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Justiça Restaurativa

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JUSTIÇA RESTAURATIVA
Ana Laura Orsolin
Uma das principais preocupações da sociedade nos dias de hoje é voltada à segurança. Cada vez mais, vê-se casas com muros altos, cercas elétricas, condomínios com segurança 24 horas, etc. São medidas tomadas para proteger-se da criminalidade, que não para de crescer. A partir disso, inserem-se as críticas ao sistema prisional, judiciário, às polícias e ao próprio governo, que não buscam alternativas para diminuir a marginalidade e, consequentemente, promover a segurança.
Nessa perspectiva, adentra a Justiça Restaurativa, diferente da presente atualmente — a Retributiva, a qual baseia-se na determinação da culpa e na punição dos transgressores —. As medidas restaurativas visam reestabelecer as relações que foram rompidas pelo delito, conscientizando e responsabilizando o ofensor, a fim de evitar a reincidência e, ao mesmo tempo, reparar o dano sofrido pela vítima, atuando numa perspectiva interdisciplinar psicossocial.
As medidas propostas pela Justiça Restaurativa partem da ideia de que cada delito é uma violação das relações entre as pessoas. Desta forma, para se obter um resultado satisfatório ao “julgar” tal delito, precisa-se, antemão, reestabelecer a relação entre as pessoas envolvidas. Para isso, as partes deixam de ser meras espectadoras, com função de meio de prova, como acontece no sistema tradicional, o qual, por vezes, não atinge o real interesse das partes, pois abrange apenas as questões juridicamente tuteladas.
A Justiça Restaurativa procura promover a satisfação mútua das partes, que devem chegar a um consenso, formando um acordo restaurativo, o qual será homologado pelo juiz. Segundo pesquisas científicas desenvolvidas por universidades da Nova Zelândia, um dos países pioneiros na aplicação deste sistema, a Justiça Restaurativa pode reduzir a reincidência, exatamente porque promove a satisfação de ambas as partes. Os envolvidos contam ainda com o apoio da comunidade, restaurando assim o trauma individual e o trauma social sofrido.
O processo de reconstrução das relações rompidas pelo conflito só será iniciado pela decisão das partes, ou seja, a Justiça Restaurativa depende da voluntariedade dos envolvidos em querer entender a causa real do conflito e resolvê-lo. Demonstrado tal desejo, iniciam-se os procedimentos, que envolvem não só as partes como também seus familiares, seus amigos e a comunidade. Tais se reúnem com um ou mais mediadores, facilitadores que dialogarão sobre o ocorrido e suas consequências, levando em conta os prejuízos emocionais, morais e materiais causados, as necessidades expostas pela vítima e as possibilidades do ofensor, estabelecendo, assim, um modo de reparar a dor, os traumas, as relações, a autoestima da vítima e os danos materiais sofridos, baseado neste diálogo, promovido com todas as pessoas presentes.
Os facilitadores ou mediadores, acima mencionados, são profissionais das áreas jurídicas, psicológica e social, que devem avaliar os fatos à luz dos parâmetros legais e éticos e, a partir do diálogo construído, traçar estratégias de ação compatível com cada caso a fim de estabelecer o plano restaurativo. 
Percebe-se, com o que já foi exposto, a existência de três dimensões abrangidas pela Justiça Restaurativa: (1) da vítima, (2) do ofensor e (3) da comunidade. Como já mencionado, a primeira, recebe autonomia e empoderamento e, muitas vezes, é representada, maneira indireta ou simbólica (exemplo: homicídio, em que a vítima é representada pela família). Quanto a segunda, tenta-se convencer o ofensor de sua responsabilização, para que compreenda efetivamente as consequências e o mal causado, incentivo para que contribua, conscientemente e voluntariamente, com a construção de mecanismos para a reparação dos danos. Sendo responsável pelo delito e, mais importante, entendendo isso, na mesma medida torna-se responsável pela resolução do conflito. Ao tratar da terceira dimensão a Justiça pretende resgatar e fortalecer o senso de coletividade, além de diminuir a ideia de impunidade, na medida em que a comunidade participa e conhece o processo e as medidas aplicadas. 
Nesta perspectiva, cabe salientar que aplicar a Justiça Restaurativa não significa que não haverá o cumprimento da pena tradicional, na maioria das vezes elas são concomitantes, acontecem ao mesmo tempo. Tanto é que o método pode ser aplicado na fase de cumprimento da pena, na fase de progressão de regime etc. Mas há casos em que o processo legal pode ser excluído, como nos crimes de pequeno potencial ofensivo e, nas infrações cometidas pelo público infantojuvenil, há a possibilidade de não judicialização do conflito, para que o adolescente não precise de internação, para isso, impreterivelmente, o resultado deve gerar segurança para a vítima e reorganização para o infrator. 
A Justiça Restaurativa é aplicada há 10 anos no Brasil, sendo motivada pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) por meio do Protocolo de Cooperação para a difusão da Justiça Restaurativa. Para exemplificar o método de maneira mais prática, pode-se usar o processo aplicado na Extensão do 2º Juizado Especial Criminal – Largo do Tanque, em Salvador – BA. Lá, o modo restaurativo é aplicado a delitos de menor potencial ofensivo, como brigas entre vizinhos, lesões corporais, perturbações do sossego, acidentes de veículos, ameaças, constrangimentos ilegais, crimes contra a honra (difamação, injúria e calúnia). Entretanto, não são em todos os casos que há essa aplicação. Cada caso é avaliado individualmente pelos Atendentes Judiciários, que os submete à equipe técnica que emite relatório a ser analisado pela Promotora de Justiça e pela Juíza de Direito. 
Em São Paulo, a Justiça Restaurativa tem sido utilizada em dezenas de escolas, auxiliando na prevenção e no agravo de conflitos.
Percebe-se que a aplicação deste método no Brasil dá-se em crimes mais leves, mas em outros países a preferência é pelos mais graves pois os resultados são mais evidentes. O juiz Asiel Henrique de Sousa, do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDFT) elucida da seguinte forma:
Vamos supor que, após um sequestro relâmpago, a vítima costuma desenvolver um temor a partir daquele episódio, associando seu agressor a todos que se pareçam com ele, criando um “fantasma” em sua vida, um estereótipo. Independentemente do processo judicial contra o criminoso, como se retoma a segurança emocional dessa pessoa que foi vítima? Provavelmente se o ofensor tiver a oportunidade de dizer, por exemplo, porque a vítima foi escolhida, isso pode resolver essa insegurança que ela vai carregar para o resto da vida.
Em vista disso, percebe-se que a recuperação da vítima é primordial. O processo pode ser longo, não ressarcir as perdas materiais nem diminuir a dor da perda de um ente querido, mas mostra que ainda há vida, dando-lhe a sensação, mesmo que mínima, de segurança pata que aquela possa ser vivida. A Justiça Restaurativa mostra-se, assim, como uma alternativa ao atual “modelo de Justiça” empregado no sistema brasileiro.
REFERÊNCIAS
SOUZA, Sergio Oliveira de. Justiça Restaurativa: o que é e como funciona. Disponível em: <https://sergiooliveiradesouza.jusbrasil.com.br/artigos/153407819/justica-restaurativa-o-que-e-e-como-funciona>. Acesso em: 12 nov. 2017. 
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DA BAHIA. Núcleo de Justiça Restaurativa Salvador – Bahia. Disponível em: <http://www5.tjba.jus.br/conciliacao/images/stories/jrcartilha.pdf>. Acesso em: 12 nov. 2017.
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO PARANÁ. Manual de Justiça Restaurativa. Disponível em: <https://www.tjpr.jus.br/documents/14797/7836487/Manual+JR+-+NUPEMEC+TJPR.pdf/2dee4c67-fc1a-40ae-a896-9b86a7d631a1>. Acesso em: 12 nov. 2017.

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