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11/05/2016 1 ESQUISTOSSOMOSE "Existem seis espécies de Schistosoma capazes de infestar o homem: S. haematobium, S. intercalatum, S. japonicum, S. malayensis, S. mansoni e S. mekongi. Atualmente, estes parasitas infestam mais de 200 milhões de pessoas em 74 países na África, América, Central, América do Sul, Ásia e Oriente Médio. Apenas no Brasil, a esquistossomose afeta cerca de 3 milhões de pessoas". INTRODUÇÃO A distribuição das espécies de Schistosoma varia bastante. O S. mansoni é encontrado em 54 países, incluindo Península Arábica (sendo o Iêmen o país mais acometido), Egito, Líbia, Mauritânia, Somália, Sudão, África Sub-Saara, Brasil, Caribe (com exceção de Antígua, Guadalupe, Martinica, Montserrat e Santa Lúcia), Suriname e Venezuela. INTRODUÇÃO O S. haematobium é endêmico em 53 países, especialmente no Oriente Médio e em boa parte do continente africano, incluindo a ilha de Madagascar. O S. japonicum é endêmico na China, na Indonésia e nas Filipinas. A China é o país mais afetado, com cerca de 900.000 pessoas infestadas. O parasita foi considerado erradicado do Japão em 1982. O S. intercalatum está presente em cerca de 10 países na África Central e Ocidental. O S. mekongi está restrito ao Cambodja e ao Laos, enquanto que o S. malayensis infesta um povo aborígene em um pequeno foco na Malásia. a- S. hematobium b- S. intercalatum c- S. japonicum d- S. mekongi e- S. mansoni 11/05/2016 2 A morbiletalidade relacionada à esquistossomose decorre de complicações fibro-oclusivas secundárias ao estímulo imune dos ovos de Schistosoma e à lesão de órgãos-alvo. A infestação acomete ambos sexos e praticamente todas as faixas etárias, mas boa parte das manifestações clínicas da doença ocorre na segunda década de vida. O quadro clínico depende da espécie, do estágio de desenvolvimento e do(s) órgão(s) acometido(s), mas, de um modo geral, pode ser resumido em três síndromes principais: 1. Dermatite cercariana. 2. Esquistossomose aguda ou Febre de Katayama. 3. Doença fibro-oclusiva crônica. Ciclo de Vida do Parasita As cercárias penetram no corpo do hospedeiro humano e passam pelos pulmões antes de chegar ao fígado, onde atingem a maturidade após cerca de 6 semanas. Uma vez adultos, os vermes migram para a circulação venosa. O S. haematobium é encontrado principalmente nos plexos venosos da bexiga, próstata e útero, enquanto que o S. intercalatum, S. japonicum, S. mansoni, e S. mekongi são observados nas veias porta, mesentérica inferior e superior. Os vermes adultos possuem uma expectativa média de vida de 5-10 anos e as fêmeas colocam 300-3.000 ovos por dia. Os ovos são depositados nas vênulas terminais da bexiga (S. haematobium), intestino e reto (S. intercalatum, S. japonicum, S. mansoni, S. mekongi), onde se transformam em miracídios após 10 dias de maturação. Nem todos os ovos de Schistosoma são eliminados pelo corpo: Até metade deles pode embolizar para outras áreas do organismo (p.ex.: fígado, pulmões, sistema nervoso central e rins), provocando reações imunes e formação de granulomas eosinofílicos. 11/05/2016 3 EXAME CLÍNICO As manifestações da esquistossomose incluem edema, urticária, prurido, febre, náuseas, vômitos, linfadenopatia, diarréia, cólicas abdominais, adinamia, palpitações, hemorragia digestiva, tosse com ou sem hemoptise, convulsões, perda ponderal, sintomas urinários (comuns na infestação por S. haematobium) e hipogastralgia. EXAME CLÍNICO A dermatite papular ocorre nos locais de penetração da cercária, podendo durar 5-10 dias após a exposição à água contaminada. Na maioria dos pacientes, a infestação é assintomática ou oligossintomática, e apenas 5-10% desenvolvem quadro clínico severo. EXAME CLÍNICO A dispnéia pode ser observada tanto na esquistossomose aguda como na crônica, podendo estar relacionada ao desenvolvimento de cor pulmonale crônico. As manifestações pulmonares em geral ocorrem 3-6 semanas após a exposição e não costumam estar associadas a quadro febris. Hematêmese e/ou melena são a apresentação inicial mais comum da esquistossomose crônica por S. japonicum e S. mansoni. O S. mansoni e o S. haematobium também podem causar mielopatia. A febre de Katayama ocorre com o início da produção de ovos. A síndrome inclui linfadenopatia e diarréia, sendo mais comum nas infestações por S. japonicum, podendo também ocorrer na forma mansônica. Os sintomas têm início 20-40 dias após e exposição. A febre cede espontaneamente após 2-12 semanas. EXAME CLÍNICO Na esquistossomose aguda, a hepatosplenomegalia decorre de congestão venosa passiva e proliferação de granulomas. Na fase crônica, o quadro pode estar acompanhado de outras manifestações de hepatopatia, tais como ascite, aranhas vasculares, edema periférico, atrofia testicular e até mesmo feminilização. Icterícia é um achado pouco comum. EXAME CLÍNICO O hiperesplenismo pode resultar em trombocitopenia, com surgimento de púrpura. Granulomas cerebrais e medulares podem provocar déficits neurológicos focais e mielite transversa, respectivamente. De um modo geral, deve-se considerar a possibilidade de esquistossomose em todo e qualquer indivíduo morador de áreas endêmicas e com contato significativo com fontes de água potencialmente contaminadas. 11/05/2016 4 TABELA DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL Hidronefrose congênita Gastrenterite viral ou bacteriana Hepatite Viral Salmonelose Infecção do trato urinário Cirrose pós-infecciosa Epilepsia idiopática Mielite transversa viral (pós-infecciosa) Nefropatias em geral Cardiopatia congênita Cor pulmonale DERMATITE LINFADENOPATIA Exames Complementares Os exames complementares podem ser divididos em: (1) Exames laboratoriais, (2) Exames de imagem e (3) Procedimentos invasivos. 11/05/2016 5 EXAMES LABORATORIAIS O diagnóstico definitivo de esquistossomose depende da detecção de ovos de Schistosoma nas fezes e/ou na urina. A oviposição tem início 5-13 semanas após a infestação e, em alguns casos, é necessário obter amostras repetidas para finalmente selar o diagnóstico. Não é recomendável tentar pesquisar a presença de ovos de Schistosoma nas fezes/urina até que se complete o período de incubação da infestação (em geral, 3 meses após o último contato com fontes de água contaminada). EXAMES LABORATORIAIS O hemograma pode mostrar uma eosinofilia intensa, trombocitopenia ou coagulopatias. Os testes de função hepática em geral encontram-se dentro dos limites da normalidade. Os principais testes sorológicos para esquistossomose são o teste de precipitação circumoral (TPC), imunofluorescência indireta, hemaglutinação indireta, ELISA e imunoblot. Eosinófilos No passado, os testes sorológicos para esquistossomose eram pouco confiáveis devido à reatividade cruzada com outras infestações helmínticas, presença de títulos elevados mesmo após o tratamento apropriado e resposta imune prolongada por parte do hospedeiro. Na última década, a sensibilidade destes exames melhorou significativamente e, hoje, o sorodiagnóstico é considerado um método mais seguro que o exame de fezes/urina. EXAMES DE IMAGEM A radiografia de tórax pode detectar a presença de múltiplosnódulos ou infiltrados intersticiais difusos tanto na doença aguda quanto na crônica. A Ultra-sonografia é uma ferramenta bastante eficaz para determinar o nível de comprometimento na esquistossomose e para monitorizar o tratamento. As alterações são inespecíficas e incluem hepatosplenomegalia e linfadenomegalia abdominal. EXAMES DE IMAGEM Exames contrastados das vias urinárias estão indicados em pacientes com suspeita ou infestação documentada por S. haematobium. A tomografia computadorizada e a ressonância nuclear magnética são úteis para avaliar pacientes com suspeita de granulomas pulmonares, cerebrais, hepáticos ou medulares. 11/05/2016 6 Procedimentos Invasivos A Biópsia retal é útil em casos de infestações leves, crônicas ou inativas. Também pode ser empregada para avaliar a resposta ao tratamento. A cistoscopia possui papel semelhante em pacientes infestados com S. haematobium. A endoscopia digestiva pode evidenciar varizes esofagianas, ao passo que a broncoscopia pode ser utilizada para avaliar pacientes com pneumonite eosinofílica. A biópsia hepática raramente é indicada. TRATAMENTO A abordagem do paciente pode ser realizada ambulatorialmente. É importante avaliar a presença de hemorragias digestivas, sepse bacteriana e hepatopatia crônica. O praziquantel (20 mg/Kg divididos em duas tomadas, com intervalo de 12 horas) é o principal fármaco atualmente empregado no tratamento da esquistossomose, sendo eficaz contra todas as 5 espécies de Schistosoma e bem tolerado por via oral (absorção de 80%). O praziquantel age alterando a permeabilidade da membrana celular do Schistosoma, além de causar desintegração do tegumento do parasita. O efeito é mais acentuado em vermes adultos. O praziquantel não deve ser administrado em pacientes com cisticercose ocular concomitante, uma vez que a destruição do parasita no olho pode causar danos irreparáveis. Hidantoínas podem reduzir sua eficácia. O medicamento é razoavelmente seguro para ser utilizado em gestantes. Os principais efeitos colaterais relacionados ao praziquantel incluem desconforto abdominal, vertigem, náuseas, febre, cefaléia e diarréia mas estes sintomas em geral se resolvem espontaneamente em 24-48 horas. O praziquantel não deve ser administrado em pacientes com cisticercose ocular concomitante, uma vez que a destruição do parasita no olho pode causar danos irreparáveis. Hidantoínas podem reduzir sua eficácia. O medicamento é razoavelmente seguro para ser utilizado em gestantes. Os principais efeitos colaterais relacionados ao praziquantel incluem desconforto abdominal, vertigem, náuseas, febre, cefaléia e diarréia mas estes sintomas em geral se resolvem espontaneamente em 24-48 horas. O Oxamniquine é ativo apenas contra o S. mansoni e atua desintegrando o tegumento do parasita, facilitando o ataque dos fagócitos. A posologia é de 12-15 mg/Kg em dose única. Em crianças com menos de 30 Kg de peso, deve-se administrar 20 mg/Kg por dia divididos em duas doses (p.ex.: após almoço e janta), por 2-3 dias. A segurança do oxamniquine em gestantes ainda não foi estabelecida. Os efeitos adversos são semelhantes aos descritos para o praziquantel. Todos os pacientes tratados devem ser monitorizados quanto à eficácia da quimioterapia. Recomenda-se realizar exames de fezes e urina 1 ano após o tratamento. Felizmente, os índices de sucesso da quimioterapia variam de 70-100%. Pacientes com esquistossomose aguda severa, febre de Katayama ou mielite transversa podem ser tratados com corticosteróides. Alguns casos mais graves podem necessitar de intervenção cirúrgica. Os principais procedimentos realizados são ressecção de pólipos vesicais e colônicos, correção de uropatia obstrutiva e colectomia parcial devido fibrose parietal intensa. Pacientes com hipertensão portal severa podem ser tratados com shunt esplenorrenal distal. Finalmente, já foram descritos vários casos de granulomas cerebrais corticais ressecados com sucesso após falha da quimioterapia. 11/05/2016 7 Complicações e Prognóstico O prognóstico está relacionado, principalmente, ao desenvolvimento de complicações da infestação. A esquistossomose pode evoluir para doença fibro-oclusiva, lesão de órgãos-alvo, insuficiência hepática e outros. Em mulheres, a esquistomossomose pode causar hipogonadismo, atraso na puberdade, infertilidade (primária e secundária), gravidez ectópica, hemoperitôneo, metaplasia, aborto espontâneo, parto pré-termo e fístulas vesicovaginais, entre outros. Em todos os grupos e faixas etárias, a esquistossomose pode cursar com bacteremias persistentes, especialmente por Salmonella sp. Complexos imunes formados em resposta à infestação podem ser depositados nos capilares glomerulares e nas membranas basais dos rins, causando glomerulonefrite mesangioproliferativa, nefrosclerose e insuficiência renal. A severidade da nefropatia está relacionada à intensidade da infestação, à duração da fibrose hepática e ao desenvolvimento de circulação colateral. A esquistossomose afeta dezenas de milhões de pessoas em mais de 74 países, sendo um importante problema de saúde pública no Brasil. Manter-se atualizado e estar sempre atento para a possibilidade de infestação pelo Schistosoma é importante para reduzir a morbiletalidade associada à esta infestação. Atualmente, o sorodiagnóstico é considerado a melhor ferramenta diagnóstica disponível. Apesar do bom índice de sucesso da quimioterapia com praziquantel ou oxamniquine, o controle de cura deve ser realizado até 1 ano após o tratamento.
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