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Grade - Rosalind Krauss

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textos e textos
TRADUÇÃO
Grades, Rosalind Krauss, (1978)
novembro 21, 2014 by renata_pedrosa
No inicio desde século começou a aparecer, primeiro na França e depois na Rússia e na Holanda, a
estrutura que se tornou emblemática da ambição modernista dentro das artes visuais até então.
Surgindo nas pinturas cubistas do pré-guerra e subsequentemente tornando-se mais rigorosa e
manifesta, a grade anuncia, entre outras coisas, o desejo modernista pelo silêncio, sua hostilidade à
literatura, à narrativa, ao discurso. Assim sendo, a grade fez o seu trabalho com uma eficiência
impressionante. A barreira que ela baixou entre as artes da visão e aquela da linguagem foi quase
totalmente bem-sucedida em apartar as artes visuais para um reino de visualidade exclusiva,
defendendo-a contra a intrusão do discurso. As artes, é claro, pagou caro por este sucesso, porque
a fortaleza que construíram com a fundação da grade tornou-se progressivamente um gueto. Cada
vez menos vozes da critica geral do establishment foram levantadas em apoio, apreciação, ou
análise das artes plásticas contemporâneas.
Ainda assim é seguro dizer que nenhuma forma dentro de toda a produção estética modernista se
sustentou tão implacavelmente enquanto, ao mesmo tempo, sendo tão impenetrável a mudanças.
Não é apenas o número total de carreiras que foram devotadas a exploração da grade que é
impressionante, mas o fato desta exploração nunca ter escolhido um campo tão pouco fértil. Como
as experiências de Mondrian amplamente mostram, desenvolvimento é precisamente o que a
grade resiste. Mas ninguém parece ter se detido diante deste exemplo, e a prática modernista
continuou a gerar cada vez mais instâncias de grades.
Existem duas maneiras com as quais a grade funciona para declarar a modernidade da arte
moderna. Uma é espacial; a outra temporal. No sentido espacial, a grade atesta para a autonomia
do reino da arte. Achatada, geometrizada, ordenada, ela é antinatural, antimimética, antirreal. É
assim que arte se parece quando ela dá as costas à natureza. No achatamento que resulta de suas
coordenadas, a grade é a maneira de reduzir as dimensões do mundo real e substituí-las pelo
espaçamento lateral de uma única superfície. Na regularidade generalizada de sua organização, é
o resultado não de uma imitação, mas de um decreto estético. Na medida em que sua ordem é
puramente relacional, a grade é uma maneira de revogar as reivindicações dos objetos naturais de
terem uma ordem particular a eles mesmos; as relações no campo estético são postas pela grade
como sendo de um mundo aparte e, em relação aos objetos naturais, como sendo ao mesmo tempo
precedentes e finais. A grade declara o espaço da arte como sendo, ao mesmo tempo, autônomo e
autorreferente.
Na dimensão temporal, a grade é um emblema da modernidade por ser apenas isso: a forma que é
onipresente na arte de nosso século, mas que jamais havia aparecido, jamais mesmo, na arte do
século anterior. Naquela incrível corrente de reações da qual o modernismo nasceu, nos esforços
do século XIX, uma mudança final resultou na quebra desta corrente. Ao “descobrir” a grade, o
cubismo, de Stijl, Mondrian, Malevich…. aterrissaram em um lugar que estava fora do alcance de
qualquer coisa que aparecera antes. O que significa, que eles aterrissaram no presente, e tudo mais
se tornou passado.
(https://textosetextos.files.wordpress.com/2014/11/malevich-12a.jpg)
Deve-se viajar um longo percurso na história da arte para encontrar exemplos prévios da grade.
Deve-se retornar o século XV e XVI , para tratados sobre a perspectiva e para estudos requintados
de Uccello ou Leonardo ou Dürer, onde a grade da perspectiva é inserida no mundo, copiado
como uma armadura de sua organização. Mas os estudos de perspectivas não são uma instância
anterior das grades. As perspectivas eram, afinal de contas, a ciência do real, não uma maneira de
se afastar dela. Perspectiva era uma demonstração da maneira como a realidade e sua
representação podiam ser mapeadas uma na outra, da mesma maneira que a pintura e seu
referente no mundo real de fato se relacionavam – o primeiro sendo uma forma de conhecimento
do segundo. Tudo na grade se opõe a esta relação, corta-a desde o início. Diferentemente da
perspectiva, a grade não mapeia o espaço de uma sala ou de uma paisagem ou de um grupo de
figuras sobre a superfície da pintura. Na verdade, se ela mapeia algo, ela mapeia a superfície da
pintura em si. É uma transferência onde nada muda de lugar. As qualidades físicas da superfície,
poderíamos dizer, são mapeadas nas dimensões estéticas da mesma superfície. E aqueles dois
planos – o físico e o estético – são demonstrados como sendo o mesmo plano: coextensivos e, pelas
abscissas e coordenadas da grade, coordenados. Considerados desta forma, a linha de fundo da
grade é um materialismo determinado e nu.
Mas se é sobre o materialismo que a grade vai nos fazer falar – e parece que não existe outro meio
lógico de se discutir – esta não é a maneira como os artistas já a discutiram. Se abrirmos qualquer
tratado – Plastic Art and Purê Plastic Art ou The Non Objective World, por exemplo – vamos
encontrar que Mondrian e Malevich não estão discutindo a tela ou o pigmento ou o grafite ou
qualquer outra forma de matéria. Eles estão falando sobre o Ser ou a Mente ou o Espírito. Do
ponto de vista deles, a grade é uma escada ao Universal, e eles não estão interessados no que
acontece lá em baixo no Concreto. Ou, para falar de um exemplo mais atual, podemos pensar em
Ad Reinhardt quem, apesar de sua repetida insistência de que “arte é arte”, acabou pintando uma
série de nove pinturas quadradas negras nas quais o motivo que inescapavelmente aparece é a
cruz grega. Não existe nenhum pintor no Ocidente que possa estar desavisado do poder simbólico
da forma cruciforme e da caixa de Pandora espiritual que se abre cada vez que é usada.
(https://textosetextos.files.wordpress.com/2014/11/captura-de-tela-2014-11-21-c3a0s-12-39-
34.png)
Agora é esta ambivalência sobre a importação da grade, uma indecisão sobre sua conexão com a
matéria de um lado ou com o espírito do outro, que seus usuários mais antigos podem ser vistos
como participantes em um drama que se estende bem além da arte. Este drama, que tomou várias
formas, foi encenado em muitos lugares. Um deles foi na sala do tribunal, onde no início desde
século, a ciência entrou em conflito com Deus, e, ao contrário de todos os momentos anteriores,
ganhou. O resultado, nos disseram os representantes dos perdedores, teria as mais catastróficas
consequências: o resultado seria certamente de que “herdamos o vento”. Nietzsche expressou isso
antes e de maneira mais cômica quando escreveu, “Nós desejávamos despertar o sentimento de
soberania dos homens ao mostrar seu nascimento divino: este caminho agora está proibido, desde
que um macaco se postou na porta de entrada”. Pelos escopos do julgamento, a divisão entre
espírito e matéria que foi presidido ao longo da ciência do século XIX tornou-se a herança legítima
do ensino infantil do século XX. Mas também foi, não menos, a herança da arte do século XX.
Dada a fenda absoluta que se abriu entre o sagrado e o secular, o artista moderno encarou
obviamente a necessidade de escolher entre um modo de expressão e o outro. A curiosa
testemunha que a grade oferece é que nesta conjuntura ele tentou optar por ambos. Na crescente
dessacralização do espaço no século XIX, a arte tornou-se um refúgio para as emoções religiosas;
tornou-se, o que continua sendo, uma forma secular de crença. Embora esta condição pudesse ser
discutida abertamente no final do século XIX, é algo inadmissível no século XX, pois agora
achamos indescritivelmente embaraçoso mencionar arte e espírito em uma mesma sentença.
A força peculiar da grade, sua extraordinária vida longa no espaço especializado da arte moderna,
vem de seu potencial de presidir sobre este constrangimento:de mascará-lo e de revelá-lo ao
mesmo tempo. No espaço culto da arte moderna, a grade serve não apenas como um emblema
mas também como um mito. Como em todos os mitos, lida com o paradoxo ou a contradição não
por meio da dissolução do paradoxo ou da resolução da contradição, mas ao cobri-los de maneira
que pareçam (apenas pareçam) terem desaparecido. O poder mítico da grade é de nos possibilitar
pensar que estamos lidando com materialismo (ou às vezes ciência, ou lógica) enquanto que ao
mesmo tempo ela nos possibilita nos libertar da crença (ou ilusão, ou ficção). Os trabalhos de
Reinhardt ou de Agnes Martin seriam instancias deste poder. E uma das fontes importantes deste
poder é a maneira como a grade é, como disse antes, tão estridentemente moderna de se olhar,
parecendo não haver deixado lugar para refugiar, nenhum espaço em sua face, para esconder os
vestígios do século XIX.
Ao sugerir que o sucesso da grade está de alguma forma conectado a sua estrutura mítica, posso
ser acusada de estar esgarçando um ponto para além dos limites do senso comum, uma vez que os
mitos são estórias, e como toda a narrativa eles se desenrolam através do tempo, enquanto que as
grades não são apenas espaciais para começar, mas são estruturas visuais que explicitamente
rejeitam uma narrativa ou qualquer modo de sequência de leitura. Mas a noção de mito que estou
usando aqui depende de um modo estruturalista de análise, no qual as feições da estória são
rearranjadas para formar uma organização espacial.
(https://textosetextos.files.wordpress.com/2014/11/captura-de-tela-2014-11-21-c3a0s-12-41-
03.png)
O motivo pelo qual os estruturalistas fazem isso é que eles esperam entender o funcionamento dos
mitos; e esta função eles vêem como uma tentativa cultural de lidar com a contradição. Ao
espacializar a estória – em colunas verticais, por exemplo – eles estão aptos a mostrar as feições
das contradições e de mostrar como isso está subjacente nas tentativas, de uma estória mítica
específica, de encobrir a oposição com a narrativa. Portanto, ao analisar uma variedade de criações
místicas, Lévi-Srauss encontra a existência de um conflito entre as noções antigas das origens do
homem como um processo de autoctonia (o homem nasceu da terra, como plantas), e outros
depois envolvendo as relações sexuais entre os pais. Pelo fato das primeiras formas de crença
serem sacrossantas elas precisam ser mantidas mesmo que violem as visões comuns sobre
sexualidade e nascimento. A função do mito é permitir que ambas visões aconteçam em algum
tipo de suspensão para-lógica.
A justificativa para a violação da dimensão temporal do mito é proveniente, portanto, dos
resultados das análises estruturais: ou seja, a progressão sequencial da estória não atinge um
resultado, ao contrário, é reprimida. O que significa que, para uma determinada cultura, a
contradição é algo poderoso, algo de que não se pode livrar, mas que só irá, por assim dizer, para
as profundezas. Portanto as colunas verticais da análise estruturalista são uma maneira de
desenterrar as oposições ingovernáveis que promoveram a criação do mito, antes de tudo.
Podemos criar uma analogia entre este procedimento e o da psicanálise, onde a “estória” de uma
vida é similarmente vista como uma tentativa de resolver contradições primárias que, persistem
em permanecer na estrutura do inconsciente. Pelo fato de estarem lá como elementos reprimidos,
eles funcionam para promover infindáveis repetições do mesmo conflito. Portanto, outra
racionalidade para as colunas verticais (a espacialização da “estória”) emerge do fato de que é útil
ver como cada característica da estória (para a análise estruturalista estes são chamados mitemas)
enterra-se, independentemente, em um passado histórico: no caso da psicanálise este é o passado
do indivíduo; para a análise do mito, este é o passado da cultura ou da tribo.
Portanto, embora a grade certamente não seja uma estória, ela é uma estrutura, e uma que, além
do mais, permite uma contradição entre os valores da ciência e aqueles do espiritualismo
mantendo-os dentro da consciência do modernismo, ou melhor, no seu inconsciente, como algo
reprimido. Para continuar sua análise – para acessar a capacidade da grade à repressão – podemos
seguir o caminho dos dois procedimentos analíticos que acabo de mencionar. Isso significa
aprofundar em cada parte da contradição até as suas fundações históricas. Não importa o quanto a
grade foi ausente na arte do século XIX, é precisamente nestes solos históricos que precisamos ir
para encontrar suas origens.
Agora, embora a grade em si seja invisível na pintura do século XIX, ela não é totalmente ausente
de certo tipo de literatura acessória a qual aquela pintura deu uma crescente atenção. Esta é a
literatura sobre ótica fisiológica. Por volta do século XIX o estudo sobre ótica dividiu-se em duas
partes. Uma parte consistiu da análise da luz e suas propriedades físicas: seu movimento; suas
feições refratárias a mediada que passava por lentes, por exemplo; sua capacidade de ser
quantificada, ou mensurada. Ao conduzirem tais estudos, os cientistas pressupuseram que estas
eram as características da luz em si, ou seja, como se a luz existisse independentemente da
percepção humana (ou animal).
O segundo ramo da ótica se concentrava na fisiologia do mecanismo de percepção: estava
preocupada com a luz e a cor como são vistos. Era o ramo da ótica que interessava diretamente os
artistas.
Qualquer que fosse a origem da informação – seja Chevreul, ou Charles Blanc, ou Rood,
Helmholtz, ou mesmo Goethe – os pintores tiveram de confrontar um fato particular: a membrana
fisiológica através da qual a luz passa para o cérebro humano não é transparente, como um painel
de janela; é como um filtro, envolvido em um conjunto de distorções específicas. Para nossa
percepção humana, existe um abismo intransponível entre a cor “real” e a cor “percebida”.
Podemos medir a primeira; mas só podemos experienciar a segunda. E isso se dá porque, entre
outras coisas, a cor está sempre envolvida na interação – uma cor afetando a leitura da outra em
seu entorno. Mesmo se olharmos para uma única cor, ainda existe interação, porque a excitação
retiniana da imagem residual vai sobrepor no primeiro estímulo cromático o segundo, na sua cor
complementar. Toda a questão das cores complementares, junto com todo o conjunto de harmonia
das cores que os pintores construíram em sua base, foi assim uma questão da ótica fisiológica.
Uma característica interessante dos tratados escritos sobre fisiologia ótica é o fato de serem
ilustrados com grades. Porque era uma questão de demonstrar a interação de partículas
específicas através de um campo contínuo, este campo era analisado dentro de estruturas
modulares e repetitivas da grade. Portanto, para o artista que desejava aumentar seus
conhecimentos sobre a visão no campo da ciência, a grade estava lá como a matriz do
conhecimento. Pela sua própria abstração, a grade convinha à uma das leis básicas do
conhecimento – a separação entre a tela perceptual daquele do mundo “real”. Assim sendo, não é
surpresa que a grade – como um emblema da estrutura da visão – viria cada vez mais a se tornar
uma característica persistente e visível da pintura neo-impressionista, como Seurat, Signac, Cross,
e Luce se empenharam nos estudos da ótica fisiológica. Da mesma forma que não é surpreendente
que, a medida que eles aplicavam suas lições, mais “abstrata” se tornava a arte deles, de tal
maneira que, o critico Félix Fénéon observou sobre o trabalho de Seurat, que a ciência passou a
submeter-se ao seu oposto, o simbolismo.
(https://textosetextos.files.wordpress.com/2014/11/captura-de-tela-2014-11-21-c3a0s-12-43-
06.png)
Os simbolistas em si permaneceram inflexivelmente opostos a qualquer tráfico entre arte e ciência,
ou sob o mesmo aspecto, entre arte e “realidade”. O objeto do simbolismo era a compreensão
metafísica,não o mundano; o movimento apoiava aqueles aspectos da cultura que eram
interpretações do real ao invés de imitações deste. Portanto, poderíamos pensar, que a arte
simbolista seria o último lugar onde se poderia buscar uma versão insipiente das grades. Mas mais
uma vez estaríamos errados.
A grade aparece na arte simbolista na forma de janelas, a presença material de seus painéis
expressa pela intervenção geométrica dos batentes da janela. O interesse do simbolismo pela janela
claramente remonta ao início do século XIX e ao romantismo. Mas nas mãos dos pintores e poetas
simbolistas, a imagem toma uma direção explicitamente modernista. Pois a janela é experienciada
simultaneamente como transparente e opaca.
Como um veículo transparente, a janela é aquela que admite luz – ou espírito – na escuridão
inicial da sala. Mas se o vidro transmite, ele também reflete. Então a janela é experienciada pelos
simbolistas também como um espelho – algo que congela e aprisiona o eu (self) no espaço de sua
própria duplicação. Fluindo e congelando; glace em Francês significa vidro, espelho e gelo;
transparência, opacidade, e água. No sistema associativo do pensamento simbolista esta liquidez
aponta para duas direções. Primeiro, no sentido do nascimento – o fluído amniótico, a “origem” –
mas depois, em direção ao congelamento estático ou morte – a imobilidade infecunda do espelho.
Para Mallarmé, particularmente, a janela funcionava como um signo complexo e polissêmico no
qual ele podia também projetar “a cristalização da realidade na arte”. Lês Fenetres de Marllamé
data de 1863; a mais evocativa janela de Redon, Le Jour, apareceu em 1891 no volume Songes.
Se a janela é a matriz da ambi ou multi-valência, e as barras das janelas – a grade – é o que nos
ajudam a ver, a focar, nesta matriz, ela é em si o símbolo do trabalho de arte simbolista. Elas
funcionam como a representação, em vários níveis, através da qual o trabalho de arte pode aludir,
e até reconstituir, a forma do Ser.
(https://textosetextos.files.wordpress.com/2014/11/captura-de-tela-2014-11-21-c3a0s-12-43-
481.png)
Não acho que seja exagero dizer que por trás de cada grade do século XX existe – como um
trauma que deve ser reprimido – uma janela simbolista desfilando na forma de um tratado de
ótica. Uma vez que percebemos isso, também podemos entender que na arte do século XX existem
grades mesmo onde não esperamos encontrá-las: na arte de Matisse, por exemplo (suas Windows),
que apenas admite a grade abertamente nos estágios finais dos papiers découpés.
Por causa de sua estrutura (e história) ambivalente a grade é completamente, até alegremente,
esquizofrênica. Testemunhei e participei de arguições sobre se a grade prenuncia os aspectos
centrífugos ou centrípetos do trabalho de arte. Falando logicamente, a grade estende, em todas as
direções, ao infinito. Qualquer fronteira imposta a ela por uma dada pintura ou escultura pode
apenas ser vista – de acordo com esta lógica – como arbitrária. Pela força da grade, o tal trabalho
de arte é apresentado como um fragmento, um pequeno pedaço arbitrariamente cortado de um
tecido infinitamente maior. Portanto a grade opera da obra de arte para fora, nos levando ao
conhecimento de mundo além da moldura. Esta é a leitura centrífuga. A centrípeta trabalha,
naturalmente, nos limites externos do objeto estético para dentro. A grade é, em relação a esta
leitura uma representação de tudo que separa a obra de arte do mundo, do espaço ambiente aos
outros objetos. A grade é uma introjeção das fronteiras do mundo para o interior do trabalho; é um
mapeamento do espaço, dentro da moldura e em si mesmo. É um modo de repetição, sendo o seu
conteúdo a natureza convencional da arte em si.
O trabalho de Mondrian, tomado em conjunto com suas várias e conflitantes leituras, é um
exemplo perfeito para esta disputa. O que vemos em uma dada pintura é apenas uma mera seção
de uma continuidade implícita, ou é a pintura estruturada como um todo autônomo e orgânico?
Dada a consistência visual ou formal do estilo maduro de Mondrian e a paixão de seus
pronunciamentos teóricos, poderíamos pensar que trabalhos deste tipo deveriam se manter em
uma ou em outra posição; e porque a escolha de uma posição contém uma definição sobre a
natureza e a finalidade da arte, pode-se pensar que um artista certamente não gostaria de
confundir o assunto ao supostamente sugerir ambos. No entanto, é isso exatamente que Mondrian
faz. Existem algumas pinturas que são irresistivelmente centrífugas, particularmente as grades
verticais e horizontais vistos nas telas em forma de diamantes – o contraste entre a moldura e a
grade reforçando o sentido de fragmentação, como se estivéssemos olhando para uma paisagem
através da janela, a moldura da janela truncando arbitrariamente nossa visão mas nunca abalando
nossa certeza de que a paisagem continua além dos limites do que, pelo momento, podemos ver.
Mas em outras obras, até do mesmo ano, são tão explicitamente centrípetas. Nestes, as linhas
pretas que formam a grade nunca conseguem efetivamente atingir as margens do trabalho, e esta
cesura entre os limites externos da grade e os limites externos da pintura nos força a ler o primeiro
como inteiramente contido no segundo.
(https://textosetextos.files.wordpress.com/2014/11/captura-de-tela-2014-11-21-c3a0s-12-44-
08.png)
(https://textosetextos.files.wordpress.com/2014/11/captura-de-tela-2014-11-21-c3a0s-12-44-
22.png)
Porque o argumento centrífugo postula a continuidade teórica do trabalho de arte com o mundo,
ela pode sustentar muitos modos diferentes do uso da grade – variando de afirmações puramente
abstratas desta continuidade até projetos que ordenam aspectos da “realidade”, sendo esta
realidade em si concebida mais ou menos abstratamente. Assim na ponta mais abstrata deste
espectro encontramos explorações do campo perceptivo (um aspecto presente no uso da grade por
Agnes Martin ou Larry Poons), ou nas interações fônicas (as grades de Patrick Ireland), e a medida
que avançamos para os menos abstratos, encontramos declarações sobre a expansão infinita dos
sistemas de signos feitos pelo homem (os números e os alfabetos de Jasper Johns). Movendo mais
em direção ao concreto, encontramos trabalhos que organizam a “realidade” por meio de
fotografias integrais (Warhol e, de maneira diferente, Chuck Close) assim como obras que são, em
parte, meditações sobre espaços arquitetônicos (Louise Nevelson, por exemplo). Neste ponto a
grade tridimensional (agora uma treliça) é entendida como um modelo teórico do espaço
arquitetônico em geral, os quais, alguns pedaços, podem adquirir forma material, e no polo oposto
deste tipo de pensamento encontramos os projetos decorativos de Frank Lloyd Wright e os
trabalhos dos praticantes de De Stijl como Reitveld ou Vantongerloo. (Os módulos e treliças de Sol
Le Witt são manifestações tardias desta posição.)
(https://textosetextos.files.wordpress.com/2014/11/captura-de-tela-2014-11-21-c3a0s-12-56-
13.png)
(https://textosetextos.files.wordpress.com/2014/11/captura-de-tela-2014-11-21-c3a0s-12-44-
56.png)
(https://textosetextos.files.wordpress.com/2014/11/captura-de-tela-2014-11-21-c3a0s-12-45-
34.png)
(https://textosetextos.files.wordpress.com/2014/11/captura-de-tela-2014-11-21-c3a0s-12-45-
55.png)
E, é claro, para a prática centrípeta o oposto é verdade. Concentrando na superfície do trabalho
como algo completo e organizado internamente, o ramo centrípeto da prática tende não a
desmaterializar a superfície, mas torná-la em si o objeto da visão. Aqui mais uma vez encontra-se
um daqueles curiosos paradoxos os quais o uso da grade fica sempre marcado. A atitude para-
além-da-moldura, ao adereçar o mundo e sua estrutura, parece traçar sua linhagem de volta para
o século XIX em relação às operações da ciência, e assim trazer as implicações positivistas e
materialistas de sua herança. A atitude dentro-da-moldura,ao contrário, envolvida como está com
a leitura puramente convencional e autotélica da obra de arte, podem parecer emanadas de
origens puramente simbolistas, e assim carregarem todas as leituras que se opõem à “ciência” ou
ao “materialismo” – leituras que modulam o mundo como simbólico, cosmológico, espiritual,
vitalista. Mesmo assim sabemos que, em geral, isso não é verdade. Por meio de um tipo de curto-
circuito desta lógica, as grades dentro-da-moldura são muito mais materialistas em caráter (tome
os diferentes exemplos como Alfred Jensen e Frank Stella); enquanto que exemplos para-além-da-
moldura geralmente correspondem à desmaterialização da superfície, a dispersão da
materialidade em centelhas perceptuais ou movimentos implícitos. E nós também sabemos que
esta esquizofrenia permite aos artistas – desde Mondrian, até Albers, Kelly e LeWitt – a pensarem
sobre a grade de ambas as formas ao mesmo tempo.

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