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Claudia 0. Bruscagin A terapia familiar sist6rnica1 a diferenqa de outras abordagens, n3o tem um 'pain (ou uma "mae"), um teorico principal considerado seu fundador. Ela foi sendo desenvolvida por varios pesquisadores e clinicos - ao mesmo tempo e em diferentes lugares - que depois foram tornando contato com os trabalhos uns dos outros, conhecendo-se e aprenden- do juntos. 0 interessante e que os precur- sores da abordagem, apesar de atuarem de rnodos diversos e em diferentes lugares dos Estsdos Unidos, pais onde esse movimento se iniciou, tinham concep~des muito pr6xi- mas sobre familia e buscavam forrnas muito semelhantes de trabalhar com ela. A abordagem baseia-se na ideia de que os comportamentos de urna pessoa devern ser compreendidos no context0 da familia. Esta e entendida corno o conjunto de pessoas que se relacionam por lacos de parentesco e/ou afetivos. E urna forma de trabalhar que busca novos caminhos para uma melhor convivencia entre os membros do grupo familiar. Tem ainda urn carater preventivo, na medida em que traz a tona - e valoriza - os recursos da propria familia, os quais muitas vezes n5o s5o usados na resolucio dos problemas e das crises por causa do desconhecimento de suas possibilidades. A terapia familiar sistemica tarnbem visa o autoconhecimento dos membros da familia, de que rnodo funcionam e estabele- cem as relacdes entre si, oferecendo-lhes novas compreens6es que os libertam para que possam escolher melhor corno se re- lacionar, se comunicar e conviver para o pleno crescimento. b PSICOTERAPIAS I Terapia familiar sist6mice A familia nao e so urn grupo de-pessoas que convivem; cada uma delas tem uma serie de regras, codigos e simbolos que the s8o proprios b Para tanto, faz uso de bases te6ricas de outros canlpos aldm das provenientes da psicologia. Desse modo, a terapia familiar sistCmica niio tem origem nas teorias da per- sonalidade ou do inconsciente, mas se utiliza das oriundas da fisica, engenharia e biologia a fim de compreender as relat6es na familia. E o caso da teoria sistCmica do biblogo aus- triaco Karl Ludwig von Bertalanffjr (1901- 1972), que parte do principio de que todo e qualquer organism0 t um sistema, o que implica a existincia de uma ordem dinlmi- ca entre virios componentes e processos em mlitua interasio. Quando aplicada estrutu- ra familiar, v&-se que ela apresenta principios identificados com as propriedades presentes nos sistemas, dentre as quais se destacam as de auto-organizasio, autorrenovasio e auto- transcendtncia. Essa linha terapeutica busca compreender a pessoa nio somente na sua dimensio indi- vidual, abordando o plano intrapsiquico, isto 6 seus processos mentais na relagso consigo mesma, mas tambtm na sua dimensio social, num plano interpsiquico, tomando o sujeito em sua relag50 com o outro, Isso porque o ser humano t um ser social, nascido em uma familia que k parte de uma familia extensa, a qual, por sua vez, esti inserida numa co- munidade compreendida no interior de uma sociedade e no mundo. E em cada urn desses diferentes contextos que recai o foco da tera- pia familiar sistCmica, A familia niio t apenas um grupo de pes- soas que convivem. Cada uma delas tem uma strie de regras, c6digos e simbolos que Ihe siio pr6prios. Seri que voc& consegue identificar PSICOTERAPIAS I Terapia familiar sistgmica algumas caracteristicas que siio peculiares B sua familia? Um determinado jeito de olhar que significa algo? Palavras que sio enten- didas sb pelos seus membros? Uma comida especial que era a especialidade da sua bisav6 depois de sua av6, e se tornou a da sua mie? Trabalhar com familias em terapia fami- liar t muito diferente do que se faz no atendi- mento individual, 0 terapeuta familiar preci- sa estar atento a todas as pessoas ao mesmo tempo - um casal apenas ou uma familia de tr&s, quatro ou sete pessoas, com adultos, adolescentes e criangas de diferentes idades, todos reunidos numa mesma sala para serem atendidos, ouvidos e compreendidos. Diante disso, t necessirio prestar atengiio na linguagem verbal, falar de uma forma que seja acessivel e compreensivel a todos os pre- sentes, sobretudo i s crianps. Elas ' t amb~m devem ser ouvidas, pois ngo estgo ali como meros espectadores; aldm disso, muitas vezes sentem-se na berlinda, especialmente quando sio objeto das conversas dos adultos que fa- zem relatos negativos a respeito delas. 4 linguagem corporal tambdm conta mui- to: quem comega a relatar, a quem se dirige a fala, quem olha para quem antes de falar, que lugares os membros da familia ocuparam ao se sentar na sala, quem parece distante, quem esti mais envolvido. 0 terapeuta familiar pro- cura observar qua1 o "idioma" dessa familia: se existem c6digos que excluem os que niio entendem, se h i jarg6es, se os seus membros aceitam a entrada e a participa~so do terapeuta para, juntos, encontrar recursos e alternativas para as quest6es que os preocupam. A terapia familiar tambdm difere da de grupo. Se nesta as pessoas niio se conhecem, naquela se d i o inverso, estio bastante fami- liarizadas umas com as outras; a familia tem uma longa hist6ria de convivtncia, e seus membros c o n t i n M o juntos por muito tem- po. No grupo terapCutico, t mais ficil falar de certas coisas porque as pessoas sso estranhas, ao contririo do que acontece na farnilia. Aliis, o terapeuta tern de ser cuidadoso porque, apesar de os membros familiares terem intimidade, nio k tudo que pode ser totalmen- te verbalizado, nem de qualquer forrna. Uma vez dito, ngo h i como voltar at&, e as pessoas da familia, lferentemente das do grupo de terapia, voltario para a mesma casa, dormirso na mesma carna ou quarto e seguirio sua vida juntos uns com outros. Se no grupo terapCuti- co uma pessoa pode sair e nunca mais voltar, na familia isso n b C possivel. Familias sso grupos de pessoas intimas, que compartilharn histbrias, crengas, mitos, defesas e pontos de vista. Seus membros nio se relacionam democraticamente, ngo sgo to- dos iguais (par mais que algumas miies ado- rem dizer que sirn ...), h i uma herarquia (que t necesshia), diferentes gerag6es se relacio- nando e influindo-se mutuamente. A familia precisa ser compreendida como tal, e, assim sendo, o caminho i vt-la como um sistema. UM POUCO DE HISTORIA 0 movimento da terapia sisttrnica familiar surgiu nos Estados Unidos no p6s-guerra, quando o pais vivia as consequ2ncias da Se- gunda Guerra Mundial, da Guerra da Coreia PSICOTERAPIAS I Terapia familiar sistemica e da bomba athmica. Nesse momento, houve, de mod0 geral, um aumento na coes2o e no envolvimento familiar; ao mesmo tempo que o governo ampliou as verbas para as pesqui- sas em sahde mental, que vivia um period0 de questionamento sobre as teorias psicodid nlmicas, psicanaliticas e behavioristas, Isso porque os atendimentos nessas linhas niio se mostravam efetivos, sobretudo, para ajudar as popula@es menos favorecidas, bem como os pacientes esquizofrCnicos e delinquentes. Gra~as a verbas destinadas para pesquisa pelo governo arnericano, psiquiatras (muitos deles com forma~so psicanalitica) e pesqui- sadores comeCararn a estudar o universo de pacientes esquizofr&nicos, observando suas interas6es com as m k s e, de mod0 geral, as rela~bes do grupo familiar ao qua1 eles per- tenciam. Uma das primeiras descobertas deles relacionava-se ao fato de que o que se pensava ser uma doen~a de uma pessoa tinha, na verdade, um sentido na sua familia ou no seu grupo social. Em virias situa~6es percebeu-se que, quando um esquizofi6nico melhorava, outro membro familiar "adoecia"; ou entiio, quando o paciente voltava para a fa&, ele pr6priopiorava e era reinternado. Era como se os com- portamentos sintomiticos, em grande parte, mantivessem o equilibria interno da farnilia e funcionassem como elementos homeostaticos, como vieram a ser chamados posteriormente. No inicio da dtcada de 50, o psiquiatra americano Don Jackson (1920-1968) docu- mantou o efeito dramatic0 que a psicoterapia podia ter sobre a vida de outros membros da familia e a esse respeito escreveu o artigo ~escobnu-se que as mesmas leis que regem os sistemas abertos, como os bioloaicos. ~odem ser J , aplicadas abs familiares "Suicide'; publicado na edic$o 191 da revista Scientific American (19%). Jackson, entre ou- tros casos, relatou o de uma mulher com de- press20 cujo marido, ii medida que ela melho- rava com o tratamento, se queixava ao mtdico da piora dela. E assim foi progressivamente: conforme ela se recuperava, o marido se dese- quilibrava a olhos vistos, a ponto de perder o emprego e, por fim, suicidar-se, Jackson pre- sumiu que a estabilidade dele estava ligada i fragilidade da esposa. 0 terapeuta americano Augustus Y. Napier, no livro Befamily crucible - ?he intense ex- perience offamily therapy (1978)) escrito em coautoria com Carl Whitaker (1912-1995) em 1978, relata a hist6ria do inicio da terapia familiar, que teve lugar num grande hospital psiquiitrico. Um grupo de pesquisadores que atuavam com os internos da instituiqiio interessou-se em observar o comportamen- to dos esquizofrCnicos, Nesse trabalho, os psiquiatras perceberam que, quando a m5e de determinado paciente o visitava, ele apre- PSICOTERAPIAS I Terapia familiar sist6mica sentava grande perturbaqso comportamental nos dias subsequentes. Diante disso, passaram a observar o que ocorria entre mse e filho quando se encon- travam. Para surpresa deles, viram que o pa- ciente, em vez de ficar desligado, preso ao seu mundo, como esperado, estava fortemente envolvido numa intrincada e perturbada for- ma de comunicaq50 com a miie. 0 padr5o co- municacional assim descoberto foi mais tarde denominado duplo vinculo, Nesse tip0 de interaqso, a comunica@o ocorre em dois niveis, um verbal e um nio verbal, e suas mensagens sio conflitantes, Por exemplo, no encontro com o filho a m2e o cha- mava para vir abraq6-la, mas, quando ele partia em dire~5o dela, ela se afastava; nas vezes em que ele conseguia abraqi-la, o corpo materno se enrijecia como se n5o quisesse o abraqo. Se o filho fizesse qualquer coment5rio sobre sua percepqio de sentir-se rejeitado, iniciava-se uma longa discussgo de~~ualificadora de seus sentimentos e percep$6es, colocando-o numa posiqiio de ser mal-agradecido ou agressivo, o que o levava a sentir-se culpado, Ou seja, quer ele respondesse de um mod0 ou de outro B aqio da mze, ele estaria errado. A partir de entfio e durante algum tem- po, as mses passaram a ser responsabilizadas pela doenCa dos filhos, mas depois os pesqui- sadores clinicos lembraram que esses pacien- tes tinham um pai e tambCm poderia haver algo na relaqgo entre eles. Descobriram entiio que nas familias de pacientes e~~uizofrdnicos os pais se mostravam distantes e separados dos filhos, o que permitia um envolvimento excessivo da mhe com a crianqa. Dando prosseguimento is suas observa- $ties, os pesquisadores notaram que entre o casal existiam dificuldades conjugais de longa data e os epis6dios psic6ticos dos filhos.esta- vam relacionados aos cidos de conflitos pa- rentais. 0 s pais iniciavam uma batalha entre eles, e, conforme esta ia se intensificando, o filho comeqava a apresentar sintomas psic6- ticos. 0 s pais, entso, deixavam os desenten- dimentos de lado para cuidar do enfermo, o que parecia rnanter a bomeostase, ou seja, a estabilidade familiar, por um periodo. Outra importante descoberta desses tra- balhos foi que a melhora substantial do pa- ciente, com a remiss50 de seus sintomas sem alteraq6es sigruficativas nos padr6es da fa- milia, era acompanhada do adoecimento de outro membro familiar, 0 s pesquisadores passaram, entiio, a ver a familia de outros in- gulos e a incorporar todos os membros nas ent~vis tas corn o paciente. kraqas a essas-e outras pesquisas, come- cou-se a g n s a r a fa& de forma diferente: w como um p u p o de individuos dotado de pa- - - dr6es de organiza$io e funcionamento, estru- tura, regras e objetivos prhprios 3 SISTEMA FAMILIAR A familia foi vista de forma mais global, e o respaldo te6rico para essas ideias foi en- contrado nos trabalhos do criador da & -1 d o s m Bertalanffv. Isso quando se entendeu que as mesrnas leis que regem os sistemas abertos, como os hico-quimicos e os biol6gicos estudados por ele, podiam ser aplicadas aos familiares. Bertalanffy abordou os grupos sociais como organismos, sistemas abertos em interaqiio com o ambiente. Diferentemente dos fechados (niio vivos), o sistema vivo manttm-se em troca continua de substhcias com seu meio. Por exemplo, ao respirar, inspiram s oxighio e expirarnos di6- xido de carbono. & sistema vivo faz mudan- qas no pr6prio comportamento baseado nas informaq6es que recebe do seu meio ambiente. Esse mecanismo, chamado feedback, permite que o sistema mude sua atividade, estrutura e direqiio, para poder atingir seus objetivos, J i os n5o vivos, como as miquinas, embora tambtm hncionem por meio defeedbacks, s6 podem fad-lo quando hrigidos por seres humanos, & Sk&XW.k, POlZUltQ, CQEl$UQ 2 glementos em interaciiq,'formado por subsis- temas separados por fronteiras. Dessa forma, a familia t definida como um sistema, na me- dida em que funciona como tal, sendo os sub- sistemas os indviduos que estiio em interak2o (por exemplo, o subsistema parental: forma --> o pelos pais, e o fraterno, pelos irmios); nele, as particularidades dos individuos niio explicam o compordmento de todos. Assim, a anAlise de uma familia niio t de mod0 algum a soma das anilises de seus membros. As caracteristicas gerais dos sistemas abertos podem ser encontradas tambtm no familiar. Siio elas: Globalidade: 0 s sistemas comportam-se como um todo coeso. Assim, se uma das par- tes se modificar, as demais mudam igualmen- teBor exemplo, caso a miie comece a estudar ou o pai perca o emprego, todos os membros da familia serio afetados pela s i tua~io e, sistemica, a familia e definida muito mais pelos padrBes das suas relaqaes que pelas caracteristicas dos individuos diante disso, precisam promover mudanqas para se adaptar. Nko somatividde: Um sistema niio pode ser considerado a soma de suas partes. Trans- formando-se a relaqiio entre elas, muda-se todo o hncionamento. Ou seja, s6 podemos com- preender as pessoas levando em conta os con- textos interacionais nos quais elas hncionam. @omeortase: 8 o process0 de autorregula~go que manttm a estabilidade do sistema e preser- va seu hncionamento diante das mudanga3 Por exemplo, se uma crianqa tem crise de asma toda sexta-feira, esse sintoma pode estar asso- ciado ao fato de que, nos finais de semana, os pais (que vivem uma relaqiio conflituosa) teriam mais tempo juntos e, consequentemente, briga- riam. Com a i r r u p ~ b da crise de asma, o casal conjugal (quer hzer, nos seus papkis de marido e mulher) evita discutir, enquanto o casal parental (que exerce os paptis de pais da crianqa) se une para atender o filho com problema. PSICOTERAPIAS I Terapia familiar s isthica 46 PSICOTERAPIAS 1 Terapia familiar sistQmica Morfogi!nese: Trata-se de uma caracte- ristica dos sistemas abertos que absorvem inputs do meio e mudam sua organizaqiio; au- totransformam-se. Portanto, esse conceit0 se opde B h o m e o s t a s 2 ~ familia tem um grande potencial de mudanqa, seja em sua estrutura, seja em suafuncionalidade, podendo adqu&ir uma configura~io nova e qualitativamente di- ferente da anterior. - - Circularidade: A interaqio entre os ele- mentos do sistema C c i r c u l a ( ~ influencia B, que k influenciado por A e por C, que, por sua vez, o t por A, e assim sucessivamente), e nio linear (A causa B, sem que B tenha nenhuma aqlo sobre A), &ehoalimenta@o ou feedback: E uma caracteristica do sistema que assegura o seu funcionamento circular. 0 s mecanismos de feedback garantem a circulaqiio da informaqiio entre os componentes do sistema. Hi dois ti- pos dele: - Feedback negativo, que reduz as pertur- baqges, permitindo ao organism0 diminuir o desvio e voltar ao estado de equilibrio. O u seja, mantkm a homeostase. - Feedback positivo, que amplia os desvios, favorecendo o desenvolvimento, a aprendiza- gem e a evoluqiio do sistema. Ou seja, promo- ve a morfogsnesJ &uijinalidade: Nos sistemas abertos, di- ferentes condiq6es iniciais geram o mesmo resultado, e diversos resultados podem ser obtidos pela mesma"causa" ou e v e n 3 No enfoque sist$mico, a familia t compre- endida como urn sistema aberto, em que cada individuo contribui de forma interdependen- te para a configuraqso dela, assim como molda ... a construqiio de sew membros como pessoas hnicas, 0 sistema familiar esti em constante troca tambtm corn o seu meio: influencia-o e t por ele influenciado. A homeostase familiar, obtida por inter- mCdio das regras familiares, governa as rela- qdes. Dessa forma, o membro da familia que tem um problema e k trazido B terapia em busca de ajuda k visto como o paciente iden- tificado (PI) daquele grupo familiar: assume o papel de vitima, sacrifica-se em pro1 de um bem maior; estabelece o equilibria familiar, desse mod0 liberando . . & os demais de suas difi- culdades. Em contraste com ele, gragas B sua "debilidade", os outros aparecem como fortes, slos e altruistas, Diante disso, o terapeuta familiar procura aten 5 er toda a fa&, e nlo s6 aquele clien- te 'hoente; por entender que cada pessoa do grupo familiar afeta e k afetada pel0 outro, bem como esti envolvida no problema, sendo parte dele e t a m b h & soluqiio. Nessa con- cepqho, a - 4 definida & mais & &IS w r~elaq6_s: a e plas risticas ~ Q S indwiduos sue LC- 3 Paralelamente ao trabalho de BertalanfTy, o matemitico americano & k t W k u ~ (1894-1964), do Institute de Tecnologia de Massachusetts (MIT, na sigla em inglcs), lanqou o livro (Xew.&ca (1948). Alkm dos PSICOTERAPIAS 1 Terapia familiar s is th ica temas de sua irea, o cientista tinha grande in- teresse nos referentes A filosofia e neurologia, entre outras disciplinas. . E o d u t o da interdisciplinaridade entre L - matem&tica, antropologia, psicologia, neuro- logia, fisica, biologia etc., a cibernktica k uma cicncia que trata dos processos de comunica- $50 e controle dos sistemas vivos e nio vivos (miquinas), a partir dos quais se elaboram os principios da informitica e da inteligzncia artificial. Ela estuda o mod0 como a informa- qio circula e se organiza, bem como a forma para controlar esses processos e govern&los. 0 conceito de retroalimenta~i?~ t fundamen- tal nessa teoria; ele se refere B rnaneira como um sistema consegue a informaqio necesskia para efetuar suas a S 6 a Vejamos um exemplo de miquina ciber- nktica, tomando como base o computador e a impressora, Quando eu quero imprimir algo, insiro as informaqbes no computador, que vai encaminhi-las A impressofa para que execute o trabalho. Esta, por sua vez, passa- rA ao computador outra informag50, do tipo: "acabou ou atolou o papel","terminou a tinta'; "a impressio chegou ao fim". Em decorrtncia dessasnotificasbes, sou levada a uma agiio: colocar o papel e reiniciar a miquina, encer- rar a impressio etc. Nos seus primordios, a cibernttica era uma disciplina que estudava a comunicaq20 em sis- temas bi016~icos, sociais e artificiais. Como tal, ocupava-se da informaqio, e nso da ma- ttria e energia, podendo opera. em sistemas com caracteristicas fisicas muito diversas. Essa concepqio trouxe entendimento sobre a conti- nuidade entre os sistemas biologicos e sociais, naturais e artificiais, nos quais ocorriam os processos de comunicaqio. Essa &nfase na con- tinuidade dos sistemas entre homem e natu- reza esti na base de uma concepqio ecologica dos rocessos de comunicagio. utro conceito fundamental dessa teoria t o @ e circularidade ou recursividade. No siste- ma familiar, isso quer dizer que cada membro influencia os outros e ao mesmo tempo k in- fluenciado por eles. Essas influhc'as m6tuas constituem o dia a dia da familia. 3 Dois grandes momentos podem ser dis- tinguidos no campo da cibernttica, 0 de pri- meira ordem, que ocorreu bem no comeso, na fase mais ligada B engenharia da comunicaqio e i s citncias da automaqiio e da cornputagio. E o de segunda ordem, que surgiu quando a cibernttica passou a tomar a si mesma como objeto de estudo. A cibernttica de primeira ordem, por sua vez, t a m b h se dividiu em dois momentos: primeira e segunda ciberndtica. A noqio prin- cipal era que se podia aprender objetivamen- te uma verdade sobre os outros e o mundo. Em termos de psicoterapia, isso se refletiu na postura dos terapeutas do periodo, que assu- miam uma posiqHo de experts do que deve- ria ser mudado na familia. Havia como que a ideia de urn modelo de como as familias "hn- cionais" deveriam ser, sendo o terapeuta seu condutor. As escolas terap&uticas dessa kpoca tinham seu foco nos processos de comunica- qio e intera@o entre os membros da familia, trabalhavam com regras e mitos familiares, bem como com padrdes interacionais. A primeira cibernttica, iniciada com a co- munica~iio nos sistemas e voltada para a ma- PSICOTERAPIAS I Terapia familiar sist@mka -49 - nutenqiio da estabilidade, focava sua atenq50 na homeostase, Outros conceitos dessa tpoca incluiam a circularidade, a continuidade, o prop6sito e oi'sistema observado': 0 terapeuta planejava toda a sess50, buscava ttcnicas que burlassem o sintoma, cuja funqlo - assim se entendia - seria fazer com que o sistema niio mudasse. 0 terapeuta endo provocava uma crise para que a familia se reorganizasse mais funcionalmente sem precisar do sintoma. Ji na segunda cibernttica o foco da terapia passou a ser as rela@es, e niio mais o sintoma, dado que ele seria t lo somente um sinaliza- 0 conceito cibernetico de circularidade, quando aplicado a fam'ilia, refe're-se as influgncias mutuas que ocorrem entre seus membros dor de que algo na familia n5o ia bem. A crise surgida dele foi sendo vista endo como par- te do process0 de ,mudanqa, que deveria ser mais ampla e profunda. , Na evoluc$o da primeira para a segunda ordem, o conceito de circularidade foi am- pliado, e o observador passou a ser incluido no fedmeno, j5 que ele C parte daquilo que observa, do "sistema observante". E s6 pode- mos conhecer nossas pr6prias construq6es sobre os outros e o mundo, Foram os trabalhos realizados na fisica qulntica que possibilitararn a compreen- sso da subjetividade da realidade. 0 &ico austriaco .-a, no livro Q+r&Jg -0, explica que, quando procuravam ob- servar elementos atdmicos, luz e outras for- mas eletromagnkticas, os fisicos notaram que estes tinham urn comportamento dual: ora como particulas, ora como ondas. Como era possivel que a mesma coisa pudesse ser uma particula e uma onda? A resposta a essa intrigante pergunta veio com a percep~so de que o comportamen- to desses elementos variava (entre particula e onda) de acordo com o que o observador esperava encontrar, a depender "do aparelho com que o elemento era forqado a interagir". Sero observador usava urn instrumento que media ondas, o elemento era percebido como tal, e o mesmo se aplicava ao caso das par- ticulas. Descobriu-se, assim,Enatureza dual da mattria e, o mais importante, a diferenqa que o observador faz no sistema que obser- va, uma vez que os resdtados que ele obtCm dependem muito do que se proptie prorurar. A partir desse momento, j i niio se trata de "urn sistema observado? mas de "urn sistema observante'; do quai ele f z parrg Com base nessas descobertas, houve uma mudanqa epistemol6gica nas ciCncias como um todo, o que tambkm se refletiu na forma de atendimento teraptutico. Isso porque se entendeu que, assim como o pesquisador or- ganiza uma skrie de instrumentos corn o ob- jetivo de encontrar respostas para a pergunta A intcoducao das ideias da cibehetica na terapia familiar foi feita por Bateson, que pesqulsava a comunica@o corn queformula, estando desatento para perceber o que n5o procura, o terapeuta tambtm obte- r i respostas conforme a postura que assumir e a d i r e ~ i o que irnprirnir ao atendimento. Desse modo, a cornpreens50 dos processos que ocorrem na terapia subjetiva seri sempre dependente dos valores, das experiCncias de vida e das crenCas do terapeuta; assim como das hip6tesei-que formula para cada caso. Sendo toda realidade subjetiva, cada pessoa tem a propria versgo das vivGncias, e, no caso da familia, as de todos os membros s5o igual- mente vilidas. Desse ponto de vista, o terapeuta deixa a posiqio de expert e assume a postura de faci- litador, cujo conhecimento t como qualquer o tro, estando ele livre do status privilegiado. 6 terapeuta t visto ent5o como mais um no sistema, No lugar de intervir, coparticipa dele, atuando para uma transformagso construida em conjunto, que conta com o inesperado e o im~revisivel, i medida que os sistemas pro- duzem a pr6pria m u d a q g 0 desenvolvimento das ideias sisttmico- ciberntticas, que se estendeu para outras Areas do saber cientifico, fez parte de uma mudan~a paradigmitica que enfatizava o papel do con- texto para a cornpreens50 das quest6es huma- nas, considerando que o individuo esti sem- pre se relacionando, Assim, os sintomas de cada pessoa deixaram de ser entendidos como apenas dela, e passaram a ser vistos como par- te e produto das inter-relaq6es no interior do context0 em que esti inserida. FUNCIONAMENTO DA MENTE A introduqso das ideias da &axuhana e a - b m i k u foi feita pelo w t r o p d o p h- &s Gqpry Bseson (1904-1980), que tra- balhava com um grupo multidisciplinar em pgscp& sobre comunica@o com p&xs A . esquizofretucor, Ele havia entrado em con- tato com Wiener e sua citncia em uma strie de conferkncias multidisciplinares, as Macy Conferences, ocorridas entre 1946 e 1953, em Nova York. Por meio delas, cientistas de diversas ireas do conhecimento buscavam definir as bases para uma cikncia geral do funcionamento da mente humana. E uma das propostas centrais da mudanqa conceitual de Bateson para pen- sar sistemas familiares foi a definiqio de circu- laridade, pela qua1 a mudanqa em uma pessoa sempre modifica o sistema. Vale lembrar que na tpoca havia um cres- cente desencanto com o pensamento linear de causa e efeito usado para explicar as doen~as mentais; tomando como base modelos mtdi- PSICOTERAPIAS I Terapia familiar sistPmica 50 PSICOTERAPIAS I Tarapia familiar s is th ica cos ou psicodiniimicos, eles ngo levavam em conta o context0 ou as relaq6es. Diante disso, essas ideias sistCmico-ciberntticas aplicadas a terapia causaram uma revolu@o na irea da salide mental. Bateson foi um grande aglutinador de pessoas inteligentes, carismiticas e criativas, provenientes de diversas ireas de conheci- mento, que se propuseram a estudar juntas e pesquisar diferentes temas relacionados a comunica~50. Tal intento culminou na ideia de que os sintomas esquizofrhicos seriam express6es de anglistia relacionada ao duplo vinculo estabelecido nas relaqdes familiares e deveriam ser validados como uma experihcia catirtica e transformativa. Lembrando, o du- plo vinculo se refere A comunica@o paradoxal da familia com o membro esquizofrtnico. Para que essa comunic@o ocorra algumas condi~6es precisam estar presentes no mod0 como as pessoas (duas ou mais) se vinculam: (a) uma relaqio de longo tempo; (b) um vinculo estabelecido de tal mod0 que a pessoa niio pode escapar dele; (c ) a comunica~io nzo pode ser comen- tada pela pessoa, em fun@o do parado- xo que cria, Por exemplo, em f u n ~ i o das seguintes ordens: "quero que me domine'; 'tern que me amar"; "tem total liberdade para ir, n5o se preocupe se comego a cho- rar': obedect-las ou niio? 0 sujeito fica num beco sem saida, pois nio pode ques- tioni-las com medo do abandon0 ou do desprezo alheio. Bateson niio era terapeuta, apesar de todo o seu interesse nas familias; mais que o trata- mento, era a teoria que o encantava. Assim, seus maiores esfor~os estavam voltados para estudar a importhcia da comunica~no na organiza~iio familiar. Como todo grupo com muitas pessoas brilhantes juntas, as ideias e desejos dos membros comepram a entrar em desacordo att que, em 1962, ele se dissolveu. Aqueles mais interessados na pritica clinica se mantiveram juntos no Institute de Pesqui- sa Mental (MRI, na sigh em ingl&s), dirigido por Jackson. Bateson e outros partiram para outras pesquisas. DO LINEAR A 0 SIS~MICO passagem da ci6nda traditional, que busca obter urn conhecirnento objetivo da realidade, B ciCncia pbs-moderna, que incluiu a subjetividade na observa~o dos fencime- nos, deu-se em decorr6ncia de uma mudan~a de paradigma: de um mod0 linear de ver os fencimenos, como estando numa relaq50 de causa e efeito, a urn mod0 circular de ensri- 10s como interdependentes um do outro. Segundo a psicbloga 5 de V a s c d . A . , n6 livro novo varadima da ciincia (7.0Q22, sii0 tr&s os principais pressupostos istemol6- gicos do pensamento sistEmico l?' A crenqa na complexidade, em todos os nivels da nature- za; a crenCa na instabilidade do mundo, em process0 de t o m - s e ; a crenCa na intersub- jetividade como condq2o de constru~50 do conhecimento do m u n d g As diferenps na forma de pensar e agir na clinica, que passam pela modifica~go do pensamento linear ao circular, podem ser re- PSICOTERAPIAS I Terapia familiar sist4mica a) 0 foco esti no por que aconteceu. b) Parte da relag50 de causa e efeito: Estimulo -> Resposta. c) Ocupa-se do conteudo da historia. psicopatologia; crenp em condutas normais e anormais. e) Atua com as nog6es de normalidade x doen- $a e de cura. f) Busca explicag6es e foca a compreensiio. g) Prioriza a comunica- g io logico-verbal (ideias e pensamentos Iogicos formais). h) Tem como foco as queixas, os problemas e sintomas. i) Visa a manutenqio do padriio infantil (depen- dencia-independencia) nas relaqBes afetivas e de poder (inclusive na relac50 terapeutica). j) Trabalha com interpre- tagiio da resistencia. a) 0 foco e no que acon- teceu e como aconteceu. b) Trabalha com o tip0 de relacio e a rede de acontecimentos. c) Vob-se a forma de relaqio e a rede de acon- tecimentos. d) Ressalta o context0 referential; as crises evolutivas do desenvolvi- rnento hurnano d o vistas como naturais. e) Trabalha com os ' conceitos de saude, funcionalidade e disfun- cionalidade. f) Proma novas alterna- tivas de funcionamento e foca a mudan-. g) Usa a comunicagio paradoxal, irracional, n i o verbal e paraverbal; inchi o corpo com suas linguagens h) Foca as diiculdades (que, se ma1 adminisIra- das, podem se transfor- marem pmblernas). i) Visa o desenvohrimento do padriio adulto (au- tonomia) nas relagBes afetivas e de poder (inclusive na relaciio terapiiutica). j) Faz uso de intervencBes sWmicas: diretas, rneta- fbricas e paradoxais. . sumidas conforme o quadro a seguir: Ao longo do tempo, a palavra "sistema" aca- bou se tornando senso comum na terapia fami- liar, perdendo att muito do seu significado pel0 seu uso excessivo, pela generalizaqiio e elabora- qio acadCmica. Embora a teoria dos sistemas seja a pedra firndamental na quai se baseia a te- rapia familiar, a dwersidade de abordagens cli- nicas que se desenvolverarn a partir dela indica as diferentes maneiras pelas quais um sistema familiar pode ser definido e manejado. Quando se trabalha clinicamente, a defini- $50 de um sistema pelos terapeutas depende do foco de aten@o dado por ele ao atendi- mento, bem como do que acredita ser a causa do problema e do mod0 como ele e a familia pretendem agir, Por exemplo, como veremos mais detalhadamente adiante, de acordo com o terapeuta argentino Salvador Minuchin, um sistema t definido de acordo corn as fronteiras e a organiza~io hierirquica, Para o americano Murray Bowen (1913-1990), tanto a defini- $50 do termo como a interven@o clinica ba- seiam-se nos conceitos de triangulaqio e grau de diferenciaqiio. Jay Haley (1923-2007), Clot Madanes e os representantes da terapia estra- tkgica, por sua vez, veem o sistema em termos de estrutura de poder. Ji o psiquiatra de ori- gem hhgara Ivan Boszormenyi-Nagy (1920- 2007) aborda as lealdades em tr&s gera~bes, e a italiana Mara Selvini Palazzoli (1916-1999), na primeira fase de seu trabalho sistgmico, bus- cava os paradoxos sistkmicos, E assim tambkm o fizeram outros expoentes da terapia familiar como James Framo (1922-2001), Whitaker, Maurizio Andolfi, Gianfranco Cecchin (1932- 2004), Peggy Papp, entre outros. PSICOTERAPIAS 1 Terapia familiar s is th ica Pensar sistemicamente e ver uma situaqi3o sob diferentes aspectos, buscando entender como o todo e as partes interagem e se rnantem 0 importante t saber que todas as escolas de terapia sisttmica, independentemente de seu foco principal e de suas defini~6es clini- cas, t tm em comum a cornpreens20 e a leitura sisttmica, de acordo com os preceitos bisicos da teoria geral de sistemas. E n s a r sistemicamente n5o t pensar s6 em termos de psicoterapia, mas t uma forma de o terapeuta compreender o mundo e a VI&.J B s i r do terreno das verdades estabelecidas, dos dogmas, para poder levantar diferentes hi- pdteses, encontrar novas alternativas e trazer - A tona os ursos dos sujeitos envolvidos no problema.Epoder ver uma rnesma situa@o sob diferentes aspectos, buscando entender como o todo e se relacionam, inte- ragem e se as semelhan~as e as difereyas, e nPo o certo e o errado. B ver a realidade de uma forma holistica, ecol6gica e circular. Essa visso propicia formas diferentes de compreender a realidade na psicoterapia e trabalhar com ela. N5o A toa, os terapeutas de destaque na hist6ria da terapia familiar ttm origens bem diferentes: psiquiatria hospitalar e interpesso- al, movimento da assisttnda social, psicologia de grupos, pesquisas sobre esquizofrenia e aconselharnento conjugal. A fim de ter uma visPo geral dessa linha teraptutica, e tomar contato corn as ttcnicas mais amplarnente utilizadas, destacamos os perfis dos principais terapeutas e apresen- tamos as respectivas abordagens, usadas at6 hoje na clinics com algumas evoluqiies. Vale lembrar que a terapia familiar 6 urn campo em constante desenvolvimento, e suas teorias e compreens6es continuam em h c a evoluqio, Hoje, ji temos as terapias famihres ditas p6s- modernas: construtivistas, narrativas e colabo- rativas que surgiram como desdobramentos dos trabalhos de terapia familiar sisttmica. No entanto, nso seriio abordadas neste texto, cen- trado nos autores rnais sisttmicos. .DlJQYOSTIW FAMILIAR .. . . ( Devido 21 sua obra e As suas caracteristicas pessod_s,&&nK Ackermm (1908-1971) t tido como o mais notivel expoente da te- rapia familiar. &quiatra L Q ~ forma& em gsicandise, seu m> -r as familias refletiu essasua base, estando & interessado tanto 13-0 w e passava no d o interior - &. pessoas cm-e g h . Inovou s psicn- C- diagdstico infant;l ao introduzir a ideia do diagn6stico familiar para melhor compreen- der a problemitica da crianqa. Dai nasceu seu interesse nas fa&. Sua obra t vasta e importante, tendo ele produzido muitos tex- PSICOTERAPIAS I Terapia familiar s isthica tos (dos 25 anos att sua morte) sobre teoria e tCcnica de terapia farnili?. Para ele, as familias demonstram uma apartncia de unidade, mas por tris &sso siio divididas emocionalmente em grupos rivais. Assim, existem co&zbes d i n h i a s , que po- dem ser entre m5e e filha contra pai e filho, i s vezes de uma gera~go contra outra. Nas sess6es fam;l;ares, Ackerman fazia quest50 de que todos os que vivessem sob o mesmo teto estivessem presentes a 6n-1 de que o contato emotional sigdicativo pudesse ser es- tabelecido, Como terapeuta era muito provoca- dor, incitava revelag6es e confronq6es entre os membros da familia; por vezes podia se mostrar agressivo, onipotente e exibicionista, mas qua coragem e criatividade para o m , mobhzar e ajudar realmente surtiu efeito nas fa& corn as quais trabahava. Juntamente corn Jackson criou, em 1960, a revista especializada Farnib P-que k a mais difundida na Area. AlCm disso, fundou a primeira Clinica de T e r a p i a k - F d a , em Nova York, que, depois de sua morte, passou a se chamar Instituto Nathan Ackerman. COMUNICACAO HUMANA Outro nome de destaque na Area t o psic6- logo e fil6sofo auscriaco radicado nos Estados U n i d o s m W&(l921-2007). Um dos mais influentes terapeutas do MRI, ele partici- pou, com Bateson, dos projetos de pesquisa so- bre comunicag50, cujas ideias serviram de base para seu livro Pragmdica da comunicap50 hu- mana, Nele, Watzlawick define axiomas Para Don Jackson, urn dos pioneiros da area; as famllias sao unidades homeostiticas que tern certa constincia no funcionamento interno necessArios para o estabelecimento de uma boa comunica@o entre duas pessoas. Se um deles, de alguma forma, estiver comprometido, haveri risco de falha na cornpreens50 da informag50. Sio eles: jJ),&o gpde MAC- Todo com- portamento e um tip0 de comunicagao; dada a inexisthcia de anticomportamen- tos, nio t possivel niio comunicar. (22Toda comunicafao tem urn conteudo e urn aspecto relational tal que o riltimo cfass;fica o primeiro, chegando-se assim a uma metacomu- nicagao. Isso significa que toda .comunicag50 inclui, alkm do sipificado das palavras, mais informa~bes sobre a forma como o emissor quer ser compreenddo e como ele mesmo vC sua relatao com o receptor da informag50. &A natureza da rela@o depende da pon- tuayao dos parceiros nos processes de comu- nicaylio. Emissor e receptor estruturam o fluxo de comunicag~o de maneiras diferen- tes e assim interpretam os pr6prios com- portamentos durante a conversaggo como PSICOTERAPIAS I Terapia familiar sistihnica mera reaqgo ao comportamento alheio. A comunicagio humana nio t linear (causa e efeito), mas circular. &A comunicatso humana envolve ambas as modalidades: digital e analdgica. Nio abrange apenas palavras (c~munica~io di- gital), mas tambtm tudo que C ngo verbal (anakgica), na forma de postura, gestos, express20 facial, inflexio de voz, sequtn- cia, ritmo e cadCncia das pr6prias palavras, bem como qualquer outra manifestasio nio verbal de que o organism0 seja capaz. (5)A comunica@o pode ser sime'trica ou complementar, A depender da rela950dos parceiros (emissor e receptor), baseia-se em diferen~as ou semelhanqas. HOMEOSTASE FAMILIAR Outro dos grandes pioneiros da terapia fa- miliar k o ji mencionado Jackson. 0- .- voltou sua atenq2o ao tratamento, enfatizando o efeito da terapia sobre a fimilia. No lugar de separar o doente dela, hos- pitalizando-o, buscou trati-lo em conjunto com seus membros. Como Bateson, com quem traba- lhou no gApo de pesquisa, acreditava que com- portamento e comunicaqio erarn sinbnimos. Descreveu as familias como unidades ho- meost5ticas que m ~ t i n h a m certa consthcia no seu funcionamento interno. Entre seus prin- cipais conceitos esti o de-famib$as familias, como unidades, seriam resistentes ii mudanqa). Portm, essa noqgo, que esteve muito presente nos primeiros anos da terapia fami- liar, nil0 levava em conta as transformaq6es que ocorriam com as f&, no caso, as mudanqas relativas ao cido vital, que s50 necessIrias para seu desenvolvirnento saudivel, ou os eventos inesperados e imprevisiveis, como morte, perda de emprego, divbrcio. Em sua vis50, as quest6es fimiliares estariarn mais relacionadas i s do ca- sal, sendo os problemas que surgiarn com as criangas apenas sintomas cla relasgo marital. E dele tambh o conceit0 de@ p w - barganhas relacionais sobre os paptis a serem desempenhados pel0 rnarido e pela mulher, que n b s2o expficitos ou conscientes. E na tro- ca m6tua que os direitos e deveres de cada um serge estabelecidos. Um exernplo C a ideia pre- concebida de que o rnarido t a pessoa racional, lbgica e realista no cad , que cuida da manuten- $20 de tudo na casa, e a mulher, a pessoa mais sensivel, sonhadora, que cuida das emo96es e entende melhor de pessoas do que de coisas. 0 que acontece se um nib corresponde i imagem esperada do outro? Outro pensamento importante desenvol- vido por Jackson refere-se Bfiotomia entre - os relacionamentos complementares e os si- mktriuw;. 0 s primeiros sio aqueles em que as pessoas diferem na mineira em que se ajustam (um subrnisso, outro dominador; um 16gic0, outro emotivo). 0 s sepndos baseiam-se na igualdade e similaridade (ambos t2m carreira e dividem as tare& domtsticas). Haley, que h k m trabalhou corn Bate- - que conheceu depois de graduar-se em comunicaqio, orientou sua terapia para reso- luFio de problemas. Este o convidou a parti- cipar do que ficou conhecido posteriormente como Projeto Bateson - tido como um dos marcos da criaqso da terapia familiar. Com Weakland, Jackson e William Fry, que tam- btm participavam desse projeto de pesquisa em comunica~iio, publicaram urn dos artigos mais importantes da Area, intitulado ".Ern di- de . 9, Foi em 1962, enquanto estava no MRI, em Palo Alto, Caifbmia, que Haley tornou- se editor fundador da revista Family Process. Nessa Cpoca, estabeleceu forte relacionamen- to profissional com o psiquiatra americano Milton Erickson (1901-1980), especialista em hipnose, cuja interessante abordagem da mente inconsciente como criativa e criadora de soluqdes influenciou fortemente o traba- Iho clinic0 e as propostas te6rica.s de Haley para a terapia familiar estratkgica. E m sua terapia estrattgica, Haley com- binava a compreensio sistCmica dos proble- mas e for~as humanas com uma abordagem pragmitica de intervenqiio. Em sua tkcnica teraptutid- sobre a q d ele dizia nio-~er uma teoria - Gfatizava estratigks criativas e provocativas, com tarefas para os dientes rea- lizarem fora da sessio. Sua Cnfase era no "aqui 2 e agora'; e os sintomas eram compreendidos como resultado das tentativas da familia de corrigir o que consideravam como comporta- mentos problemiticos. Eua terapia ertrattgiu ti, portanto, focada na solu~io de problemas es ecificos. Entre seus principios bisicos temos: fi (1) o terapeuta tem o comprornisso de ali- H viar as queixas apresentadas; Para Bowen, outros dos qrandes nomes da are< a satlde de cada membro da familia e uma funcao do seu grau de diferencia@o dentro dela (2) os problemas sPo vistos como dificul- dades de interagio seu enfoque maior era nos dist6rbios d? o casal que geravam sin- tomas nos filhos), bem como dificuldades cotidanas nio resolvidas, resultantes de um problema estrutural do sistema; - (3) as transigbes de vida e o ciclo de vida . . . . G l i a r regueTem grandes mudangas nos relacionamentos; .-. - - - - - - .- - - (4) os problemas de longa duragio nem I - sempre sio indicadores de cronicidade, nus de persisttncia de uma dificuldade ma1 enfrentada; a resolugso de problema requer pri- meiramente a substituigio de padr6es de comportamento; @ a promoqio de mudan~as atravks de meios que funcionem mesmo que pare- Cam il6gicos. Nessa linha terapeutica, as tarefas sso da- das corn o objetivo de mudar o padrio com- portamental e d m valor mesmo que nio se- jam realizadas. PSICOTERAPIAS I Terapia familiar sistlimica 56 PSICOTERAPIAS I Terapia familiar s i s t h i c a 57 Por exemplo, pensemos em um casal que chega ao consult6rio com a queixa de que 1150 tem relagbes sexuais h i oito anos. 0 terapeu- ta pode qualifici-10s como "destreinados" para relacionarem-se sexualmente e depois ques- tioni-10s sobre o que j& fizeram para tentar resolver essa situac+o, Pode apontar tambtm que precisam estabelecer mais intimidade e propor coisas nesse sentido: que o marido convide a esposa para jantar e ir ao cinema. E endo perguntar ao marido se ele se lembra de quando tinha 19 anos e foi com a namorada pela primeira vez ver um filme. "VocC a agar- rou logo na primeira vez? Tente algo como foi no inicio." Nessas colocagbes hi, sem dhvida, um toque de provocaq50 e desafio. PRESENCA HUMANIZADORA Numa tpoca em que as atengiies eram muito mais voltadas para o pragmatisma.das solugbes dos problemas familiares que para as pessoas da familia, a presenqa de Virginia Satir (1916-1988) foi humanizadora. A as- sistente social e cofundadora do MRI, com Jackson, foi uma das primeiras terapeutas a ver a familia toda nas sessbes. Ela costumava recomendar que os pais fossem mais afetivos e carinhosos um com outro e com seus filhos, mas sem deixar de ser firmes com eles. Seu grande interesse - era romover a autoestima de cada membro da P amilia, encorajando-os a deixar de lado suas mascaras e a expressar seus verdadeiros sent imento3 Numa profissHo predominantemente mas- culina, Satir foi a primeira e, por um longo tempo, a h i c a mulher a ter proeminkncia na terapia farmliar, o que h e trouxe problemas com os colegas, que culrninaram em sua saida do grupo de Palo Alto. A partir de endo, de 1964 a 1969, foi diretora do Instituto Esalen, em Big Sur, Calif6rnia. Seus livros, de uma clareza e simplicidade invejiveis, s50 usados por todos os terapeutas de familia. ABORDAGEM INTERGERACIONAL J i Bowen, outro dos pioneiros na area, desenvolveu seu trabalho sempre buscando fazer carninhar pari passu teoria e prftica te- rap2utica; att hoje, aEoria desenvolvida por ele t5 a mais cri osa e completa no campo da terapia famili 3 a exemplo de sua elabora- da visgo sobre a diferencia$io do"euu" na fami- lia. Como muito dos "hndadores" da Area, era psiquiatra especializado em esquizofrenia. Para ele,&hde de cada membro da fami- lia t uma h @ o do seu grau de diferenciaq50 dentro d e a ~ s s e conceito, pedra Lndarnen- tal da sua t eo r ia ,Fhe as pessoas de acordo com o grau de fusgo ou diferenciagiio entre o funcionamento emocidnal e in te lec tu .~es- sa forrna, pode-se pensar os individuos em um continuun: num extremo estariam aqueles cujas emo$bes e intdecto se encontrariam t%o fusionados que suas vidas seriam dominadas pelas primeiras; no outro, os maisdiferencia- dos (mais flexiveis, adaptbeis e independentes emocionalmente que os seus pr6ximos). Nes- se caso, as pessoas MO d teriam a razHo, mas conseguiriam equilibrar pensamento e senti- PSICOTERAPIAS I Terapia familiar sisclmica mento; assim, em situaqdes de estresse teriam relativa autonomia pat;a enkentar a crise. Outro conceit0 fundamental da teoria de Bowen, anteriormente mencionado, t a triangulagio&triiogulo t uma configura~io emocional de trCs pessoas, o bloco bhico de qualquer sistema emocional, seja a farnilia ou outro grupz~rata-se, portanto, da estrutu- ra relacional que resulta da rea~iio emocional humana em combinaqso com a tendtncia de evitar conflitos, mesmo que ao custo de falhas na resolug50 de problemas. Por exemplo, quando, nurn casal, os par- ceiros vivem um momento de t e d ~ , h i uma tendhcia a buscar urna terceira pessoa para dirninuir a ansiedade, evitando assim uma briga maior e estabilizando a rela+o. No en- tanto, isso n5o ocorre nas situapks em que os parceiros siio diferenciados, niio d m medo do conflito e conseguem resolver a situa~io dire- tamente sem a necessidade de intermediirios ou neutralizadores para equilibri-la. Nesses casos, t mais Mcil enxergar seus virios lados, procurando entender a posiqiio de cada um, mas mantendo o foco na resolueo da questiio, e niio no julgarnento. Isso w b t m permite que as pessoas se conscientizem das pr6prias emogcies e controlem suas respostas. Sem sombra de dinida, urna das principais contribui#es de Bowen h i na ima de fbnna@o dos terapeutas, ao mostrar a imprdncia de que fizessem urn trabaho de c L f k f f n w na pr6- pria f$rr3ia, Ele dernonstrou isso aplicando em si mesmo a pr6pria teoria. Passou 12 anos tentando compreender sua fan3ia e sete ou oito anos em es- fbrqo ativo e direto para m0dif;ca.r sua -0 com ela (difkrenciar-se e nib enmr em &6es). A terapia experiential da familia, de Whitaker, e radical - e provocativa, uma mktura de apoio cordial e rasteira ernocional imprevisivel Relatada a experikncia, vkios de seus es- tagiirios passaram a se voltar para as pr6prias familias e trabalhar a diferenciaqgo deles em rela@o a elas. Segundo Bowen observou, eles se tornaram mais produtivos como terapeu- tas em cornparag50 Bqueles que n5o haviam trabalhado as pr6prias questdes. Nos cursos de formagso de terapeutas fa- miliares no Brasil, esse t um quesito obrigat6- rio no process0 formador, que t feito em mo- mentos especiais em que a familia de origem do terapeuta t trabalhada por intermkdio de ttcnicas pr6prias desenvolvidas para esse fim. N5o se trata de uma terapia familiar do tera- peuta, mas de um trabalho de autoconheci- mento da sua familia e questdes relativas a ela. A abordagem de Bowen leva o nome de intergeracional, dada a grande ihfase que d i Bs transmiss6es e repeti~des que ocorrem nas geraq6es familiares, ainda que de formas dife- rentes. Uma das tkcnicas por ele desenvolvi- das para melhor coletar e compseender dados importantes relacionados ao sistema familiar PSICOTERAPIAS I Terapia familiar sistemica multigeracional foi o que ele primeiramente denominou diagrama da familia, mais tarde chamado degenograma. Este t uma represen- taqio grifica multigeracional que vai altm da genealogia da familia; inclui relaqses, aconte- cimentos, vinculos e padr6es familiares. Seus simbolos sio sistematizados e facilmente compreensiveis para os terapeutas de familia de qualquer parte do mundo, ESTRESSE NECESSARIO Ji Whitaker, criador da terapia experien- cia1 da familia, desenvolveu seu trabalho com base na convic+o de que os preconceitos, o mod0 de viver e os valores dos terapeutas si0 elementos-chave na escolha dos objetivos e da estratkgia terapCutica. No seu entender, as pessoas com problemas psicol6gicos estio alienadas de suas emoqdes e congeladas em rotinas desvitalizadas. Sua abordagem, radical e provocativa, t uma mistura de apoio cordial e rasteira emocional imprevisivel, buscando fazer com que as pessoas entrem em contato com sua experitncia imediata. Para ele, o estresse na terapia t necessirio para que haja mudanqa; por isso o seu jeito confrontativo, criador de tens6es. Whitaker costumava dizer que ni0 tinha estrattgia para seu trabalho e que sua terapia era dirigida pel0 seu inconsciente. To- das as suas interven~des visavam maior flexi- bilidade e mudanqa. Ele foi urn dos prirneiros terapeutas a tlsar a coterapia para o atendimento fimhar, acreditando ser fundamental esse trabalho conjunto para que os terapeutas pudessem atuar com rnais esponta- neidade, sern medo de uma mntramferCncia. A partir de 1946, juntamente com outros terapeutas farniliares, Whitaker comeqou a ministrar conferencias duas vezes por ano, durante as quais os terapeutas observavam os atendimentos uns dos outros com as familias e depois discutiam os trabalhos. Em 1953, convidou vhios terapeutas para demonstrar as respectivas abordagens corn a mesma fami- lia enquanto os outros observavam a atuaqao, Essas observap5es eram sempre realizadas por intermCdio de espelhos unidirecionais, uma das caracteristicas atC hoje presentes na format$o de terapeutas farniliares, na qua1 se mostra concretamente o trabalho que k feito nas sess6es de terapia. 0 s terapeutas familia- res exibem abertamente seus atendimentos tanto para ensino quanto para crescimento e desenvolvimento pessoal. ESCOLA ESTRUTURAL Minuchin, fundador da Escola Estrutural de Terapia Familiai e dono de uma perso- nalidade carismitica, esd entre aqueles que combinam o rigor te6rico corn uma notbe1 maestria dinica. Argentino de nascimento, emigrou para os Estados Unidos ap6s uma breve estada em Israel. Inicialrnente viveu em Nova York, transferindo-se depois para Fila- dtlfia, onde pvsou n dirigir n ~hi lade l~h ia Child Guidance Clinic. Uma de suas primeiras reaiza~ijes marcan- tes foi treinar membros da comunidade negra local como terapeutas familiares'paraprofissio- PSICOTERAPIAS 1 Terapia familiar sistihica nais" para prestarem primeiros socorros emo- cionais, sensibihzando as pessoas para fazerem psicoterapia em chicas do govern0 ou outras institui~6es. Isso porque a aceitqio de pessoas de fora dessa cultura e comunidade (brancos, de classe mtdia) era muito dificil, e eles preci- savam ser acessados a fim de receber os atendi- mentos de satide mental n e c ~ o s , Como caracteristica de sua forma de trei- nar terapeutas familiares esti a experihcia pritica direta, o uso constante da grava~iio das sessBes de terapia e a s u p e d o ao vivo. Esta ocorria conjuntamente corn o atendimento, da seguinte forma: o supervisor e uma equi- pe de alunos em forrnaeo assistiam B sess5o na sala de espelho unidirecional e a interrom- piam para orientar o terapeuta e redirecionar o atendimento quando necessirio. Em vez de aprenderem depois, os terapeutas o faziam na prAtica, durante a terapia. Minuchin v4 a fknilia como urn sistema complexo formado por subsistemas de uma ou mais pessoas que se agrupam por geraqso, sexo, interesse ou fungo. Assirn cada urn pode pertencer a mais de urn subsistema conforme os papkis que desempenha; pot exemplo, con- jugal (marido e mulher); parental (pai e miie); fiaterno (irmsos); de mulheres. Um nSo exclui o outro e tem tarefas distintas a curnprir. 0 s subsistemas s50 demarcados por fi-ontei- ras que estabelecem as regras que definem quem participa e como. Elas protegem a diferenciaq20 do sistema. As fi-onteiras podem ser rigidas, flexiveis ou difusas (perm&veis dernais). Nos extremos de fgmilias com quest6es de fiontei- ras temos as aglutinudas ou emaranhadas, nas quais a interaqso entre os membros t intensa: A Escola Estruturalv@ a familia como urn sistema complexo, corn subsistemas que se agrupam h i grande proximidade entre eles, mas falta di- ferencia+o. G o famoso "um por todos e todos por um", Nesse caso, nio existe privacidade ou individualidade, As fi-onteiras e os limites siio fi-acos, e todos os invadem. 0 problema de um k o de todos; no namoro da filha, por exemplo, todos "narnoram': e assim por diante. No outro extremo temos as familias desliga- das, em que n50 h i conexties fortes entre seus membros. Eles se relacionam muito pouco en- tre si, o famoso "salve-se quem puder". As fron- teiras-limite slo muito rigidas, ningukm sabe de ningukm, e muitas vezes os mernbros familiares s50 at6 vistos como inimigos. Ao longo do tempo, a familia elabora mo- dos de se relacionar por intermtdio de regras de funcionamento que, se repetidas, se transfor- mam nos padr6es de transaq20 que v2o formar sua estrutura. Muitas vezes essas regras nio siio explicitadas, existindo uma dinimica interna que leva aos acordos, os quais siio reconhecidos em algum nivel pela familia e funcionam como poderosos condutores de comportamento, PSICOTERAPIAS I Terapia familiar s is th ica Por exemplo, quando um filho quer di- nheiro para sair, ele sabe a quem deve pedir para conseguir, se para o pai ou a m%e, e isso sem nenhuma combinagso prdvia. Ou ent5o no que se refere aos lugares onde os mem- bros se sentam B mesa; cada um tem o seu, e, quando recebem uma visita, ela em geral nso toma o lugar do pai ou da mie. A terapia estrutural busca atingir o indivi- duo, mas tambdm a familia; reconhece a hrga do passado e o poder do presente. A fimilia saudivel tem uma estrutura flexivel que se ajus- ta as novas exigsncias B medida que seus mem- bros passam pelos diferentes estAgios de desen- volvimento dentro da familia (ciclo vital), com tarefas e necessidades pr6prias de cada fase. OUTRAS VERTENTES ' Outro tip0 de terapia familiar sisttmica d a contextual, desenvolvida por Boszormenyi- Nagy, a qua1 inclui o conceito de lealdades invisiveis, justiqa, equidade e equilibria, que cruzam gera~bes, 0 psiquiatra de origem hlingara analisava as consequ&ncias para os membros da familia em decorr&ncia das aq6es de um deles e como elas fluiam de pessoa a pessoa, bem como de gerag%o a geraqao. Como outros nomes da Area, ele de ini- cio trabalhou com pacientes esquizofrtnicos, frequentemente solicitando o compareci- mento, nas sessbes, dos av6s do paciente, de seus pais, irmsos e filhos. Ele acreditava que, trabalhando para balancear as lealdades e obrigagbes tticas entre os membros da fami- lia, conseguiria diminuir os sintomas, se n5o cud-10s. A marca de seu trabalho terapiuti- co foi a dimensgo ttica dos relacionamentos - confianqa, lealdade, justi~a -, que colocava no centro do process0 teraphtico. Andolfi, por sua vez, prop6e que na tera- pia seja feito urn movirnento de ir e vir entre a hist6ria individual de cada membro da fami- ha, suas vivhcias emotivas, quest6es pessoais e o sistema familiar. 0 psiquiatra italiano estagiou e ensinou nos mais renornados centros de terapia familiar dos Estados Unidos. Estudou com Minuchin, Haley e Albert Scheflen, tendo sido fortemen- te influenciado por Carl Whitaker. De volta i Itilia fundou, altm de seu centro formador de terapeutas, a Sociedade Italiana de Terapia Fa- miliar e a revista Terapia Familiare. Segundo ele, o papel do terapeuta 6 ajudar a familia a encontrar seus pr6prios recursos de salide. Em seu trabalho usa muito de pro- vocag6es, urn conceito que para ele significa um comportamento intencional de desafio ao sistema familiar corn o objetivo de mudar suas regras de comportamento. Independenternente das diversas aborda- gens, os terapeutas farniliares da linha sist&- mica trabalham corn uma sdrie de premissas e conceitos bisicos nos atendimentos As fami- lias e casais. Entre eles esti a ideia de que as pessoas siio produto de seu context0 social; assim, qualquer tentativa de compreendC-las precisa incluir o conhecimento sobre suas fa- milias. Mais do que as forgas internas, enten- PSICOTERAPIAS I Terapia familiar sistlmica de-se que s90 as interaqdes com a familia e seu ambiente que pariicipam mais fortemen- te do desenvolvimento da. personalidade. Diante disso, para efetivamente alcan~ar a mudanqa de uma pessoa, a melhor maneira t al- terar suas interallies farniliares. Por essa razio, rehe-se a farnilia toda e assim se trabalha com ela. Mesmo que nern todos os mernbros estejam presentes na sessiio, as interven$6es, perguntas e atividades s20 sempre feitas de mod0 que as interaqbes farniliares sejarn afetadas. Outra no950 importante k que muitos sin- tomas servem a uma f u n ~ f o no h b i t o fami- liar. Ou seja, parte-se do pressuposto de que os problemas de um dos membros da familia podem ser funcionais para o sisterna familiar, sendo mais bem compreenddos quanto vis- tos no contexto. A quest50 da circularidade k outro pon- to relevante. A partir desse conceito, os tera- peutas de familia pensarn os problemas e a psicopatologia como parte de sequzncias de comportamentos continuos e circulares. Tomando como base a ideia de padr6es mul- tigeracionais, os terapeutas entendem que os problemas niio surgem unicarnente nas intera- q6es atuais, mas se desenvolvem durante muitas geraqdes. A u&@o do genograma colabora para detectar padr6es multigeraaonais e ajudar a familia a compreender seus problemas de uma perspectiva longitudinal, o que acaba reduzindo a responsabilidade e a culpa que ela sente. Quando farnilia e terapeuta examinam jun- tos sua histdria, muitas vezes descobrem segre- dos, traumas, repeti@es e crises ocomdos no passado (is vezes muitas geraq6es atris) que elucidam fatos e experidncias atuais. Outro ponto que merece atengio t o ciclo de vida familiar. As familias se desenvolvem A medida que entram e saem de diferentes esti- gios vitais. A incapacidade dela de ultrapassar com sucesso urn deles pode deflagrar tipos de sequkncias circulares que eventualmente con- duzem a problemas. Nesse caso, em vez de vC-la como defeituosa, essa perspectiva cicli- ca nos permite reconhecs-la como paralisada em determinada etapa, A descriqiio das fases do ciclo vital surgiram naturalmente da necessidade dos que traba- lhavam com terapia familiar de entender o que acontecia na dinlmica das fimilias que aten- diarn e n50 permitia que elas fizessem a passa- gem de urn ciclo para outro de forma natural. Betty Carter e Monica McGoldrick, te- rapeutas de familia que estudaram e desen- volveram muito de seus trabalhos orientadas por Bowen e sua teoria, examinam o ciclo de vida familiar sob t r b aspectos: (1) estigios prediziveis do desenvolvimen- to familiar normal na tradicional classe mtdia americana, e as disputas clinicas quando as familias tCm problemas para negociar essas transa~6es; (2) padr6es do ciclo de vida familiar em transforma+o na nossa kpoca e mudangas naquilo que t considerado normal; (3) em fungiio disso, do ponto de vista cli- nico, a terapia deve ajudar as familias que descarrilaram no ciclo de vida a voltar h sua trilha de desenvolvimento. Altm desses aspectos, os ciclos de vida fa- miliar dividem-se em etapas: saindo de casa - jovens solteiros; uniao de familias no casa- mento: o novo casal; familias com filhos pe- PSICOTERAPIAS I Terapia familiar s is th ica quenos; familias com adolescentes; lanqando os filhos e seguindo em frente; e familias no est6gio tardio da vida. Essa divisso k a mais utilizada mundialmente na terapia familiar. No Brasil, percebemos que as familias niio funcionam no que diz respeito i s fases exa- tamente como as americanas; assim, Ceneide Cervenyprofessora e pesquisadora na Pon- tificia Universidade Cat6lica de SSo Paulo (PUC/SP) e do Nticleo de Familia e Comuni- dade (Nufac/SP), pesquisou as de classe mC- dia paulistana e propas, para a nossa realidade, a divisiio em quatro fases: aquisiq?io; adoles- cente; madura e tiltima - cada uma delas in- termediada por etapas de transiqiio, incluindo ai familias que fogem B regra. Ao percorrermos com a familia os virios contextos que englobam as etapas de seu ciclo de vida, temos um meio eficaz para conhecc-la e ajudi-la. APRENDIZADO PARA A VlDA A maior parte das familias chega ao con- sult6rio procurando ajuda para um de seus membros. Diante do terapeuta de visa0 sis- &mica, porkm, d m a chance de compreender que o problema abrange mais do que uma pes- soa apenas. Como todos os familiares estao de certa forma envolvidos, podem explorar juntos como se relacionam e de que maneira se co- municam, e tambtm perceber de que forma os comportamentos e atitudes se relacionam com o que acontece com a sua familia. Alkm disso, aprendem maneiras de mudar comportamen- tos e formas de perceber os outros, bem como t&m a oportunidade de tomar contato com re- cursos que possuem e podem utilizar niio s6 na resolu@o da quescio at& como tambkm em futuras situaq6es familiares. As terapias farniliares n2o se prophem ser um process0 longo, uma vez que o ob- jetivo k focal, tendo em vista a resoluqio de problemas. Certarnente h i outros aspectos a levantar e trabalhar tambkm na terapia, mas os terapeutas creem que as familias, ao se co- nhecer mais, descobrir suas capacidades e re- cursos pr6prios, seriio capazes de fortalecer- se e assim estar preparadas para continuar seu caminho e resolver muitas de pr6ximas crises e problemas. autora CLAUDIA BRUSCAGIN e psichga clinica, psicoterapeu- ta de casais e fanSa. Mestre e doutora em psicologia clinica pela Pontificia Llniversidade Cat6lica (PUC-SP), e professora e supenfisora do curso de especializa- CBO em Terapia de Cabal e Farnflia do Nircleo Famflia e Cornunidade (Nufac), da WC-Cogeae, e pesquisadora nas areas de famlia, psicoterapia e religiosidade e re- siligncia. A autora agradece a Lana Harari e Ana V. L. R. Dias as sugesths dadas ao texto. PSICOTERAPIAS I Terapia familiar sistlmica r a conhec A cura da famla. S. Minuchin. Artes ' Medicas, 1999. A familia como modelo: desconstruindo a patologia. C. M. 0. Cerveny. Psy, 1994. A pragmhtica da comunicafio. P. Watzlawick. Cultrix, 1999. Atendimento sist5mico de familias e redes sociais (vol. 2, tomos I e Ill. J. Aun Gontijo, M. J. Esteves de Vasconcelos e S. V. Coelho. Ophicina de Arte&Prosa, 2007. Familia e ciclo vital: nossa realidade em pesquisa. C. M. 0. Cerveny, C. M. Berthoud e colaboradores. Casa do Psic6log0, 1997. Familia: funcionamento e tratamento. S. Minuchin. Artes Medicas, 1998. Gritos e sussums, intern e ressonhcias: trabalhando com casais (vols. 1 e 2). S. Fedulo Colombo. Vetor, 2006. Manual de terapia familiar. L. C. Osorio e M. E. Pascual do Valle. MMed, 2008. 0 ponto de mutaq8o. F. Capra. Cultrix, 1995. Papai, mamse, vocl ... E eu? CmersaqBes terap6uticas em lamilias com crianqas. H. Maffei Cruz. Casa do Psicologo, 2000. Por t r is da mkcara familiar. M. 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