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ROMANCINI A praga do plagio academico

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Artigo disponível em http://richard.romancini.googlepages.com/pragaplagio 
 
A praga do plágio acadêmico 
 
 
Prof. Dr. Richard Romancini 
 
 
Resumo 
O texto discute a prática do plágio em trabalhos feitos por estudantes universitários. 
O fenômeno é visto como resultante, em grande medida, de facilidades oferecidas nos 
dias de hoje pelos meios digitais e também por deficiências na formação e 
desinformação por parte dos discentes e docentes. Ressalta-se ainda o prejuízo que 
essa prática causa ao próprio aluno e, de modo a contribuir para a superação do 
problema, define-se o que é o “plágio” e são expostos meios de evitá-lo. 
 
Palavras-chave: Plágio; Educação; Docência; Direitos autorais; Trabalhos 
estudantis 
 
 
1. Introdução 
Há cinco anos, numa reunião científica onde foi apresentado um texto sobre a figura 
do ghost writer, uma docente de uma universidade bem conceituada pediu a palavra, 
na fase de debates. Desculpou-se por externar uma preocupação que era apenas 
marginal ao texto (a venda de monografias), ou seja, uma das modalidades do plágio 
acadêmico. E, em sua fala preocupada, transmitiu informações sobre a disseminação 
desse desvio por parte dos estudantes de sua instituição. Pouco a pouco, os presentes 
à reunião (docentes de faculdades e universidades) fizeram relatos, mais ou menos 
dramáticos ou desapontados, sobre experiências parecidas. 
 
A discussão que foi feita então produziu dois consensos, no nosso entender, ainda 
válidos: que o aumento dessa prática condenável está correlacionado à expansão da 
Internet, e que situações similares também existiram antes e, de modo paradoxal, 
eram mais difíceis de serem percebidas no ambiente pré-rede. Atuando na função 
docente, nessa época, recebemos uma resenha de livro muito bem escrita por um 
aluno relativamente ausente de um curso. E, como outros educadores versados nessa 
possibilidade, ao digitar uma frase do texto, entre aspas, num buscador na Internet, 
constatamos o plágio e invalidamos o trabalho. 
 
Como esperado, em função do aumento da população estudantil universitária e dos 
usuários de computador, a preocupação com o tema amplificou-se, nos últimos anos. 
Reportagens da imprensa (Folha de S.Paulo, 2006; Garschagen, 2006; Rabelo, 2006; 
Goulart, 2007) e textos de educadores (Oliveira, 2005; Silva, 2006) documentam e 
discutem essa situação, que não é só brasileira. Os textos chamam ainda a atenção 
sobre fraudes na elaboração de trabalhos acadêmicos inclusive no nível pós-graduado 
(Garschagen, 2005). 
 
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Publicado originalmente na Revista Científica FAMEC/FAAC/FMI/FABRASP. Ano 6, n. 6, 2007, pp. 44-48.
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Assim, docentes e instituições procuram precaver-se e estas criam procedimentos, 
visando coibir os plágios. A preocupação principal diz respeito, em parte, à quebra na 
relação de confiança entre educadores e educandos, base da ação pedagógica, que a 
ocorrência de trabalhos com vícios revela. No entanto, há uma outra faceta da 
questão, não menos grave, mas certamente muito típica de países (como o Brasil) nos 
quais as práticas de leitura e escrita, e a própria educação, apresentam deficiências. 
 
 
2. A questão da formação 
 
No ano passado, percebemos esta outra dimensão do problema, quando solicitamos 
um trabalho a segundo anistas de uma faculdade e recebemos, majoritariamente, 
trabalhos com plágios a textos da Internet. Ao discutir a questão com os alunos, 
notamos que (no caso em questão) se poderia falar em “plágio involuntário”. Não era 
clara para os alunos a idéia de que, ao atribuir a si mesmos a autoria de produções 
intelectuais de outros, incorriam em plágios. Isso aponta para uma realidade negativa 
do ensino, representada, em particular, pela errônea associação entre “pesquisa” e 
“cópia” não refletida. Porém, é claro, era uma situação diferente da anterior. 
 
Assim, alteramos o conteúdo do curso, de modo a discutir a questão da redação do 
trabalho acadêmico, para tanto utilizamos o quinto capítulo (“A Redação”) de um 
livro de Umberto Eco (1992). Aliás, estratégias, como essa, são recomendadas a quem 
passe por situações parecidas; e é esta também a atitude de outros educadores que 
assumem uma postura ativa frente ao problema (vide reportagem do site Universia, 
2005). 
 
Bem diferente disso é a atitude de indiferença que observamos, por vezes, em certos 
discursos docentes. Alguns, por trás de uma postura populista ou paternalista de 
“fechar os olhos”, estão sendo, na verdade, profundamente elitistas. O subtexto 
parece ser o seguinte: a certos estudantes é dado o direito de produzir conhecimento 
de modo rigoroso, sério e consistente; a outros, nem vale a pena explicar como fazer. 
 
Há o caso de outros profissionais do ensino (segundo o relato que ouvimos de uma 
colega) que chegam a defender os plágios, já que o estudante “teve o trabalho de 
pesquisar (sic)”. Se por “pesquisa” se entende a localização de informações, houve 
pesquisa. No entanto, se por esse termo entendemos uma produção intelectual que, 
sem ignorar o estado da arte sobre determinado tema, revele um processo de 
questionamento e reflexão (do qual resultem sínteses pessoais), é certo que não. 
 
Em outro caso bastante pitoresco contado por outra colega, um aluno defendia-se da 
acusação de plágio, ao dizer que concordava com a integralidade do texto copiado. 
Não seria suficiente explicar-lhe que entre concordância e autoria há uma distância 
bem larga? Ou dizer-lhe que o plágio configura um crime tipificado, ao violar direitos 
autorais? Que existem formas de manifestar concordância com a opinião de outrem 
que são diferentes do plágio? Ocorre que para alguns docentes fazer tais explicações 
talvez pareça uma tarefa “menor”, já que os estudantes de ensino superior, em tese, já 
deveriam, ao longo de seu processo educativo, ter internalizado esse conhecimento. 
Isso ocorre para todos? 
 
No nosso entender, infelizmente, não; portanto um professor que não procure, com 
clareza, explicitar aspectos como os mencionados, a cada situação necessária, estará 
falhando em seu papel como educador. Devemos ser capazes de formar competências 
gerais e comuns, entre elas, a produção textual acadêmica (ou escolar) rigorosa e 
ética. Por isso é imperioso explicar porque determinada produção, eventualmente, 
foge a tais parâmetros. 
 
 
3. Autoria e competência discursiva 
 
Por mais que possamos discutir o conceito de autoria (e, de fato, isso pode ocorrer no 
atual ambiente digital), isso exclui o plágio. É necessário apontar o que faz de um 
sujeito o produtor pleno de uma obra textual, ou seja, facultar a cada sujeito a 
possibilidade de se tornar um autor. É claro, que “a construção do autor não se dá 
sem a formação do leitor, visto que depende das histórias de leitura do sujeito sua 
competência discursiva, a fim de que se constitua, de fato, co-autor de textos lidos e 
produzidos” (Silva, 2006, 10). Em outras palavras, é a conquista da competência 
discursiva que, num longo processo educativo, transversal às disciplinas, mostra-se 
central. 
 
Espera-se, pois, que os professores possuam, eles próprios, essa competência para 
facilitar essa aquisição aos educandos. Mas o que acontece quando sequer parte dos 
professores têm bem consolidada essa capacidade ou clareza sobre o que isso 
significa? Isso é evidenciado por depoimentos como o do professor que, ao participar 
da avaliação de um trabalho de conclusão de curso, percebeu que a orientadora do 
mesmo “considerava o procedimento de cópia de trabalhos alheios uma coisa normal 
e corriqueira” (Lourenço, 2004). Em nossas experiências em EAD, na formação 
continuadade professores, também notamos deficiências nesse sentido. 
 
É nesse contexto que devemos atuar, e a única atitude ética, no caso, é o reforço à 
ação pedagógica (também na formação dos docentes) que se respalde na transmissão 
de boas práticas de produção textual, para, algum dia, exterminar a praga do plágio. 
Esta prática prejudica, em particular, os estudantes que dela se utilizam, pois o plágio 
acaba tendo como resultado perverso, para o educando, o “roubar de si mesmo a 
possibilidade de um outro pensar, da inventividade [o que] é um preço muito caro 
que o sujeito tem a pagar” (Silva, 2006, 4). 
 
Em outras palavras, é preciso insistir que o educando é o principal prejudicado ao 
renunciar a (ou lhe ser negada a possibilidade de) constituir-se como autor – ainda 
que somente (e isso não é pouco) ao analisar/criticar/ sistematizar textos alheios, 
num processo reflexivo, contudo, pessoal. É essa a garantia da aquisição/produção de 
um conhecimento qualquer (que geralmente os trabalhos solicitados procuram aferir) 
que, por sua vez, reforça a competência discursiva do sujeito. 
 
Feitas essas considerações, creio que um segundo nível, de caráter mais prático, da 
contribuição desse texto deve ser a explicação mais detalhada sobre o que define o 
plágio (e sua diferenciação em relação à citação), tipificação penal e meios de evitá-lo. 
 
 
4. A citação e o plágio 
 
O conhecimento humano, em suas produções mais sofisticadas como a ciência (que 
se pretende universal), é essencialmente coletivo. É impossível que um aspirante a 
produtor de conhecimento não lide com as reflexões, idéias, informações e dados de 
outros sujeitos, mesmo que para submeter à crítica algum desses aspectos. Desse 
modo, a prática da remissão a outros textos e autores é constitutiva do modo de 
produção do trabalho intelectual mais elaborado, que o ambiente universitário 
procura promover. 
 
A citação a outros autores constitui um dos procedimentos mais característicos do 
texto crítico. Ela garante o ingresso do autor na “rede intertextual” relativa a 
determinado tema ou questão. Por isso, na produção acadêmica, a citação a idéias de 
outros autores, relevantes à discussão do trabalho, deve ser precisa e averiguável. Isso 
garantirá que o leitor possa – se quiser – checar o contexto geral da citação e a 
fidelidade com que a mesma foi feita. Nesse sentido, é que Eco (1992) vê a citação 
como uma “testemunha num processo”. Decorrem dessa preocupação, as 
recomendações dos diferentes sistemas (ABNT, Vancouver, ISO) quanto ao modo de 
produzir Bibliografias e Referências Bibliográficas. 
 
Ressaltado esse caráter coletivo do trabalho intelectual crítico, observa-se que isso 
não chega a diluir o conceito da autoria (nem mesmo o de originalidade) de um texto. 
Ou seja, determinado autor (ou eventualmente autores) que se utiliza de idéias de 
diferentes sujeitos produzirá um trabalho cuja originalidade é garantida pela seleção, 
modo peculiar de exposição e interpretação dada ao seu objeto. Isso ocorre 
igualmente em termos temáticos e das idéias propostas e/ou utilizadas a partir de 
outros autores. 
 
Em resumo, a citação, que podemos agora definir como a atribuição da fonte a uma 
idéia ou conteúdo, não é um empecilho ao trabalho autoral, nem se confunde com o 
plágio. A própria Lei de Direitos Autorais (nº 9.610/98) permite o uso de trechos de 
qualquer tipo de trabalho desde que seja indicada a autoria e procedência do mesmo. 
 
Cabe ainda notar que a citação pode ser indicada de duas maneiras. A partir da 
transcrição de trechos literais de um texto, geralmente entre aspas ou outro sinal 
demarcador, como a fonte em itálico. O segundo método remete às paráfrases, ou 
seja, quando o autor da citação coloca a idéia de outrem em suas palavras, sem 
deixar, contudo, de citar a fonte (exemplos claros podem ser vistos em Eco, 1992, 
128-9). 
 
De outro lado, o plágio caracteriza-se como uma falsa atribuição de autoria, uma 
apropriação indevida de trabalho de um autor por outro indivíduo (o plagiário). 
Em outras palavras, trata-se da cópia de idéias ou conteúdos de trabalhos de outra 
pessoa, que são utilizados como se fossem daquele que finge ser o autor legítimo dos 
mesmos. É interessante notar que a origem etimológica da palavra (do grego 
“plagios” ao latim “plagiu”) carrega acepções que ilustram o conceito: “oblíquo”, 
“dissimulado”, “trapaceiro”. 
 
“Nesse sentido”, nota Ferrari (2005), “a etimologia demonstra que plágio está 
diretamente ligado ao efeito ético e moral, logo, deve-se entender que não há níveis 
de interpretação. Incorreto é o não correto e pronto. Não há interpretações extensivas 
e paralelas”. 
 
Também é fundamental notar que o plágio resulta numa violação de diretos autorais 
do autor plagiado. E esta ação configura, na linguagem jurídica: “Mais do que um 
ilícito civil, uma vez que afronta direito de personalidade do autor, 
constitucionalmente garantido, [...] nos deparamos também com um ilícito criminal 
gravíssimo” (Furtado, 2002). Como explica o autor citado, a violação de direito 
autoral é um crime previsto no artigo 184 do Código Penal, cuja penalidade envolve 
detenção e multa. 
 
Tendo explicitado no que consiste o plágio na produção textual, podemos avançar, 
notando que o mesmo possui diferentes facetas, no cotidiano acadêmico, como: 
- A compra ou furto de um trabalho na íntegra; 
- A apropriação (sem citação), em determinado texto, de trecho(s) de certa(s) 
obra(s); 
- A “falsa paráfrase”, ou seja, a cópia de texto de um autor, feita sem a 
indicação de citação integral (aspas ou formatação), mesmo que se informe 
que a idéia ou trecho provém do autor de que foi feita a cópia. 
 
Sem dúvida, o primeiro caso é o mais grave e irremediável em termos de falha ética. 
Nos outros dois casos, em particular no último, pode existir um caráter “involuntário” 
no plágio. No entanto, o que é claramente recomendável é que os trabalhos sejam 
submetidos a análises e revisões (por seus autores e orientadores), antes de sua 
finalização, de modo a eliminar a possibilidade de plágio, pelos motivos apontados. 
 
Concluindo, pode-se dizer que o papel do educador para coibir o plágio, além do 
acompanhamento na elaboração dos trabalhos de seus alunos, está ainda relacionado 
com a transmissão de informações sobre o plágio. Nesse sentido, é também válido 
que as instituições de ensino busquem esclarecer e informar os alunos e docentes 
sobre esse ilícito e adotem procedimentos que desestimulem sua prática. Como 
observa Furtado (2002): 
Agir com respeito perante não somente àquilo que se propõe a produzir 
com seriedade, mas igualmente em relação às fontes pesquisadas, às 
idéias consultadas, aos pensamentos, reflexões, pontos de vista, propostos 
em estudos e pesquisas já feitas, que recorrera para melhor ilustrar, 
fundamentar ou enriquecer o seu trabalho científico, é o mínimo que 
podemos esperar de alguém voltado para o conhecimento. 
 
 
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