Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
O PLANO DE METAS DO GOVERNO DE JUCELINO KUBITSCHEK O desenvolvimento autônomo com forte base industrial, que constituiu o núcleo da proposta econômica desde a Revolução de 1930 praticamente esgotou suas possibilidades. O Brasil precisava avançar para um novo patamar da indústria de bens duráveis, de insumos básicos e de bens de capital. Para isso, havia necessidade de grande volume de capital e de alta tecnologia. Mas o país não dispunha nem de um nem da outra. A posição nacionalista do governo Vargas conseguiu êxitos relativos em alguns setores considerados fundamentais, na época, para a segurança do país, como siderurgia, petróleo, energia elétrica e comunicações, através das próprias empresas estatais. Mas o empresariado brasileiro era fraco. Não tinha condições de competir nos setores mais dinâmicos e lucrativos, sobretudo na indústria de bens duráveis. Sem grandes empresas privadas nacionais, sem empresários empreendedores, sem base cientifica e tecnológica própria, sem suficiente disponibilidade de poupança interna, com limitada tradição e capacidade gerencial, com carência de capital e de recursos humanos qualificados; em Vargas, fracassou a tentativa de promover o desenvolvimento autônomo do país, a partir da burguesia nacional, apoiada pelo Estado. Em agosto de 1954, Getúlio Vargas veio a se suicidar. Este acontecimento teve profundas repercussões históricas e políticas, possibilitando a formação de uma ampla frente antigolpista, que assegurou a manutenção da ordem constitucional e a posse, meses depois, do vice-presidente de Vargas, Café Filho. Mais ainda, essa tomada de posição majoritária em defesa da democracia viabilizou e impulsionou a recomposição da frente "centro-esquerda" formada pelo PSD e PTB (partidos que apoiavam Getúlio), que seria responsável, em 1955, pela eleição de Juscelino Kubitschek à Presidência da República. Assumindo o Governo Federal, Café Filho executou, num espaço curto de tempo (1954-55), dois tipos de políticas econômicas distintas, ou seja, cada uma delas foi administrada por ministros da Fazenda que tinham prioridades diferentes para a economia do país: inicialmente, com Eugênio Gudin, economista com atitudes liberais (ortodoxas), e, depois, com um banqueiro chamado José Maria Whitaker, representante da cafeicultura paulista. Eugênio Gudin implementou uma política de estabilização baseada no diagnóstico de que havia uma inflação elevada e esta seria resultado da grande oferta de moeda na economia devido à monetização dos déficits públicos e do excesso de crédito, o que fazia com que houvesse um nível de demanda acima do nível de oferta da economia. A partir desse diagnóstico, Gudin tentou cortar os gastos públicos, principalmente os investimentos, e executou uma forte política de contração monetária e de crédito. O resultado dessa política foi uma falta de liquidez que provocou uma crise bancária, bem como ocasionou falências e concordatas no país, principalmente no Rio de Janeiro e em São Paulo; além de prejudicar a cafeicultura com uma taxa de câmbio desfavorável. Em abril de 1955, Whitaker defrontou-se com uma nova crise bancária, ainda decorrente da política contracionista de Gudin, mas aos poucos restabeleceu a liquidez da economia por intermédio da ação do Banco do Brasil. Mas em 1956, o governo de Juscelino Kubitschek (JK), a exemplo do que ocorria nos países em reconstrução, adotou uma nova orientação no modelo substitutivo de importações e passou a atrair investimentos estrangeiros com o propósito de alavancar o desenvolvimento brasileiro. A experiência brasileira de planejamento estatal, consubstanciada no Plano de Metas do governo JK, foi considerada um caso bem-sucedido de formulação e implementação de planejamento. Além dos amplos projetos estatais e de infra- estrutura, o Estado conseguiu articular grandes somas de investimentos privados de origem externa e interna, destinadas a áreas como indústria automobilística, construção naval e construção aeronáutica, tomando como exemplo apenas os setores em que o transbordamento dos efeitos interindustriais das cadeias produtivas eram extremamente importantes. O governo JK utilizou o instrumental do planejamento (por meio do Plano de Metas) para sintetizar a sua proposta política de desenvolvimento industrial acelerado. Naquele momento, a ideologia desenvolvimentista tornava-se a chave e a palavra de ordem para escapar do chamado subdesenvolvimento. Naquele momento da corrida para o desenvolvimento industrial caberia avançar na industrialização de bens de consumo duráveis, como a simbólica indústria automobilística. Contrariamente ao projeto nacionalista de Vargas, havia uma clara aceitação da predominância do capital externo, limitando-se o capital nacional ao papel de sócio menor deste processo. Os grandes investimentos estatais em infra-estrutura, bem como as empresas estatais do setor produtivo, estariam a serviço da acumulação privada. O Plano de Metas estimulou decisivamente o Processo de Substituição de Importações (PSI), especialmente no setor de bens de consumo duráveis, e mesmo em importantes áreas do setor de bens de capital, como nos ramos de máquinas, ferramentas e de equipamentos sob encomenda; e particularmente no setor de insumos básicos tais como na produção de carvão, na produção e refino de petróleo e no setor elétrico pesado. Plano de Metas: Previsão e Resultados Metas Energia Elétrica (1000 kw) Carvão (1000 ton.) Petróleo-Produção (1000 barris/dia) Petróleo-Refino (1000 barris/dia) Ferrovias (1000 km) Rodovias-Construção (1000 km) Rodovias-Pavimentação (1000 km) Aço (1000 ton.) Cimento (1000 ton.) Carros e caminhões (1000 um.) Nacionalização (carros - %) Nacionalização (caminhões) Previsão (A) 2000 1000 96 200 3 13 5 1100 1400 170 90 95 Realizado (B) 1650 230 75 52 1 17 ------ 650 870 133 75 74 %((B/A)*100) 82 23 76 26 32 138 ------ 60 62 78 83 78 Fonte: Banco do Brasil, Relatório e Anuário Estatístico, vários anos. Apud ABREU, Marcelo de Paiva. A Ordem do Progresso: cem anos de política econômica republicana, 1889/1989. Rio de Janeiro: Campus. A economia brasileira foi aquela em que o PSI mais avançou na América Latina. A partir de então, o próprio sucesso do PSI exigia a transição para um modelo auto-sustentado de crescimento. Mas, para isso, o país não tinha poupança interna suficiente e houve, então, um crescimento das despesas financeiras com o serviço do capital estrangeiro devido aos empréstimos externos acumulados nessa época. A situação agravou-se devido aos prazos curtos dos vencimentos dos empréstimos externos, em um contexto de conflitos entre o governo JK e o FMI e o Banco Mundial que culminaram em um rompimento em 1959. Apesar da política liberal seguida por JK relativamente ao capital estrangeiro, esses organismos internacionais não aprovavam os pilares do PSI, ou seja, protecionismo e controle de importações. Além disso, a ortodoxia monetarista predominante no FMI e no Banco Mundial também não aprovava a condução da política macroeconômica - com grandes déficits fiscais - e a política monetária expansionista, que não se preocupava com as crescentes taxas de inflação do período. Indicadores Econômicos Ano 1955 1956 1957 1958 1959 1960 1961 Acumulação (%) PIB (%a.a) 8,8 2,9 7,7 10,8 9,8 9,4 8,6 74,28Indústria (%a.a.) 11,1 5,5 5,4 16,8 12,9 10,6 11,1 100,18 Inflação (%a.a.) 23 21 16,1 14,8 39,2 29,5 33,2 376,30 Dívida Externa (US$ milhões) 1.445 1.580 1.517 2.044 2.234 2.372 2.835 96,19 Saldo em Transações Correntes (US$ milhões) 2 57 -264 -248 -311 -478 -222 Fonte: ABREU, Marcelo de Paiva. Logo, o subdesenvolvimento (econômico) de um país era considerado um atraso derivado de um ritmo mais lento de crescimento econômico. E nesse sentido, o Plano de Metas de Juscelino Kubitschek foi implantado com o objetivo de acelerar o crescimento econômico (50 anos em 5) para conseguir, conseqüentemente, a partir de tal aceleração, um processo de transformações que se consubstanciaram em um desenvolvimento brasileiro. Ao mesmo tempo, o Plano de Metas foi além do Processo de Substituição de Importações, já que ele não se constituiu apenas em uma resposta a um estrangulamento externo, mas buscou promover a organização de uma estrutura industrial integrada. Assim, o desenvolvimento do governo JK foi um modelo de desenvolvimento voltado para a realização de um crescimento acelerado, em ritmo superior ao desenvolvimento que tinha sido feito nos governos anteriores, e cujo objetivo era o de diminuir a distância do nível de industrialização (e renda) em relação aos países que eram considerados mais desenvolvidos. Para a realização do Plano de Metas, o Estado desempenhou a função de principal agente indutor do processo de industrialização e renda, quer sinalizando os rumos da economia e direcionando os investimentos, quer investindo diretamente em setores fundamentais como infra-estrutura e indústria básica.
Compartilhar