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1 O III PND Para o comando da área econômica do governo, ou seja, no Ministério do Planejamento, foi mantido o Ministro Mário Henrique Simonsen, designado de mais poderes. Defendia a necessidade de controle da inflação através de uma política de contenção dos gastos públicos e desaceleração do crescimento, para posterior retomada da expansão econômica com segurança. Apesar disso, a orientação de Simonsen gerou descontentamento nos meios empresariais do País, provocando o desgaste do ministro, que foi substituído em agosto de 1979. Em seu lugar, voltou Antonio Delfim Netto, que tentou, com sua estratégia através do III Plano Nacional de Desenvolvimento (III PND), conciliar a manutenção do crescimento acelerado da economia com a política gradualista de combate à inflação, tentando repetir o período do “milagre” econômico, apesar das condições das economias mundial e brasileira terem mudado. O Esgotamento de um Projeto de Desenvolvimento “Autônomo” O Governo do Presidente Figueiredo teve, na verdade, as suas metas e objetivos econômicos explicitados basicamente em dois tipos de linhas de atuação. A primeira linha (de Simonsen), por meio do Programa Emergencial (1979), que compreendia dois conjuntos de medidas de curto prazo: medidas de estímulo à agricultura e medidas visando o controle da inflação. A segunda (de Delfim), no III PND (1980-85), era uma tentativa de atualização e adequação do Projeto Brasil- Potência à nova situação da economia brasileira na primeira metade da década de 1980. O III PND era apenas um plano de intenções. Não descia a detalhamentos, nem quantificava metas. Sua idéia central era a busca de compatibilização entre um crescimento econômico acelerado, a necessidade de uma política de controle da inflação e do equilíbrio das contas públicas e externas. Compatibilização muito difícil, dadas as circunstâncias da época. Mas apesar da economia brasileira estar abatida no final da década de 70 e início da década de 1980, devido à evolução desfavorável da conjuntura econômica internacional, por meio do III PND o governo Figueiredo conseguiu algumas realizações significativas, principalmente no que diz respeito aos dois primeiros 2 anos, quando essa conjuntura “ainda” não era tão grave, pois conseguiu dar uma certa continuidade aos projetos iniciados no governo anterior. Conforme mostra a tabela I, o PIB cresceu 7,2% em 1979 e 9,1% em 1980. A maturação de vários projetos, atingindo a fase de produção, ampliou a infra- estrutura e deu mais consistência ao parque industrial brasileiro. De um lado, possibilitou a redução das importações e, por outro, favoreceu o aumento das exportações brasileiras, por meio de uma maior diversificação dos produtos industrializados (com destaque para os manufaturados, que fizeram com que o Brasil passasse a ser crescente exportador destes produtos industrializados). Tabela I: Brasil: Variáveis Macroeconômicas Internas – 1978-1985 (%) Ano PIB Investimento/PIB Inflação (IGP-DI) Déficit Público 1978 4,8 22,2 40,5 5,7 1979 7,2 23,0 77,2 8,3 1980 9,1 22,5 110,2 6,7 1981 -3,1 21,0 95,2 6,0 1982 1,1 20,4 99,7 7,3 1983 -2,8 16,1 211,0 4,4 1984 5,7 15,5 223,8 2,7 1985 8,4 16,7 235,1 4,3 Fontes: Banco Central e Conjuntura Econômica. Apud: Rego e Vasconcellos. Mas a opção do Governo Figueiredo pelo crescimento acelerado teve suas conseqüências negativas para a economia brasileira, pois a conjuntura pela qual o País passava era bem mais grave que no período do Governo Geisel. O Brasil estava gravemente doente em termos econômicos, a situação internacional tinha sido alterada profundamente quando comparada com o período Geisel e as medidas para sustentar o crescimento foram pouco consistentes e revelaram-se inadequadas para as circunstâncias. O governo errou no diagnóstico e no tratamento. O elevado grau de atrelamento da economia brasileira ao exterior era um aspecto complicador, uma vez que tornava a economia do País mais vulnerável ainda às mudanças ou mesmo às flutuações da economia mundial, tendo como resultado, o colapso, a crise e a recessão, demonstrando o esgotamento de um projeto de desenvolvimento “autônomo”. 3 A Crise da Dívida Externa, a Falência Financeira e a Crise Fiscal do Estado Brasileiro Por tentar manter a economia brasileira com crescimento acelerado, o Governo Figueiredo lançou mão das reservas cambiais disponíveis, usou o crédito externo no nível máximo obtido e apelou também para o endividamento interno. Mas as situações internas e externas se agravaram, provocando a deterioração do quadro econômico brasileiro. A dívida externa bruta subiu 109,2% no período de 1978 a 1984. O déficit no saldo de transações correntes saltou de US$ 10,7 em 1979, para US$ 12,8 em 1980, para US$ 11,7 em 1981 e para US$ 16,3 em 1982. Como podemos ver pela tabela I, a economia entrou em recessão, com o PIB apresentando taxas negativas de crescimento de 3,1% em 1981 e 2,8% em 1983. A inflação saltou de 77,2% em 1979 para 223,8% em 1984. Ao mesmo tempo, pode-se ver pela tabela II que ocorrem déficits nas contas públicas, devido à deterioração da situação fiscal do Estado, dada a redução na carga tributária bruta, ao aumento no volume de transferências (com destaque para os pagamentos de juros sobre a dívida interna) e às estatais que eram foco de déficits (conseqüência do enorme passivo financeiro, dos controles tarifários e do orçamento monetário, contaminado por várias operações creditícias do governo). Com a maioria dos saldos em transações correntes sendo negativos, havia necessidade de se obter moeda forte para atender aos compromissos de pagamentos com amortizações e juros, resultando em uma grave crise cambial que fez com que Delfim Netto, em dezembro de 1979, decrete uma maxidesvalorização de 30% da moeda nacional frente ao dólar, estimulando as exportações e diminuindo as importações. Com o agravamento da crise, tornou-se mais forte a pressão dos credores internacionais, sobretudo a partir de setembro de 1982, quando os bancos internacionais suspenderam o crédito ao Brasil, por causa da moratória do México. Não tendo outra saída, o governo optou por frear o crescimento da economia no final de 1980, por meio do controle da expansão da moeda, corte nos investimentos das empresas estatais, elevação das taxas de juros internas e controle do crédito. Em conseqüência, houve queda também dos investimentos privados. 4 Para atender a seus compromissos financeiros, o governo viu-se obrigado a raspar o restante das reservas disponíveis e obteve empréstimos emergenciais (os chamados “empréstimos-ponte”) junto ao Fundo Monetário Internacional (FMI) e ao Banco Internacional de Compensações (BIS), além de vários outros empréstimos de curto prazo. Isso demonstra que havia terminado a era de facilidades de crédito externo, pelo qual o Brasil financiou o crescimento acelerado da economia durante décadas. Além disso, o Brasil, a partir de 1982, se submetia às exigências dos credores internacionais sob a tutela e a auditoria do FMI. Na prática, era a falência financeira do País. Foi feito um acordo com este organismo internacional em fevereiro de 1983 e com isso transferiu-se para o sistema financeiro internacional as decisões fundamentais sobre a gestão financeira e econômica do País. Com isso, em vez do Brasil administrar a dívida, era a dívida que passava a administrar o Brasil; em outras palavras, o Brasil passava a ser administrado em função da dívida externa e dos interesses dos credores internacionais.As Políticas Externas de Ajuste para o Saldo da Balança Comercial e uma Retomada do Crescimento Brasileiro em 1984 Para fazer frente ao pagamento das amortizações e juros da dívida externa, a única saída era conseguir superávits na balança comercial, através de maiores estímulos às exportações e diminuição das importações. Para tanto, o governo fez nova maxidesvalorização de 30% em fevereiro de 1983 e com isso foram obtidos superávits de US$ 6,5 bilhões e US$ 13,1 bilhões em 1983 e 1984, respectivamente, como podemos verificar na tabela I. Uma conseqüência dramática da dívida externa foi a inversão do fluxo de capital, ou seja, o Brasil passou a ser, a partir de 1983, um país transferidor de capital líquido para o exterior, principalmente para os bancos credores dos países ricos. A nova maxidesvalorização, de 30% em fevereiro de 1983, representa uma das medidas incluídas em um acordo de estabilização econômica com o Fundo Monetário Internacional assinado pelo governo Figueiredo, cujas principais medidas adotadas, de uma maneira geral, foram: a própria maxidesvalorização e variação cambial igual à inflação a partir de então; arrocho salarial (reajustes de acordo com uma porcentagem da inflação); 5 corte nos gastos públicos e aumento de tributos; controle monetário e aumento das taxas de juros. Apesar dessas medidas, a inflação (medida pelo IGP-DI) continuou acelerando-se, conforme podemos constatar pela tabela I: 95,2% em 1981, 99,7% em 1982, 211,0% em 1983 e 223,8% em 1984. A inflação não cedeu por três motivos básicos: não houve quebra dos mecanismos de indexação (ao contrário, em 1979, por exemplo, os reajustes salariais haviam passado de anuais para semestrais); o déficit público foi reduzido, mas permaneceu alto: 7,3% em 1982, 4,4% em 1983 e 2,7% em 1984, como podemos ver pela tabela II; pressões de custos derivadas da desvalorização (sendo que num quadro de indexação, pressões de custos aceleram a inflação). A política econômica adotada com o acordo foi fortemente recessiva, gerando: uma queda do PIB entre os anos de 1981 e 1983 (tabela II); queda dos investimentos (tabela II); falências de empresas; aumento do desemprego; redução dos salários (perdas reais de 20% em 1983 e 30% em 1984). Os setores mais duramente atingidos pela recessão foram as indústrias de bens de consumo, bens de capital, construção civil, comunicações e transporte. As empresas estatais também foram obrigadas a reduzir seus investimentos, além de diminuir as encomendas e atrasar os pagamentos. Em conseqüência, várias firmas fornecedoras das empresas estatais foram à falência ou entraram em concordata. Com a significativa queda do crédito externo, o governo apelou em maior grau para o endividamento interno, usando como instrumento os juros elevados para a obtenção do financiamento do déficit público e da dívida interna. 6 A dívida interna que em 1982 correspondia a 14,4% do PIB passou para 20% do PIB em 1984 – aumento em quase 40% em apenas dois anos (ver tabela II). Como as atividades econômicas estavam retraídas, os investidores e as próprias empresas aplicavam seus recursos disponíveis na especulação financeira, em vez de direcioná-los para empreendimentos produtivos. Tabela II: Dívidas Interna e Externa (% PIB) – 1982-1986 Ano Dívida Interna (% PIB) Dívida Externa (% PIB) % Total do PIB 1982 1983 1984 1985 1986 14,4 17,0 20,0 21,6 21,5 17,9 30,3 29,8 30,8 30,1 32,3 47,3 49,8 52,4 51,6 Fonte: Banco Central. Apud: Lanzana. Depois de uma dolorosa fase de recessão e ajuste às exigências externas ditadas pelos credores internacionais, a produção industrial voltou a crescer em 1984, puxada principalmente pelo aumento das exportações, possibilitando um acréscimo de 5,7% do PIB no referido ano. Mas, por outro lado, a inflação estava alta devido à crescente indexação da economia brasileira.
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