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A Crise de 1930 até o Segundo Governo Vargas Em 1930 o mundo estava mergulhado em uma profunda crise por meio da Grande Depressão, provocada a partir da Queda da Bolsa de Nova York, e que ocasionou respectivamente uma diminuição das exportações do café brasileiro, bem como uma queda de entrada de divisas, gerando saldos negativos no balanço de pagamentos. O Brasil vivia um momento histórico de crise de hegemonia e gerava- se uma revolução, mas onde nenhuma classe social tinha força suficiente para impor sua orientação de forma dominante: o latifúndio agroexportador estava em decadência, a burguesia urbana era ainda incipiente e o operariado apenas ensaiava os primeiros passos. Diante desse relativo vazio de hegemonia, Getúlio Vargas impôs-se com habilidade centralizadora no poder central. Apesar das contradições, a Revolução de 1930 no Brasil abriu uma nova fase na vida brasileira. Aos poucos a ordem tradicional até então vigente foi sendo superada e colocada num segundo plano, sem, contudo, desaparecer do cenário. De fato, não se superou a ruptura total com o passado, mas uma reacomodação de interesses. Com uma política de conciliação, Vargas conseguiu razoável êxito na orientação urbano-industrial e nacionalista que assumiu e procurou manter. Os anos de 1930 foram um momento de ruptura no tipo de desenvolvimento econômico que se desenrolava na época. Devido à Grande Depressão, houve uma queda nas exportações, acompanhada também de uma forte queda nos preços do café. Configurou-se também uma grave crise no balanço de pagamentos do Brasil, pois as exportações caíram e a balança de capital passou a ter saldos negativos, gerando um problema crônico no balanço de pagamentos. Nesse sentido, o deslocamento do centro dinâmico da economia brasileira foi a forma como o governo de Getúlio Vargas administrou esse problema. Ou seja, o elemento essencial na determinação da renda nacional deixava de ser o mercado externo e passava a ser a atividade voltada ao mercado interno, por meio da evolução do consumo e do investimento internos. O deslocamento do centro dinâmico da economia brasileira ocorreu em função da crise e da resposta a esta crise feita pelo governo Vargas por meio de uma política de manutenção da renda e do deslocamento da demanda depois da Revolução de 1930. A manutenção da renda foi realizada por meio da política de defesa do café, seja através da compra feita pelo governo por um preço mínimo baixo para os cafeicultores, seja através do financiamento, em parte, com crédito e emissão de moeda doméstica, bem como de empréstimos estrangeiros. Dada a dificuldade que se tinha pelas vendas das grandes safras de café no mercado internacional, o governo decidiu estocar café e acabou por queimá-lo ao longo dos anos 30 e 40. No entanto, mesmo pagando o preço mínimo baixo aos cafeicultores, esta política conseguiu viabilizar a realização da colheita e manutenção de parte do efeito multiplicador obtido pelo café sobre o resto da economia brasileira (por meio da formação de uma demanda mínima). Apesar de mantida esta demanda mínima por meio da política de estoque e queima do café, continuava existindo, porém, um problema no balanço de pagamentos, devido à queda nas exportações do café e na entrada de recursos externos. Este problema ainda se agravou com a própria manutenção da demanda na economia, ou seja, um aumento do nível de importações. A fim de solucionar esse problema, foi feita uma moratória sobre parte da dívida externa do país e permitida uma expressiva desvalorização da moeda nacional. Também se impôs um contingenciamento no uso dos recursos externos, isto é, as poucas divisas em moeda estrangeira que entravam no país eram utilizadas no pagamento de alguns compromissos externos e para a aquisição de bens essenciais ao país. Com a desvalorização cambial ocorre um forte aumento dos preços dos produtos importados. Esse aumento, junto com a própria dificuldade em se importarem produtos pelo contingenciamento, fez os produtos nacionais ficarem mais atraentes, passando, então, a substituir os produtos importados no atendimento ao mercado interno. Nesse sentido, a demanda que foi mantida minimamente pela política de estoque e queima de café, teve suas necessidades deslocadas dos produtos importados para os produtos nacionais. A produção nacional passou então, com a proteção recebida do Estado frente aos concorrentes externos e com as vendas propiciadas pela manutenção da demanda, a gerar um retorno que, dada a queda de rentabilidade do setor cafeeiro, atraía o capital de outros setores e o próprio reinvestimento dos lucros gerados na atividade industrial. E são justamente esses investimentos (capital de outros setores e o próprio reinvestimento dos lucros gerados na atividade industrial) que passam a definir o ritmo da evolução econômica do Brasil, caracterizando assim o deslocamento do centro dinâmico da economia brasileira e que, ao mesmo tempo, se desenvolve como um modelo substitutivo de importações. Este modelo (ou processo) substitutivo de importações, apesar da relativa escassez de fontes de financiamento devido à quase inexistência de um sistema financeiro consistente, caracterizou-se pela idéia da construção nacional, isto é, de obter o desenvolvimento e a autonomia com base na industrialização. Isto ocorreu em decorrência da chamada Lei da Usura que não estimulava a poupança, bem como da ausência de uma reforma tributária bastante ampla. Esta idéia de construção nacional tinha o objetivo de superar as restrições externas, por meio do aumento e da diversificação da produção dos produtos nacionais, diminuindo, assim, as necessidades de importação em relação ao abastecimento do mercado interno. O motor dinâmico do processo de substituição de importações era sem dúvida o estrangulamento externo. E este funcionava como estímulo e limite ao investimento industrial nacional. No entanto, conforme o investimento e a produção avançavam em determinado setor, geravam-se pontos de estrangulamentos em outros, e a demanda por bens destes outros setores era atendida através das importações. Com o correr do tempo, estes bens passaram a ser objeto de novas ondas de investimentos no Brasil, substituindo as importações que ditariam a seqüência da evolução dos novos investimentos industriais. A crise econômica e política que se manifestou no início da década de 1930 abriu espaço para a ascensão de uma nova proposta de desenvolvimento, com base no fortalecimento do processo de industrialização substitutiva de importações e que encontra respaldo no Estado getulista, principalmente a partir da implantação do Estado Novo em 1937 até 1945, para a transformação da proposta em um projeto nacional de desenvolvimento. A ação do Estado na economia foi fundamental para assegurar o crescimento industrial ao longo das décadas de 30 e 40, quer implantando agências governamentais para a regulação das atividades econômicas (adequando um arcabouço institucional à indústria, gerando infra-estrutura básica, captando e fornecendo poupança), quer estabelecendo uma nova legislação trabalhista, quer ainda assumindo o papel de produtor direto. Por meio da utilização das políticas cambial, fiscal e de crédito, o Estado getulista, (e, por conseguinte, o próprio governo de Eurico Gaspar Dutra (1946-1950)) criou as bases para a aceleração industrial. O processo, contudo, foi gradual, pois teve como base a proteção do mercado nacional,decorrente das elevadas tarifas incidentes sobre os bens importados, bem como o controle direto das importações e a administração de estrangulamentos externos. Isto impunha limites estreitos à capacidade de importação e, conseqüentemente, ao acesso de bens de produção, como máquinas, equipamentos e matérias-primas, necessários ao crescimento e à modernização da produção industrial. O Segundo Governo Vargas Com a Segunda Guerra Mundial (1939-1945), foram criadas condições que favorecessem ainda mais o avanço do processo de industrialização no Brasil. A guerra criou inicialmente dificuldades para o comércio internacional, e os países aliados nesse confronto orientavam-se economicamente para atender às necessidades desse grande conflito. Assim sendo, foram fechadas, quase que totalmente, as possibilidades de obtenção de créditos externos e ocorreu a escassez interna de produtos importados e a conseqüente elevação de preços. Com tais circunstâncias, o Brasil foi obrigado a fazer um grande esforço próprio para atender a economia interna em grande funcionamento. O governo, por sua vez, preocupou-se com a indústria básica, de grande porte, uma vez que a iniciativa privada não tinha recursos financeiros nem experiência empresarial. São criadas, por exemplo, a Companhia Siderúrgica Nacional (1941), destinada à produção de aço em grande escala. Também foi criada a Companhia Vale do Rio Doce (1942), destinada à exportação de minério de ferro bruto para atender, inicialmente, a necessidade dos aliados na produção de armas e equipamentos para a guerra. Mais tarde surgiu também a Petrobrás. Por outro lado, o Brasil tirou proveito econômico durante e após a Segunda Guerra (principalmente no segundo governo Vargas), mantendo relativamente elevadas as exportações de produtos primários. Exportando mais produtos primários e importando menos produtos industriais, foram obtidos constantes saldos positivos na balança comercial. Esses recursos aplicados possibilitaram ao país a importação seletiva de bens de capital (por exemplo, máquinas, equipamentos e aparelhos), novos e mais modernos, incorporando o avanço tecnológico do pós-guerra e dando um certo impulso quantitativo e qualitativo ao processo de industrialização brasileiro. No interior da indústria de transformação foi nítido o avanço do processo de industrialização substitutiva de importações no país. Tal fenômeno se refletiu positivamente nos anos de 1949 e 1955 como demonstra a tabela abaixo. As importações tiveram uma queda significativa no seu valor industrial, ao mesmo tempo em que a produção doméstica cresceu. Como resultado, a participação dos produtos importados na oferta doméstica do país [(importações + PIB) – exportações), após atingir 19% em 1949, cai para 11% em 1955. Estrutura das Importações sobre Oferta Total da Economia Brasileira (1949 e 1955 - %) Anos Bens de Consumo Bens de Consumo Bens Intermediários Bens de Capital Total de Produtos não Duráveis Duráveis (ou Insumos Básicos) Manufaturados 1949 3,7 64,5 25,9 63,7 19,0 1955 2,2 10,0 17,9 43,2 11,1 Fonte: Vasconcellos e Toneto Jr. Com a queda das importações e o aumento da produção doméstica, ambos os movimentos demonstram o esforço da industrialização baseada na substituição de importações, caracterizado pela idéia varguista da construção nacional: alcançar o desenvolvimento e a autonomia com base na industrialização, com o objetivo de superar as restrições externas e diminuindo as necessidades de importação em relação ao atendimento da demanda interna.
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