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1 O CICLO VITAL SEGUNDO ERIK ERIKSON E A CONSTITUIÇÃO DA IDENTIDADE: EXPERIÊNCIA COM UM GRUPO DE ADOLESCENTES (2010) 1 BOSSI, Tatiele Jacques2; SANTOS, Anelise Schaurich dos3; ARDANS- BONIFACINO, Héctor Omar4 1 Trabalho de ensino _UFSM 2 Graduada em Psicologia pela Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) - 2010, Santa Maria, RS, Brasil 3 Acadêmica do Curso de Psicologia da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), Santa Maria, RS, Brasil 4 Professor Adjunto do Departamento de Psicologia da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), Santa Maria, RS, Brasil E-mail: tatielejbossi@gmail.com; anelise_ssantos@hotmail.com RESUMO Erik Erikson descreve o desenvolvimento psicossocial do ser humano com base em 8 etapas que se distribuem do nascimento a idade do adulto maduro. No entanto, a adolescência é por ele a fase mais destacada por se configurar como o momento em que o sujeito passa pela “crise de identidade”. Neste trabalho, será brevemente apresentada uma experiência com um grupo de adolescentes realizado na cidade de Jaguari no ano de 2009. Tais grupos tinham por objetivo possibilitar aos sujeitos discutir sobre sua identidade através de questionamentos que remetiam ao “quem sou eu” e ao “quem eu quero ser”. Conclui-se que possibilitar aos jovens um espaço em que possam colocar sobre suas dúvidas, sonhos e anseios é importante para que eles consigam passar pela crise da identidade sem desamparos, estruturando assim uma identidade que vá ao encontro de suas aspirações futuras. Palavras-chave: Desenvolvimento psicossocial, adolescência, identidade, psicologia social. 1. INTRODUÇÃO Erik Erikson (1972) descreve o desenvolvimento psicossocial do ser humano com base em 8 etapas que se distribuem do nascimento a idade do adulto maduro. No entanto, a adolescência é por ele a etapa mais destacada por se configurar como o momento em que o sujeito passa pela “crise de identidade”. Nesse caso, a palavra “crise” deixa de ter uma conotação de catástrofe, passando a designar um ponto decisivo e necessário, isto é, um momento crucial no qual o desenvolvimento deve optar por uma ou outra direção, mobilizando recursos de crescimento, recuperação e nova diferenciação. 2 Neste trabalho, serão destacadas cada uma dessas etapas desenvolvimentais e sua importância para a constituição da identidade na adolescência, a qual é entendida como a criação de um sentimento interno de semelhança e continuidade sentida pelo indivíduo e reconhecida pelo outro (ABERASTURY & KNOBEL, 1981), e sua posterior reposição durante a idade adulta, uma vez que a base da personalidade adulta é o conceito que a pessoa possui do seu “eu”. Se essa base for forte, resultará uma sólida identidade pessoal; do contrário, a conseqüência será uma identidade difusa (SPRINTHALL & COLLINS, 1988). Como exemplificação, será destacada brevemente uma experiência com um grupo de adolescentes realizado na cidade de Jaguari no ano de 2009. Tais grupos tinham por objetivo possibilitar aos sujeitos discutir sobre sua identidade através de questionamentos que remetiam ao “quem sou eu” e ao “quem eu quero ser”, visto que, os autores, em conformidade com as idéias de Sprinthall & Collins (1988) entendem que a formação da identidade é um processo que integra transformações pessoais, exigências sociais e expectativas em relação ao futuro, a fim de criar um sentido de unicidade. É importante destacar ainda que o processo de formação da identidade no qual os adolescentes se envolvem depende de quatro (04) fatores: como eles julgam os outros; como os outros os julgam; como eles julgam os processos de julgamentos dos outros; e sua capacidade de manter em mente categorias sociais importantes, disponíveis na cultura, quando eles formam julgamentos sobre outras pessoas (ERIKSON, 1972). 2. O CICLO VITAL SEGUNDO ERICK ERIKSON E A CONSTITUIÇÃO DA IDENTIDADE O desenvolvimento humano é descrito por Erik Erikson (1972) como momentos de conflitos internos e externos, que ele designa como “crises”, que o sujeito tem de suportar para ressurgir de cada etapa com um sentimento cada vez maior de unidade interior, ou seja, com sua estrutura egóica mais fortalecida. Esses conflitos são descritos pelo autor com base em 8 etapas, que ocorrem estruturando a identidade e personalidade dos sujeitos. Destaca-se que cada uma das etapas depende do desenvolvimento da etapa anterior, no entanto, os conflitos de cada fase já existem, de uma forma mais amena, antes da chegada “normal” de sua fase, da mesma forma que se mantém depois de seu tempo decisivo. A seguir serão apresentadas cada uma das etapas do desenvolvimento humano destacadas no livro “Identidade, juventude e crise” do autor já referido. 2.1 Confiança básica versus desconfiança básica 3 Esta etapa se inicia com o nascimento, momento em que o bebê é separado de sua simbiose com o corpo materno, precisando ser nutrido e acariciado por alguém no mundo externo que esteja disponível a satisfazer suas necessidades. Erikson menciona que neste momento a criança, imersa na oralidade, “vive através da boca e ama com a boca; e a mãe vive através de (e ama com) seus seios ou qualquer outras partes de sua postura e corpo que transmitam a sua ânsia de suprir a tudo o que o bebê precisa.” (1972, p.98). O bebê, dessa forma, está receptivo a tudo o que lhe é oferecido, na mesma medida em que espera receber, minimamente, o que necessita. Quando a relação materna é de qualidade o bebê aprende a confiar na continuidade dos provedores externos, o que se estende em uma confiança em si próprio. A criança desenvolve o sentimento de esperança, já que percebe que nunca foi abandonado em suas necessidades. Caso isso não ocorra tem-se o desenvolvimento da desconfiança, ocasionada quando os provedores não conseguem ser previsíveis nos cuidados ao bebê. Erikson destaca que a aquisição da identidade nesse primeiro momento da infância deixa como resíduo para as etapas posteriores a seguinte aquisição: “Eu sou a esperança que tiver e der”. 2.2 Autonomia versus vergonha e dúvida Essa etapa corresponde à fase anal do desenvolvimento psicossexual freudiano, sendo a época em que a criança adquire o controle motor que lhe permite reter e expulsar as fezes voluntariamente. Erikson menciona que esse comportamento não se limita aos esfíncteres, mas se estende para as relações sociais, já que a criança tem a necessidade de manter seguro e jogar fora qualquer coisa que se possua. É esta a fase em que a criança manifesta um desejo extremo de ter a mãe por perto e, em um rápido instante posterior a rechaça violentamente. Todo esse poder que a criança adquire em reter e eliminar se converte no que Erikson chama de uma batalha pela autonomia. No entanto, um treino demasiado rígido ou prematuro acaba privando a criança da sua livre tentativa de controle. Tal fato faz com que a criança necessite se defender e, para isso, ela se utilizará da regressão (um mais primitivo controle oral), ou passará a utilizar as fezes como munição agressiva, tornando-se uma pessoa hostil e perigosa. Outra alternativa será fingir uma autonomia, a qual, realmente, ela nunca conquistou. Esse sentimento de perda de autonomia, bem como o sentimento de um supercontrole parental resulta numa duradoura propensão para o desenvolvimento de sentimentos de dúvida e vergonha. Somente o apoio do meio cuidador nos desejos do bebê 4 de fazer as coisas por ele mesmo o protege dos sentimentos de vergonha e dúvida (de si e da perspicácia de seus cuidadores). Essa fase apóia a formação da identidade já que, com a aquisição da autonomia se consuma a primeira emancipação da criança em relação à mãe ou cuidador. O resíduodessa fase para as etapas posteriores é a seguinte aquisição: “Eu sou o que posso querer livremente”. 2.3 Iniciativa versus culpa A criança, nesta fase, já é capaz de movimentar-se mais livremente, da mesma forma que sua linguagem também se aperfeiçoa. Esses dois fatores, linguagem e locomoção, permitem a criança ampliar sua imaginação a tantos papéis que ela própria se assusta com tudo o que pode imaginar e sonhar. Frente a tudo isso, na criança surgirá um forte sentimento de iniciativa. Essa etapa corresponde à fase fálica do desenvolvimento psicossexual, na qual a criança começa a desenvolver curiosidades sobre diferenças e espécies, em geral, e sobre diferenças de sexo e idade em particular. Devido ao enorme poder imaginativo, a criança se fantasia exercendo inúmeros papéis, aprendendo com isso, principalmente, sobre os comportamentos aceitos e exigidos socialmente a um menino e a uma menina. Essas fantasias envolvem auto-imagens sexuais que servirão para a constituição da identidade futura. No entanto, por não estar em uma idade em que seja possível suportar as exigências do âmbito sexual, a criança desenvolve sentimentos de culpa, sendo que no seu caso se referem a atos que sequer foram cometidos. Surge, assim, o sentimento moral na criança. A principal contribuição dessa fase para o desenvolvimento da identidade consiste na “libertação da iniciativa e sentido de propósito da criança para as tarefas adultas que prometem (mas não podem garantir) a realização plena da gama de capacidades do indivíduo.” (ERIKSON, 1972, p.122). O resíduo dessa fase para as etapas posteriores é a seguinte aquisição: “Eu sou o que posso imaginar que serei”. 2.4 Diligência versus inferioridade Esta etapa se configura pelo interesse da criança no que se refere à aprendizagem. É a etapa em que a criança se insere na escola formal, sendo então alfabetizada. Por entrar em um mundo que vai para além do convívio com a sua família, a criança passa a se 5 identificar com os professores e pais de outras crianças, com o intuito de, assim, observar e imitar seus comportamentos, representado, principalmente, suas ocupações (secretária, professora, policial, bombeiro, etc.). Este momento equivale ao período de latência do desenvolvimento psicossexual, momento em que a criança, segundo Erikson, tem necessidade de ser reconhecida em suas produções, em seu trabalho. A criança deseja aprender, e para isso ela dá o seu melhor, esforçando-se ao máximo em suas atividades, buscando assim o reconhecimento de suas figuras significativas. A isso, Erikson deu o nome de sentimento de diligência. No entanto, o oposto também pode acontecer, sendo que a criança pode não se sentir preparada para a convivência escolar, preferindo ficar junto de seus cuidadores a obter conhecimentos fora do âmbito familiar. “O perigo desta fase é o desenvolvimento de uma alienação de si mesma e das suas tarefas – o tão conhecido sentimento de inferioridade.” (ERIKSON, 1972, p.124). Tal sentimento implica em a criança não se considerar capaz de fazer e, consequentemente, de ser reconhecido, estruturando o sentimento de que “nunca prestará para nada” (ERIKSON, 1972. p.126). Socialmente, esta fase é uma das mais decisivas, já que a diligência envolve fazer coisas com outras pessoas, desenvolvendo-se, assim, um primeiro sentido de divisão do trabalho. O resíduo dessa fase para as etapas posteriores é a seguinte aquisição: “Eu sou o que posso aprender para realizar trabalho”. 2.5 Identidade versus confusão de identidade A calmaria dos impulsos sexuais ocorrida no período de latência chega ao fim quando a puberdade traz a tona a genitalidade, anunciando uma nova fase psíquica e social para o ser humano: a adolescência. O adolescente se percebe tendo de dar conta da maturação genital que o invade, bem como da incerteza dos papéis adultos que a ele se apresentam. Este é o período em que os seres humanos se mostram “preocupados com o que possam parecer aos olhos dos outros, em comparação com o que eles próprios julgam ser, e com a questão de como associar os papéis e aptidões cultivados anteriormente aos protótipos ideais do dia” (ERIKSON, 1972, p.129). Devido a isso, o autor destaca que os adolescentes precisam de uma moratória, para que assim possam integrar os elementos identitários das fases precedentes. No entanto, essa integração, passa a ser em um mundo mais vasto que o mundo infantil, ou seja, passa a se dar na sociedade. 6 O adolescente, se utilizando da autonomia que adquiriu na segunda fase do desenvolvimento psicossocial, busca oportunidades em que possa decidir sobre o seu rumo no que se refira a deveres e serviços. Dessa forma, ele acaba desenvolvendo medos de ser forçado a atividades que coloquem em dúvida a si próprio, ou seja, a sua identidade. Já com base na aquisição da fase escolar, o sentimento de fazer bem o que se propõe a fazer, coloca para o adolescente que a escolha da profissão vai para além da questão de remuneração e status. O que eles buscam é a oportunidade de funcionar com excelência, o que leva os adolescentes a buscar modos de vida que valham a pena ser vividos, lavando, assim, a um sentimento de identidade. A alienação própria dessa fase é o que Erikson chamou de confusão de identidade. Quando o adolescente tem dúvidas sobre sua própria identidade, não é incomum a pessoa se perder em uma confusão de papéis que se associa a aspectos não resolvidos de fases anteriores. Neste período, o sujeito se define para uma vida adulta, tendo assim uma identidade constituída. O que fica de resíduo para as fases posteriores é o que Erikson chamou de “para além da identidade”, se referindo a uma vida depois da adolescência e o retorno de crises de identidade nas fases ulteriores do ciclo vital. 2.6 Intimidade versus isolamento A primeira crise que se tem nas fases “para além da identidade” é a de intimidade. Somente com a formação identitária em desenvolvimento é que uma verdadeira intimidade é possível, sendo que essa intimidade envolve, principalmente, o desenvolvimento da genitalidade adulta. Com isso, essa etapa envolve o que se refere a relações sexuais satisfatórias, mas também vai além disso, abarcando as relações de amizade e confiança no outro. “O jovem que não está seguro de sua identidade furta-se à intimidade ou lança-se em atos de intimidade que são ‘promíscuos’, sem uma verdadeira fusão ou real entrega de si próprio.” (ERIKSON, 1972, p.136). Ao não conseguir consumar relações íntimas, o jovem acaba retendo um profundo sentimento de isolamento, sem conseguir compartilhar uma verdadeira intimidade com outras pessoas. O que fica agora de resíduo para as fases posteriores não se baseia mais no “eu sou”, mas sim, devido ao incremento da intimidade, se torna “nós somos”, sendo colocado na seguinte aquisição: “Nós somos o que amamos”. 7 2.7 Generatividade versus estagnação O ser humano tem por característica ser um animal que tanto ensina como também aprende. A generatividade se refere a “preocupação em estabelecer e orientar a geração seguinte.” (ERIKSON, 1972, p.138). Isso não se refere somente ao fato de se tornar pai e mãe, já que existem sujeitos que não tem filhos, mas desenvolvem o sentimento de generatividade. No entanto, quando essa capacidade falha, o que se desenvolve é um sentimento de estagnação, fazendo com que os indivíduos satisfaçam-se como se fossem filhos um do outro, ou o seu próprio e único filho. Vale destacar que o simples fato de ter filhos não significa o desenvolvimento da generatividade, já que essa implica em um desvelo nos cuidados da criança, o que nem todos os sujeitos conseguem desenvolver.As conseqüências desse comportamento acabam repercutindo nas gerações seguintes, em que a falta de desvelo dos pais não permite o desenvolvimento identitário satisfatório do filho em cada etapa. O resíduo dessa fase para as etapas posteriores continua a ser a seguinte aquisição: “Nós somos o que amamos”. 2.8 Integridade versus desespero Esta é a última fase descrita por Erikson, se dando com o amadurecimento conseguido com a idade. A pessoa passa pelo que o autor menciona ser a integridade, ou seja, o sujeito deve integrar as suas vivências, tendo sido elas desapontadoras ou não. Erikson define essa fase da seguinte maneira: “É a aceitação pela pessoa do seu único ciclo vital e daqueles que se tornaram significantes para ela como algo que tinha de ser e que, necessariamente, não permite substituição.” (Erikson, 1972, p.140) A falta ou perda dessa integração resulta no que o autor chama de desespero, que se configura em um sentimento de que o tempo é curto para começar uma nova vida, na tentativa de obter, assim, a integridade. O que fica como resíduo dessa fase para a geração seguinte (e não mais para a fase seguinte, já que não há uma fase posterior a essa) é a adaptação de seu único ciclo vital, já que a preocupação dos sujeitos nessa fase é a “conservação do mundo”. Dessa forma, uma nova edição da crise de identidade se dá ao final da vida, podendo ser expressa nas seguintes palavras: “Eu sou o que sobrevive de mim.” 3. METODOLOGIA 8 O trabalho aqui apresentado se refere a uma atividade de estágio extracurricular em Psicologia da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), nomeada como “Clínica Psicossocial da Identidade”. Foram realizados grupos de discussão com adolescentes de escolas públicas da cidade de Jaguari, RS. Tal atividade teve início a partir do pedido da Secretaria de Educação do referido município. O trabalho com os adolescentes se estruturou na modalidade de oficinas, com base em dinâmicas que eram levadas pelos estagiários com o intuito de servirem como disparador para as discussões sobre o “ser adolescente”. Tais disparadores se constituíram de música, poesias, maquetes, produções artísticas, dentre outras possibilidades. Tais construções tinham o intuito de simbolizar a própria construção da identidade adolescente. Foram realizados, ao longo do segundo semestre do ano de 2009, um total de oito grupos, com 3 encontros cada. Três grupos foram formados com alunos da 7ª série; três grupos com alunos da 8ª série e dois grupos com alunos do ensino médio. Tais encontros tiveram periodicidade mensal, coordenados por uma dupla de estagiários, com 2 horas e meia de duração. Tal trabalho ocorreu aos sábados pela manhã, já que se objetivava desvincular essa atividade dos horários de aula, para não se configurar como algo obrigatório. Foram atendidos, ao longo dos encontros, cerca de 60 adolescentes, sendo que os pais ou responsáveis autorizaram por escrito a participação dos mesmos nos grupos. 4. RESULTADOS E DISCUSSÕES Neste trabalho, será descrito os resultados alcançados em um dos grupos realizados. Tal grupo foi composto por sete estudantes da 7ª série com idades entre 12 e 13 anos. Apenas um dos sujeitos tinha a idade de 29 anos, no entanto, sua participação no grupo foi permitida por ele trazer questões adolescentes a resolver, não se distanciado, assim, dos demais participantes. Os temas trabalhados se referiram ao presente, passado e futuro dos participantes, já que na adolescência, todas as características das fases do desenvolvimento descritas por Erikson (1972) se encontram em maior ou menor grau possibilitando estruturar a identidade do sujeito para a vida adulta. Temas como trabalho, estudos, escola, diversão, amigos e família surgiram ao longo de todos os encontros, estruturando discussões que, para alguns temas foi possível o aprofundamento, enquanto para outros a pouca convivência com as coordenadoras do grupo não permitiu maior abertura. 9 Em uma conversa realizada sobre a música “Eduardo e Mônica” do grupo Legião Urbana (que os adolescentes participantes não conheciam, o que possibilitou entender que essa música foi escolhida por ter feito parte da adolescência das próprias coordenadoras), três assuntos se destacaram, sendo: todos os participantes pensam em continuar estudando e em prestar vestibular, sendo que alguns já haviam escolhido o curso que desejavam cursar, mostrando que eles já estavam começando a decidir sobre algo que perturba muitos jovens, a sua identidade ocupacional (ERIKSON, 1972); a maior parte dos participantes já trabalhou, em lavouras de fumo ou como ajudante de pedreiro para auxiliar no sustento da família e também ganhar o próprio dinheiro. Tal fato não foi destacado como sofrido, mas sim como a possibilidade de terem dinheiro para poderem viver uma vida adolescente, bem como a uma oportunidade para saberem como é trabalhoso conseguir o próprio dinheiro; e, por último, o fato de que três participantes já moraram fora da casa dos pais, sendo que duas meninas ainda se mantinham nessa condição. No entanto, esse assunto foi pouco explorado devido ao mal-estar que causou nessas participantes que preferiram não mencionar sobre esse aspecto de suas vidas. Como as coordenadoras almejavam possibilitar a confiança básica dos sujeitos no grupo, esse aspecto de silenciamentos foi respeitado, já que se referiu a uma adaptação às necessidades manifestadas pelos sujeitos. Outro momento importante dos encontros se deu com a construção de uma maquete da cidade de Jaguari, sendo que nesse encontro só compareceram alunos da escola rural, localizada a mais de 40 Km da cidade. O pórtico do município foi o primeiro objeto construído, e no relato dos sujeitos foi possível verificar a felicidade que era para eles irem, em média uma vez ao mês, à cidade, para fazer as compras do mercado e visitar o pequeno shopping do município. Nessa mesma atividade, a quantidade de papel disponível foi considerada, pelos participantes, como insuficiente para fazer a maquete, e ao longo de sua elaboração foi possível entender isso. Os participantes tiveram a necessidade de nos mostrar, nas dimensões mais realistas possível, a real distância de sua escola e casas, para que assim pudessem mostrar que suas vidas adolescentes em nada se parecem com as mencionadas nos meios de comunicação: grupos de amigos sempre juntos, passeios pelas cidades e festas. Isso para eles quando acontecia era motivo de alegria por não ser algo comum, mas sim especial. 10 Dessa forma, a elaboração da maquete possibilitou, na prática e em relatos concretos, o que freqüentemente é mencionada na literatura: o ambiente em que cada pessoa vive exerce influência direta sobre a estruturação da identidade dos indivíduos, sendo auxiliar na determinação de personalidades. No último encontro, os participantes decidiram por escrever sobre a experiência que tiveram com o grupo, e assim cada um falou do seu enriquecimento com as discussões suscitadas. Ao final, cada um escolheu palavras de suas frases e foi escrita uma poesia conjunta, tendo ela recebido o título de “vida”. Ao se falar de identidade, de “quem eu sou” e de “quem eu quero ser”, indiscutivelmente se coloca a vida em foco durante todo o trabalho. 5. CONSIDERAÇÕES FINAIS Os grupos tiveram boa aceitação no ano de 2009, sendo que o trabalho teve continuidade no ano de 2010. Possibilitar aos jovens um espaço em que consigam colocar sobre suas dúvidas, sonhos e anseios é importante para que eles possam passar pela crise da identidade sem desamparos, conseguindo estruturar assim uma identidade que vá ao encontro de suas aspirações futuras.Como o próprio Erikson (1972) menciona, a contribuição mais importante para a aquisição de uma identidade final é a coragem do ser humano em buscar sua independência, para assim poder guiar o seu próprio futuro. REFERÊNCIAS ABERASTURY, A. & KNOBEL, M. Adolescência normal. Porto Alegre: Artes Médicas, 1981. ERIKSON, E. H. (1968). Identidade, Juventude e Crise. Rio de Janeiro: Zahar, 1972. SPRINTHALL, N. A. & COLLINS, W. A. Psicologia do Adolescente. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1988.
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