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DIREITO Política criminal com derramamento de sangue NILO BATISTA A pena é un i me io extremo; i o r n o lai c também a guerra. Tobias Barreto I - Introdução Para evitar distorções idealistas, no pre- sente estudo a expressão politica criminal não se referirá apenas, como no concei to de Z ip l , à obtenção e realização de crité- rios direiívos no âmbito da justiça c r i m i - n a l " ", nela se i n c l u i n d o o desempenho concreto das agem ias públicas, pol ic iais ou judiciárias, que se encarregam da imp le - mentarão co l i d i ana não só dos critérios diret ivos enunc iados ao nível normat i vo , mas lamoém daqueles outros critérios, s i - lenciados ou negados pelo discurso jurídi- co , porém leg i t imados soc ia lmente pela recorrência e ac a lamcnlo de sua aplicação. Assim, por exemplo , quando .1 polícia men - salmente executa (valendo-sc de expedien- tes encobridores os mais diversos, da s imu- lação de confronto ao chamamento à au - toria de gangues rivais) um numero cons- tante de pesso.is, verif icando-sc ademais que essas pessoas têm a mesma exlração social, faixa etária e etnia, n ã o se pode dei- xar de reconhecer que a politica criminal f o r m u l a d a para e por essa po l i c i a c o n t e m - pla o extermínio c o m o tática de aterroriza- ção e con t ro le d o g rupo socia l v i t im izado - m e s m o que a Constituição proc lame coisa d i f e ren te . Por ou t ro l ado , c o m o p ione i ra - mente entre nós observava He l eno Fragoso, "a política c r im ina l é parte da política soci- àr m , e essa conexão - me lho r diríamos c o n - t i n u i d a d e - pode ser u m impor tante expe- d i en t e metodológico para o esc larec imen- to de seus programas e ob je t i vos . Retoman- do o e x e m p l o anter ior , a complacência , indiferença o u mesmo o aplauso para c o m rot inas po l ic ia is de aterrorização ^extermí- nio s ina l iza para a incorporação desses, ins- t rumentos por parte da política social de - senvo lv ida - por mais q u e indignações opor - tunistas ou o sacrifício periódico de bodes expiatórios p rocu rem sugerir coisa diversa. E nosso ob j e t i vo compreender a política c r i m i n a l para drogas no Brasil e seus ref le- xos no d i re i to e no processo pena l ; c o m o se sabe, encont ramos ho je uma política c r i - m i n a l (sem t rocad i lho ) dependente de cer- tas articulações in ternac iona is , que gosta de apresentar-se c o m o u m a guerra . De fato, se o l h a r m o s o atual cenário amer i cano , que política c r im ina l é essa que con temp la ope - rações mi l i tares e m territórios estrangeiros, que d i s t ingue grupos a l iados e be l igeran - tes, p r o m o v e acumulação e intercâmbio de informações e m p lano in te rnac iona l e i n - tervenção permanente da rede diplomáti- ca , adm in i s t r a orçamentos astronómicos, ce l eb ra c rescentemente tratados que ver - sam desde compromissos c r imina l izadores até erradicação de cul turas e extradições, passando por patrulhas marítimas e helicóp- teros, e na qua l se pretende envo lver a cada d ia mais intensamente as forças armadas? C l ausew i l z obse rvou , c o m f inura , que "a guerra é u m ins t rumento da política: ela traz necessariamente a marca desta políti- c a " 1 " . Tomemos a pr ime i ra guerra do ópio, q u e começa e m 1839 , o i t o anos após a morte de Clausewltz. Temos ali uma guerra em favor do comércio do ópio, em favor dos negociantes ingleses (havia-os também norte-americanos) que levavam o ópio da índia para a Ch ina , c o m o etapa de u m cir - cu i t o comerc ia l tríplice. O conf l i to opunha de um lado a decisão do imperador chinês de i n t e r romper e p ro ib i r o comércio e o uso d o ópio, e de out ro "os enormes inves- t imentos ingleses na produção e d i s t r ibu i - ção da droga e o papel cruc ia l representa- do pelos rendimentos do ópio na estratégia da balança de pagamentos internacional da Inglaterra" ' 4 ' . Sem nenhuma dúvida, a guerra do ópio traz "a marca da política" que a v i a b i l i z o u : o f i c i a lmen te , a ra inha Vitória nada sabe da droga, mas se preocupa sim c o m as violências e "injustiças" (leia-sc o conf isco do ópio) contra seus súditos, e o Par lamento autor iza o env io da frota para obter "reparações" (leia-se indenização pela perda dos estoques de ópio conf iscados, af inal aval iados em seis milhões de dóla- res, c o n f o r m e o a r t igo 4" do t ra tado de N a n q u i m , cu jo art igo 3" entregava a i lha de H o n g Kong à soberania ing lesa ) " . A con - dução das operações mil i tares também re- vela "a marca da política", ob je t ivando uma asfixia em suprimentos externos e um gra- dual avanço de posições (favorecido pelo fosso tecnológico) que conduza á rend i - ção e ao acordo para as "reparações"; não era uma campanha para destituir o gover- no nem destruir a nação chinesa (o Parla- mento não declarara guerra à China) , e por mais que os documentos oficiais o d iss imu- lem, a estratégia incluía a sobrevivência do Eslado-devedor e dos consumidores de ópio que hav i am c r i ado aquele mercado apa- rentemente in f in i to . Se é relat ivamente fácil perceber "a mar- ca da política" d iante de uma guerra e m favor d o tráfico de drogas, as coisas se c o m - p l i c a m q u a n d o pretendemos perceber as características da política c r imina l que ele- geu a própria guerra c o m o método, da po - lítica c r im ina l que se vê e se pretende guer- ra contra as drogai. Teremos que Inverter o percurso, e ao invés de, como Clausewltz, procurar na guerra a marca da política, tra- tar de v is lumbrar nessa política c r imina l as marcas da guerra. I I - 1914-1964: o m o d e l o sanitário A legislação anterior a 1914, seja aque- la inscrita na tradição, que remonta às Or - denações Fil ipinas (V, LXXXIX), das "subs- tâncias venenosas" (expressão empregada no CP 1890, art. 159), c o m sabor de del i to profissional dos boticários, prevent ivo do venefício, seja aquela esparsa em posturas munic ipa is , c o m o a proibição do "pito-de- pango" pela Câmara d o Rio de Janeiro, em 1830 ' " , a legislação anter ior a 1914 não dispõe de massa normat iva que permita ex- trair-lhe uma coerência programática espe- cífica. Tendo o Brasil subscrito, no próprio ano cie 1912, o p ro toco lo suplementar de assi- naturas da Conferência In te rnac iona l do Óp io , rea l izada c m Ha ia , o dec re to n" 2 . 8 6 1 , de 8 . ju l .14 , sancionou a Resolução do Congresso Nac iona l que aprovara a ade- são. Através d o dec r e to n" 1 1 . 4 8 1 , de Kl.íev. 15 - que mencionava "o abuso cres- cente do ópio, da morf ina e seus der iva- dos, bem como da cocaína" -, Wenceslau Braz determinava a observância da C o n - venção. É nesta ocasião que a política c r i - mina l brasileira para drogas começa a ad- quir i r uma configuração deíinida, na d i re - ção de um mode lo que chamaremos "sani- tário", e que prevalecerá por m e i o século. Seis anos depois , o decreto legislativo n 4 . 2 9 4 , de 6 . j u l . 2 1 , s a n c i o n a d o por Epitácio Pessoa, revogaria o artigo 159 do CP 1890 para in t roduz i r a hipótese na qual "a substância venenosa tiver qual idade en- torpecente, como o ópio e seus derivados, a cocaína e seus der ivados" (art. 1 ", par. ún.); foi então que a expressão "entorpe- c e n t e " in i c iou sua longa e polissémica car- reira no direito penal brasileiro. Também as disposições sobre e m b r i a g u e z e v enda abusiva de bebidas do CP 1890 (arts. 39S, 397 e 398) eram expressamente revogadas, , porque o decreto 4.294/21 disc ipl inava ino - vadoramente a matéria, e devemos exami - nar uma dessas inovações. Dist inguindo - ao contrário do CP 1890 - entre a embr ia - guez escandalosa e a hab i tua l , o decretoestabeleceu que à segunda se responderia com "internação por 3 meses a 1 ano em estabe lec imento co r r ec iona l adequado " , solução que vir ia a inf luem iar a ainda v i - gente Lei de Contravenções Penais (art. 62 e par. ún ) . Em correspondem ia a tal solu- ção, os intoxicados "por substância vene- nosa que tiver qual idade entotpecenle" se sujeitavam a uma internação compulsória "para evitar a prática de atos cr iminosos ou a completa perdição mora l " (art. 6", § 2"', a l . a). A regulamentação desse dec re to legislativo, efetuada dois meses depois atra- vés do decreto n" 14.969, de l .set .21, pre- via a criação do Sanatório para toxicóma- nos" no Distrito Federal, mas enquanto isso não oroiresse as internações dos intox ica - dos - que estavam sujeitos à interdição - se dar iam na Colónia de Al ienados (art. 9", § 5"). Este decreto 14.969/21 dispunha t am- bém sobre controle das substâncias entor- pecentes nos despachos alfandegários e no varejo das farmácias, n u m esboço que se- ria rendi lhadamente desenvolv ido nos anos trinta - c o m o já veremos mais pormenor i - zadamente -, regu lamentando também o procedimento judiciário (art 15 ss) e pre- vendo ainda, em seu artigo 8 , responsabi- lização c o m o autores do droguista, do far- macêutico, do prático, de "qualquer outro comerc iante" e f inalmente d<> "par t icu lar " que, conforme o caso, vendesse, expuses- se à venda ou ministrasse tais substâncias, enquanto o "portador c o ent iegador" seri- am punidos como autores, em caso de au- xílio necessário, ou c o m o ( umpl ices sob qualquer outra moda l idade par t i c ipat iva : estas disposições sobre autoria e part ic ipa- ção tiveram porventura a função de e l imi- nar t oda dúvida sobre o caráter comum, não especia l (prof iss ional ) do crime. Mas o passo de c i s i vo foi dado com o decreto n° 2 0 . 9 3 0 , de 11 . j an .32, cujas nor- mas c r im ina l i z ado ra s ser iam consol idadas por V i cen te P iragibe, no espaço d o revo- gado a r t igo 159 d o CP 1890 . O decreto n" 2 0 . 9 3 0 , d o qua l a lguns disposit ivos seriam a l t e r a d o s p e l o d e c r e t o n " 2 4 . 5 0 5 , d e 2 9 . j u n . 3 4 , teve sua estrutura inte i ramente reaprove i tada pe lo decreto-lei n° 8 9 1 , de 25 . nov .38 , que o revogar ia . N o que tange às normas c r im ina l i zado ras , a estrutura p r o - posta pe los três decre tos dos anos t r in ta , submet ida a u m a c i ru rg ia técnico-jurídica, conduzirá à sóbria fórmula d o art igo 281 do CP 1940 . É impor t an te ressaltar que esta sucessão de decre tos e x p r i m e a influência das su- cessivas convenções in te rnac iona is . Após a Conferência de Ha ia , de 1912 , sucede- ram-se, sob os auspícios da Liga das Na - ções, conferências " c o m p l e m e n t a r e s " e m G e n e b r a , e m 1 9 2 5 , 1931 e 1936 , todas subscritas pe lo Brasil e promulgadas inter- namente 1 7 1. A influência de tais convenções sobre a legislação penal brasi leira - essa i n - ternacionalização d o con t ro l e argutamente perceb ida por Saio de Carva lho ' 8 ' - chegara para f icar, e não só caracter izar ia l odo o período d o m o d e l o sanitário c o m o subsist i - r ia , c o m referenciais d is t in tos , à própria re- fo rma do m o d e l o político-criminal, até por - q u e , c o m o veremos opo r tunamente , o m o - d e l o seria r e fo rmado de fora para dent ro . Impor ta agora ressaltar a influência das convenções in ternac iona is sobre o d i r e i to i n te rno . A convenção decorrente da C o n - ferência de 1925 c o m p r o m e t i a os países subscritores c o m uma revisão periódica de suas leis e regulamentos (art. II); c o m a f is- cal ização da exportação e importação, de sorte a que fossem expedidas autorizações específicas (art. IV, a l . b e arts. XII e XIII); com o registro nos l ivros mercant is e c o m a retenção das receitas que prescrevessem substâncias entorpecentes, a serem conser- vadas "pe lo médico ou pelo farmacêutico" (art. V I , a l . c). A convenção decorrente da Conferência de 1931 trataria de regulamen- tar desde os stocks de Estado (art. I, i tem 4 " ; art. IV, i tem 2") até os rótulos de comer- cialização das drogas (art. XIX), bem c o m o uma troca de informações entre os países "sobre todo caso de tráfico ilícito desco- be r to " (art. XXIII). E a convenção decorren- te da Conferência de 1936 se ocupava p r i n - c ipa lmente dos problemas de extraterr itori- a l idade colocados pela repressão do tráfi- co internac ional versando, entre outros tó- picos, extradição e reincidência in ternac i - ona l (arts. V I , V I I , VIII e IX). Nossa legislação interna corresponden- te não passa de uma ressonância, cer ta - m e n t e d e c o r a d a c o m as v o l u t a s d o bachare l ismo t rop ica l , porém uma assumi- da ressonância dessas convenções. O de- creto n" 20 .930 , de 11 . j an .32 , mal enun - ciada a lista das "substâncias tóxicas entor- pecentes em ge ra l " , trata de deixar c laro sua revisão periódica "de aco rdo c o m a evolução da química-terapêutica" (art. I " , par. ún.); a licença especial para o fabr ico o u comercialização (art. 2") bem c o m o o cer t i f i cado de importação (art. 8"), registra- d o e m l i v ro próprio (art. 10, § 2", e art. 21) , c o m val idade anual (art. 15, par. ú n ) , estão con temp lados e regulamentados . A venda ao público depende de receita, que não é restituída mas s im registrada, c o m número de o rdem, em l i v ro "dest inado es- pec ia lmente a esse f i m " (art. 3", § 1 ) , l i v ro este que deve ser aberto, encerrado e ru - b r i c ado pela au tor idade sanitária o u , em sua falta, pelo " j u i z togado de pr imeira ins- tância mais antigo na comarca ou t e rmo" (art. 3", § 2"); tais l ivros, além disso, estari- am "permanentemente sujeitos à inspeção das autoridades sanitária, po l i c ia l e judiciá- r ia, inc lusive o Ministério Público" (art. 3", § 3"), e é c laro que da etiqueta comerc ia l da droga deve constar o número de ordem RH da receita (art. 3", § 4"). Todo o f luxo i m - portador era concentrado na alfândega do Rio de Janeiro (arts. 11 e 14), e qualquer substância p r o i b i d a dest inada a alguém desprovido do cer t i f i cado de importação era cons iderada c o n t r a b a n d o (art. 19). Para poder intercambiar informações, o Depar- tamento Nac iona l da Saúde Pública coor - denaria dados estatísticos e organizaria "a lista dos indivíduos impl icados no tráfico" (arts. 54 e 55). O decreto n" 24 .505 , de 29 . j un .34 , que alterou algumas disposições do decreto n" 20 .930 , de 11 . jun .32 , preo- cupou-se c o m q u e as rece i t as fossem grafadas " e m caracteres legíveis" , c o m "identificação e residência do médico e do en fe rmo" (art. 3"), e lançada n u m "papel o f i c i a l " , " fo rnec ido gratuitamente pela re- partição sanitária l o ca l " (art. 3", §§ 4" e 5"). O decreto-lei n" 8 9 1 , de 25.nov.38, recicla e revoga o decreto n" 20 .930 , de 11 . jun.32 (mod i f i c ado pe lo decre to n" 2 4 . 5 0 5 , de 2 9 . j u n . 3 4 ) , f ie l à mesma orientação das convenções (temos agora o "stock do Esta- d o " - arts. 11 e 12), cap i la r izando o con - trole alfandegário ("guardados debaixo de chave, sob imediata responsabi l idade do fiel do armazém"- art. 10, $ 5"). acrescen- tando a exigência de "guia de trânsito de entorpecentes" para vendas internas (art. 16), e de maior apuro na escrituração da - queles l ivros ("sem rasuras ou emendas"- art. 17, § 2"). O que se depreende c o m clareza de lais normas é uma concepção sanitária de con - trole do tráfico, de u m tráfico que se a l i - menta do desvio da droga de seu f luxo autor izado. As drogas estavam nas prate- leiras das farmácias ou nos "stocks" de uma indústria que apenas suspeitavade seu fu - turo sucesso comerc ia l , e boticários, práti- cos, facultat ivos ' " , fiéis de armazém e fun - cionários da alfândega" 0 ' são os persona- gens que abastecem de opiáceos ou coca- ína grupos reduzidos e exóticos, inte lectu- ais, f i lhos do baronato agroexportador edu- cados na Europa, artistas: um hábito com horizonte cultural bem def in ido, sem s ign i - ficação económica, que desatava a repre- sentação social de um "universo mister io- so", como disse Rosa dei O l m o ' " 1 , e mórbi- do. (A maconha, embora contemplada na listagem dos artigos pr imeiros, estava fora desse c i rcu i to , porque era consumida pe- los pobres, ou , para usar as palavras aristo- cráticas de Hungr ia , por "gente de m a c u m - bas ou da boémia do troisième dessous"" 1 ' ; era a "erva do nor te " que figura num sam- ba de Wi lson Baptista dos anos trinta.) Não é, contudo, apenas pela consideração do v ic iado como doente (ainda que ta[ cons i - deração reforce o argumento, como vere- mos) que este mode lo , no qual autoridades sanitárias, pol ic iais e judiciárias exercem - às vezes, fungivelmente - (unções contínu- as, merece a designação de sanitário: é que se pode perceber claramente o aproveita- mento de saberes e técnicas higienistas, para as quais as barreiras alfandegárias são ins- trumento estratégico no controle de epide- mias, na montagem de tal política c r im ina l ; não por acaso, o decreto n" 2 0 . 9 3 0 , de 11 jun .32 , converteu a drogadição em d o - ença de notificação compulsória (art. 44), não por acaso a retenção de partidas i t re - gulares sabe a quarentena, e a man ipu la - ção dos extraditandos evoca as precauções com os contaminados. Constituir ia um ob- jeto autónomo de estudo aprofundar as cor- respondem ias entre medidas dessa política cr iminal e, no mov imento coetâneo de me- dicalização das instituições, medidas h ig ie - nistas sobre contágio e inlei ção no Rio da febre amarela c da varíola, bem c o m o a elaboração teórica racista da Liga Brasileira de Higiene Menta l , fundada em 1923, cujos' membros, c o m o adverte Freire Costa, so- nhavam com " u m sistema med ico-po l i c i a l " para trabalhar u m de seu tópicos favoritos, o a lcool ismo " . O usuário de drogas, dependente o u experimentador, não era c r im ina l i zado , e Hungria, que transplantou o princípio para o CP 1940, expl icava por que: "o v ic iado ítual (ji toxicómano ou ilmplts Intoxicado habitual) é um doente que precita de trata- mento, e não de punição (...) o a inda não v i c i a d o não d e i x a d e ser u m a vítima d o pe r i go de ser e m p o l g a d o pe lo vício, e não u m c r i m i n o s o " " 4 1 . C o m o e ram tratados esse d o e n t e e essa vítima? Estabelecido que a t o x i c o m a n i a era doença de not i f icação compulsória, estavam os usuários de d r o - gas sujeitos a internação, que poder ia ser obrigatória o u facu l ta t i va , por t e m p o deter- m i n a d o o u não (dec. 20 .930/32 , art. 45 ) : o decreto-le i n" 8 9 1 , de 17 .ago .38 , p r o i b i - r ia " o t ra tamento de toxicómanos e m d o - mic í l io" (art. 28) . A improvável internação facu l ta t i va "a r eque r imen to d o interessado" abr ia espaço para q u e parentes "até o quar - t o g rau co la te ra l i n c l u s i v e " (dec. 2 0 . 9 3 0 / 3 2 , ar t . 4 5 , § 3 o ) dispusessem de u m prec i - oso i n s t r umen to de c o n t r o l e intrafami l iar , através de u m a delação c o m repercussão p a t r i m o n i a l , u m a v e z q u e a s i m p l e s internação, decretada pe lo j u i z , levava-o a n o m e a r "pessoa idónea para acautelar os interesses d o i n t e r n a d o " , c o m "poderes de administração", p o d e n d o o magistrado, f u n - d a d o e m laudo médico, autor izar a ou to r - ga d e "poderes expressos nos casos e na f o r m a d o ar t igo 1.295 d o Código C i v i l " , isto é, a l ienar e h ipotecar bens, entre o u - tros (dec. le i 891/38 , art. 30) . A internação obrigatória, c o n t u d o , era m u i t o mais drásti- ca : ve jamos c o m o a t ra tou o decreto-lei n" 8 9 1 , de 25 .nov .38 . Prevista também para a hipótese de a l - c o o l i s m o , a internação obrigatória depen - d ia de representação da autor idade p o l i c i - a l o u d o Ministério Públ ico, e cabia " q u a n - d o p rovada a necess idade de t ra tamento adequado ao en fe rmo o u q u a n d o for c o n - ven iente à o r d e m pública" (art. 2 9 , §§ 1° e 2°) , sendo aplicável igua lmente às situações de i n i m p u t a b i l i d a d e v incu ladas ao abuso de drogas , na ocasião submet idas à fórmu- la d a " c o m p l e t a perturbação de sentidos e de inteligência" da Consolidação das Leis Penais"*'. D ian te de "casos urgentes"(?) a potfcla podia tomar a Iniciativa da efetuar "a prévia e Imediata Internaçlo fundada no l audo de exame, embora sumário, eíetua- d o por dois médicos idóneos" (art. 29 , § 4 ° ) , d e vendo instaurar-se o p roced imen to j u d i c i a l e m c inco dias após a internação, levada a efeito " e m hospi ta l o f i c i a l para ps i - copatas " ou part icular f isca l izado (art. 29 , § 6") . A simples necessidade de "observa- ção médico-legal" autor izava o ju iz a or - denar, a internação (§ 5"). Todo diretor de hosp i t a l que recebesse toxicómanos para t ra tamento estava obr igado a comun i ca r o fato à autor idade sanitária, que por seu tur- n o o transmit i r ia à polícia e ao Ministério Público; o diretor, na l inha do contro le b u - rocrático e suspeição genera l izada, deve - ria comun i ca r "a quant idade de droga i n i - c i a lmente min is t rada" e qu inzena lmente "a diminuição feita na toxi-privação progressi- va"(§§ 7" e 8° ) . Se o ingresso e m tais noso- cômios parecia bastante fac i l i tado , a saída era comp l i c ada , dependendo sempre (a in- da que não apenas) de uma atestação mé- dica de cura ; a pretensão de retirar-se v o - l u n t a r i a m e n t e o p a c i e n t e d e v e r i a ser comun i cada ao ju iz pe lo d i re tor do estabe- l ec imento part icular, seguindo-se sua trans- ferência forçada (§ 9° ) ; a d isc ip l ina do de - creto n" 2 0 . 9 3 0 , de 11 . j an .32 , outorgava ao d i retor do hospital part icu lar no qual o toxicómano se houvera internado facul tat i - vamente o poder de , d i scordando da alta, o f i c i a r ao Ministério Públ ico " m a n t i d a a internação pelo prazo de c inco d ias" (art. 4 6 , § 7")! Q u a n d o a alta era conced ida , a a u t o r i d a d e sanitária n o t i f i c a v a a polícia "para efe i to de vigilância" (dec. lei 891/38, art. 29 , § 10). Cabia , é c laro , ao internado que se entendesse curado uma reclamação para postular d o ju iz o exame per ic ia l que lhe abr i r ia as portas do estabelec imento (§ 13) Incontestavelmente, a alta do paciente não era uma decisão médica e s im uma decisão j ud i c i a l , assimilável a u m alvará de sol tura , in formada por u m parecer médico (art. 3 ° , § 4"). Além d o deficit imposto a sua capac idade jurídica, va r i ando da no- 82 i meação do curador para caios de slmplei internaçlo, ató a Interdição p l ena , c o m equiparação aos absolutamente incapazes (art. 30 , § 5"), estava o interdi to sujeito a l i cenc iamento temporário d o cargo públi- co que ocupasse (art. 31). Esta síntese das regras que d isc ip l inavam as respostas jurí- d icas à drogadição d i spensam q u a l q u e r ou t ro argumento quan to à adequação da designação " m o d e l o sanitário". Em sua monograf ia sobre o a lcoo l i smo, o pr imei ro Evaristo de Moraes designava tal sistema por "assistência coac t i va " , semelhante - d iz ia ele - "à que se apl ica hoje aos pestosos, e que se aplicará, no futuro, aos siíilíticos em período de contágio" 1"' 1. Examinemos, por f i m , as normas penais. O decreto4 .294/21 , abstraídos os casos de embriaguez previstos, se restringia a punir as condutas de "vender, expor à venda ou min is t ra r " as "substâncias venenosas que tivessem qua l idade entorpecente " : a posse ilícita não era p u n i d a " 7 1 . Já o decreto n" 20 .930 , de 11 . j an .32 , p romoveu uma i n - tervenção penal m u i t o mais ampla e drásti- ca. O t ipo básico do tráfico começa a acu- mular núcleos ("vender, ministrar, dar, t ro - car, ceder o u , de qualquer modo , propor - c ionar " - art. 25), antec ipando o fenómeno que Zaffaroni designará por "multiplicação dos verbos"" " 1 , além de contemplar todo e qualquer i nduz imen to ou instigação ao uso. Os iníratores médicos, cirurgiões-dentistas, farmacêuticos ou que mil i tassem em qua l - quer profissão o u arte que favorecesse a prática do cr ime sujeitavam-se ainda à sus- pensão temporária do exercício prof iss io- nal (no caso dos médicos, por 4 a 11 anos). A posse ilícita fo i c r imina l i zada (art 26), bem c o m o a prestação de local (art. 27) e a receita fictícia (art. 28): aí está o f igur ino do artigo 281 CP 1940. A receita íictícia con - sistia n u m cr ime de perigo presumido, cons- truído numa moda l idade c o m o norma pe- nal e m branco ("prescrever o uso de qua l - q u e r substânc ia e n t o r p e c e n t e c o m preterição de formal idade necessária", que poderia ter por exemplo o "receituário ofi- cial") e em outras como infração Indetermi - nada a norma técnica ("em dose ev idente- mente mais elevada que a necessária o u fora dos casos indicados pela terapêutica"): nem o po l imento gramatical apl icado por Hungr ia resgataria os vícios desse t ipo , i n - d icador da importância do e ixo médico- farmacêutico no acesso às drogas ilícitas. A l iás , o p r o f i s s i o n a l que prescrevesse "cont inuadamente" substâncias entorpecen- tes poderia ve r se "declarado suspeito" pelai autoridade sanitária, sendo seu receituário submetido a "fiscalização especial e r igo- rosa (...) f icando as farmácias proibidas de aviar-lhe as receitas sem o visto da autor i - dade sanitária l oca l " (art 29). A impor ta - ção de entorpecentes por via aérea, ou pos- ta l , ou qua lquer outra inobservância das regras próprias era punida com uma pena fixa de quatro anos de prisão celular (art. 30) . Toda violação aos regulamentos de controle era punível com multa , e na re in - cidência prisão de seis meses a dois anos (art. 32). O tráfico e a importação irregular eram inaíiançáveis (art. 3 1). O condenado, por qualquer de l i to , que fosse funcionário i público perderia o cargo; se fosse a luno de estabe lec imento de ensino "de qua lque r grau, público ou part icular" , seria excluído e teria a matrícula trancada pelo tempo da pena (arts. 34 e 37). A tentativa se equ ipa - rava ao cr ime consumado (art. 18), c não cabia sursis nem l ivramento condic iona l (art. 35). A reincidência agravava ao dob ro a pena (art. 39), e o estrangeiro reincidente seria expulso do território nac ional (art. 40). O sistema de tratamento inst i tuc iona l izado e interdição de in tox i cados faz surgir a modal idade de cárcere pr ivado consistente na internação extra judic ia l "sob o falso pre- texto de tratamento" (art. 43) , que será re- co lh ido pelo CP 1940 c o m o forma qua l i f i - cada (art. 148, § 1 " , inc II). O contexto moralista dessa legislação não pode ser mais vis ivelmente demonstrado que pela trans- crição da agravante prevista no art igo 36 : "a procura da satisfação de prazeres sexu- ais, nos cr imes de q u e trata este decreto , constituirá circunstância agravante" . O dec re to n° 2 4 . 5 0 5 , de 2 9 . j u n . 3 4 , que i n t r o d u z i u a lgumas modificações, e o de - creto n° 8 9 1 , de 25 .nov .38 , que revogou o dec re to n" 2 0 . 9 3 0 , de 11 . j an .32 , não al te - r a r am substanc ia lmente essa proposta, sal - v o na criminalização d o consumo , u m ver- b o a ma is na nova multipl icação que se operou" ' " , que não p roduz i r i a efeitos práti- cos face à próxima vigência do CP 1940. Registre-se, por o u t r o l ado , a eliminação da expulsão automática para réus estudan- tes. O s processos cr imina is , no Distr i to Fede- ra l , e r a m da atribuição da Procurador ia dos Feitos da Saúde Pública (art. 5 8 , dec. 20.930/ 32) , e u m disposit ivo d o dec. 891/38 sela o compromisso médico-criminal desse mode - l o : "as autoridades sanitárias e pol ic ia is pres- tarão auxílio recíproco nas diligências que se t o m a r e m necessárias ao b o m cumpr imento dos disposit ivos desta l e i " (art. 63). Sob revêm o CP 1 9 4 0 , q u e con fe re à matéria u m a d i sc ip l ina equ i l i b rada , não só o p t a n d o por desc r im ina l i za r o consumo de drogas , mas também c o m u m sóbrio recor- te dos t ipos legais, observando-sc inc lus ive u m a redução d o número de verbos c m c o m - paração c o m o antecedente imed ia to (dec. 891/38 , art. 33) , redução tanto mais a d m i - rável q u a n t o se observa a fusão, n o art igo 281 CP, d o tráfico e da posse ilícita no mes- m o d i spos i t i vo . N o con t ex to l ibera l izante da redemocratização, após 1946 , o tema I das drogas cai para u m segundo p lano . O e ixo mítico repressivo centra l a inda repou- sa - e assim permanecerá até os anos ses- senta - na " c o m p l e t a perdição m o r a l " ou na predisposição para "a pract ica de actos c r i m i n o s o s " d o decre to de 1 9 2 1 , porém a irrelevância estatístico-criminal do tráfico e d o abuso de drogas não atrai a atenção dos jur istas, dos criminólogos e mesmo dos legis ladores. Convém menc ionar o decre- to-lei n" 4 . 7 2 0 , de 21 de setembro de 1942, o decreto-lei n" 8 .646 , de 11 de jane i ro de 1946 , e o decreto-lei n" 2 0 . 3 9 7 , de 14 de jane i ro de 1946 . O pr ime i ro f ixava as "no r - mas gerais para o cu l t i vo de plantas entor- pecentes e para a extração, transformação e pur i f i cação de seus pr incípios a t i vo- terapêuticos"; o segundo alterava o decre- to-lei n " 8 9 1 , de 25 de novembro de 1938, c en t r a l i z ando e m dete rminada repartição pública o poder de autor izar importação e exportação de entorpecentes para "d roga - r ias, laboratórios, farmácias e estabelec i - mentos fabr is " , e o terceiro regulamentava a indústria farmacêutica no país, detendo- se, nos artigos 19 a 26, sobre os laboratóri- os que fabricassem especial idades conten - do entorpecentes. No pecul iar quadro da industrialização restringida brasileira, a con - versão da droga em mercador ia de u m lado sinal izava os bons negócios futuros no âm- b i to s i lencioso e lícito das íármaco-depen- dências, e de o u t r o l ado contribuía para dissipar o protagonismo dos próprios ope - radores sanitários no comércio das chama- das substâncias entorpecentes, segundo a lógica - basta recordar Freud e a cocaína - de que a droga é a cura da droga" 0 1 . I l l - O m o d e l o bélico A escolha de 1964 c o m o marco divisó- r i o ent re o m o d e l o sanitário e o m o d e l o bélico de política c r im ina l para drogas cer- tamente não se prende à edição da lei n" 4 . 4 5 1 , de 4 de n o v e m b r o de 1964 , que acrescentou o verbo "p lanta r " ao art igo 281 CP. (A inda que tecnicamente ociosa, c o m o logo registrou He leno Fragoso, toda altera- ção no sent ido da "multiplicação dos ver- bos" é sintomática para o panpena l i smo da proposta , para o delírio de uma i l i c i tude contínua e inescapável.) A escolha de 1964 se prende obv iamente ao golpe de estado que c r i o u as condições para a implantação do m o d e l o bélico, o que não signif ica que mot ivos d o mode lo sanitário - m u i t o espe- c i a l m e n t e na consideração d o "estereóti- po da dependênc ia" , mag i s t r a lmen te des- c r i t o po rRosa de i O l m o " " - não c o n t i - nuassem a operar r e s idua lmen te . Não foi o acaso que reun iu , nos m o v i - mentos contraculturais jovens dos anos ses- senta, a generalização do contacto com a droga e a denúncia pública dos horrores da guerra, e a derrota de tais mov imentos não pode ser melhor representada que pela política c r imina l que resolveu opor-se à dro - ga c o m os métodos da guerra. Refugindo por comple to aos l imites desse trabalho uma análise dos conf l i tos e contradições que exp lod i ram naqueles mov imentos , é indis- pensável uma referência ao capita l ismo i n - dustr ial de guerra. C o m o se sabe, a cha- mada "guerra f r i a " p r o d u z i u nos Estados Unidos - e fixamo-nos nos Estados Unidos porque o chanceler brasi leiro d iz ia em 1966 que "o que é b o m para os Estados Unidos é bom para o Brasi l " - uma aliança de seto- res mi l i ta res e indust r ia i s para a qua l a iminência da guerra era condição de de- senvo lv imento , ao ponto do fracasso das conferências sobre desarmamento no f inal dos anos c inquenta repercutir favoravelmen- te em Wall Street" ' 1 ; segundo Leonlief, o gasto mi l i tar mund ia l d u p l i c o u entre 1951 e 1970. passando de cem bilhões a duzen - tos bilhões de dólares'-'". Estas c ifras fantás- ticas, nesse período fortemente concentra- das nos dois blocos de cu jo antagonismo depend iam (Estado Unidos e Otan de u m lado e União Soviética e Pacto de Varsóvia de outro ) , ag lu t inavam interesses para os q u a i s e ra f u n d a m e n t a l não apenas a militarização das relações internacionais, no c a m p o d o q u e então se c h a m o u de geopolítica, mas também ao nível interno dos países incorporados. O instrumento te- órico desse projeto foi a doutr ina da segu- rança nac iona l , e laborada no Brasil pela Escola Superior de Guerra, fundada em 1949 sob a inspiração do National U'ar Colleue e c o m a ajuda de uma missão mi l i tar ame- r icana' ' 4 1 . O autor i tar ismo da dout r ina da segurança nac iona l , expressamente adota- da na legislação de defesa do Estado d u - rante a d i t adu ra mi l i t a r 1 2 1 " , b e m c o m o a efetividade de seus porões, ultrapassam os objetivos desse estudo, porém é preciso re- colher um de seus conceitos - o de " i n i m i - go interno" - que, intensamente v ivenc iado pelos operadores pol ic ia is , militares e j u d i - ciários no âmbito dos delitos políticos, trans- bordará para o sistema penal em geral, e sobreviverá à própria guerra fr ia. N o dis - curso de uma alta patente mil i tar da época, o "uso de tóxicos" - ao lado, claro está, d o "amor l ivre" - const i tu i lática da guerra re- volucionária contra a "civilização cristã""1'1. Em 19í>8, treze dias depois do A to Insti - tuc ional n" 5, o edito mi l i tar que minist rou o coi/p-cfe-grâce na democrac ia represen- tativa e garroteou a um só tempo as garan- tias indiv iduais, a l iberdade de expressão e o Poder Indiciário, o decreto lei n" 385, de 2b de dezembro, alterava o artigo 281 CP. Além da introdução de mais alguns verbos no l ipo de injusto do tráfico ("preparar, p ro - duz i r " ) , e de sua ampliação para as maléri- as-primas, a novidade eslava na equipara- ção quoad poenam do usuário - daquele que "Iraz consigo, para uso próprio, subs- tância entorpecente"- ao traiic ante. Cerca de seis meses depois, o decreto-lei n" 753 , de I 1 de agosto de 1969, estabelecia fisca- lização pol ic ia l sobre os laboratórios cujos produtos contivessem substâncias entorpe- centes; neste d ip l oma , a preocupação c o m as amostras grátis ocupava a lunção que no imaginário c a r i o c a de ho j e têm os balciros das podas de escolas. A equiparação quoad poenam do usuá- r io ao traficante de drogas provocou a lgu- ma reação no escasso grupo de juristas e magistrados que ousavam insurgir-se c o n - tra o regime autoritário. Uma das estratégi- as por eles uti l izadas foi questionar a va l i - dade do depo imento dos pol ic ia is que ha- v iam part ic ipado da prisão em llagranle d o usuário, lendo se notab i l izado por suas sen- tenças c seus trabalhos teóricos a respeito o juiz Hélio Sodré"" . O absurdo dessa equ i - paração, mesmo (ou pr inc ipalmente) dian- te da visão "of ic ia i " do problema, não sen- sibi l izou os legisladores da ditadura, como demonstraria sua manutenção pela lei n° 5 .726, de 29 de outubro de 1971. Dese jamos se lec ionar alguns aspectos dessa lei n" 5.726, de 29.out .71. Seu fa- moso artigo 1°, inspirado no artigo 1" da " l e i " de segurança nacional vigente, como observou Ce lso Del manto' 2 " , que declara constituir "dever de toda pessoa física ou jurídica colaborar no combate ao tráfico e uso de substâncias entorpecentes" , para a lém do compromisso bél ico que a vox "combate" contém, utiliza-se da estrutura normativa da imposição do dever jurídico, fundamento dos ilícitos omissivos, para con- verter qualquer opinião dissidente da polí- tica repressiva numa espécie de cumpl ic i - dade moral com as drogas. Decorre daí que "sob pena de perda do cargo, ficam os di- retores obrigados a comunicar às autorida- des sanitárias os casos de uso e tráfico (...) no âmbito escolar" (art. 7", par. ún.) Que i - mando etapas burocráticas, a diretora de um colégio estadual do Rio de Janeiro en- c a m i n h o u e m 1 9 7 3 à Po l í c i a F ede ra l cinquenta e quatro nomes de alunos "sus- peitos de estarem envolvidos em tóxico"'" 1 , fato que poderia ter levado ao trancamento da matrícula de todos, tal como previsto no artigo 8" da lei. Para a lei, essa educa- dora estava prestando "serviço relevante", ao colaborar "no combate ao tráfico e uso" de entorpecentes (art. 24). Aos usuários de drogas cujo vício pudesse fundamentar uma situação de inimputabi l idade, construída segundo o modelo biopsicológico, aplica- va-se uma "medida de recuperação", con - sistente em internação "para tratamento psi- quiátrico pelo tempo necessário à sua re- cuperação" (arts. 9° e 10). A lei 5.726/71 cr iava um procedimento judicial sumário (art. 14 ss) e alterava as regras para expul - são d e estrangeiros, colocando o uso e trá- fico de drogas ao lado dos crimes contra a segurança nacional numa investigação su - mária com o prazo de c inco dias (art. 22). Q u a n t o às normas c r im ina l i zadoras , sem p e r d e r a o p o r t u n i d a d e de acrescer u m ve rb inho a mais (dessa fe i ta , "oferecer" ) , as penas e ram elevadas (a escala da receita fictícia subia de 6 meses a 2 anos para 1 a 5 anos), criava-se a "quadr i l ha de do i s " que até hoje const i tu i u m prob lema técnico-ju- rídico, e mantinha-se a equiparação penal entre usuários e traf icantes, agora c o m o teto de 6 anos de reclusão. A cu l tura po l i c i a l dos anos setenta c o m - preendeu perfei tamente as expectativas d o regime mi l i ta r acerca de seu desempenho, e respondeu a elas c o m dedicação. A o p i - nião de u m inspetor de polícia m i n e i r o , transcrita no l i v ro de u m general que exer- c i a impor tan tes funções na Secretaria de Segurança Pública d o Rio de Janeiro, é bem representat iva: "só há u m rumo para pôr f i m ao p rob lema , o enquadramento dos tra- f icantes na lei de segurança nac ional (...), a interferência das autor idades mi l i t a res " " 0 1 . Vera Ma lagu t i S. W. Batista e x a m i n o u as fichas do DOPS-Rio referentes ao verbete tóxicos nesse período, demonstrat ivas des- sa or ientação; u m dos d o c u m e n t o s , de 1 9 7 3 , i n t i t u l a d o "Tóxicos e Subversão", apresenta a droga c o m o arma da guerra f r ia : " c i t ando Lênin, M a o e H o Chi M i n , atribui-se a disseminação d o uso de drogas a uma estratégia comunista para a destru i - ção d o m u n d o o c i d e n t a l " " " . Mas a cu l turajurídico-penal também i n - c o r p o r o u a visão segundo a qua l a questão das drogas não passava de uma face da guerra. V icente Greco F i lho, que na in t ro - dução de seu l i v ro recordava a utilização histórica de tóxicos " c o m o arma bélica", interpretava o art igo 1" c o m o exortação às "forças da Nação para essa verdadeira guerra santa q u e é o c o m b a t e aos tóx icos" " 2 1 . "Ninguém contestará que a disseminação de tóxicos entre a juventude (...) const i tu i tática subvers iva" , pont i f i cava Seixas San- tos, acrescentando: " o de l i t o d o traficante dever ia ser inser ido na lei de segurança na- c iona l , porque é c r ime de lesa-pátria"'"'. A relação entre a tox i coman ia e a "segurança e o desenvo lv imento" - a divisa política da d i tadura - era assinalada por Sérgio de O l i - veira Med i c i 1 1 4 1 , enquanto Carva lho Rangel t o m a v a e m cons ideração "as m e d i d a s adotadas pelo governo amer i cano" para as- sinalar a necessidade de uma "ação con - j u n t a " entre o judiciário e outras agências governamentais para co ib i r o tráfico, "pois só assim o ma l será e l i m i n a d o " ' 3 5 ' . Essa amostragem é suf ic iente para constatar que a produção jurídico-penal daquela con jun - tura absorveu a ideia de que a general iza- ção do contacto de jovens c o m drogas de- via ser compreend ida , no quadro da guerra fr ia , como uma estragégia do b loco c o m u - nista para solapar as bases morais da c i v i l i - zação cristã o c i d e n t a l , e que o enfren- tamento da questão devia valer-se de méto- dos e dispositivos mil i tares. A reunião do e lemento bélico e d o e lemento religioso- mora l resulta na metáfora da guerra santa, da cruzada, que t em a vantagem - extrema- mente func iona l para as agências pol ic ia is - de expr imir uma guerra sem restrições, sem padrões regulat ivos, na qual os fins just i f i - c am todos os meios. N o plano internacio- na l , o novo front das drogas reforçava as fantásticas verbas orçamentárias do capita- l ismo industrial de guerra A vigente lei n 6 .368 , de 21 de outubro de 1976, ap r imorou , para o bem e para o ma l , a lei n" 5 .726/71. Aquele dever jurídi- co genérico do art igo 1 permaneceu, po - rém a palavra " comba te " foi substituída pela expressão "prevenção e repressão". Os alu- nos surpreendidos c o m um cigarro de ma- c o n h a já não e s t a v a m s u j e i t o s ao trancamento da matrícula nem os diretores à delação, mas se os últimos não adotas- sem medidas preventivas colocar-se-iam na l inha de uma responsabilização "penal e administ rat iva" fe l izmente não expl ic i tada (art. 4" e par. ú n ) . O proced imento j ud i c i - ário foi regulamentado mais minuc iosamen- te, e o réu condenado por tráfico não pode- ria apelar sem recolher-se à prisão (art. 35). As penas subiram estratosfericamente, indo a escala penal do t ipo básico do tráfico (art. 12) - ao qual se acresceram novos verbos, " remeter " , " adqu i r i r " e "prescrever", este ú l t imo p o r q u e a r e c e i t a f ic t íc ia se transmudaria e m cr ime culposo (art. 15) - para a faixa de 3 a 15 anos de reclusão e mul ta . Uma modal idade de apologia, o r i un - da da legislação dos anos tr inta, construída c o m o t i p o a b e r t o de conteúdo indeterminado ( c o n t r i b u i r de qualquer for- ma para i n c e n t i v a r o u d i f u n d i r o uso indevido ou o tráfico" - ait 12, § 2", inc. I l l ) , capaz de, nas mãos de u m delegado de polícia devotado, levar à instauração de i n - quérito contra Charles Baudelaire, Aldous Hux ley , Jean Cocteau e Walter Benjamin numa única estante de l ivrar ia, estava agora sujeita à pena de 3 a 15 anos de reclusão. A posse para uso próprio, entretanto, recebeu disc ip l ina à parte, cominando-se-lhe uma pena privativa da l iberdade (detenção de 6 meses a 2 anos e mul ta - art 16) só excep- c ionalmente executada O tratamento dos drogaditos foi apr imorado, prevista a alter- nativa da assistência ambula tona l ("em re- g i m e ex t ra-hosp i t a l a r " - art 10, § 1° ) , man t ida a cláusula de i n i m p u t a b i l i d a d e segundo o mode lo anterior (art. 19 e par. ún.) A regulamentação dessa le i , efetuada pelo decreto n" 78 992 , de 21 de dezembro de 1976, além cia vedação das amostras grá- tis (art. 13), pro ib ia qualquer " tex to , car- taz, representação, curso, seminário ou con - ferência" sobre o tema sem prévia autor iza- ção (art. 8 '), b e m c o m o recomendava a fis- calização rigorosa pelas autor idades de censura", sobre espetáculos públicos, para "evitar representações, cenas ou situações que possam, ainda que veladamente, susci- tar interesse" pelo tema (art 9"). "A l iber- dade artística - d iz i a u m dos e laborado - res dessa legislação - precisa de ser cont ro - lada" i b . A Constituição da República de 1988 de u m lado revogou esses últimos dispositi- vos, ao ban i r a censura (art. 5 ° , inc . IX) e de o u t r o d e t e r m i n o u que o tráfico de drogas constituísse c r ime inafiançável e insuscetível de graça ou anistia (art. 5", inc . XLIII)^ no c o n t e x t o de uma disputa const i tu inte entre representantes da corrente que à época de - s ignamos por "direita penal " e representan- tes da tendência que Maria Lúcia Karam cha - mar i a d e "esquerda pun i t i va " ' 1 7 1 . A chama - da le i dos cr imes hed iondos (n° 8 . 0 7 2 , de 2 5 . j u l . 9 0 ) p ro ib i r i a também o i ndu l t o e a l i be rdade provisória para o tráfico de d ro - gas (art. 2", incs. I e II) e, pre tendendo ele- var as penas da quadr i lha votada à prática de todos os del i tos por ela con templados (art. 8 ° ) , sem aperceber-se que a quadr i l ha de dois d o artigo 14 da lei 6.368/76 já dispu- nha de uma escala penal elevadíssima (3 a 10 anos de reclusão), acabou por invo lunta r iamen- te r eduz i- l a " 8 1 . Essa mesma lei d o b r o u os prazos d o p roced imento jud i c i a l (art. 10), para garant i r uma prisão provisória mais extensa dos acusados por tráfico. Essas derradeiras alterações na d i s c i p l i - na jurídico-penal do abuso e tráfico de d r o - gas ilícitas, todas no sentido de uma severi - dade e u m rigor só comparáveis ao m o d e l o repress ivo dos cr imes contra a segurança n a c i o n a l durante a d i tadura mi l i tar , já se dão n u m quadro político in ternac iona l d is - t i n t o . N o s anos o i tenta , uma sequência ver- t ig inosa de en tend imen tos e articulações c o n d u z ao f im da guerra fr ia , cu jo símbolo c o n s i s t i u na reunif icação da c i d a d e de Be r l im . O cap i ta l i smo monopol i s ta de base indust r ia l - aí compreend ida a indústria bé- l ica - se reorganizava, ao impacto d o surto dos serviços e da corr ida tecnológica, c o m a emergência de novas potências económi- cas a tuando t ransnac ionalmente e o adven - to de u m a soc iab i l idade urbana na qua l o c o n s u m o e as comunicações de massa pas- savam a exercer funções estratégicas. Para as classes hegemónicas do m u n d o o c i d e n - tal e suas corporações, as perspectivas de expansão sobre os destroços do b l o c o soc i - alista e r am deslumbrantes, e as poss ib i l i - dades de deslocamento de recursos e inves- t imentos de tal envergadura, a nível p lane- tário, só pod i am ser em seus sonhos empa- relhadas, guardadas todas as pecul iar idades dos respectivos processos históricos, aos ho - r izontes abertos, meio milénio atrás, c o m a d e s c o b e r t a da Amér ica . Os artífices e ideólogos da guerra fria v i am sua história terminar, e nada mais compreensível que proclamassem o f im da História A econo - mia de mercado vencera, as leis de merca- do assumiam a função de estatuto funda- m e n t a l das re lações e conómicas , e a c o m p e t i t i v i d a d ese c o n v e r t i a no l i a m e sinalagmático da convivência humana. Não compete mais ao Estado imiscuir-se na eco- nomia para fomentar e garantir condições decentes de sobrevivência para a popu la - ção, devendo sim privatizar todos os seto- res de sua intervenção, desregulamentar os m e r c a d o s e p r o m o v e r a m a i s a m p l a liberalização f inanceira e comerc ia l ; para lavorecer estes objet ivos, a mídia - agora o braço armado do império transnacional da produção de tecnologias, equipamentos e dos serviços de telecomunicações - golpeia enfat icamente c procura desmoral izar coti- d ianamente toda e qualquer irregular idade que se passe no âmbito da administração pública, enaltecendo paralelamente a " e f i - ciência" das gestões privatizadas, reduz in - do o noticiário ou mesmo s i lenc iando so- bre suas negociatas. C o m o o resultado real dessa espécie de "vale-tudo" económico é o aumento da marginalização social e do desemprego, c o m todos os conf l i tos e ten- sões que, exprimindo-se também nas inc i - dências cr imina is , a lavancam crescente de- manda de repressão po l i c i a l , estabelece-se um cur ioso paradoxo, tocando ao "Estado mínimo" exercer um contro le social penal máximo. Paralelamente a essas transformações, a ampliação inimaginável dos mercados i n - ternacionais de drogas ilícitas alterara o ce- nário geográfico da guerra que N i x o n enun - ciara e Reagan ve io a declarar. Rosa dei O l m o mostra como , após as grandes ope- rações na Jamaica e no México, em mea- dos dos setenta, a produção da maconha, "seguindo a lógica d o cap i ta l " , vai estabe- lecer-se na empobrec ida Colômbia" 9 ' . Nos anos o i ten ta , o apo io norte-amer icano à contra-revolução nicaraguense é empreen- d ido " e m nome da luta contra as drogas" 1 4 0 1 . Dessa forma, a inda nos estertores de um m u n d o an tagon icamente b i p o l a r i z a d o , a droga vai se convertendo no grande eixo - o mais imperturbave lmente plástico, capaz de associar motivos religiosos, morais, po- líticos e étnicos - sobre o qual se pode re- construir a face do i n im igo (interno) tam- bém n u m compatr io ta ; no Rio de Janeiro, na f i g u r a de u m a d o l e s c e n t e neg ro e favelado que vende maconha ou cocaína para outros adolescentes bem-nascidos. A severidade de nossa legislação, acima exa- minada , expr ime não somente a síndrome dos governos lat ino-americanos de serem "mais drásticos que o próprio governo nor- te-americano" ' 4 " , mas também a func iona- l idade mítica da droga para o exercício da- quele contro le social penal máximo sobre as classes marginal izadas, cujos fi lhos são recrutados para trabalhar nos arriscados es- tágios da produção e comercialização de um produto cu jo mercado está c o n d i c i o - nado por sua criminalização e cujos pre- ços osc i l am na razão direta da maior ou menor eficiência das agências de repressão penal1 4-'1. Consoante l uc idamente observa Nils Christ ie, " c o m o f im da guerra Iria, num quadro de profunda recessão económica, no qua l as nações indust r i a l i zadas mais importantes não têm in imigos externos con - tra os quais se mobi l izar , não parece i m - provável que a guerra contra in imigos i n - ternos seja p r i o r i zada " 1 4 " : as drogas ilícitas, c o n v e n i e n t e m e n t e d e m o n i z a d a s , e suas i legal idades satélites v i e r am a cons t i tu i r o c a m p o de ba ta lha dos expe r imen tos e (áticas dessa guerra . "A guerra cont ra as drogas - escreve G i l b e r t o M e d i n a - ado- tou as mesmas pautas estabelec idas para enfrentar a "ameaça c o m u n i s t a " ' 4 4 1 , e t an - to o d iscurso penalístico quan to a práti- ca do sistema penal o reve lam. Uma política cr imina l de guerra tem efe i - tos benéficos para a indústria do contro le do cr ime, seja no aquecimento dos gastos públicos c o m equ ipamentos adequados , com a reengenharia das divisões encarre- gadas da inteligência e do confronto , e c o m a ampliação do sistema penitenciário, seja no âmbito desse novo setor que é a segu- rança privada, o qua l , segundo um relató- r io amer i cano de 1 l) l)1 c i t ado por N i l s Christie, ultrapassa as verbas das agências públicas de segurança em mais de 7 0 % (US$ 52 bilhões anuais), e ocupa duas ve- zes e meia mais pessoas do que elas, o que significa um milhão e meio de empregos 1 4 5 ' . Essa máquina g i g a n t e s c a , c a p a z de redirecior.ar frustrações orçamentárias o r iun - das do f im da guerra fria, deve uma bela fatia de suas engrenagens a i legalidade da droga, e trata de realimentar todos os mitos que, a partir da droga, desatam pânicos sociais e instam por repressão penal. E fácil perceber que os lucros da industria do con - trole do cr ime são tributários da política c r i - mina l adotada, para compreender as ver- dadeiras razões pelas quais as orientações político-criminais passam, neste período, a assumir uma posição de destaque no de- bate político em geral, bem como os ver- dadeiros compromissos dos representantes das correntes chamadas de " lei e o rdem" . 1 A mudança de ident idade do in im igo , da guerra fria para a guerra contra as drogas e o "c r ime organizado" internacional , se re- ílete também na indústria cultural do c r i - me: sai de cena o agente soviético ru ivo que Sean Connery matava, entre uma na- | morada e outra, e entra um homem la t ino , mu i t o parecido com todos nos, perverso traficante que teve a desventura de conhe - cer a filha de Charles Bronson IV - As marcas da guerra Seria re la t ivamente simples reduzi r as políticas sociais brasileiras a um aforismo elaborado para a guerra, e não hesitaría- mos em eleger aquele que Maquiavel re- co lheu em Vegécio: "é melhor vencer o inimigo com a fome do que com o ferro"' 4 6 ' . As coisas se compl icam um pouco ao pre- tendermos surpreender alguns princípios da arte militar aplicados a um sistema penal cu jo funcionamento é concebido como uma guerra, mas essa angulação poderá recom- pensar-nos com a revelação de certas cor- respondências inquietantes. Principiemos por aquilo que o mais an- tigo teórico da guerra conhecido, Sun Tzu , chamava de "lei mora l " , que segundo ele "faz c o m que o povo fique de completo a c o r d o c o m s e u g o v e r n a n t e " ' 4 7 1 , e C lausewi tz ' 4 4 1 chamou de "informação", ob- servando que as notícias que circulam em tempo de guerra são na maior parte falsas; as guerras do século XX demonstrariam a importância estratégica da propaganda. No caso das drogas, entre tantas mistificações ideológicas produzidas não apenas pela m í d i a , mas t a m b é m p e l a e l a b o r a ç ã o conceituai teórica, selecionamos o dogma da i l icitude ontológica como aquele com maior aptidão para concentrar opiniões, para c o l o c a r o povo de acordo c o m o governante, como diz ia Sun T z u . Tráfico ilícito de drogas é sinónimo perfeito de trá- fico de drogas ilícitas, porém nem mesmo a conhec ida experiência da malograda "lei s e c a " norte-americana consegue despertar essa desconfiança na generalidade dos ju - ristas; muitos procuram refugiar-se numa argumentação qu ímica para preservar a conv icção de que a maconha é proibida pelo que é, e não porque é proibida - como se o álcool também não dispusesse de uma química, como se só o tabaco pudesse in- denizar os danos aos pulmões, como no recente acordo bilionário nos Estados Un i - dos. Por essa razão, enquanto, sob o mo- delo sanitário, procuravam-se , como v i - mos, soluções semelhantes para usuários de drogas ilícitas e para o alcool ismo, o m o d e l o bélico d is t ingue comp le t amente : o demónio não pode ser u m adjet ivo . Liga-se a tal empostação a característica de cr imes de per igo abstratodos tipos de in jus to . C o m o anota Saio de Carva lho , "nas leis de entorpecentes não há ofensiv idade causal , apenas jurídica, eis que o resultado das condutas não produz dano empírico, apenas n o r m a t i v o " ' 4 " . Todo o desprestígio teórico dos cr imes de per igo abstrato, às vezes proc lamado pelos t r ibunais - versan- d o matéria dist ina - não aba lou , con tudo , a aplicação massiva e ind isc r iminada da le i . Dir-se-ia, c o m o Clausewi tz , que na guerra "a violência arma-se c o m as invenções das artes e das ciências" 1 S 0 ' , e no caso toca à ciência jurídico-penal fornecer a invenção de u m resultado presumido . Para não perder t e m p o c o m as óbvias impropr iedades da criminalização do uso, f ixemo-nos na indistinção da escala penal do tráfico de drogas ilícitas. C o m o compre - ender que as mulheres pobres latino-ame- ricanas que operam c o m o transportadoras de pequenas partidas, as " m u l i t a s " 1 5 " , ou o " t ra f icante famélico"' 5 2 1 , ou aquele que se envo lve e m decorrência do c o n s u m o 1 5 " , ou ainda o usuário que adquire também para seu co l ega , c o m o c o m p r e e n d e r que tais pessoas se suje i tem à mesma escala penal de u m atacadista fac inoroso, a não ser por u m a lógica de guerra , segundo a qua l - valha-nos novamente C lausewi tz - " enquan - to eu não tiver abat ido o meu adversário posso temer que ele consiga destruir-me" ' 5 4 ' , lógica que abstrai toda a f ragi l idade daque- les personagens, transformados mag icamen- te e m in imigos temíveis? Imaginemos a surpresa d o pesquisador que u m dia comparar o número de pesso- as mortas pelas drogas, por overdose, de- bilitação progressiva ou qua lquer out ro m o - t i vo , c o m o número de pessoas mortas pela guerra contra as drogas. N o Brasil em ge- ra l , e no Rio de Janeiro e m particular, aquele pesquisador perceberá que as vítimas da guerra contra a droga , além da extração social c o m u m , são jovens - tal c o m o na guerra convenc iona l - e será tentado a to - mar uma vereda psicanalítica para conc lu i r que ao sistema penal a nova o rdem inter- nac iona l reservou as tarefas do filicídio, antes cumpr idas pela guerra ' " ' . A questão da in imputab i l idade por menor idade, e den - tro dela part icu larmente a tendência para rebaixar o marco etário, guarda impressio- nante correspondência c o m a questão da idade de recrutamento mi l i tar tios jovens, que historicamente também sofria alterações ao sabor das necessidades de estorço béli- co da ocasião1 5'". Os amplos setores da i m - prensa compromet idos c o m o projeto eco- nómico neol ibera l fazem o que podem para omi t i r ou recalcar o noticiário nosso de cada dia; um dos recursos consiste e m subtrair às execuções pol ic ia is sua autoria real (pela aceitação acrítica da versão de 'disputa de quadri lhas" ) ou sua significação de abuso de poder (pela tantas vezes indev ida atr i - buição da qua l idade de "traf icantes" às ví- timas). O jorna l carioca O Dia, edição de 29.mar .97, estampava em sua pr imeira pá- gina: "PM mata um a cada quatro horas - Nos últimos seis dias, a Polícia Mi l i ta r m a - tou 52 pessoas suspeitas de c r i m e . Só o n - tem, no Rio e na Baixada, foram o i to . E o resultado da o rdem do general Cerqueira: 'atirar pr ime i ro e perguntar depo is ' " . Caso este desempenho fosse mant ido permanen- temente, a projeção para o i to anos e meio - o tempo que durou a escalada norte-ame- ricana - nos convencer ia de que a Polícia Mi l i ta r carioca tem capacidade bélica ca- paz de executar mais de u m terço do total de mortos norte-amerícanos em combate na guerra do Vietnã. Enquanto alguns j u - ristas desatentos não se dão conta de quanto é ridículo propor a pena de morte n u m país em que a polícia a executa tão intensamente, no Rio de Janeiro a boa pontaria é premia - da com aqu i lo que o h o m e m carioca cha- ma de "gratificação faroeste". Mas ai en - contramos ou t ro princípio, que Maqu iave l também tomou a Vegécio e transcreveu em sua Arte da Guerra: "mantemos os solda- dos nos quartéis c o m o medo e com pena- l idades; na guerra, nós os conduz imos com a esperança e prémios"" 7 ' . O mode lo bélico da po l i t i ca c r i m i n a l impr ime suas marcas também no proced i - mento judiciário, a começar pela cont rad i - ção de julgar alguém que, por constituir-se n u m i n i m i g o , deve ser imp lacave lmen te abatido (= condenado) Tal i ontradição f i - cará exposta nas múltiplas toleiáncias para com violações ao dev ido processo penal , no preconceito general izado contra as ga- rantias constituc ionais dos acusados por trá- f ico de drogas, que alcançam também os democratas que não transigem c o m os d i - reitos humanos. "As almas filantrópicas - dizia Clausewitz - poder iam faci lmente j u l - gar que existe uma maneira art if ic ial de de- sarmar e derrotar o adversai 10 sem verter demasiado sangue. Por mais desejável que isso pareça, é u m erro que c preciso e l i m i - nar. N u m assunto tão perigoso c o m o é a guerra, os erros devidos à bondade da alma são precisamente a pior das coisas"' 5"'. D i - ante de tal enfoque, as limitações const i tu - cionais ao exercíc io do poder penal se con - v e r t e m n u m a b s u r d o , v l e t o m e m o s Clausewitz: "não seria possível in t roduzi r um pr inc ip io moderadoi na própria f i loso- fia da guerra sem cometer um absurdo" ' 5 " . Basta olhar a tolerância dos tribunais - c o m honrosas exceções - para c o m as nu l ida - des, c o m o excesso do prazo da prisão preventiva em processos concernentes a trá- f ico de drogas, para constatar a influência velada do pensamento de C lausew i tz . A questão da prova ilícita, que está para a investigação po l i c ia l c o m o a espionagem para a guerra, também revelará uma to le - rância especial para casob de tóxicos. Cur i - osamente, a operação de c onlra-espiona- gem, mediante a qual uma falsa in forma- ção é passada ao i n im igo , é designada por "intoxicação""'"... N o l imi te , as "tensões i n - ternas" associadas aos "apr is ionamentos em m a s s a " , aos "maus tratos ou condições inumanas de detenção" e ao menosprezo habitual pelas garantias fundamentais que equivalha a sua suspensão - estamos trans- crevendo Swinarski ' 6 " - poderão criar con- dições diante das quais a invocação do di - reito internacional humanitário, as regras das Convenções de Genebra que limitam os métodos da guerra, deixaria de constituir uma trágica metáfora. Podemos ficar por aqui. A substituição de um modelo sanitário por um modelo bélico de política cr iminal , no Brasil, não representa uma metáfora académica, e sim a intervenção dura e frequentemente in- constitucional de princípios de guerra no funcionamento do sistema penal. Mao Tsé- Tung retomou certa feita a famosa compa- ração de Clausewitz , formulando-a nos se- guintes termos: "a política é guerra sem der- ramamento de sangue, enquanto que a guerra é política com derramamento de san- gue" . Neste sentido, podemos concluir que, em nosso país, temos para as drogas uma política criminal com derramamento de san- gue. Ao participar do Congresso Internacio- nal de Direito Penal em comemoração ao 7 5 " aniversário do Código Penal Argenti- no, tomei ciência do iminente fechamento do volume em honra do Proí. Jorge Frias Cabal lero. C o m o presente estudo, elabo- rado para o Seminário Internacional do Ins- tituto Brasileiro de Ciências Criminais deste ano, integro-me às merecidas homenagens que ora são prestadas ao notável penalista; dedico-o ao prof. Jorge Frias Caballero com afetuosa admiração. N o t a s : ( 1 ) Z i p f , H e i n z , Intfoducción a la Política Crimi- nal, t r a d . M l . M a c í a s - P i c a v e a , C a r ac a s , 1 9 7 9 . e d . E D R , p. 4 . ( 2 ) Lições de Direito Penal, P C , R i o , 1 9 8 7 , e d . F o - r e n s e , p. 1 7 . A l e s s a n d r o Barat ta o b s e r v a v a r e c e n - t e m e n t e q u e " a c o n t r a p o s i ç ã o en t re p o l i t i c a d e s egu rança e po l í t i ca s o c i a l n ã o é lóg ica m a s s i m i d e o l ó g i c a " ( D e f e s a d o s d i r e i t os h u m a n o s e p o - l í t i ca c r i m i n a l , i n Discursos Sediciosos - Crime, Direito e Sociedade, R i o , 1 9 9 7 , n" 3, p 5 8 ) . ( 3 ) C l a u s e w i t z , C a r l v o n . D a G u e r r a , trad. T B P. Bar- r o s o , B ras í l i a , 1 9 7 9 , e d U n B , p. 7 4 3 (4 ) S p e n c e , Jona l l i . in D . , E m Busca d a China M o derna. t rad. T R B u e n o e P M Soares , S ã o Pau lo , 1 9 9 5 . e d . C i a . d a s L e i r a s , p. 151 (5) S p e n c e , o p . c i t . , p p . 1 6 5 e 1 6 9 . (6) C f . N i l o B a t i s t a , A c u r a , o ê x t a s e e a t r anscendênc i a , in O . D G o n c a l v e s e F.l. Bastos ( o r g s ) , Só Socialmente, R i o , 1 9 9 2 , e d . Re l ume- D u m a r á , p. 6 0 . (7 ) R e s p e c t i v a m e n t e através dos dec re tos n 2 2 . 9 5 0 , d e 1 8 . j u l . 3 3 , n" 1 1 3 , d e 1 3 . o u t . 3 4 e n " 2 . 9 9 4 , d e 1 7 . a g o . 3 8 . (8 ) A Politica Criminal de Drogas no Brasil, R i o , 1 9 9 6 , e d . L u a m , p. 2 0 . (9 ) U m a d e c i s ã o d o T)SP, d o s a n o s q u a r e n t a , a b s o l - v i a " o facu l ta t i vo q u e , por c a r i d a d e , s e m interes- se p e c u n i á r i o , p r o c u r o u a l e n u a r o so f r imento d e u m c l i en te , p r e s c r e v e n d o - l h e e m la rgo p e r í o d o e n t o r p e c e n t e s " , e s c l a r e c e n d o q u e se o m é d i c o " d e i x o u d e usa r p a p e l o f i c i a l , n ã o foi i n t e n c i o - n a l m e n t e , m a s p o r q u e g e r a l m e n t e n ã o e r a e m - p r e g a d o n o lugar e m e s m o n ã o ex i s t i a à d i s p o s i - ç ã o d o s m é d i c o s , n a é p o c a d o s f a tos " ( RT 168/ 1 1 4 - 1 1 7 ) . ( 1 0 ) N u m p r o c e s s o j u d i c i a l d e 1 9 2 1 , ind ic a d o pe l a Rev i s ta Fo r ense c o m o pr ime i ra ap l i c a ção d a nova le i s o b r e t o x i c o m a n i a , o in te rd i to é u m o f i c i a l a d u a n e i r o (RF XXXV I I I /88 ) . U m dos m é d i c o s q u e s u b s c r e v e r a m o l a u d o , s e g u n d o o q u a l a i n t e rnação d o p a c i e n t e se r e c o m e n d a v a urgente - m e n t e pa r a ev i ta r a " c o m p l e t a p e r d i ç ã o m o r a l " , e r a He i t o r C a r r i l h o . A sen tença d o ju iz A b e l a r d o B u e n o d a C a r v a l h o c i l a c o n t u d o u m a d e c i s ã o an te r io r , d e 3 0 d e s e t e m b r o d e 1 9 2 1 , d o j u i z A l f r e d o R u s s e l , q u e t a m b é m foi p u b l i c a d a (RF X X X V I I / 4 2 6 ) , n a q u a l , p e l o m e s m o f u n d a m e n - to , foi o i n t o x i c a d o i n t e r n a d o n o S a n a t ó r i o Bo ta fogo . ( 1 1 ) A Face Oculta da Droga, I r ad . T O t t o n i , R i o , 1 9 9 0 , e d . R e v a n , p. 2 9 . ( 1 2 ) Comentários ao Código Penal, R i o , 1 9 5 9 , e d . F o r e n s e , v. IX, p 1 3 8 . (13 ) lu rand i r F re i r e C o i t a , H i s tó r i a rfa Psiquiatria n o Brasil. R i o . 1 9 8 9 . e d . X e n o n , p. 91 Sobre medi- l a l i z a ç ã o d a s ins t i tu i ções . R o b e r t o M a c h a d o et a h i , Danação da Norma. R io , 1 9 7 8 , e d . G r a a l , pp. 2 7 8 ss ; sob re as opressões h ig ien is tas no R io de ( ane i ro , S i d n e y C h a l h o u b , Cidade Febril, S. Pau lo , 1 9 9 6 , e d . C i a . das Le i r a s . (14 ) O p . c i t , p. 1 19. (15 ) E m b o r a a n o r m a e s p e c i a l (ait 4 5 . ^ 2 , al h d e c 2 0 . 9 3 0 / 3 2 e, d e p o i s , art. 2 9 § 2 , a l . b d e c . l e i 891/38 ) p r e s c r e v e s s e in te rnação obrigatória para casos de " i m p r o n ú n c i a ou abso l v i ç ão " dec orren- tes de ta is s i t uações , e n l e n d i a - s e , já no r eg ime d o C P 1 9 4 0 , q u e " n ã o e x c l u i a resi>onsal>il idade a embr iague i : p r o v o c a d a pe lo uso de entorpec e n - t e s " (RF L X X X V / 4 7 8 ) . (16 ) Ensaios de Palholngia Social, R io 1 9 2 4 , e d . L R ibe i ro , p 1 14. (17 ) N ã o inc ide nas p e n a l i d a d e s c o m i n a d a s pe l o de - c re to n' 4 2 9 1 . d e 6 . j u l . 2 1 . o i n d i v i d u o e m c u j a c a s a é e n c o n t r a d o f rasco d e c o c a í n a , e s c o n d i d o sob u m c o l c h ã o O q u e a lei d e f i n e c orno con- I r a v e n ç ã o é vende r , e x p o r à v e n d a ou m in i s t r a i ( . ) en torpecente , s e m legít ima autor ização e s e m as f o r m a l i d a d e s p resc r i t a s nos r e g u l a m e n t o s s.i n i t á r ios " (RF X L V / 5 6 8 ) . (18 ) L a l eg i s l a c ión an t i d rogas l a l i n o a m e i i c a n a : sus componen te s d e d e r e c h o pena l autoritário, in Fas- cículos de Ciências Pen.m. v l , i i 2 . P \ l eg re . 1 9 9 0 . e d . Fabr i s , p. 18 (19 ) Art. 33 - Fac ihlar, inst igar por a ios o u por p a l a - vras , a aqu i s i ç ão , u s o , e m p r e g o o u a p l i c a ç ã o d e qua lquer substância entorpec en le , i>u, sem as for- m a l i d a d e s p resc r i t as n c s l a le i , v e n d e i ministrar, dar, deter, guardar , transportar, env i.u, troi ar, so- negar, c o n s u m i r subs tânc ias c o m p r e e n d i d a s no art igo 1 o u p lantar , cu l t i var , c o l h e r as p l an tas m e n c i o n a d a s no art igo 2 " , ou de q u a l q u e r m o d o p r o p o r c i o n a r a aqu i s i ç ão , u s o o u a p l i c a ç ã o dos sas subs tânc ias - P e n a : u m a c i m o a n o s d e pr i - são c e l u l a r e mu l t a d e 1 : 0 0 0 $ ( ) 0 0 a 5 : 0 0 0 $ 0 0 0 (20 ) C í P a s s e l i , f d s o n . D a s Fumeriei a o Na r co t r á f i - c o . S. P a u l o . 1 9 9 1 . e d . E d u c . p. lr> i 2 1 i A F a c e O c u l t a da D r o g a . cu., p S 4 e p a s s i m (22 ) C f . F r e d |. C o o k , O E s t ado Mi l i ta r i s ta , trad F C Fer ro , R io , 1 9 6 4 . e d . C i v Bras , p 154 ss 121) Leon l i e í . W a s s i l y , e D u c h i n , F a y e Ef gasto m i l i - tar. I r a d . A H i b b e r t . M a d n . 19H<> e d . A l i a n z a , p. 22 (24) C ( . C o m b l i n , | o s e p h , A I d eo l og i a d.i S e g u r a n ç a N a c i o n a l , trad. A V F i a lho , Rio 1 9 7 8 , e d . C iv . Bras., p 151 ss; Martins. Rc4>etlo K Segurança Na c ion. i l . S .Pau lo , 1 9 8 6 , ed Bras i l i ense , p . l 1 ss (25 ) Cf . H e l e n o F ragoso , l e i de Segurança Nacional Uma Exper iênc ia A n t i d e m o c r á t i c a , P. A l eg r e , 1 9 8 0 , e d . Fabr i s ; An tón io Evar isto de M o r a e s F i - lho, Lei de Segurança Nac ion.i l ( ' m A ten tado a Liberdade, R io , l ' ) 82 . ed Zah .n (26) A p u d C o m b l i n . o p . c i l . , p 4ri (27 ) N o mie I O de 1 9 7 1 , H é l i o S o l e p u b l i c o u u m a i l i go , " P r o v a p e n a l r e l e i e n l e á posse de en tor - p e c e n t e s " (Rev i s ta d e D i re i to / 'eu.d. R io , 1 9 7 1 , ed Borsó i , p. 91 ss) , e no ano seguinte u m l i v io , •Tóxicos - A N o v a t e i " , R io . 1 9 7 2 , e d . R i o (28 ) Tóxicos. S Pau lo . 19H2 ed S . u a i s a , p. 1 i 29 ) V e r a M a l a g u t i S. W. Bat ista, D r o g a s e C r i m i n a l i - z a ç ã o d.i j u v e n t u d e P o b r e no R io de l ane i r o , N i t e ró i , 1 9 9 7 , m i m e o , p H l (30) | a ime R ibe i r o <la G r a ç a . I Ó M I • . R i o . 1 9 7 1 , e d . Renes , p 24 (31 ) D rogas e C r i m i n a l i z a ç ã o d a I m e n l u d e Pobre no R io de l ane i ro , in D i s c u r s o s Sed i c i o sos - Crime. D i r e i t o e S o c i e d a d e , R i o . 1 9 ' X i v 2. p 2 ) 8 (32 ) tóxicos, S. P a u lo . 1977 ed S a i a i v a . p p . l e 4 i . U m acó rdão recen te do I|R| r e i o m a o mot i vo d a guerra santa , a o lembrar q u e " a i r u z a d a contra o tox i co n ã o se i nn f i na nos l i nde* de u m de te rm i - n a d o p a i s " , c o n s i s t i n d o n u m d e s a l i o in te rna i i- o n a l " . A e m e n t a de f ine o c a s o T o x i c o P lanta - ç ã o da m a c o n h a no qu in ta l (!<• m o r a d i a d o a c u - s a d o ' C \ C n m 1 4 1 5 'K, I i l i T|R| D ( ) - R | I 7 . a b r . 9 7 , P. Ill p 160) (33) -\a l e i Ant i tóxicos ( "o i i i en l .u l a S P a u l o , 1 9 7 7 , e d . P I O - I I V I O , p. 2 1 . ( ) 4 ) Tóxicos. B a u r u . 1 9 7 7 , ed |al u . p 29 (35 ) l e i d e Tóxicos R io 1 9 7 8 ed F o r e n s e , p. XI. 136) M e n n a Bar re io . Estudo Geral d.i Nova l e i de Tó- x i cos . R io , 19H2 . e d . F Bastos p 1 6 0 . (37) N i l o Bat is ta , Pti/iidos <• M a l I . igos, R i o , 1 9 9 0 , e d . R e v a n , p IH . M a n a Lú( ia K.ir.irn, A esque r - da puni t i va , in D i s c u r s o s Sedn I O S O Í - C o m e . D i - reito e . Soc iedade , R io , 1 9 9 6 n 2, p. 7 9 SS . (38) A C o r t e S u p r e m a r e c e n t e m e n t e d e s l i n d o u o imbróg l i o , n o j u l g a m e n t o do I I C n" 6 8 . 7 9 3 - 8 , 1' T., rei M i n M o r e i r a A l v e s , D l 27 j u n . 9 7 , p. 50 2H7 (39) Prohibir o Domesticarf Políticas d e d r o g a s e n América latina, C a r a c a s , 1 9 9 2 , e d . N u e v . i S o c i e d a d , p. 1B . ( 4 0 ) S a u l o y , M y l è n e , e L e B o n n i e c , Y ve s , À quiproíite la cocaine?. P a r i s , 1 9 9 2 , e d . C a l m a n n - L é v y , p. 2 9 7 . ( 4 1 ) R o s a d e i O l m o , Prohibir o Domesticar' c i t . , p. 6 7 . ( 4 2 ) S o b r e a a t i v i d a d e p o l i c i a l p r e s s i o n a n d o o p r e ç o d a s d r o g a s , cf . C h a r l e s - H e n r i d e C h o i s e u l P ras l in , i a Drogue, une économie dynamisée par la répression, P a r i s , 1 9 9 1 , e d . C N R S . p. 2 3 e p a s s i m . ( 4 3 ) Crime Control as Industry, L o n d r e s , 1 9 9 3 , e d R o u t l e d g e , p. 1 3 - 1 4 . ( 4 4 ) La Narco-política de los EíUU, in Región, M e d e l l i n , nov . 9 6 , n* 2 2 , p. 2 0 . ( 4 5 ) O p . c i t . , p. 1 0 4 . ( 4 6 ) M a q u i a v e l , A Arte da Guerra, t r ad . S. B a t h , B r a s í l i a , 1 9 8 0 , e d . U n B , p. 3 3 ; V e g é c i o , A Arte Militar, t r a d . G . C . C , d e S o u z a , S. P a u l o , 1 9 9 5 . e d . P r u m a p e , p. 1 2 0 . ( 4 7 ) A Arte da Guerra, t r a d . ) . S a n z , R i o , 1 3 ' e d . , e d . R e c o r d , p. 1 7 . ( 4 8 ) Da Guerra, c i t . , p. 1 2 7 . ( 4 9 ) O p . c i t . , p. 8 8 . ( 5 0 ) O p . c i t . , p. 7 3 . ( 5 1 ) Z a f f a r o n i , o p . c i t . , p. 2 2 . ( 5 2 ) S a i o d e C a r v a l h o , o p . c i t . , p. 1 2 8 . ( 5 3 ) R o s a d e i O l m o , Prohibir o Domesticar? c i t . , p. 6 8 . ( 5 4 ) O p . c i t . , p. 7 6 . ( 5 5 ) " E n t r e a s d i v e r s a s c a u s a s q u e d e s e n c a d e i a m as gue r ras , des t aca-se a n e c e s s i d a d e d e perpe tuar o sac r i f í c i o h u m a n o n a f o r m a d e h o l o c a u s t o d o s f i l hos , c o m s e u s p r i m i t i v o s s i g n i f i c a d o s sócio- c u l t u r a i s i m p l í c i t o s . (...) A gue r r a m a n t é m a a m e a ç a d e mor te s o b r e a j u v e n t u d e , q u e d e v e se s u b m e t e r t o t a lmen te a o exé r c i t o e d e s l o c a r s e u s l a ços e m o c i o n a i s d o lar p a r a a c o m u n i d a d e " • A r n a l d o R a s c o v s k y , O Filicídio, R i o , 1 9 7 4 , e d . A r t e n o v a , p. 1 6 4 . D o m e s m o R a s c o v s k y , F i l i c í d i o e G u e r r a , i n G l e y P. C o s t a ( o r g ) , G u e r - ra e M o r t e , R i o , 1 9 8 8 , e d . I m a g o , p 6 0 s s . ( 5 6 ) S a b i n a L o r i g a , A Experiência Militar, in L e v i , G i o v a n n i e S chmi t t , J e a n - C l a u d e (orgs.) História dos lovens, t r ad . P. N e v e s , N . M o u l i n e M . L. M a c h a d o , S P a u l o , 1 9 9 6 , e d C i a . d a s Let ras , v. 2 . p. 2 3 . ( 5 7 ) M a q u i a v e l , o p . c i t . , p. 3 4 ; V e g é c i o , o p . c i t . , p 1 2 2 . ( 5 8 ) O p . c i t . , p. 7 4 . ( 5 9 ) I b i d e m . ( 6 0 ) J e a n - P i e r r e A l e m , £/ Espionage y el Contraespionage, t rad . D . H u e r t a , M é x i c o , 1 9 8 3 , e d . F o n d o d e C u l t u r a E c o n ó m i c a , p p . 17 e 1 0 3 . ( 6 1 ) C h r i s t o p h e S w i n a r s k i , A Norma e a Guerra, P. A l e g r e , 1 9 9 1 , e d . F a b r i s , p. 3 0 \O j Tolerânssia Zero "A Câmara de Vereadores de São Paulo aprovou lei que pune os comerciantes que usarem em seus estabelecimentos letreiros, anúncios ou qualquer outro tipo de mensagem pública com erros de português. As multas vão de R$ 100 a R$ 300, e serão aplicadas tanto para erros ortográficos e de concordância como de acentuação. A nova lei entrará em vigor em 30 dias." O Globo, 13.dez.97, p. 5 DIREITO Sobre o alcance da imunidade parlamentar material ALEXANDRE ARARIPE M A R I N H O E I MARIA HELENA CORTES PINHEIRO I - Introdução Sem qua lque r pretensão de esgotar o tema, o presente trabalho tem por f ina l ida - de ser uma breve reflexão sobre alguns as- pectos do inst ituto da imun idade par lamen- tar material . Os autores tomaram como base e pon - to de partida para sua elaboração a prática no enfrentamento de questões relativas à inv io labi l idade dos parlamentares, obtida no desempenho de suas funções na Assesso- ria Especial de Investigações Penais da Pro- curadoria-Geral de Justiça do Estado do Rio de laneiro, órgão c o m atribuições de assessoramento e consultor ia do Exmo. Sr. Procurador-Ceral de Justiça, no que diz res- pei to às atribuições originárias da Chefia do Ministério Público, e m sede c r im ina l (ação penal originária), aí eng lobados o exame e elaboração de pareceres sobre um expressivo número de representações c r i - minais por prática de crimes contra a hon - ra, formuladas em face de parlamentares, por diversas pessoas, na quase total idade dos casos, detentores de cargo público, p r in - c ipalmente no Poder Executivo. O número relat ivamente expressivo de representações cr iminais cie detentores de cargos públicos no Executivo e no Judiciá- r i o cont ra pa r l amenta res ; destes con t r a aqueles ou , até mesmo, em casos raros, de parlamentares contra parlamentares, conduz a pensarmos inicialmente no quanto alguns ocupantes de função pública não compre - endem que é um dos, por assim se dizer, "ossos do ofício", a exposição à crítica, às vezes ácida, sobre suas vidas públicas. Ao discorrer sobre a exceção da verda- de no de l i to de difamação cap i tu lado na Lei de Imprensa, e m seus Comentários", Darcy Ar ruda M i r a n d a sal ienta o t ema , quando af irma : 'Eis por que todo cidadão que aceita um cargo público ou se investe numa função pública, transitória que seja,
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