Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
A revolução do conhecimento chega às escolas brasileiras A hora de mudar é agora Já vínhamos pensando na reforma do ensino médio desde o início do governo. Ela é extremamente importante para o país. Não para hoje, este ano, mas para o futuro. Sabíamos, entretanto, que primeiro teríamos que enfrentar o desafio do ensino fundamental. E isso já foi feito, embora os resultados ainda não tenham sido plenamente atingidos. Nós sabemos que, em se tratando de educa- ção, os resultados demoram a aparecer. Mas, sem dúvida, o ensino fundamental já tem o seu rumo. Daqui a quatro ou cinco anos, a questão da qualidade do ensino fundamental será uma página vira- da na história da educação brasileira. Agora, começamos a enfrentar o problema do ensino médio. Problema que já se manifesta com a explosão das matrículas. Te- mos quase sete milhões de alunos matriculados no 2º grau e observamos que os jovens querem cursá-lo não apenas como uma transição para a faculdade, mas como preparação para o mercado de trabalho. Na pesquisa que fizemos ano passado com cerca de 430 mil alunos que estavam concluindo o 2º grau, verificamos que a grande maioria deles queria algo mais do que simplesmente ingressar na faculdade. Apenas 38% pretendiam seguir para a Universidade. Por isso, o 2º grau passou a ser algo extremamente importante. Eu diria até crucial, neste momento. No próximo governo, a questão do ensino médio deverá ser a maior preocupação do Ministério da Educação e do Desporto, em razão da grande demanda, tanto em termos de qualidade como de quantidade de vagas. Por isso, a reforma que começamos a im- plantar vem a tempo, no momento oportuno. Na verdade, nós nos antecipamos aos problemas ao aprovar essas mudanças. Tenho participado de vários fóruns internacionais e posso asse- gurar que a reforma em curso está sendo vista lá fora, por organis- mos como a Unesco e o Banco Mundial, como uma das mais avan- çadas, mais importantes, mais inovadoras de todo o mundo. As mudanças propostas flexibilizam o sistema, definem um conteúdo central – que são as competências básicas que o aluno deve ter e que correspondem a 75% da carga horária – mas também abrem novas possibilidades para os jovens. Cada aluno vai procurar no 2º grau desenvolver as habilidades, as competências para as quais tem mais aptidão. Se quiser fazer o vestibular, poderá se aprofundar nas áreas acadêmicas; se desejar ir para o mercado de trabalho, Paulo Renato Souza Ministro da Educação e do Desporto ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ “Essa reforma deve contribuir decisivamente para a diminuição das desigualdades e a formação de um novo cidadão, mais consciente de seus direitos e obrigações.” terá a possibilidade de começar uma pré- profissionalização; se tiver veia artística, po- derá cursar algumas matérias que contarão para o 2º grau e já servirão para seu aperfei- çoamento na área das artes. Além disso, o ensino médio que agora definimos se encaixa perfeitamente com a reforma efetuada no ensino técnico. Te- mos, então, uma área totalmente nova na educação brasileira, que é a área do novo 2º grau e do ensino técnico. O novo ensino médio vai ser a grande resposta para os jovens que querem a profissionalização. Já para as famílias, a grande demanda está voltada para o ensino profissionalizante, que precisa dar ao jovem alguma pre- paração para enfrentar o mundo lá fora. É isso que estamos alcançando com esta reforma. Nós não vamos fazer a reforma e deixar o problema para os estados. O governo tem consciência de que precisa fazer o mesmo que foi feito em relação ao 1º grau. Não vamos executar diretamente as políticas, mas exercer um papel de liderança nas mudan- ças do ensino médio. Por isso, já definimos com o Banco Interamericano de Desenvolvimento uma linha de crédito de 2,5 bilhões de dólares para os próximos cinco anos, além da contrapartida brasileira no mesmo valor. Dessa forma, poderemos ter um investi- mento de cinco bilhões de dólares no 2º grau em prédios, carteiras, laboratórios, bi- bliotecas, recursos de informática. Enfim, são recursos para que a reforma transfor- me o ensino médio numa preparação im- portante para os nossos jovens. Tenho certeza de que a reforma, apoia- da por esses recursos adicionais, poderá contribuir decisivamente para uma mudan- ça significativa do nosso país, para a dimi- nuição das desigualdades e a formação de um novo cidadão, mais consciente de seus direitos e obrigações. Este novo ensino médio contribuirá, certamente, para a afir- mação do nosso país como uma grande nação já no próximo século. Essa é a linha mestra da reforma que o Ministério da Educação e do Desporto quer ver implantada nas escolas de ensino médio – o antigo 2º grau. A Resolução que institui as diretrizes curriculares nacionais para o ensino médio foi aprovada pela Câmara de Educação Básica do Conselho Nacional de Educação no dia 1º de junho e, a partir do próximo ano letivo, depois que os Conse- lhos Estaduais baixarem as normas comple- mentares, cada escola poderá elaborar seu próprio currículo e definir suas estratégias de educação. Identidade. A mudança no ensino médio mostra-se urgente. Desde que o ves- tibular tornou-se o único e massacrante mé- todo de ingresso no nível superior, o 2º grau passou a ter um conteúdo definido a partir daquela prova. Considera-se boa escola, então, aquela que for- nece a maior quantidade de in- formações, mesmo que não sejam importantes para o futuro curso ou vida profissional do estu- dante. Mas as informações chegam cada vez mais rapidamente e em maior quantidade aos jovens, independentemente da escola, e o objetivo dos três últimos anos de ensino básico não pode mais ser o mesmo: “É pre- ciso dar identidade própria ao antigo 2º grau para que ele deixe de fazer o papel de do- bradiça entre o 1º grau e o ensino supe- rior”, afirma o secretário de Educação Mé- dia e Tecnológica do MEC, Ruy Leite Berger Filho. O que se quer é um ensino médio signi- Pensamento cr e cidadania Em vez de fórmulas decoradas, a compreensão do que é ensinado e a possibilidade de usar o aprendizado na vida prática. No lugar de uma escola que se limita a ensinar o aluno a fazer provas, outra que estimule a sua vontade de aprender, o seu espírito crítico, a sua capacidade de resolver problemas – enfim, que lhe indique o caminho para se tornar uma pessoa apta a exercer sua cidadania e a participar do mundo do trabalho. ficativamente diferente do atual, com mu- danças de concepções, valores e práticas. Trata-se de uma reforma que tem data para começar, mas não para ser concluída, e que não pretende simplesmente substituir um modelo por outro, pronto e acabado. “É preciso perder o formalismo e pas- sar a ter conteúdo, de maneira que o aluno tenha condições de desenvolver o pensamen- to abstrato, crítico. A idéia é ter uma diver- sificação no processo para chegar a resulta- dos comuns, que são um conjunto de habi- lidades e conhecimentos indispensáveis a todo aquele que termina a Educação Básica, da qual o ensino médio faz parte. Esse con- junto de competências tem por objetivo a melhor inserção no mundo como cidadão e a preparação básica para o trabalho”, expli- ca Ruy Berger. A preparação para o trabalho mencio- nada por Berger nada tem a ver com o an- tigo ensino profissionalizante, não queren- do dizer preparação para o exercício de pro- fissões específicas ou para a ocupação de postos de trabalho determinados. Antes, significa a compreensão dos processos pro- dutivos enquanto aplicações das ciências em todos os conteúdos curriculares. Segun- do o secretário, “o cidadão de hoje tem de estar instrumentalizado para compreender as novas tecno- logias, e por isso é funda- mental que os conteú- dos do ensino médio sejam contextualizados.Não se pode trabalhar as questões de física, por exemplo, sem se fazer referência ao pro- cesso produtivo. Quando um aluno apren- de movimento, velocidade e outras noções da física mecânica, tem de fazer a transpo- sição para a vida real, de modo a entender o que se passa com um carro em velocida- de que atinge um obstáculo fixo, como um poste, por exemplo.” Pretende-se educar pessoas de forma a torná-las mais aptas a assimilar mudanças, mais autônomas em suas escolhas, seres que respeitem as diferenças e superem a segmentação social. Como afirma a con- selheira Guiomar Namo de Mello em seu parecer aprovado pela CEB/CNE, “diante da fragmentação gerada pela quantidade e velocidade da informação, é para a educa- ção que se voltam as esperanças de preser- var a integridade pessoal e estimular a soli- dariedade”. Por isso, espera-se que a escola contribua para a constituição de uma cidadania de qualidade nova. Aumento de matrículas. Existe um outro fator que indica a necessidade de mudanças. Embora no Brasil somente 25% dos adolescentes de 15 a 18 anos fre- qüentem o ensino médio, as matrículas nesse nível vêm aumentando significativamente, tanto por jovens que terminam o antigo 1º grau mais cedo como por aqueles que já es- tão no mercado de trabalho, mas que pre- tendem melhorar sua situação profissional. O resultado é que a clientela do ensino médio está ficando cada vez mais hete- rogênea, o que torna impossível atendê-la bem com um currículo único e fechado. Além disso, já é tempo de acabar com aque- la dualidade há muito praticada no Brasil, segundo a qual adolescentes de classe mé- dia e alta podem cursar um ensino médio do tipo acadêmico, enquanto aqueles mais pobres vêem-se direcionados para o ensino médio profissionalizante, de forma a ocu- par uma profissão técnica no mercado de trabalho. O ensino precisa perder seu caráter enciclopédico. A memória deve ser menos trabalhada do que o raciocínio. rítico A teoria na prática. Os quinze artigos da Reso- lução da Câmara de Educação Básica do Conselho Nacional de Educação que estabelece as diretrizes para um novo en- sino médio no país definem, também, os princípios pedagó- gicos a partir dos quais os novos currículos serão es- truturados: identidade, diversidade e autonomia, inter- disciplinaridade e contextualização. O conhecimento precisa ser contextualizado, porque esse é o recurso que a escola tem para tirar o aluno da condição de espectador passivo. Não basta ao aluno conhecer o fun- cionamento dos aparelhos do organismo humano. Ele pre- cisa entender como funciona seu próprio corpo e que conseqüências têm atitudes práticas que adota em seu dia- a-dia – como fazer dieta, fumar ou exercer sua sexualidade. A conselheira Guiomar Namo de Mello cita exemplos da con- textualização pretendida: o jovem do novo ensino médio que surfa nas ondas deverá saber relacionar seu equilíbrio e seus movimentos às leis da física. Ou entender como funciona um telefone celular, ou ainda saber estabelecer a relação entre o tamanho de um ambi- ente e a potência em “BTUs” do aparelho de ar condicionado que deve comprar. Enfim, saber exercer a cidadania a partir do seu círculo de convivência cotidiana. O outro eixo norteador – a interdisciplinaridade – pretende fa- zer o aluno entender que conhecimento não é algo estanque e só o estabelecimento de padrões torna possível a convivência social. Como explica Ruy Berger: “Podemos começar na área de ciências sociais, com os conceitos de grupo social, de blocos regionais e outros, até bater na matemática, com suas medidas padronizadas, e na língua portuguesa, com as regras de ortografia. Fica mais fácil para o aluno estudar se ele entender que a relação social precisa de um código de normas convencionadas.” A partir desses dois princípios estruturadores do currículo – interdisciplinaridade e contextualização – será possível vincular a educação ao mundo do trabalho e à prática social, de maneira que o aluno seja capaz de continuar aprendendo, de ter autonomia in- telectual e pensamento crítico e de compreender os fundamentos científicos e tecnológicos dos processos produtivos. Para que o aluno aprenda a pensar e a relacionar o conheci- mento com dados da experiência cotidiana, o currículo precisa, em primeiro lugar, perder seu caráter enciclopédico e congestionado de informações. Os conteúdos devem ser entendidos como meios para constituição de competências e valores e não como objetivos do ensino em si mesmos. A memória deve ser menos trabalhada do que o raciocínio. O conhecimento deve ser “experimentado” pelo aluno, e não apenas recebido por ele. Durante o curso, o aluno deve adquirir abertura e sensibilidade para identificar as relações que existem entre os conteúdos do ensino e das situações de apren- dizagem com os contextos de vida social e pessoal, de modo a estabelecer uma relação ativa entre o aluno e o objeto do conhecimen- to Em resumo: o ensino médio de- verá ser capaz de constituir compe- tências, habilidades e disposições de condutas e não de simplesmente entupir o aluno de informação. Autonomia. Para o desem- penho dessas novas funções, as es- colas não vão receber um currículo pronto, com as matérias obrigató- rias e os conteúdos necessários. Aliás, as escolas não vão nem mesmo preci- sar ministrar as disciplinas como as que co- nhecemos hoje. Língua portuguesa, mate- mática, geografia ou história, biologia, quí- mica e física poderão nem existir com esses nomes. Depois que os órgãos estaduais res- ponsáveis normatizarem as políticas de apoio à implementação dos novos currículos de ensino médio, os centros de ensino deverão ser estimulados a exercer uma autonomia responsável e desenvolver seu próprio currículo.O trabalho das escolas será o de trocar a padronização de baixa qualidade por uma diversificação de bom nível, que tire de cena o ensino enciclopedista e aca- demicista dos currículos tradicionais, hoje reféns do vestibular, como define a con- selheira Guiomar Namo de Mello, e privile- gie a capacidade de aprender. De acordo com a Resolução que esta- belece as diretrizes do novo ensino médio, o currículo deve ser dividido em duas par- tes: uma base nacional comum e uma parte diversificada. A base nacional comum de- verá ocupar pelo menos 75% do tempo le- galmente estabelecido como carga horária mínima daquele nível de ensino, que é de 2.400 horas distribuídas em três anos, sen- do cada ano letivo de 800 horas e 200 dias. Essa base comum será organizada em três áreas do conhecimento. A primeira é a de linguagens, códigos e suas tecnologias. A segunda, ciências da natureza, matemáti- ca e suas tecnologias. E a terceira, ciências humanas e suas tecnologias. Cada uma des- Secretário Ruy Leite Berger Filho: “Os processos de seleção para o ensino superior devem ser revistos”. sas áreas de conhecimento deve levar o alu- no a um tipo de competência. Ao estudar linguagens, códigos e suas tecnologias, o aluno deverá ser capaz de compreender e usar os sistemas simbólicos das diferentes linguagens, confrontar opi- niões e pontos de vista, analisar e interpre- tar textos. Nessa área estão agrupadas as diferentes formas de expressão, entre as quais, em primeiro lugar, aparece a língua portuguesa. Também estão incluídas as lín- guas estrangeiras – pelo menos uma é obri- gatória –, as artes, as atividades físicas, a informática e qualquer outra linguagem, seja ela visual, sonora ou de outra natureza. “A educação física é uma manifestação corpo- ral, o que significa que é essencialmente uma linguagem. Afinal, o que é um jogo senão um texto?” – argumenta Ruy Berger. Na área das ciências da natureza e ma- temática estão incluídos os conhecimentos relacionados à física, química, biologia e matemática. Não se trata de matérias ou de disciplinas com aquelas denominações, masde competências relacionadas à apropria- ção de conhecimentos daquelas áreas. Nes- se sentido, o aluno deve ser levado a com- preender as ciências como construções hu- manas, entender a relação entre o desen- volvimento das ciências naturais e o desen- volvimento tecnológico e associar as dife- rentes tecnologias ao problemas, solucio- nando-os. O aluno precisa ainda entender o impacto das tecnologias na sua vida pessoal, nos processos de pro- dução, no desenvolvimento do conhecimento e na vida social. A matemática deixa de ser uma disciplina estudada isolada- mente e o estudante deve compreender conceitos, procedi- mentos e estraté- gias matemáticas para aplicá-los a situações diver- sas no contexto das ciências, da tecnologia e das atividades cotidianas. Na área de ciências huma- nas, destacam-se as competên- cias relacionadas ao conhecimen- to da sociedade e da cultura, da his- tória, geografia, sociologia, antropo- logia, psicologia, direito, filosofia e socio- logia. Nessa área, o aluno deve compreen- der a sociedade, sua formação e transfor- mações, bem como traduzir os conhecimen- tos sobre a pessoa, a sociedade, a econo- mia e as práticas sociais e culturais de for- ma pessoal. A proposta pedagógica da escola esta- belecerá a proporção de cada área dentro do currículo, os conteúdos a serem incluí- dos em cada uma delas – o que será feito a partir das competências a serem atingidas, já descritas pelo Conselho Nacional de Edu- cação – e os conteúdos e competências a serem incluídos na parte diversificada. A parte diversificada, que deverá ocu- par os restantes 25% do tempo de ensino, será definida pela escola a partir das ca- 7racterísticas regionais e locais da socieda- de, da cultura, da economia e dos próprios alunos, que poderão escolher disciplinas de que gostem ou que tenham a ver com seu futuro profissional. Escolhendo, sempre que possível, os estudos, projetos, cursos ou O conhecimento deve ser “experimentado” pelo aluno, e não apenas recebido por ele. atividades da parte diversificada, o alunos terão um papel impor- tante na construção dos seus próprios currículos. Qualquer que seja a parte diversificada, ela terá de ser organicamente integrada à base nacional comum para que o currículo faça sentido. Seu desen- volvimento poderá ser feito por meio de projetos e estudos focaliza- dos em problemas selecionados pela equipe escolar. A identidade de cada escola dependerá, basicamente, dessa parte diversificada. É importante notar, segundo Ruy Berger, que a divisão curricular em base nacional comum e parte diversificada não tem relação direta com as outras duas premissas do novo ensino médio, que são a formação geral e a preparação básica para o trabalho. Base comum não quer dizer formação geral, nem parte diversificada significa preparação para o trabalho. Como dispõe a Resolução, “não haverá dissociação entre a formação geral e a preparação básica para o trabalho, nem esta última se confundirá com a for- mação profissional”. A Resolução estabelece, também, que “a pre- paração básica para o trabalho deverá estar presente tanto na base nacional comum como na parte diversificada”. Profissionalização. As escolas poderão preparar os alu- nos para o exercício de profissões técnicas porque o novo ensino prevê essa possibilidade, mas isso não significa que, pelo fato de oferecerem profissionalização, elas estejam cumprindo o preceito de preparar o estudante para o trabalho. Habilitação profissional difere do conceito de preparação geral para o trabalho, já que este último abarca noções gerais sobre o papel e o valor do trabalho, os produtos do trabalho, as condições de produção e muitas outras. A habilitação para o exercício de profissões técnicas, ao contrá- rio da preparação geral para o trabalho, pode variar em duração, mas deverá ser desenvolvida paralela ou seqüencialmente ao ensino médio, tendo organização curricular própria e independente. Os diferentes cursos profissionalizantes poderão ter duração variável, segundo o perfil do profissional a ser habilitado, mas serão, sem- pre, realizados em carga horária adicional às 2.400 mínimas pre- vistas para o ensino médio. Se a preparação para o trabalho incluir estudos que também forem necessários para a habilitação pro- fissional, eles poderão ser aproveitados em cursos ou programas de formação profissionalizante, até o limite de 25% da carga horária total para eventual habilitação. Em termos práticos, o que o Conselho Nacional de Educação aprovou foi um “currículo proposto”, já que o desenvolvimento curricular real será feito pela escola. Entre esse currículo proposto e o ensino na sala de aula estão as instâncias normativas e executi- vas estaduais, que ainda vão se pronunciar sobre o assunto. Em seu trabalho, os órgãos estaduais deverão levar em conta os dois eixos norteadores – o da flexibilidade, que reconhece a autonomia dos estabelecimentos escolares na definição de sua proposta pedagó- gica, e o da avaliação, em torno do qual se articulam os proces- sos de monitoramento de resultados e co- ordenação. Avaliação. Segundo o secretário Ruy Berger, a existência de um bom sistema de avaliação é a contrapartida da flexibilidade das escolas. “Cada escola vai ter de defi- nir como trabalhará as três áreas de co- nhecimento. Se uma delas fugir muito das diretrizes, os resultados vão mostrar que ela não está dando conta de uma ou de outra área e será possível corrigir os rumos”, justifica. No contexto da avaliação está o Exame Nacional de Ensino Médio, optativo para o aluno do último ano. “O ENEM, realizado uma vez por ano, dará referências so- bre o estudante em relação às competências e poderá servir para que as Universidades selecionem seus novos alu- nos, bem como para a admissão em curso técnico ou como elemento de seleção para o mercado de trabalho”, explica Berger. Além disso, os estados vão ter de insti- tuir sistemas de avaliação e de prestação de contas e os resultados de cada escola serão divulgados ao público. “Nossa cultura é es- sencialmente cartorial, mas, como hoje é impossível controlar tudo, não podemos fi- car presos a um sistema burocrático”, afir- ma Berger. Ele confia que a qualidade do ensino será garantida pela publicidade da avaliação. “Certamente uma escola que pre- za seu nome não vai querer aparecer com resultados ruins”, argumenta. O sucesso do novo ensino médio de- penderá, em parte, do comportamento das Universidades e de outras instituições de en- sino superior, não apenas como nível edu- cacional que recebe os alunos egressos do ensino médio – e como tal influenciam a realidade daquele nível de ensino – mas como pelo fato de serem responsáveis pela formação dos professores. Os processos de seleção de alunos para o ensino superior devem, pois, ser revistos, segundo Berger. A formação dos professores para o en- sino médio, por sua vez, foi apontada em várias pesquisas realizadas pelo MEC como a maior dificuldade para a imple- mentação das novas diretrizes curricu- lares, mais importante até que a falta de recursos financeiros. Berger reconhece que a formação dos professores não é a mais adequada, mas afirma: muito do que eles fazem ou deixam de fazer acontece em função das exi- gências feitas pela escola. “São todos professores de nível superior, o que certa- mente facilitará a mudança”, espera o secretário. Em sua opinião, a grande dificuldade está na elaboração de material didático que corresponda às novas expectativas. O material usado atualmente, embora sem os graves proble- mas encontrados no 1º grau, foi modela- do pelo vestibular. O MEC pretende apoiar o desenvolvimento de material di- dático adequado ao novo ensino médio. Para isso, realizará concursos e financiará a execução de projetos que considerar in- teressantes. Haverá recursos especiais pa- ra as escolascomprarem novo material. “Mais sério do que o problema do ma- terial físico, só mesmo a falta de costume de cada escola pensar seu próprio aspecto pedagógico, já que sempre disseram a elas o que fazer e como fazer”, afirma Berger. Daí a importância de um bom sistema de difusão da reforma e de seu significado, para que a idéia seja comprada por todos os envolvidos e saia, efetivamente, do papel. Tudo para que os alunos concluam o novo ensino médio sem terem decora- do fórmulas cujo sentido escapa à com- preensão da maioria deles, mas revelan- do habilidades e competências que, hoje, estão muito longe de atingir. O ensino médio não pode mais fazer o papel de dobradiça entre o 1º grau e o ensino superior. Foram nove meses colhendo informações, confrontando dados e ouvindo a comunidade educacional. Com as diretrizes básicas do ensino médio finalmente aprovadas pela Câmara de Educação Bá- sica do Conselho Nacional de Educação, os conselheiros não têm dúvida: a partir de agora, abre-se para os estudantes o acesso à cidadania. Outro ponto destacado pelos conselheiros, que juntos somam mais de 300 anos dedicados ao ensino, é a autonomia dada às escolas para que organizem sua grade curricular. A relatora do projeto, professora Guiomar Namo de Mello, destaca que a maior preocupação na elaboração das diretrizes foi com o desenvolvimento da capacidade de resolver problemas. O aluno deve ser preparado para fazer uma análise da situação, esta- belecer um conjunto de ações e intervir na realidade. “Não se ensina geografia para que o indivíduo saiba os nomes das capitais do mun- do, mas sim para que ele possa interagir com a sua paisagem. Quan- do se fala de um currículo de competência, atrás do nome física, leia- se capacidade de resolver problemas; atrás do rótulo arte, leia-se capa- cidade de ter pensamento simbólico, capacidade de fazer alegoria, de entender a realidade por meio de símbolos.” Cara própria. O conselheiro Carlos Roberto Jamil Cury garante que “o ensino médio deixou de ser carona do ensino fun- damental para ter uma cara própria, uma identidade própria, que é de ser a comple- mentação, o término da Educação Básica”. “O que se consagra é o acesso completo ao direito de cidadania, iniciado com a edu- cação infantil, solidificado pelo ensino funda- mental e completado no ensino médio”, sus- tenta a conselheira Iara Silva Lucas Wort- mann. No seu entendimento, “o que é revo- lucionário neste momento é o reconhe- cimento, por fim, do direito do cidadão bra- sileiro, criança ou adolescente, a uma edu- cação de qualidade”. A professora chama a atenção para o fato de que, até hoje, quando se discutia o A palavra dos especialistas O ensino médio deixa de ser o caroneiro tradicional do ensino fundamental para ganhar identidade própria. currículo do ensino médio, o ponto de par- tida eram as disciplinas de forma estanque, não havia uma interdisciplinaridade. Agora isso mudou. “Vamos deixar de pensar o ensino médio como um somatório de cargas horárias e de disciplinas que vão dar um total de 2.400 ho- ras. O professor tem que consolidar conhe- cimento, o que é fundamental”, ressalta Iara. A conselheira Regina Alcântara de As- sis, por sua vez, destaca a relação que as áreas de conteúdo vão ter com um projeto de sociedade brasileira, a partir das novas diretrizes. “Ao trabalharmos com a física, a química, a matemática, a língua portuguesa, vamos estar, por exemplo, usando como conceito básico o desenvolvimento susten- tável do meio ambiente”, explica. A professora observa que, quando se educa, não se está apenas informando, pas- sando conceitos: “Nós estamos levando os alunos a tomarem decisões, a serem autô- nomos e responsáveis. Estamos falando de conhecimento, de valores, do lugar da es- cola na sociedade brasileira, com toda di- versidade do país.” O papel do professor. Já o con- selheiro Francisco Aparecido Cordão lem- bra a necessidade de preparação adequada dos docentes para a implantação do novo ensino médio. “A mudança deverá ser operacionalizada a partir das propostas pe- dagógicas dos próprios estabelecimentos de ensino, o que implica que diretores, su- pervisores, professores, técnicos, enfim, toda a comunidade escolar participe decisi- vamente dessa elaboração. Só tem sentido falar de autonomia da escola se essa auto- nomia for vinculada à concepção, ao de- senvolvimento e à avaliação de uma pro- posta pedagógica”, afirma. O conselheiro João Antônio Cabral de Monlevade tem a mesma opinião. Para ele, “sem a participação efetiva do professor, a reforma vai ficar no papel”. O livro didático será cada vez mais uma fonte de apoio, ins- piração e informação, mas é a proposta pedagógica da escola, na sua elaboração e na sua execução, que vai se tornar o eixo de todo o trabalho, segundo Monlevade. A mudança no ensino médio implica ainda uma revisão completa da própria Universidade e da formação dos pro- fessores, de acordo com o conselheiro Antenor Manoel Naspolin. O presidente da Câmara de Ensino Básico, Ulysses de Oliveira Panisset, concorda. “Vai ser neces- sária também uma mudança radical nos pro- cessos seletivos para ingresso no ensino su- perior. Não dá mais para usar os mesmos critérios que tentam avaliar quanto o sujei- to sabe de física, química, matemática, bio- logia, história, geografia e uma língua es- trangeira”, adverte. Exercício da cidadania. Nin- guém duvida da profundidade da reforma. Para a conselheira Edla de Araújo Lira Soa- res, ela é uma convocação à sociedade bra- sileira no sentido de mudar não só a con- cepção de ensino até então vigente na últi- ma etapa da educação básica, mas também no sentido de convocar para um novo modo de convivência dentro do processo de escolarização. Segundo Edla, com a reforma fez-se uma aposta de que os professores, enquanto intelectuais da transformação, são capazes de unir, no contexto escolar, a crítica e as possibilidades de mudanças. “No interior dessas possibilidades de mudança, conside- ro que está presente o compromisso assu- mido com a sociedade brasileira de que a universalização do ensino médio de quali- dade representa hoje um patamar indispen- sável ao exercício da cidadania plena. A au- tonomia aponta para um novo modo de convivência”, defende. “E até quando isso tudo vai estar im- plantado?” – questiona o conselheiro Kuno Paulo Rhodes, adiantando-se às inúmeras perguntas que serão dirigidas ao governo. “O melhor seria responder: ‘A partir de ago- ra’. Até quando, nessa imensa Nação, é muito difícil dizer”. Toda a comunidade escolar vai ter um papel decisivo no sucesso do novo ensino médio. Os conselheiros apostam na “autonomia responsável”. Guiomar Namo de Mello Ulisses Panisset Edla de Araújo Soares Uma revolução Entre os professores, a reforma do ensino médio provoca um misto de ansiedade – reconhecidamente normal diante de uma proposta ainda pouco conhecida da maioria – e esperança de uma verdadeira revolução. Uma mudança de base que irá tirar a escola do seu isolamento acadêmico e recolocá-la no centro da sociedade, como principal receptora e geradora do contínuo processo de aprender a aprender. Uma escola inserida em seu meio, voltando a ser um dos principais atores das transformações sociais. “Hoje preocupamo-nos muito com o processo e pouco com os fins. Não podemos mais aceitar passivamente ver um aluno estudar inglês sete ou oito anos e precisar de um curso extra para poder iniciar uma conversação. Ou ainda estudar matemática por mais de 11 anos sem entender um plano de financiamento para comprar uma casa”, observa o professor Renato José Casagrande, professor de Matemática e Diretor da Organização Paranaense de Ensino Técnico do Paraná – OPET, atentoa fatores práticos da educação. Casagrande é professor do 2º grau desde 1986. Inconformado com o atual ensino médio brasileiro, é um otimista com a reforma, que começou a ser discutida em seminários na rede pública do Paraná no ano passado. “Tive acesso aos parâmetros curriculares do MEC e estou convencido de que por aí começará, sem dúvida, a maior revolução já feita no ensino do 2º grau do país. As outras reformas, pelo menos no Paraná, ficavam impressas em livretos ou apostilas distantes dos professores e da escola. E foi assim que vi alunos e professores pouco a pouco perdendo o interesse pelas disciplinas e conteúdos ministrados. Eu fui um deles. Sentia-me desmotivado. Não conseguia associar o que ensinava, preso a um programa, com a realidade vivida pelos alunos”, diz. Alguns temores não deixam de ser registrados. A professora de Química e assistente técnica pedagógica da Secretaria de Educação de São Paulo, Marília Gonçalves Chiapetta, elogia a oportunidade e a importância da reforma, mas acredita que ela demandará tempo e muito investimento no professor e na graduação. “Entre outros pontos, ela muda completamente o rumo prioritário do ensino médio: a preparação para o vestibular. Os professores serão os agentes da mudança. Será necessário esclarecer os docentes sobre o conteúdo da reforma, levar a discussão a cada estado, envolver os professores da rede pública e privada, aproveitando experiências positivas e negativas de ambas, evitando mais uma vez partir da estaca zero, como se todos fossem iniciantes. Embora seja indiscu- tível a importância da autonomia de cada escola no processo, várias questões podem e devem ser discutidas coletivamente”, avalia. Em Brasília, já tiveram início algumas discussões sobre a refor- ma, que devem se aprofundar este ano. “O papel do professor, que será núcleo deste processo, vai mudar bastante”, comenta o professor Gilmar de Souza Ribeiro, diretor da Divisão de Ensi- no Médio da Fundação Educacional do Ensino Médio do GDF. “Ele terá que refletir sobre a concepção do cumprimento do seu papel. A própria escola terá que mudar. O professor vai rever a sua formação pedagógica, se atualizar e se abrir para novos conhecimentos. Ele será o grande ator e o aluno o objetivo. Caberá ao MEC criar os mecanismos, aparelhar as escolas para o professor poder se capacitar.” O professor de Geografia Ronaldo Yungh, diretor do Centro Educacional Sigma, de Brasília, aponta para possíveis resis- tências: “A metodologia proposta pelo MEC é boa. Eu até diria que ela já é adotada por alguns profes- sores, que procuram se atualizar, não se engessam. Mas devemos contabilizar a fal- ta de preparo de boa parte e as resistências de muitos a qualquer tipo de mudança. Quando as mudanças são propostas, temos uma parte que adere apenas na superficia- lidade e outra no extremo, até além do pro- posto. O alvo deve ser o meio termo. O tempo da implantação desta reforma vai de- pender do tempo de adaptação dos profes- sores”. No Ceará, a proposta de reforma ainda é algo olhado a distância. Poucos professo- res se dispõem a comentá-la fora das con- versas informais. Quando resolvem entrar na discussão, insistem na necessidade de mudança, que para alguns é até tardia. “Como o mundo é dinâmico, o ensino tem de ser dinâmico. As mudanças no ensino médio se fazem necessárias há anos. Na educação, nada é imediato, mas também não podemos continuar paralisados. Acre- dito que em dois ou três anos teremos con- dições de mudar os rumos do ensino médio. O que vemos de interessante nesta reforma é que, ao contrário das outras, ela pede a participação de diversos segmentos da so- ciedade, tanto na elaboração como na sua aplicação. Além de uma grande abertura na elaboração dos projetos pedagógicos, cur- rículos e planos de cursos. Um grande avanço”, diz o professor de Matemática e diretor do Colégio Estadual Justi- O professor será um dos principais agentes das mudanças. Ele vai ter que se atualizar e rever a sua formação pedagógica. acontecimentos que cercam a sua realidade. Hoje é muito comum veri- ficarmos que o ensino já não atende mais às expectativas do alu- no, o que não o atrai para o acesso ao conhecimento, e sim para um espa- ço que lhe serve de passatempo e reencon- tro com os amigos. Com as novas diretrizes, nova deve ser a postura de todos os envol- vidos na comunidade escolar: professor, alu- no e família. Deverá promover a reorgani- zação da experiência cotidiana e espontâ- nea. O processo da avaliação passará por necessárias transformações. Deve deixar de ser uma forma de punir o aluno. A avalia- ção tende a ser um momento onde aluno e professor verifiquem conscientemente o pro- cesso de ensino-aprendizagem, exercitan- do o processo de ação-reflexão-ação”. Seu colega Renato José Casagrande completa: “Sabemos que o profissional, o cidadão do próximo milênio deverá trocar de profissão cinco ou seis vezes aproxima- damente em sua vida. É fundamental que sua formação geral seja sólida. E aí vem o grande paradigma a ser incorporado pelos nossos educadores: ensinar nossos alunos a ‘aprender a aprender’. Esta é a grande tônica do novo currículo. O aluno não ver a escola como um fim em si própria, mas como um meio de começar a ‘aprender a aprender’ para poder aprender sempre”. niano Serpa, de Fortaleza, Paulo Walmir Santiago. No Núcleo Regional de Educação de Cianorte, interior do Paraná, as notícias de uma reforma no ensino levaram os professores a procurar atualizações constantes na Secretaria de Educação. A professora de inglês e pedagoga Solange Bation Neri fala de pre- sente e de futuro: “Nós, professores, somos as janelas pelas quais os alunos irão olhar o horizonte do mundo. As mudanças no méto- do, no conteúdo e na forma como ensinamos são imprescindíveis. Estão ocorrendo verdadeiras revoluções no mundo. Todo este ema- ranhado de transformações se reflete no comportamento social. A escola não pode continuar a ser uma ilha. Temos que formar jovens que sejam, acima de tudo, críticos, que tenham facilidade de adapta- ção, que sejam flexíveis, criativos e com espírito empreendedor. A escola tem que preparar os nossos jovens, de forma que atendam aos novos perfis que estão sendo delineados no mundo a ser en- frentado fora dos muros escolares”. O professor de História do Colégio Estadual do Paraná Denilson Roberto Schena fala de uma nova e crescente demanda no ensino médio: “Além da necessidade de prepararmos o aluno para o mer- cado de trabalho, do exercício pleno da cidadania, aprimorando-o como pessoa com formação ética, autonomia intelectual e pensa- mento crítico, temos de lembrar que há uma escassez de mercado de trabalho e esses jovens tendem a permanecer mais tempo na escola. É preciso pensar numa expansão da rede”. “O ponto de partida para uma educação significativa para o aluno tem de ser a sua realidade”, continua. “Os temas abordados em sala de aula de- verão estar em sintonia com os O ponto de partida para uma educação significativa tem de ser a realidade do aluno. Para o secretário executivo do Serviço Nacional de Aprendiza- gem Rural (SENAR), Ataíde Alves, a mudança vai acabar melho- rando, e muito, a vida no meio rural. Ele explica: “A atividade rural sempre exigiu do homem do campo várias habilitações. Quem tira leite, por exemplo, acorda cedo para juntar o rebanho. Depois, faz o processo de assepsia de sua ordenha e tira o leite. Em seguida, transporta e comercializa seu produto. Ele tem ainda que cuidar do pasto e das cercas da fazenda. São, só aí, umas sete atividades. No meio urbano, haveria especialistas para cada uma delas.” O secre- tário observa que o processo educacional hoje, tal como se encon- tra, é fruto do desenvolvimento industrial, com ocupações segmen- tadas, muito seletivas. “A realidade no campo é outra e exigeum outro tipo de aprendizado”, completa, esperançoso na reforma do ensino médio. Ataíde Alves é de opinião que a educação deve ser encarada de uma forma mais abrangente. “Todos acham que educação é uma responsabilidade só do estado. A educação é função de todos os brasileiros. E essa proposta de mudança, principalmente no sentido de liberalizar, de fazer um currículo modular, é uma forma de democratização, de dar acesso a todos, de poder escolher e optar por aquilo que se quer”. Para a direção do Serviço Social do Transporte/Serviço Nacio- nal de Aprendizagem do Transporte (SEST/SENAT), as mudan- ças aprovadas para o ensino médio são da “mais alta importância e atualidade”. Em estudos e pesquisas desenvolvidos pela CNT junto a 2,5 milhões de trabalhadores e 300 mil autônomos do setor, foi identificada uma aspiração para que o ensino médio não se concen- tre apenas na preparação para os exames vestibulares, mas desta- que a educação tecnológica básica e relacione melhor a teoria com a prática em cada disciplina, além de melhorar a preparação básica para o trabalho e a estimular a cidadania. Além de uma formação geral satisfatória, a direção da CNT e do SEST/SENAT torce para que o novo ensino médio prepare melhor os alunos para o exercício de profissões técnicas, com maior liberda- de curricular. A CNT também acha importante adequar o país e sua população aos novos fatores decorrentes da urbanização acelera- da, crescimento econômico e tecnológico, competitividade cres- cente e globalização, que exigem maior versatilidade e valori- zação da educação, particularmente a nível médio. No campo e na cidade Não foi só a comunidade escolar que aplaudiu as novas diretrizes básicas do ensino médio. Elas também receberam o apoio das Confederações Nacionais do Transporte (CNT) e da Agricultura (CNA), duas entidades que desenvolvem intenso trabalho no campo da educação por meio de cursos profissionalizantes e de aperfeiçoamento. De norte a sul do país, a reação é uma só: a mudança no ensino médio é mais do que bem-vinda, é um verdadeiro alívio. Não importa a idade, a classe social ou o nível escolar. Os pais e estudantes que tomam conhecimento das novas diretrizes básicas para o ensino médio no Brasil comemoram o fim da tradicional “decoreba” e do conhecimento segmentado e apostam no surgimento de um aluno mais consciente, preparado com base numa abordagem que privilegia a interdisciplinaridade e o estímulo ao pensamento crítico e à cidadania. Até que enfim! Até que enfim! “Gosto do conceito de conhecimento aplicado. Mais importante do que um con- junto de regras e fórmulas é o aluno apren- der a interpretar a realidade que o cerca. É fundamental, por exemplo, que a matemá- tica no 2º grau inclua noções básicas de eco- nomia: como calcular a taxa de juros, o que é inflação, por que uma nação deve manter sua moeda estável. Assim, os alunos deixa- rão o ensino médio não só mais qualifica- dos para o trabalho, mas mais preparados para a vida”. A análise é do técnico em informática Antônio Carlos de Oliveira Almeida e tem todo o apoio da mulher, a dona de casa Lindamar Rosa de Almeida. Antônio e Lindamar moram no Distri- to Federal e têm quatro filhos: Rose Hellen, 21 anos, Júnior, 20, Jorge, 18, e André, 16. Jorge faz o 3º ano do 2º grau e André a 8ª série, ambos na rede pública. Os dois mais velhos interromperam o estudos antes de completar o 2º grau. Um dos motivos foi a dificuldade nas chamadas disciplinas exatas. O pai lembra que perdeu muito tempo decorando fórmulas que nunca tiveram a menor utilidade prática no seu cotidiano ou profissão e que eram esquecidas logo depois das provas. Jorge acha que, além de “estimular o estudante a pensar”, o ensino médio deveria prepará-lo melhor para enfrentar o mercado de trabalho. Afinal, nem todo mundo pretende ingressar na facul- dade. A autonomia dada às escolas para a elaboração do currículo também chamou a atenção da família. Lindamar lembra que o alu- no que vive no interior do país tem necessidades diferentes daqueles que moram nos grandes centros. Segundo ela, os conteúdos das disciplinas precisam ser adaptados às realidades regionais para que a transmissão de conhecimentos se dê de forma mais eficaz. Pais e filhos também são unânimes na hora de apontar o que o ensino médio deveria proporcionar: recursos multimídia, informática, esportes, teatro, educação artística etc. “Tudo aquilo que, hoje em dia, o aluno precisa buscar fora da escola pública”, comenta Rose Hellen, otimista com as mudanças. Para a funcionária pública de São Paulo, Rosana da Costa Silveira, a abertura do leque de opções através da interdisciplinaridade e da contextualização do conteúdo aprendido são os pontos fortes das diretrizes aprovadas. “A escola precisa estimular o aluno a desen- volver suas potencialidades e a compreender melhor o mundo, in- terligando os vários ramos do conhecimento”, afirma. Seus filhos, Marcelo, 16 anos, estudante do 2º grau, e Priscila, 21, universitária, lamentam não ter alcançado esse novo ensino médio. Eles acreditam que vai ser necessário um grande esforço para “mudar a cara” do 2º grau no Brasil . “O trabalho de reciclagem dos professores e livros não poderá ser feito do dia para a noite”, prevê Priscila. A autonomia das escolas é um dos pontos positivos apontados pelos alunos e pelos pais. Em Salvador, a pedagoga Elda Lisboa, mãe de um universitário, acredita que, na hora de elaborar sua grade curricular, as escolas vão poder dar mais ênfase à filosofia e à sociologia e incluir atividades práticas que levem em consideração as diferenças de cada região: “Um sistema educacional que não leva em consideração as particularidades regionais e os avanços tecnológicos está estagnado.” Christiane Maria Tanden Bauer, 18 anos, que faz o último ano do 2º grau numa escola pública da cidade catarinense de Chapecó, compara: “Tenho certeza de que, se essas reformas vingarem, meus irmãos mais novos terão uma educação muito melhor do que a que eu recebi. A minha geração está mais preocupada com datas, no- mes e o passo a passo da resolução de problemas de matemática, física e química que vão cair no vestibular, do que em aprender”. Quase no outro extremo do país, em Recife, o advogado José Maria da Fonseca, pai de Mariana, 8 anos, Joelma, 15, e Roberval, 18, também lamenta que a reforma tenha vindo só agora. A família Fonseca acredita que, com um ensino mais contextualizado, os alu- nos vão se interessar mais pela escola e, consequentemente, terão melhor desempenho. “A escola é uma instituição viva, tem que mudar para não perder o trem da história”, observa Roberval, estudante de Direito. Ele conta que sua primeira monografia na faculdade foi um desastre: “Não tinha a menor idéia do que fazer. No 2º grau, copiávamos nossos trabalhos das enciclopédias. Foi difícil inserir nos meus tex- tos um pouco de espírito crítico.” Mas a maior expectativa é de quem ainda vai passar pelo ensi- no médio. Joelma pretende chegar lá no ano 2000 e já aposta na reforma: “Quero poder terminar o curso com a certeza de ter adquirido, além do diploma, maior capacidade para criar e racioci- nar”. Em Brasília, a pequena Rafaela Osler de Almeida, de 11 anos, pergunta, ansiosa, se já vai “pegar” o novo ensino médio. Sua mãe, a dona de casa Sandra, fica torcendo: os alunos, para ela, só têm a ganhar com as mudanças. Antônio Carlos de Almeida não quer ver os filhos perdendo tempo com fórmulas e regras que nunca vão aplicar na vida prática. A experiência européia A reformulação do sistema de ensino é uma tendência hoje em todos os países da União Européia. Uma das preocupações é aproximar cada vez mais os sistemas educacionais dos países- membros para evitar problemas de homologação de diplomas e facilitar oaproveitamento de mão-de-obra. Em quase todos os países, o ensino obrigatório já foi estendido até os 16 anos. Quando chega ao Ensino Médio, o aluno tem várias opções, tanto para o exercício imediato de atividades profissionais quanto para se preparar melhor para a Universidade. Espanha. Na Espanha, a reforma educacional, aprovada em 1990, deve estar concluída até o ano 2.002. O novo progra- ma divide a vida escolar em quatro ciclos: educação infantil (de 0 a 6 anos), educação primária obrigatória (de 6 a 12 anos), edu- cação secundária obrigatória (de 12 a 16 anos) e educação secundária pós-obrigató- ria (de 16 a 18 anos). Os currículos do Ensino Médio foram reformulados, de modo a preparar os alu- nos não só para a Universidade, como tam- bém para os cursos técnicos e para o aces- so direto ao mercado de trabalho. Hoje, na Espanha, cerca de 68% dos alunos que con- cluem os ciclos de educação secundária se matriculam num curso universitário. “A reestruturação foi feita atendendo a uma exigência do próprio mercado de tra- balho, que demanda menos formação uni- versitária, trabalhadores de formação cada vez mais versátil e técnicos qualificados”, comenta Maria Teresa Vidaechea, da sub- direção geral de Orientação Acadêmica do Ministério de Educação e Cultura da Espanha. Ao iniciar os dois anos do Ensino Médio – o bachillerato ou logse –, o aluno deve escolher entre quatro modalidades: artes, ciências da natureza e da saúde, humanida- des e ciências sociais ou tecnologia. Exis- tem matérias comuns e obrigatórias a to- das as áreas, matérias específicas da moda- lidade escolhida e matérias opcionais, que podem estar ou não relacionadas à sua área. “O Ensino Médio agora prepara o alu- no para participar ativamente da vida social e cultural e capacita-o para o exercício de atividades profissionais, a partir de conhe- cimentos intelectuais e técnicos e do desen- volvimento de habilidades como o raciocí- nio, a argumentação, a tolerância, a auto- nomia e a cooperação”, afirma Maria Tere- sa. Como alternativa ao bachillerato, estão os cursos de formação profissional específica de grau médio (cursos profissionalizantes), cujos currículos estão sendo adaptados sob a orientação da Comissão Européia. Como o novo sistema está sendo aplica- do aos poucos, ainda não existem estudos comparativos sobre seus resultados. Os crí- ticos do programa argumentam que seu sucesso está diretamente associado aos meios econômicos disponíveis. Os próprios técnicos do Ministério de Educação e Cul- tura da Espanha admitem que são necessá- rios altos investimentos para aparelhar os colégios e também para formar os profes- sores do bachillerato. Itália e França. O Ministério re- conhece que foi buscar inspiração para seu programa de reformulação do ensino nos seus vizinhos mais próximos. Na Itália , onde o ensino obrigatório também foi estendido até os 16 anos, o aluno tem quatro opções ao chegar ao Ensino Médio: as escolas clás- sicas, científicas e normais, que preparam para a Universidade e formam as professo- ras infantis e de primeiro grau, os liceus ar- tísticos, o ensino técnico e os cursos profissionalizantes. Na França, o ensino obrigatório tam- bém vai até os 16 anos, idade a partir da qual o estudante escolhe entre o curso ge- ral, que prepara para a Universidade, o curso tecnológico, que conjuga conhecimentos gerais com uma formação correspondente a “tecnologias modernas”, e o curso técnico. Como alternativa, o aluno francês tem o cha- mado “liceu profissional”, um curso profissionalizante disponível desde os 14 anos, e os chamados “cursos de formação profissional inicial não escolar”. Alemanha e Inglaterra. Na Ale- manha, devido à integração da Alemanha Oriental, também existe uma reforma edu- cacional em curso. Seu esquema é um pou- co mais complexo, já que, como na Ingla- terra, existem diferentes autoridades educativas (locais, regionais ou nacionais). A educação obrigatória se estende até os 18 anos. Para os estudantes com mais de 16 anos, existe um ciclo clássico de três anos de preparação para a Universidade, um pro- grama específico para alunos com proble- mas físicos e quatro modalidades de cursos profissionalizantes. Também na Inglaterra, as alternativas a partir do fim do ensino obrigatório aos 16 anos são variadas: permanecer nas escolas secundárias ou high scholls, participar dos chamados Sixth Form College, Further Education College ou Tertiary College, com matérias clássicas, pré-profissionais e pro- fissionais, ou optar pelos cursos de “forma- ção de jovens”, desenvolvidos em coopera- ção com empresas privadas. Na Europa, a tendência do mercado de trabalho é demandar menos formação universitária. A educação nos Estados Unidos é totalmente des- centralizada. Os estados, comunidades e escolas têm grande autonomia e pro- vêem quase a totalidade dos recursos para as instituições pú- blicas de Ensino Básico e Médio. Dos US$ 350 bilhões destinados anualmente ao sistema educacional, apenas 6% são do go- verno federal, e esse dinheiro é aplicado na escola primária de áreas carentes. Sem vín- culo algum com o governo federal, o Ensi- no médio é responsabilidade das comuni- dades locais, que decidem sobre tudo: cur- rículo, carga horária, educação vocacional, aplicação de provas, salário de professores etc. O único ponto em comum é a duração do curso – quatro anos. Há quatro áreas básicas de interesse: in- glês, matemática, ciências (física, biologia, química) e estudos sociais (história, geogra- fia). Certos estados incluem também no cur- rículo educação física e disciplinas optativas como música, artes e línguas estrangeiras. A carga horária varia de escola para escola mas, em média, o ano letivo tem 180 dias. Preocupados em elevar o nível de conhe- cimento e preparação dos alunos, alguns estados resolveram recentemente instituir exames obrigatórios para a conclusão do 2º grau. Seguindo o modelo europeu, alguns es- tados, como a Geórgia, dão maior desta- que ao ensino vocacional. Se esta for a opção do estudante, ele pode procurar uma escola de 2º grau para ter uma formação profissional em mecânica, hotelaria ou administração de restaurantes, entre outros. Porém, o objetivo maior do curso secundário norte-americano ainda é fazer a ponte para a Universidade. Nada que se assemelhe à sobrecarga de informações para o vestibular no Brasil. Nos Estados Unidos, a seleção para o ingresso no curso superior é completamente diferente. As notas ao longo da história escolar do estudante são um item fundamental na escolha dos futuros universitários. Há também dois exames básicos, preparados por instituições privadas, que os estu- dantes fazem durante o 2º grau. Eles podem escolher qual, quando e quantas vezes fazer o teste. Normalmente, preferem fazê-lo nos dois últimos anos do curso secundário, pois se sentem mais prepa- rados. O ACT Assessment consiste em provas de inglês, matemáti- ca, compreensão de texto e ciências. O Scholastic Assessment Test, o SAT, traz questões de matemática e inglês. Algumas Universida- des exigem que o estudante faça o SAT II, que é centrado em uma matéria específica – história, química, biologia, física e línguas – em mais de um assunto. Mas, na hora de selecionar seus alunos, a Universidade também pode exigir cartas de recomendação da escola e um texto prepara- do pelo estudante sobre o curso que escolheu ou outro tema defini- do pela instituição. É comum também a realização de entrevistas com quem está pleiteando uma vaga e a aplicação de testes práticos se o estudante quer ingressar em cursos como música e artes. Ou- tros fatores também contam ponto: se o aluno está envolvido com atividades esportivas, se é voluntário em atividades comunitárias, hospitais etc. No entendimento das universidades, isso mostra a capacidadede socialização do estudante e o grau de comprometi- mento com sua comunidade e com seu país. Em outras pala- vras, é um exemplo de cidadania. O modelo americano Nos Estados Unidos, as comunidades locais têm toda autonomia sobre o ensino médio. Decidem o currículo, a carga horária e o sistema de avaliação. O prazer do conhecimento Antes da batalha final entre os dois deuses, ocorrerá algo que hoje é impensável: os jovens vão entender o significado dessa bata- lha de titãs. Porque, ao estudar filosofia, deverão aprender mitolo- gia grega e romana e ficarão sabendo que Júpiter é a maior das divindades romanas, deus da sabedoria, equivalente ao Zeus gre- go. E que Mercúrio, deus da indústria e do comércio, equivale ao grego Hermes, filho de Zeus. Ou seja, o sucesso da reforma poderá representar, na visão de nossos entrevistados, o em- brião de uma mudança da nossa concepção de mundo e das relações humanas. O conhecimento voltará a ser mais impor- tante do que os ganhos materiais. “Hoje, o jovem só quer enriquecer, talvez para diminuir sua frustração”, constata o escritor e programador visual Rogério Duarte, professor da Universidade de Brasília, com saudades dos seus tempos de 2º Grau no Colégio da Bahia, em Salvador. Entre Júpiter vencerá Mercúrio em uma grande batalha e retomará seu lugar de destaque no Olimpo. É o que artistas e intelectuais brasileiros acreditam que ocorrerá em nossa sociedade, caso seja implantada com sucesso a reforma do ensino médio. seus colegas estavam Wally Salomão, Gláuber Rocha, Ca- pinam, Caetano Veloso, Tomzé e João Carlos Teixeira Go- mes. Os professores eram os mais importantes intelectuais locais. “Tínhamos um núcleo de debates absolutamente extraordinário”, recorda. Rogério Duarte lembra com carinho do jornal literário feito na escola, da vinculação com as bibliotecas e do ativo grêmio escolar: “Tínhamos a capacidade de pensar por nós mesmos.” Seria um fenômeno local, próprio da Bahia? Não é o que pensa o escritor Luiz Carlos Maciel, que relata o mesmo fenômeno no Rio Grande do Sul. Naquela época, lá pelos anos 50, garante, existia o prazer pelo conhecimento e era no 2º Grau que se forjavam os intelectuais do País. Mudando a sociedade. Experiência muito dife- rente viveu o índio Aílton Krenak, que levou 20 anos para concluir uma formação acidentada, da alfabetização à con- clusão do curso médio, o que ocorreu entre os anos 60 e 70. Hoje uma das maiores lideranças indígenas e referência in- ternacional, Krenak comenta as dificuldades que sentiu na escola: “era um ritual meio falso”. Essa falsidade, ele perce- bia na fragmentação e nos conteúdos “que não tinham nada a ver comigo”. A alternativa que Krenak encontrou na época foi se apro- priar, aos poucos, dos conteúdos que lhe interessavam. Agora, ele acredita que o sucesso da reforma no ensino médio poderá alterar toda a sociedade. “Se acontecer, de fato, nós vamos fazer uma verdadeira revolução, numa geração que vem sendo tratada de forma reducionista, por um sistema que forma técnicos e gerentes”, afirma. Krenak aposta que o jovem resgatará o prazer pelo conhecimento na medida em que, a partir de um núcleo principal, puder escolher e trabalhar com os assuntos de seu interesse, “com visão holística”. Rogério Duarte concorda e vai além: para ele, o resgate da dignidade do conhecimento poderá apontar para uma nova socie- dade. Isso levará a uma grande reflexão na busca do resgate de valores como a solidariedade humana. Se, de um lado, a escola começa a pautar a sociedade, o inverso também acontecerá e haverá um embate entre dois ideais de vida: conhecimento e materialismo, Júpiter e Mercúrio. Pelo menos, os jovens brasileiros vão poder discutir esses temas e conhecer suas bases. Estímulo ao raciocínio. O astrônomo Ronaldo Ro- gério Mourão, fundador e pesquisador titular do Museu de As- tronomia, órgão do CNPq, destaca, na reforma, a proposta de se explicar cientificamente a vida cotidiana. “Isso pode signifi- car o despertar do interesse, no jovem, pelo conhecimento O sucesso da reforma pode representar o embrião de uma mudança da nossa sociedade e da nossa concepção de mundo. científico. “É valiosa a iniciativa de se mostrar a importância de tudo que se estuda”, garante. Para o teatrólogo Augusto Boal, uma educação integral – cujo as- pecto humanístico esteja embasado em conhecimentos sobre o mundo, a filosofia, as artes e as ciências – formará homens e mulheres intei- ros e se contraporá à globalização do mercado, que ele classifica como “nova forma de colonialismo”. Ziraldo, autor de dezenas de li- vros para crianças e escritor per- manentemente envolvido com te- mas educacionais, reforçou a im- portância do estímulo ao raciocí- nio. Para ele, “com a rapidez com que as mudanças estão ocorrendo, as pessoas vão precisar muito de reflexão”. O escritor brinca: “Todo mun- do tem sua salvação do ensino na cabeça”. A salvação que Ziraldo pro- põe é a ênfase ao convívio com as palavras, além da gramática. Mas, na opinião dele, a utilização da in- formática também é fundamental. O cientista Ronaldo Mourão vai mais adiante. Não apenas chips ou software... Ele gostaria de ver alu- nos de 2º grau estudando cosmografia mo- derna, a par dos avanços tecnológicos, para conhecer o universo em que vivem e en- contrar soluções viáveis só mostradas pela astronomia. Defensor do ensino do Latim, Rogério Mourão sugere muita leitura e formação ambiental. Tem todo o apoio do jornalista e ambientalista Washington Novaes, para quem a questão ambiental deve ser vista como base constitutiva da vida e fundamen- to de toda educação moderna. Augusto Boal também tem um palpite prontinho: o as- pecto humanístico contemplado na refor- ma do Ensino Médio deve ser reforçado e a especialização não deve limitar o educan- do, eliminando sua visão global do mundo. Ziraldo Augusto Boal R o n a ld o d e O liv e ir a /C B P re ss Z u le ik a d e S o u za /C B P re ss Produção e Edição Alô Comunicação e-mail: alo@alo.com.br Coordenação Nelson Penteado, Taisa Ferreira e Eduardo Henrique dos Santos Repórteres Andréa Doti (Madri), Alessandra Ellwood, Daniela Mendes (Nova Iorque), Elaina Daher, Fernando Fraga, Heloísa Doyle e Roberto Stefanelli Fotografia José Alberto da Silva/Macro e Kazuo Okubo Direção de Arte Hélio Paixão e Rilson Raposo Arte final Rodrigo Severo e Eduardo Branquinho Fotolito Dots Bureau Impressão Gráfica Ipiranga Presidente da República Fernando Henrique Cardoso Ministério da Educação e do Desporto Ministro Paulo Renato Souza Chefia de Gabinete Edson Machado de Sousa Secretaria Executiva Luciano Oliva Patrício Secretaria de Educação Média e Tecnológica/Semtec Ruy Leite Berger Filho Sistema de Comunicação Social - SICOM Tânia Mara Viegas Ministério da Educação e do Desporto Esplanada dos Ministérios - Bloco “L” 9º andar - Sala 90 - CEP: 70047-900 - Brasília-DF http://www.mec.gov.br
Compartilhar