escrever letra a letra, tal como ocorria quando estava aprendendo a escrever. Expressão automatizada (continuação) • Promove maior agilidade, economia de tempo e esforço. Por ex., ter a tabuada decorada é importante para que o aluno possa realizar as contas de multiplicação com mais rapidez e precisão. • Refere-se ao fazer, isto é, o indivíduo é capaz de agir com precisão e correção. No entanto, o fato dele fazer determinadas ações corretamente, não significa necessariamente, que ele saiba o porquê de estar fazendo esta ação . Nem sempre a ação em si é acompanhada de compreensão. Neste caso, pode haver uma pseudoaprendizagem, ou seja, o aluno somente realiza as ações de forma correta, se seguir um padrão previamente conhecido por ele. Se o contexto de aprendizagem mudar, o aluno tende a fracassar, pois pode não ser capaz de “reconhecer” a pergunta, levando-o ao erro. Exemplo 1: Um aluno sabe a tabuada de 3 e 7 na ponta da língua, mas quando o professor pergunta fora da ordem e mescla as tabuadas, o aluno não sabe e para responder, precisa lembrar da tabuada “em ordem” 3X1; 3X2; 3X3... Repetindo-a até chegar àquela que o professor perguntou. Exemplo 2: Durante as aulas de história, os alunos respondiam à inúmeras perguntas que apresentavam estrutura semelhante visando sistematizar a aprendizagem do conteúdo, tais como: O Brasil foi descoberto por quem? Quem descobriu o Brasil? ________________ descobriu o Brasil. O professor resolve modificar a “estrutura” da questão para diferenciar a prova dos exercícios feitos em sala de aula, assim elabora a seguinte questão: “Nos idos do século XVI, vários navegadores se arriscaram nos oceanos em busca de novas terras. Explique como ocorreu o descobrimento do nosso país?”. Ao corrigir a prova o professor constatou que, apesar dos vários exercícios realizados em sala, muitos alunos erraram a questão. Isso ocorreu porque esses alunos foram treinados a produzir um padrão de resposta, através da repetição praticada pelas listas de exercícios, não sendo capazes de aprofundar e correlacionar o conhecimento obtido com outros saberes. Assim, por mais que tenham feito inúmeros questionários, quando precisam articularuma informação que não foi trabalhada de forma diversificada, sendo correlacionada com outros saberes e contextos, os alunos apesar de terem respondido à estas questões com excelência costumam fracassar. “Apenas a prática não pressupõe, obrigatoriamente, a aprendizagem; pode haver prática sem aprendizagem”. (Campos, 1996) Em outras palavras, os alunos fazem certo, respondem corretamente, mas não sabem porque aquela forma é a correta. Dessa forma, quando falamos em aprendizagem devemos estar atentos às suas expressões de forma a proporcionar ao aluno uma experiência que integre essas aprendizagens. As expressões cognitiva, automatizada e afetiva são imprescindíveis para o sucesso da aprendizagem do aluno. Neste sentido, o professor deve planejar sua aula organizando suas atividades de modo a equilibrá-las entre cognitivas e automatizadas. Quanto maior a diversidade de atividades, melhor é a integração entre essas expressões, visando atribuir sentido ao que o aluno está aprendendo, bem como, fazer com que ele desenvolva as habilidades necessárias para a aprendizagem. Isso tende a fazer com que o aluno se sinta capaz e estimulado a aprender, pois entende a aprendizagem como um processo dotado de significado, sendo importante para a construção do seu conhecimento e para o seu desenvolvimento como um todo. Referências Bibliográficas LEFRANÇOIS, G (2015).Teorias da Aprendizagem. São Paulo: Cengage Learning. CAMPOS, D.M. (1996). Psicologia da Aprendizagem. Petrópolis: Vozes.
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