Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
SUAIDEN, Emir. Biblioteca Pública e Informação à Comunidade. São Paulo: Global, 1995. Capítulo 2 BIBLIOTECA PÚBLICA A verdadeira missão, ou o objetivo mais importante da biblioteca pública, tem sido muito discutida pelos especialistas da área em artigos, livros' e em numerosos congressos nacionais e internacionais. As seguintes afirmações são ditas de forma freqüente e sistemática: "o objetivo da biblioteca pública é melhorar a qualidade de vida da comunidade"; "a biblioteca pública é a base fundamental do sistema educacional e cultural"; "seu objetivo principal é a formação do hábito de leitura"; "sua missão é assistir os usuários através de um acervo compatível com as necessidades da população" etc. Os participantes do Curso de Extensão sobre Gestão de Biblioteca em Tempos de Crise, ministrado pela professora Myriam Gusmão de Martins na Universidade Federal de Pernambuco, Brasil, entre 22 e 30 de agosto de 1985, definiram as bibliotecas públicas e populares como instituições essencialmente sociais, de caráter democrático, destinadas aos habitantes de uma localidade, distrito ou região. A biblioteca pública, mantida pelo governo, tem por objetivo primordial preservar e difundir o conhecimento, principalmente no que se refere à cultura local, e dentre todos os tipos de bibliotecas é a única que possui realmente características de uma instituição social, tanto pela amplitude de seu campo de ação como pela diversificação de seus usuários. É um centro de educação permanente para a pessoa. A biblioteca popular está destinada a uma comunidade local e tem objetivos semelhantes aos da biblioteca pública, mas difere substancialmente daquela em que o usuário que a freqüenta não tem em geral um nível formal de conhecimento e também porque a biblioteca pública há de promover atividades de lazer ou culturais que satisfaçam as necessidades da comunidade dentro da qual opera. Portanto, qualquer que seja seu objetivo, seja economicamente rica ou pobre, rural ou urbana, a biblioteca pública terá de ser uma só em sua finalidade e em sua concepção, e tanto mais democrática quanto mais estenda seus serviços a todos seus potenciais usuários. Na realidade, a biblioteca pública deve constituir-se, cada vez mais, em um centro convergente das aspirações comunitárias, ou seja, deve ter uma identificação muito grande com sua comunidade e contribuir para resolver os problemas que são próprios à mesma comunidade. Por exemplo, se há na comunidade um número razoável de mulheres que costuram para sobreviver, a biblioteca pública deve divulgar obras sobre corte e costura, e contribuir assim para melhorar suas atividades. As bibliotecas públicas nos paises desenvolvidos são as responsáveis, em grande parte, pela formação de hábitos de leitura na comunidade e a principal fonte de estimulo para o desenvolvimento da indústria editorial. Desde há tempo se reconhece pelas autoridades o valor das bibliotecas públicas e o dever dos governantes de oferecer esse serviço à comunidade. Nos Estados Unidos, desde 1917, a biblioteca pública tem assumido um papel de grande importância, e desde 1949, com a publicação do "Manifesto da Unesco sobre bibliotecas públicas", se tem despertado um grande interesse, que tem dado um grande impulso a vários países, com fins a que a biblioteca pública seja a que preste taís serviços à comunidade. Outras atividades de grande importância e que contribuíram para este propósito foram as desenvolvidas ao longo das últimas décadas pela Federação Internacional de Associações de Bibliotecários (FIAB). Assim mesmo, poderiamos afirmar que também tiveram um papel importante e influente a "Declaração Geral das Normas", aprovada em Madri em 1958, e as "Normas para a Construção de Bibliotecas Públicas", aprovadas em Varsóvia em 1959. O manifesto da Unesco foi revisado em 1972 e as normas da FIAB em 1973. Os novos textos aproveitaram a experiência obtida na preparação das normas nacionais. O "Manifesto da Unesco" e a "Declaração de Caracas sobre a Biblioteca Pública" são de grande importância para o estudo desta instituição. Segundo a Unesco (7) "a biblioteca pública é uma mostra da fé que tem a democracia na educação de todos como um processo contínuo ao longo da vida, assim como na atitude de todo o mundo para conhecer as conquistas da humanidade no campo do saber e da cultura. A biblioteca pública é o principal meio de dar a todo mundo livre acesso à soma dos conhecimentos e das idéias do homem às criações de sua imaginação. Sua missão consiste em renovar o espírito do homem, suprindo-o de livros para sua distração e recreio, ajudar o estudante e dar a conhecer a última informação técnica, científica e sociológica. A biblioteca pública há de estar fundada em virtude de textos legais, precisos, concebidos de maneira que todos os habitantes de um país possam desfrutar de seus serviços. É indispensável que as bibliotecas procurem uma cooperação entre si para que a totalidade dos recursos nacionais possa ser utilizada plenamente e posta a serviço de qualquer leitor. Há de estar totalmente financiada por orçamento público e não há de exigir aos usuários nenhum pagamento por serviços. Para lograr completamente seus objetivos, a biblioteca pública tem de ser de fácil acesso e suas portas devem estar abertas para que a utilizem livremente e em igualdade de condições todos os membros da comunidade, sem distinção de raças, cor, nacionalidade, idade, sexo, religião, língua, situação social e nível de instrução" . Em 1982, na capital da Venezuela, especialistas elaboraram a "Declaração de Caracas sobre a Biblioteca Pública" como fator de desenvolvimento e instrumento de transformação social na América Latina e no Caribe. Segundo a referida declaração, a biblioteca pública deve: a) assegurar a toda a população o livre acesso à informação em suas diferentes formas de apresentação. Essa informação deve ser ampla, atualizada e representativa do universo de pensamento e idéias do homem e a expressão de sua imaginação criadora, de tal forma que tanto o indivíduo como a comunidade possam situar-se em seu meio histórico, socioeconômico, político e cultural; b) estimular a participação ativa e efetiva da população nacional, incrementando o papel da biblioteca como instrumento que contribua para a transformação social e para a participação na vida democrática; c) promover o resgate, a compreensão, a difusão e defesa das culturas nacionais, autóctones e minoritárias, objetivando a formação da identidade nacional, e apoiar o conhecimento de outras culturas e o respeito por elas; d) promover a formação de um leitor crítico, seletivo e criativo, desenvolvendo ao mesmo tempo sua motivação para a leitura, sua habilidade para extrair dela experiências gratificantes, capacitando desse modo cada vez mais o indivíduo para desempenhar um papel ativo na sociedade; e) apoiar a educação permanente em todos os níveis formais e não formais pondo ênfase na erradicação do analfabetismo e nos serviços para as crianças, jovens e leitores necessitados socialmente e inválidos; f) servir como centro de informação e comunicação para a comunidade; g) começar e desenvolver, quando seja necessário, serviços bibliotecários nacionais, especialmente em paises pequenos; h) apoiar o desenvolvimento de uma indústria editorial nacional economicamente forte e culturalmente independente. Na "Declaração de Caracas" é fácil observar a preocupação dos bibliotecários latino-americanos e do Caribe pela formação do hábito de leitura, pelo papel importante da informação à comunidade e pela função que desempenha a biblioteca pública na sociedade, criandocondições para que o homem tenha uma participação ativa no desenvolvimento de seu país. Nos países desenvolvidos, a biblioteca pública é quase essencialmente uma instituição de prestação de serviços à comunidade, portanto, tem uma identificação muito grande com sua comunidade. A biblioteca, além de prestar serviços como o de facilitar a elaboração de pesquisa bibliográfica, difusão de sumários correntes e alertas, empréstimos a domicilio, consultas etc., é também um ponto de encontro para a comunidade debater sua participação econômica e política e onde se oferecem informações práticas para a população. Nos países em desenvolvimento, com poucas exceções, não se pode afirmar que a biblioteca pública tenha realmente realizado um trabalho eficaz em prol da comunidade. A grande prova é que a comunidade não vê, ainda hoje, a biblioteca pública como instituição indispensável nos planos de desenvolvimento de uma nação, devido principalmente à falta de vinculação mais adequada com a população, através do serviço de informação à comunidade. Estudando as bibliotecas e sociedade na Primeira República, Gomes (8) afirma que as bibliotecas brasileiras refletiam a condição de dependência pois elas reuniam, conservavam e difundiam de modo reflexo a cultura estrangeira característica das sociedades dominadas. Assim, as bibliotecas, instaladas de 1890 a 1930, foram o resultado de obstinados esforços isolados de alguns elementos, bem-intencionados mas sem recursos de toda ordem, para levar avante a idéia transplantada de biblioteca. A primeira biblioteca pública fundada no Brasil foi a Biblioteca Pública da Bahia, inaugurada no dia 4 de agosto de 1811. As bibliotecas fundadas anteriormente, como as dos conventos, não eram públicas, e a Biblioteca Real do Rio de Janeiro já existia em Lisboa, havendo, portanto, no caso, apenas a transferência de sede. É importante salientar que a fundação da Biblioteca Pública da Bahia não se efetivou através de uma iniciativa governamental. Ela foi criada por iniciativa dos cidadãos. Pedro Gomes Ferrão de Castello Branco encaminhou um projeto, datado de 5 de fevereiro de 1811, ao Conde dos Arcos, governador da Capitania da Bahia, solicitando a aprovação do plano para a fundação da biblioteca. O projeto para o funcionamento da biblioteca, contendo as idéias de Castello Branco, intitulava-se: Plano para o estabelecimento de huma biblioteca pública na cidade de São Salvador Bahia de todos os Santos, oferecido à aprovação do Ilustríssimo e Excelentíssimo Senhor Conde dos Arcos, Governador, e Capitão General desta Capitania.(9) Ele solicitou ao governador apenas a aprovação do projeto, pois a biblioteca seria mantida através da cooperação de todos os cidadãos que desejassem dela fazer parte. Castello Branco concebeu a biblioteca como uma instituição para promover a instrução do povo. A idéia de Castello Branco era começar com subscritores de um plano coletivo de assinaturas de revistas e, com as sobras financeiras, adquirir livros para formar uma biblioteca. Castello Branco propôs, ainda, que, "para que destes elementos se possa formar com mais brevidade uma biblioteca ampla e capaz de preencher os fins de uma geral instrução; serão convidados os subscritores a entrarem para este estabelecimento com suas livrarias particulares ou com aquelas obras que podem dispensar do seu uso ordinário, as quais serão encaminhadas por doação ou por empréstimo, de que se lhe dará uma clareza, e far-se-á pública por meio da imprensa e uma cópia dela será remetida ao ilustríssimo e excelentíssimo senhor general desta Capitania com o nome do que a houver feito como um benfeitor do Público, Amigo da Pátria e zeloso dos verdadeiros interesses do Soberano”. Em seguida, aventa medidas para a escolha do local da biblioteca e recrutamento dos funcionários: "Tomar-se-há uma casa sufficiente, para os fins propostos, a qual deve ser dentro da cidade, em sítio agradável, bem arejado, e não muito próximo aos lugares mais freqüentados. Esta casa será ordenada com a possível decência e sempre de modo que se possa estar nela com asseio e satisfação. Na sala principal haverá uma grande mesa com assentos ao redor sobre a qual estarão as Gazetas mais recentes, pincel e tudo mais necessário para a escripta. Os officiaes da Casa por agora serão uniccamente hum bibliotecário, hum moço servente, hum porteiro e hum moço empregado em a trazer sempre o maior asseio. Criar-se-hão depois os mais Officiaes que os subscritores julguem necessários. O Bibliotecário deverá ser hum sujeito de muito boa conducta que saiba bem ler, escrever e contar, sendo muito para desejar-se que tenha conhecimento das línguas, principalmente Latim, Francês e Inglês. Os moços serventes deverão também saber ler, escrever e contar. O porteiro terá as mesmas qualidades" . O Conde dos Arcos aprovou o Plano e, elogiando a iniciativa do seu autor, deu-lhe “a Direção de todos os objetos, trabalhos intermediários até a perfeição daquele estabelecimento”. A biblioteca foi inaugurada no antigo Colégio dos Jesuítas, em 4 de agosto de 1811. Posteriormente, a 29 de setembro de 1829, foi fundada a Biblioteca Pública do Estado do Maranhão, cuja abertura oficial ao público se deu no dia 3 de maio de 1831, ocupando a parte superior do Convento do Carmo, na Rua do Egito. Em 1851 foi anexada ao Liceu Maranhense, e, através da Lei n" 752, datada de 1 ° de junho de 1886, passou a Biblioteca Pública Provincial a ficar a cargo e sob a guarda do Instituto Literário Maranhense. De acordo com a Lei nº 991, datada de 10 de junho de 1872, foi confiada à Sociedade Onze de Agosto, situada no pavimento superior do prédio da Rua do Egito. Em 4 de abril de 1883, foi reaberta ao público na Igreja da Fé, retornando depois ao Convento do Carmo, em 1886. Depois de várias mudanças, o governador Sebastião Archer da Silva resolveu construir sua sede atual, cuja inauguração se deu no dia 29 de janeiro de 1951, localizada na Praça do Panteon. A Biblioteca Pública do Maranhão, posteriormente denominada Biblioteca Pública Benedito Leite, começou a contar com profissionais bibliotecários na direção, a partir de agosto de 1973. A seguir, e sempre através de iniciativa do governo, foram fundadas as seguintes bibliotecas públicas estaduais: Biblioteca Pública do Estado de Santa Catarina, em 1855; Biblioteca Pública do Espírito Santo, em 1855; Biblioteca Pública do Estado da Paraíba, em 1857; Biblioteca Pública do Paraná, em 1857; Biblioteca Pública do Estado de Alagoas, em 1865; Biblioteca Pública do Ceará, em 1867, atualmente denominada Biblioteca Pública Governador Menezes Pimentel; Biblioteca Pública do Estado do Amazonas, em 1870; Biblioteca Pública do Estado do Rio Grande do Sul, em 1871; Biblioteca e Arquivo Público do Pará, em 1871; Biblioteca Estadual do Rio de Janeiro, em 1873; Biblioteca Estadual do Piauí, em 1883, atualmente denominada Biblioteca Estadual Desembargador Cromwell Carvalho; Biblioteca Pública Estadual do Mato Grosso, em 1912; Biblioteca Municipal de São Paulo, em 1926, atualmente denominada Biblioteca Municipal Mário de Andrade; Biblioteca Pública do Amapá, em 1945; Biblioteca Pública do Acre, em 1948; Biblioteca Pública do Estado de Minas Gerais, em 1954; Biblioteca Pública Câmara Cascudo, do Estado do Rio Grande do Norte, em 1963; Biblioteca Pública Estadual de Goiás, em 1967; Biblioteca Pública Dr. José Pontes Pinto, de Rondônia, em 1969. É importante salientar que a maioria dessas bibliotecas públicas foi criada sem possuir sede própria e ocupou diversos locais diferentes. Muitas só na década de 1970 construíramum edifício apropriado ao funcionamento dos serviços, como a Biblioteca Pública da Bahia, que atualmente se chama Biblioteca Central da Bahia, a Biblioteca Pública do Espírito Santo, a Biblioteca Pública Epiphânio Dória, de Sergipe etc. Exemplo do destino andejo de nossas bibliotecas é a Biblioteca Pública Governador Menezes Pimentel, do Ceará, que antes da construção de sua sede própria, inaugurada em 1975, ocupou os seguintes locais: praça Marquês de Herval (1867 a 1873); rua Sena Madureira, esquina da Visconde de Sabóia (1904 a 1926); ex-edifício da Assembléia Legislativa, na rua Floriano Peixoto (1926 a 1952); rua Solon Pinheiro, nº 76 (1967 a 1970); no antigo Palácio da Luz, na rua Sena Madureira (1970 a 1974); e rua Tristão Gonçalves, nº 920. Mesmo no século XX, apenas alguns prédios de bibliotecas públicas foram construídos com assessoramento de bibliotecários. As Bibliotecas Públicas do Paraná, Pernambuco, Bahia, Municipal de São Paulo, Pará e Rio de Janeiro são desses raros exemplos. Inaugurada em 1926, a Biblioteca Pública Municipal Mário de Andrade foi um marco importante na biblioteconomia brasileira e um exemplo para a América Latina. Ocupando uma área de 15.000 m², está localizada no centro de São Paulo, sendo um verdadeiro monumento à cultura. Sua primeira diretora, Adelpha de Figueiredo, foi urna das primeiras bibliotecárias brasileiras, formada pela Universidade de Columbia, em Nova York. Rubens Borba de Moraes foi o segundo diretor (período de 1935 a 1943), e a ele deve a Biblioteca sua reorganização, cujo plano foi dividido em quatro pontos: 1. reorganização completa dos serviços técnicos; 2. adoção de esquema de expansão bibliotecária; 3. formação de pessoal habilitado; 4. cooperação com outros institutos. O terceiro diretor (1943 a 1959) foi o escritor, crítico literário e de artes plásticas Sérgio Milliet. Segundo Edson Nery da Fonseca, "os nossos primeiros bibliotecários tinham de ser influenciados pela Europa, como o foram os nossos primeiros escritores, artistas e cientistas. A essa constante da cultura brasileira não escapou nem poderia escapar a biblioteconomia. Foram europeus os primeiros tratados e manuais de biblioteconomia lidos no Brasil. Namur, Ciro, Maire, Delisle, Cousin, MoreI, Petzholdt, Graesel, Laborde, Constantin e Peignot são nomes que encontramos freqüentemente nos relatórios e catálogos das bibliotecas mais antigas. E muitos bibliotecários foram à Europa como hoje vão aos Estados Unidos com o fim de estudar a organização e a administração de bibliotecas. O primeiro foi Benjamin Franklin Ramiz Galvão, cujo relatório, apresentado ao Ministro dos Negócios do Império, em 31 de dezembro de 1874, ainda hoje pode ser lido com proveito pois contém críticas muito justas e observações de interesse permanente. Em 1937, o governo criou no Brasil, com a finalidade de propiciar meios para a produção, o aprovisionamento de livros e a melhora dos serviços bibliotecários, o Instituto Nacional do Livro, passando este órgão do Ministério da Educação e Cultura a dar prioridade, em seu trabalho, à formação de bibliotecas em todo o território nacional. Mário de Andrade, grande intelectual brasileiro, se expressava assim em 1939 a respeito deste assunto (10): "A criação de bibliotecas populares me parece uma das atividades mais necessárias para o desenvolvimento da cultura brasileira. Não é que essas bibliotecas venham a resolver qualquer dos dolorosos problemas de nossa cultura, como o analfabetismo, ou o da criação de professores de ensino secundário, por exemplo..., mas a divulgação entre o povo do hábito de ler bem orientado criará uma população urbana mais clara, com vontade própria, menos indiferente à vida nacional. Será talvez esse um passo agigantado para a estabilização de uma entidade racial que se encontra em extremo desprovida de outras forças de unificação”. Em 1961, o Decreto-Lei nº 51.223, de 22 de agosto, criou no Ministério da Educação e Cultura o Serviço Nacional de Bibliotecas. Esse órgão teria por finalidade: a) fomentar as diferentes formas de intercâmbio bibliográfico entre as bibliotecas do país; b) estimular a criação de bibliotecas públicas, e especialmente de sistemas regionais de bibliotecas; c) colaborar para a manutenção de sistemas regionais de bibliotecas; d) promover a criação de uma rede de informações bibliográficas que sirvam em todo o território nacional. Lamentavelmente, devido a uma série de fatores, o Serviço Nacional de Bibliotecas não conseguiu cumprir seus objetivos e o Decreto-Lei n° 62.239 o incorporou ao Instituto Nacional do Livro, passando a coordenar a política nacional de bibliotecas, que tinha como meta prioritária a biblioteca pública. Posteriormente, o Instituto Nacional do Livro adotou, entre outras, duas medidas de fundamental importância: a) firmar convênios com as Prefeituras Municipais para a manutenção de bibliotecas públicas, nas quais ficariam definidas as obrigações do Instituto Nacional do Livro, e em conseqüência também a dos municípios; b) adotar um sistema de co-edições em lugar de simples compras de livros para enviar às bibliotecas públicas municipais. Outro fator importante foi a implantação da Lei 5.692/71, que reformou o ensino de primeiro e segundo graus, convertendo em obrigatória a pesquisa por parte do estudante. Devido à impossibilidade de se manterem bibliotecas em todas as escolas, a biblioteca pública começou a ser vista pelas autoridades com uma maior importância, pois passou a servir aos estudantes e à população em geral, tomando-se uma instituição indispensável para a formação educativa e cultural da comunidade. Apesar dos sucessivos esforços em prol do fortalecimento das bibliotecas públicas, estas não alcançaram o desenvolvimento esperado. Não há bibliotecas públicas em muitos dos municípios e as existentes não estão de acordo com as normas internacionais. Vários fatores dificultaram o desenvolvimento das bibliotecas públicas, entre eles podemos citar: a) falta de planejamento integrado e de colaboração entre as bibliotecas, o que impede um melhor rendimento de recursos existentes; b) falta de conscientização dos governantes municipais quanto à importância que a biblioteca pública pode ter para o desenvolvimento socio-cultural da comunidade; c) carência de recursos financeiros; d) carência de recursos humanos. Do total existente de bibliotecários poucos trabalham em bibliotecas públicas. A grande maioria se encontra trabalhando nas bibliotecas do Rio de Janeiro e São Paulo. A residência do bibliotecário no interior do país é um problema de difícil solução, pois apesar de existirem diversas escolas de biblioteconomia, os bibliotecários preferem permanecer nas grandes cidades, onde recebem uma boa remuneração e gozam de melhores condições de especialização; e) a falta de boas livrarias nos municípios, além de impossibilitar a motivação espontânea da população pelo hábito de ler, dificulta sobremaneira a atuação dos responsáveis pelas bibliotecas locais, através das poucas opções oferecidas para a aquisição dos acervos e o preço excessivo que normalmente é cobrado. O Brasil possui cerca de 800 livrarias, 90% das quais estão localizadas no Rio de Janeiro e em São Paulo. Analisando a situação das 23 Bibliotecas Públicas mais importantes do Brasil: Porto Velho, Rio Branco, Manaus, Belém, Macapá, São Luís, Teresina, Fortaleza, Natal, João Pessoa, Recife, Maceió, Aracaju, Salvador, Belo Horizonte, Vitória, Rio de Janeiro, São Paulo, Curitiba, Florianópolis, Porto Alegre, Cuiabá e Goiânia, chegamos às seguintes conclusões (11): a) algumas dessas bibliotecas não possuíam regulamentos, o que dificultava o conhecimentoda posição da biblioteca em relação à dependência ou subordinação a outros órgãos superiores no âmbito administrativo da Unidade Federada; b) a biblioteca pública, como órgão de prestação de serviços à comunidade, necessita manter estatísticas diárias ou, pelo menos, uma mostra mensal, referentes à assistência de leitores. Em algumas das bibliotecas a confecção destas estatísticas se vê dificultada pela escassez de dados. Em razão disso, não se pode saber se há um aumento de consultas, empréstimos e freqüência de uso e conseqüentemente, a biblioteca desconhece o grau de satisfação do leitor com respeito aos serviços por ela oferecidos; c) são poucas as bibliotecas públicas que possuem um local e mobiliário adequado para uma boa atenção aos leitores. É de fundamental importância que, sempre que seja possível, seja utilizado o planejamento bibliotecário para construção de locais e seleção de um mobiliário adequado; d) o número de bibliotecários que trabalham nas bibliotecas públicas é ainda muito pequeno. Segundo as normas da Federação Internacional de Associações de Bibliotecários, a proporção de bibliotecários com qualificação, em relação ao resto do pessoal, dependerá das condições específicas em que se desenvolve uma unidade urbana. O mínimo proposto para uma unidade urbana desenvolvida é de 33% do pessoal total. Os gastos de pessoal constituem uma proporção muito elevada no que se refere ao orçamento da biblioteca pública, e é importante que os salários pagos aos bibliotecários com qualificação sejam suficientes para atrair e remunerar adequadamente o pessoal capaz e com iniciativa. Deve, portanto, haver uma separação clara entre o trabalho dos bibliotecários e o do pessoal auxiliar, assim como uma administração eficiente para que o tempo dos primeiros não seja desperdiçado em trabalhos rotineiros e de caráter secundário. e) os recursos econômicos das bibliotecas públicas são insuficientes e, em alguns casos, ridículos. Os bibliotecários devem conscientizar a autoridades sobre a necessidade da biblioteca ter seus próprios recursos, recebendo parcela considerável dos recursos destinados à educação e cultura. Esse problema não será resolvido somente com grandes recursos, a não ser que estes sejam aplicados com um planejamento adequado e sempre tendo como principal objetivo uma melhor assistência aos usuários. Assim, é importante que o índice de freqüência de uso, consultas e empréstimos seja melhorado, já que a parcela da população que utiliza a biblioteca é pequena; f) o acervo disponível na maioria das bibliotecas públicas é ainda insuficiente e não reflete a produção editorial brasileira. Este fato supõe que não exista uma motivação da comunidade para utilizar os serviços bibliotecários, ao não existirem acervos adequados. E com respeito aos usuários, o acervo bibliográfico nas bibliotecas públicas em um país em desenvolvimento como o Brasil é o setor, entre os diferentes que oferece a biblioteca, mais solicitado. A manutenção e atualização do acervo, o descarte de obras sem interesse para a comunidade, e a encadernação, sempre que seja necessária, são alguns dos aspectos de que não se podem descuidar em uma biblioteca, para que esta possa cumprir sua finalidade com os leitores; g) ainda que não tenha sido muito comum a utilização dos serviços de extensão nas bibliotecas públicas com o fim de atender às comunidades carentes, houve nos últimos anos um grande avanço neste setor. Atualmente a maioria das bibliotecas públicas estaduais possui este serviço através de carros-bibliotecas e caixas-estantes. Esta forma de extensão é de grande importância para o atendimento das populações suburbanas e rurais. No entanto, o número de carros-bibliotecas e caixas-estantes existentes é reduzido para um país tão grande como o Brasil. Tomando como ponto de partida estas conclusões, observa-se que as bibliotecas públicas podem e devem dar uma parcela maior de contribuição para o desenvolvimento educativo e cultural das comunidades brasileiras. É por isso necessário contar com recursos humanos e econômicos adequados. Da atuação do bibliotecário em beneficio da comunidade dependerá a conscientização das autoridades, para que se consigam mais recursos em prol da biblioteca pública. Em um país com tantas prioridades como o Brasil, os recursos nunca serão suficientes para o desenvolvimento dos serviços bibliotecários. Cabe aos bibliotecários a tarefa de aplicá-los de acordo com as necessidades e interesses da comunidade. As bibliotecas públicas brasileiras, que podem ser de caráter federal, estatal, municipal ou particular, segundo Hipólito Escolar (12), sofrem de um grave defeito: não contam, em geral, com empregados profissionais, nem recebem com continuidade recursos econômicos, nem aumentam seus acervos em quantidade regular; levam ainda um grande atraso na catalogação. Têm, no entanto, mais pessoal que o necessário, o que dificulta seu progresso, pois seus salários absorvem recursos que poderiam destinar-se à compra de livros. Além do mais, seu trabalho rende muito pouco. De todas elas, as que funcionam melhor são as municipais. Destaca-se a Municipal de São Paulo (Biblioteca Municipal Mário de Andrade), que ocupa o primeiro posto entre as bibliotecas da América Latina e de Portugal desde que a organizou nos anos 30 o grande bibliotecário e bibliógrafo Rubens Borba de Morais, que na década seguinte foi diretor da Biblioteca Nacional, cujos serviços modernizou. Na seguinte década Borba de Morais seria diretor da Biblioteca das Nações Unidas em Nova York e terminou sua carreira profissional nos anos 60 como professor de História do Livro e das Bibliotecas na Universidade de Brasília. Um bom plantel de bibliotecários, não muito numeroso, mas bem preparado, pode predizer, através de umas ativas organizações profissionais, um melhor porvir na missão de promover o desenvolvimento do livro e das bibliotecas brasileiras. A carência de bibliotecas, em termos quantitativos e qualitativos, tem produzido sérios problemas, cujos reflexos se configuram na difícil situação financeira que atravessam diversos editores e também na falta de hábito de leitura em grande parte da população brasileira. A falta de hábito de leitura na população apresenta um elevado índice. Anos atrás o Sindicato Nacional dos Editores de Livros e a Câmara Brasileira do Livro levaram a cabo uma investigação sobre a função social do livro na realidade brasileira. Verificou-se em seis grandes cidades brasileiras que o aluno de segundo grau se via limitado a uma vida doméstica em que “á noite se assiste à televisão". O uso regular do livro se apresenta em uma porcentagem de 39,3% de informantes, manifestando-se assim mesmo um afastamento da leitura em uma população que se encontra a um passo da vida universitária. Em um grupo da Universidade de São Paulo se comprovou que apenas 60% declarou haver lido no dia anterior à prova. E por leitura se entende uma revisão de um livro, jornal ou revista. A quantidade de tempo reservada à leitura em consonância com os indicadores apresentados revelou um resultado baixo em relação ao que se poderia esperar, enquanto que outras investigações revelaram uma média de duas a três horas diárias dedicadas à televisão. Richard Bamberger (13), ao analisar as razões por que em certos países se lê muito mais que em outros, viu que estas se revelaram nos seguintes fatores: a) a posição do livro na escala de valores do país, tal como se expressa através dos gastos econômicos destinados á promoção do livro; b) a tradição cultural; c) as oportunidades de leitura; d)o papel representado pelos livros nas escolas e no sistema educativo.A solução dos problemas detectados anteriormente pressupõe a adoção de técnicas de planejamento bibliotecário e de normas em nível nacional que uniformizem os serviços bibliotecários, a apresentação efetiva de assistência técnica nos diferentes níveis, tendo em vista a reorganização e melhora da atenção a toda a comunidade nacional, a utilização de serviços de extensão bibliotecária objetivando a assistência às populações suburbanas e rurais e como suporte às afirmações anteriores, a criação de uma infra-estrutura de recursos materiais e humanos. Assim mesmo, ao que acima se expõe, adicionam-se outras considerações: a) as bibliotecas públicas devem submeter-se a um planejamento integrado nos planos nacionais de educação, formando parte do planejamento social e econômico do país, pois não é senão nesse contexto que o planejamento bibliotecário pode alcançar as bases de apoio que precisa para ser eficaz; b) os recursos do Estado e dos municípios precisam ser melhor aproveitados, a fim de se evitarem desperdícios, duplicação de esforços e o desenten- dimento das regiões cronicamente desprovidas de infra-estrutura cultural; c) o Governo Federal não pode, pela magnitude do problema, deixar de atuar nesse setor de forma planejada e integrada; d) qualquer sistema de informação científica e tecnológica é um ápice de uma estrutura de serviços e hábitos de informação cujos representantes são as bibliotecas públicas; e) as bibliotecas públicas, como depositárias e divulgadoras de parte significativa da memória nacional, devem integrar-se no objetivo de superação do subdesenvolvimento; f) os interesses do Governo Federal na solução dos problemas que afetam ao plano de desenvolvi-mento educativo, cultural e do bem-estar do povo brasileiro. Considerando tudo isso, foi proposto ao Ministério da Educação e Cultura, no ano de 1976, por um grupo de bibliotecários de Brasília, formado por Antônio Briquet de Lemos, Edson Nery da Fonseca e Emir Suaiden, a implantação de um Sistema Nacional de Bibliotecas Públicas, com o propósito de incrementá-lo com os recursos necessários para a prestação de uma assistência técnica eficaz para as bibliotecas públicas estaduais, a fim de que estas viessem a desempenhar suas funções de cabeça ou centro de Sistemas Estaduais de Bibliotecas. Pretendia-se que as bibliotecas públicas brasileiras deixassem de funcionar isoladamente, como o vinham fazendo, estabelecendo-se um sistema institucionalizado de colaboração mútua que levasse a um maior rendimento dos recursos empregados. Neste sentido, a implantação do Sistema Nacional de Bibliotecas Públicas estava dirigida, em um primeiro momento, a: a) a criação de infra-estruturas de recursos humanos e materiais; b) a elaboração de normas de colaboração mútua entre as bibliotecas participantes; c) a organização de um serviço de extensão bibliotecária às comunidades carentes, de acordo com as necessidades e realidades locais. Considera-se que esta linha de atuação deveria criar condições suficientes para a efetividade do sistema, tendo em vista os objetivos definidos e os benefícios esperados. Ao órgão coordenador compete: a) acompanhar o sistema, nos moldes em que foi planejado, de acordo com a realidade nacional e com o melhor aproveitamento dos recursos disponíveis, já que os modelos existentes nos países desenvolvidos são inadequados para o Brasil; b) prestar cooperação técnica e financeira aos Estados, para a organização das bibliotecas públicas e a implantação do sistema; c) definir normas técnicas e procedimentos de serviço destinados a bibliotecas públicas; d) realizar inspeções técnicas e auditorias às bibliotecas públicas que o solicitem ou recebam subvenções e assistência técnica; e) desenvolver e estimular atividades de treinamento e aperfeiçoamento dos recursos humanos nos diferentes níveis, com a colaboração de instituições de ensino; f) promover e apoiar outras atividades de aperfeiçoamento de recursos humanos, como congressos, conferências, reuniões etc; g) estimular e promover a edição de obras adequadas ao aperfeiçoamento de recursos humanos em biblioteconomia e áreas afins; h) publicar periodicamente o Guia de Bibliotecas Brasileiras. As unidades federadas devem organizar seus respectivos subsistemas de bibliotecas públicas, de acordo com as normas emitidas pelo órgão coordenador. No âmbito estadual e regional as atividades de aquisição de livros, encadernação e processamento técnico devem ser centralizadas numa biblioteca já existente (preferencialmente a Biblioteca Pública Estadual) ou um órgão criado especificamente para este fim. As bibliotecas públicas estaduais ou regionais, como cabeça de sistema, são responsáveis pelas atividades de assistência técnica às bibliotecas integrantes do subsistema, tais como o catálogo coletivo, classificação e catalogação de obras, treinamento de recursos humanos etc. As bibliotecas públicas existentes e as que estão por organizar-se devem obedecer aos princípios de cooperação, racionalização e planejamento de suas atividades, tendo como meta a organização do subsistema de base estadual e regional. A referida implantação criará condições para que as bibliotecas públicas atendam convenientemente à comunidade através de seus serviços, tais como: pesquisa bibliográfica, consultas, empréstimos domiciliares, além de: a) proporcionar aos usuários o acesso a todos os conhecimentos e idéias independentemente da forma e do suporte material do seu registro, de maneira ampla e eficiente; b) participar ativamente dos programas culturais da comunidade e proporcionar serviços de extensão bibliotecária; c) atender ao maior número possível de usuários na sua área de ação através de serviços de carros-bibliotecas, vagão-biblioteca, barcos-bibliotecas, caixas-estantes etc; d) manter sistemas eficientes de circulação interna e externa, abrangendo todos os tipos de materiais da biblioteca, tanto impressos como não- impressos; e) proporcionar facilidades de leitura aos alunos de escolas que não disponham de bibliotecas; f) cooperar com os planos de alfabetização e educação continuada de adolescentes e adultos; g) colaborar com os sistemas de informação científica e tecnológica. O sistema em curso tem como objetivo geral a implantação de, pelo menos, uma biblioteca pública em cada município brasileiro. As metas especificas são: a) estimular a implantação de serviços bibliotecários, racionalmente estruturados, em todo o território nacional; b) promover a divulgação dos serviços oferecidos pelas bibliotecas brasileiras; c) promover a melhoria do funcionamento das bibliotecas públicas para que atuem como centro de ação cultural e educação permanente; d) manter o controle efetivo dos recursos bibliotecários existentes em nível municipal, estadual e federal, tendo em vista uma atuação planejada que conduza ao seu melhor aproveitamento; e) promover a extensão dos serviços bibliotecários nas zonas suburbanas e rurais. O projeto foi aprovado e sua implantação até agora tem beneficiado 13 Unidades Federadas. No transcurso de sua existência se pode observar que o desenvolvimento do sistema provocou diversas melhoras nos serviços bibliotecários, dentre as quais devem destacar-se: a) as bibliotecas estaduais, incluídas no sistema, passaram a dar assistência e ter controle efetivo nos municípios. Novos bibliotecários foram contratados e treinados nos serviços. Diversos prédios estão em processo de construção com bibliotecários participando do projeto. Aumentou sensivelmente o número de usuários atendidos, inclusive se deu atenção a presidiários,enfermos etc. A biblioteca pública pouco a pouco se vai convertendo num centro de irradiação cultural e de programas de aproximação à leitura, como com a chamada Hora do Conto, além de representações teatrais, atividades todas elas cada vez mais estimuladas; b) o Instituto Nacional do Livro, como órgão coordenador, procurou seguir ao pé-da-letra todas as determinações do projeto. Além da transferência de recursos financeiros e da assistência técnica das Unidades Federadas, vêm dando ênfase à publicação de livros de biblioteconomia e documentação. Na área de recursos humanos, além de cursos de formação de auxiliares de bibliotecas, o Instituto Nacional do Livro assinou um convênio como Departamento de Biblioteconomia da Universidade Federal da Paraíba, assegurando recursos para um projeto de quatro tipos de investigação: 1) a biblioteca pública como agente catalisador da comunidade; 2) tecnologias alternativas da informação; 3) estudos bibliográficos; 4) formação de recursos humanos em bibliotecono- mia. Em 1990 o Governo Collor extinguiu o Instituto Nacional do Livro passando suas atividades para a Fundação Biblioteca Nacional. O desenvolvimento das bibliotecas públicas brasileiras é um processo a médio e longo prazos. Os órgãos do governo responsáveis pela política bibliotecária, as escolas de biblioteconomia e associações de bibliotecários, têm uma grande responsabilidade neste processo de desenvolvimento que se inicia com a conscientização por parte das autoridades de que as bibliotecas públicas representam uma condição indispensável para a formação educativa e cultural, assim como para o aperfeiçoamento da qualidade de vida e a tomada de decisões em todas as esferas da vida administrativa e econômica. Por isso, a biblioteca pública se converte cada vez mais em um dos fatores de maior peso no desenvolvimento e na vida independente dos povos. A biblioteca pública tem urna importância muito grande no desenvolvimento da uma indústria editorial forte e independente, não somente porque adquire e divulga as obras publicadas, mas principalmente porque é a instituição que tem as melhores condições para formar um público leitor. Na realidade, o livro continua sendo o instrumento principal das atividades bibliotecárias. Há de se destacar que a produção e o consumo do livro no Brasil vem aumentando sensivelmente nos últimos anos, e nos parece prematuro e um tanto desfocado antecipar a sorte que está reservada ao livro como veículo de divulgação do conhecimento e saber. Ainda que se multipliquem até limites não previstos os meios de comunicação de massas os chamados mass media, ao longo de muitas décadas a palavra impressa (principalmente sob forma de livro), estará destinada a desempenhar um papel de grande importância na elevação dos níveis de informação à comunidade, funcionando como agente educativo primordial ou como um fator auxiliar; caber-lhe-á ainda por muito tempo uma função que seria imprudente menosprezar. Em sincronia com o esforço para a erradicação do analfabetismo, todas as agências ou entidades dedicadas a missões de alcance educativo devem unir-se para fortalecer o mais possível a ação deste instrumento altamente versátil e de incomparável penetração que é o livro. Sendo assim, é cada vez mais importante a integração da biblioteca pública com a indústria editorial, pois nos países desenvolvidos a biblioteca pública é o grande estimulador do progresso editorial. Penna, Foskett e Sewell (14), estudando a função da biblioteca na produção de livros, destacam que: “A função da biblioteca na complicada rede de produção e distribuição de livros exige uma cuidadosa precisão e necessita ser pormenorizadamente descrita nos planos de desenvolvimento educativo, assim como bibliotecário e editorial. As seguintes propostas são geralmente aceitáveis: a) ser uma fonte de inspiração e informação para os escritores; b) colocar autores principiantes em contato com os organismos de produção de livros, através de sua rede de serviços; c) esclarecer diante dos editores e livreiros as implicações de expansão de seus serviços em termos de qualidade e tipos de material requeridos; d) prestar assistência à indústria do livro nos intercâmbios internacionais através do ISBN (lnternational Standard Book Number) e outros programas de catalogação; e) prestar assistência à indústria do livro na determinação das preferências de leitura; f) contribuir para a circulação de livros novos através das bibliografias nacionais; g) proporcionar instalações para as classes de alfabetização, seja na língua nacional ou na língua internacional aceita; h) estimular o pessoal da biblioteca a atuar como professor destas classes; i) proporcionar instalações e material bibliográfico para o laboratório de redação e tradução; j) cooperar com eventos nacionais e locais destinados a promover os livros e a leitura; k) proporcionar nas áreas que não possuam livrarias pontos-de-venda de livros; I) formar um público leitor, como meta mais importante. Esta lista não está necessariamente completa e requer ser ampliada e adaptada para atender às circunstâncias nacionais e locais. Entretanto, demonstra que no processo de encontrar objetivos dentro de seu próprio âmbito, o serviço bibliotecário pode oferecer uma contribuição valiosa para o desenvolvimento do livro. Na realidade, os dois campos estão inter- relacionados e são interdependentes, e é desejável que se tenham instrumentos pertinentes na organização para reunir o pessoal empregado nas bibliotecas com aquele que trabalha no comércio de livros, tanto a nível local quanto nacional. " A formação de um público leitor é um dos principais objetivos da biblioteca pública. E como se forma um público leitor? Através de um acervo compatível com as necessidades da comunidade, por meio de pessoal qualificado e da comunicação direta com a comunidade. O papel do profissional bibliotecário, neste caso, é de grande importância na seleção dos livros que haverão de constituir os acervos da biblioteca e na identificação das necessidades de leitura da comunidade. Muitas vezes, o que se observa é que a comunidade não tem muita disposição para ler a literatura clássica de seu país e prefere os livros escritos por humoristas da televisão. Esse é um direito da comunidade, portanto, os bibliotecários não têm que impor um tipo de leitura; deve, isso sim, ser um profissional disseminador de uma política de leitura. Além da falta de bibliotecas públicas e de acervos adequados a indústria editorial brasileira encontra diversos obstáculos para se desenvolver. Existem poucos fabricantes de papel e celulose, o que obriga alguns editores a importar papel às vezes com um custo mais econômico que o nacional. O parque gráfico está desatualizado e a mão-de-obra é precária. A distribuição é complexa e o livro tem dificuldades para ser entregue no interior do país. Muitos editores não pagam os direitos autorais correspondentes e preferem editar os autores mais conhecidos. A falta de livrarias e a alta taxa de inflação complicam ainda mais a situação do livro no Brasil. Concordamos com Lucila Martinez (15) quando afirma que a leitura ao longo do processo histórico desempenhou um papel importante para intensificar a participação social dos indivíduos. Já existe uma série de posturas definidas em tomo desta problemática, entre as quais destacamos: a) uma das causas dos fracassos das reformas qualitativas da educação é a atenção inadequada e insuficiente que se dá aos problemas da leitura, situação esta que deriva da não-inclusão deste fator dentro dos planos e políticas de desenvolvimento do setor educativo e cultural; b) a eficácia das campanhas dealfabetização de massas é prejudicada pela falta de investigação, estudos e informação sobre a produção e distribuição de materiais para novos leitores, crianças e adultos, pela carência de mecanismos de sustentação das campanhas (o que provoca o retorno ao analfabetismo) e igualmente pela falta da facilidade para generalizar o acesso da população à produção editorial que circula em cada país; c) a contradição que existe na atualidade entre as quantidades de produção e venda de livros e o baixo número de leitores registrados pelas estatísticas, provocado em grande parte pela identificação indiscriminada de livro e da leitura como uma atividade predominantemente escolar e que, portanto, deixa de ser exercida quando cessa a escolaridade; d) não basta criar certas condições quanto à leitura; é necessário dedicar esforços à formação do leitor para despertar nele o interesse de ler, estimular sua atividade positiva e seu gosto pelos livros e facilitar o acesso a materiais e atividades que consolidem seus hábitos de leitura; e) os aspectos anteriores também explicam a dificuldade existente em alguns paises para obter o apoio necessário para o aumento e o desenvolvimento de serviços bibliotecários escolares e públicos. Muitos foram os esforços empreendidos nestes últimos anos. No entanto, não têm geralmente continuidade. Outros provêm da iniciativa privada, em lugar de vir de uma estratégia de governo (o que possibilitaria sua expansão nacional) ou, o que é pior ainda, em forma não-coordenada são desenvolvidos programas diferenciados por tipos de bibliotecas (de acordo com seus usuários), sofrendo uma perda considerável de recursos e falta de planejamento a médio e longo prazos. A bibliografia existente comprova que são os estudantes os grandes usuários das bibliotecas públicas. São as crianças que costumam ir às bibliotecas para fazer as tarefas escolares. Essas bibliotecas raramente são utilizadas pelos adultos. Isso é devido à falta de hábitos de leitura por parte da população adulta, ao que se juntam as más instalações, que não resultam nada atrativas, assim como a grande assistência de crianças às salas de leitura, que, invadindo aqueles espaços reservados aos maiores, produzem uma retração na população adulta. Por outra parte, a atenção que se oferece aos usuários é muito deficiente, devido a que os encarregados de propiciá-la não são as pessoas mais qualificadas. A falta de bibliotecas escolares e universitárias faz com que os estudantes busquem as bibliotecas públicas como uma grande alternativa para a realização de seus trabalhos escolares. Mas, da grande porcentagem que representam os estudantes entre os leitores das bibliotecas públicas, se deduzem também duas importantes conclusões: a) a parte da comunidade que resulta excluindo os estudantes, e onde se incluem os trabalhadores operários da construção, os industriais, donas de casa, comerciantes etc., tem uma participação pouco significativa relativa à freqüência com que utilizam a biblioteca pública ou usam os recursos que esta lhes oferece; b) a participação efetiva do estudante é muito importante na biblioteca pública e isto significa, quando menos, que os futuros administradores, por haver freqüentado a biblioteca pública, saberão valorizar melhor a função desta instituição no plano de desenvolvimento nacional, pois segundo Bamberger (16) "o direito a ler significa igualmente o direito a desenvolver as capacidades intelectuais e espirituais da pessoa, o direito a aprender e progredir”. Não obstante, se analisarmos a porcentagem de estudantes que não freqüentam a biblioteca pública, chegaríamos à conclusão de que se trata de uma porcentagem muito elevada. Em realidade, poucos são os países cujos sistemas de ensino favorecem a biblioteca, já que os próprios professores não foram educados para utilizá-la. As estatísticas comprovam que o aluno dedica muito mais horas ao lazer ou aos audiovisuais que à leitura. Em relação a este problema a professora Vera Teixeira de Aguiar (17) afirma que: "Ao lado do texto escrito, estão os meios de comunicação de massas, em um avanço crescente e progressivo, oferecendo o mundo novo da cor, do movimento, do som, da aventura, muito mais motivadores. E enquanto que os meios audiovisuais oferecem ao jovem uma enorme quantidade de materiais informativos e recreativos, a escola, que é a entidade de ensino sistemática, não desempenha um papel importante na criação do hábito de leitura, pois afasta o aluno do livro, ao não exigir dele mais do que comportamentos baseados na identificação de fatos e repetição de dados, não oferecendo situações realmente desafiantes, com ênfase no desenvolvimento do espírito critico e da criatividade, nem ensinando a pensar. Para a solução do problema é importante que se encontre uma estratégia que leve a criança, desde o inicio de sua formação, a ter experiências de contato direto com os livros, que devem ser manipulados, lidos, escolhidos e comentados. Para chegar a propiciar-se uma adequada intimidade entre o bom leitor e o livro, devem-se oferecer obras que, por sua trama narrativa, argumento e desenvolvimento dos personagens, assim como pelos problemas do mundo social que o rodeia, venham a interessar-lhe. É importante selecionar materiais de leitura que, por seu conteúdo e aspecto exterior, interessem ao leitor. Daí a necessidade de se diagnosticarem as tendências do público infantil e juvenil através da elaboração de pesquisa sobre os interesses de leitura". A integração com a biblioteca pública é um aspecto relevante segundo Pimentel (18): "Está evidenciado que ainda que a escola disponha de livros, recursos e materiais audiovisuais, estes não são suficientes. É necessário dinamizarmos e dar sentido especial ao trabalho educativo, convertendo o aprendizado em um fator cotidiano. O reconhecimento da importância das atividades bibliotecárias se produz pela convicção de que a personalidade não se desenvolve somente através do intelecto, mas também de todos os aspectos da vida mental, especialmente o afetivo. Mas, ainda que os alunos possam diferir na maneira de desenvolver sua personalidade, pondo alguns mais ênfase no aspecto intelectual e outros no sensório-motriz ou no emocional, o desenvolvimento da personalidade pode ser favorecido por aquelas práticas e por situações que provoquem maior vivência e proporcionem maior identificação dos alunos consigo mesmos. Considerando que a promoção social do indivíduo na comunidade e, num contexto mais amplo, a promoção da mesma comunidade, é diretamente uma conseqüência da educação, vale dizer que se refere à formação integral do homem, de modo que propicia sua participação como agente e beneficiário (no processo de melhora de sua qualidade de vida) no seu próprio ambiente. Por suas características, a biblioteca pública deverá assegurar o desenvolvimento de atividade de extensão de caráter permanente, contribuindo a proporcionar aos membros da comunidade seu aperfeiçoamento contínuo, possibilitando-lhes levar a cabo a transformação social sem ser marginalizados, representando assim um forte fator de mobilização para os programas pedagógicos" . A relação da biblioteca com a escola e a concorrência o a rivalidade entre a leitura e os meios de comunicação de massa têm sido muito discutidos nos últimos anos. Milanesi (19) estudando a diferença fundamental entre a biblioteca com centro de informação (e debate da problemática social), e escola e a televisão, chegou à seguinte conclusão: "Ambas, a escola e a televisão, permitem a discussão, ambas estão sedimentadas na vida, principalmente a televisão; apresentamrelativamente monolíticas em seus discursos; segue um caminho sem muitas variações, sem exceções. A biblioteca em contrapartida leva em si, ao contrário, a contradição do discursos opostos. Um leitor, depois de ler um texto com u determinado conteúdo, poderá imediatamente ter contato co outro que será ou pode ser a oposição ao precedente. Na escola isso não ocorre, devido à própria organização do ensino. No meios de comunicação de massa o jogo das contradições pode ser realizado, mas não terá alcance para o público. Nenhum programa de televisão comercial questionará a sociedade consumo e seus valores, se o fizesse seria de tal forma que intervalo de dois minutos restabeleceria todos os valore consumistas através dos anúncios". Já que os estudantes são os maiores usuários e isso é um realidade que deve orientar o planejamento dos serviços, biblioteca pública deve, além de aumentar seu grau de vincula com a escola, buscar meios, como o serviço de informação comunidade, para dar assistência a outros segmentos (operários de construção, donas de casa, aposentados etc). A utilização metodologia de estudo dos usuários e diagnóstico da necessidade de informação à comunidade são de fundamental importância para o desenvolvimento comunitário. Segundo afirma Murilo Bastos da Cunha (20), "nos últimos anos a biblioteconomia em quase todos os países está avançando de uma postura centrada nas técnicas e organização bibliográfica* pagina 51 A freqüência de uso foi medida pelo número de vezes que os entrevistados iam à biblioteca, assim como pelo número de vezes que haviam telefonado para a biblioteca no ano anterior. A freqüência zero indicava a não- utilização. A intensidade foi medida através da duração da visita à biblioteca. De acordo com o resultado da investigação, constatou-se que os usuários se diferenciavam dos não-usuários pela freqüência com que acudiam aos acontecimentos culturais, assim como o seu nível de hábito de leitura. No que se refere ao uso da biblioteca, os indivíduos foram classificados da seguinte maneira: a) não-usuários: aqueles que não queriam ser leitores ativos e tampouco envolver-se em programas culturais com a comunidade, nem com atividades de educação para adultos. A oportunidade dessas pessoas de chegarem a ser usuários das bibliotecas está muito longe, e em qualquer caso dependeria do desenvolvimento de campanhas de divulgação e programas de incentivos por parte da biblioteca que poderiam motivar interesse; b) não-usuários, mas que poderiam deixar de sê-lo, se forem considerados como usuários potenciais; c) usuários: pessoas que utilizavam a biblioteca com freqüência regular em suas visitas. Em 1983 D'Elia desenvolveu um novo modelo para demonstrar a satisfação dos usuários em relação aos serviços oferecidos pela biblioteca. Existiam assim duas aproximações de tipo geral para avaliar a satisfação dos ditos usuários, uma objetiva e outra subjetiva. Segundo a primeira, a biblioteca é o ponto de análise, enquanto que este seria o usuário se considerarmos a segunda aproximação. A satisfação das necessidades mediu-se pela função da biblioteca. O modelo foi provado em uma investigação do tipo domiciliar, em que os participantes eram todos os usuários da biblioteca. O nível de satisfação dos mesmos se mediu por meio de medidas diretas e indiretas. No primeiro caso, as perguntas foram objetivas, sendo subjetivas no segundo. Para avaliar os serviços consideraram-se vários elementos, como a qualidade das coleções, as facilidades físicas, os recursos humanos e a conveniência do horário de funcionamento. Quanto a medir a utilização da biblioteca, considerou-se a freqüência e a duração da visita, os serviços utilizados, a circulação dos acervos. No que diz respeito às características individuais dos usuários levaram-se em conta variáveis demográficas (sexo, idade e último ano de estudo). Concluiu-se que este tipo de avaliação só seria válido para medir um serviço específico desenvolvido pela biblioteca, e não para medir o serviço em sua totalidade. A única diferença que se observa neste modelo com relação a outros estudos anteriores consiste nas perguntas subjetivas, cujas respostas são dificilmente codificadas, e em alguns casos impossíveis de codificar. Baseando-se em uma pesquisa sobre usuários e não-usuários das bibliotecas públicas nos Estados Unidos, Madden chegou às seguintes conclusões: a) a utilização das bibliotecas está muito relacionada com outras atividades. Uma pessoa que realiza outras atividades, como políticas, desportivas etc. é provavelmente usuário da biblioteca; b) a mulher que não utiliza a biblioteca não participará seguramente em outros programas desenvolvidos por aquela. Seus interesses e atividades de grupo são muito limitados e a biblioteca pouco lhe oferece, pois ela não tem intenção de variar e ampliar suas atividades cotidianas. Muitos bibliotecários contradizem essa conclusão, mas mostra-se evidente que a biblioteca não representa o aspecto principal de vida dessas pessoas; c) muitos não-usuários poderiam ser conquistados através de grandes campanhas publicitárias, muito especialmente relacionadas com aperfeiçoamento doméstico e carros-bibliotecas. Muitos homens não- usuários desenvolveram habilidades relacionadas com seu aperfeiçoamento doméstico e a biblioteca pública poderia tirar proveito deles. Partindo da base de que o não-usuário tenha mulher ou filhos que usem a biblioteca, alguns livros relacionados com os seus interesses poderiam resultar na utilização da biblioteca. Muito provavelmente uma grande porcentagem desse público não será alcançada e, conseqüentemente, não utilizará a biblioteca; d) os usuários assíduos da biblioteca possuem uma variedade de interesses tão grande que as bibliotecas teriam dificuldades para definir suas necessidades. Por outro lado, os usuários representam uma pequena porcentagem do total da população, o que representa uma dúvida a respeito do emprego dos recursos em materiais destinados a este grupo; e) os usuários moderados, de ambos os sexos, são um público que merece uma atenção especial. As bibliotecas podem pedir ajuda para as mulheres deste grupo, particularmente para as que tenham habilidades particulares, babás e ocupações no tempo de lazer. Os homens podem verse atraídos mediante o aperfeiçoamento doméstico, o esporte, e um bom departamento de material de serviço. O problema está em organizar uma coleção ao gosto de quem visite a biblioteca. Além dos estudos de usuários tem também interesse o treinamento e a educação dos mesmos. Emília Currás (23) afirma que o usuário desconfia dos serviços bibliotecários pelos seguintes motivos: a) o usuário desconfia de que possa obter todas as informações aparecidas relativas a sua área de especialização; b) o usuário desconfia de que possa compreender ou entender todas as informações relativas a seus temas de trabalho; c) o usuário desconfia de que tenha todas as informações de que necessita, talvez porque não conheça as fontes eficazes para consegui-las; d) o usuário desconfia da eficácia da informações que recebe por desconhecimento das possibilidades do centro que as envia; e) o usuário desconfia da eficácia das informações que pode receber, porque o bibliotecário não compreende seus problemas de trabalho; f) o usuário desconfia dos serviços de informação em linha porque não os conhece. Não conhece sua estrutura e sua composição. Para a solução destes problemas é necessário o treinamento dos usuários nos serviços oferecidos pelas bibliotecas. A participação ativa dos usuários permitirá alcançar um grau de confiança e satisfação cada vez maior.Como conclusão, caberia indicar que é de fundamental importância que a biblioteca pública tenha um comportamento seguro com relação ao estudo de usuários. O importante é que mantenha um nível de satisfação adequado em relação aos usuários reais e que, por meio da qualidade de serviços, transforme os usuários potenciais em usuários reais e como ponto fundamental estude os não-usuários, de modo que estes possam, no futuro, converter-se em assíduos da biblioteca pública. No Brasil a porcentagem de não-usuários é bastante superior à de usuários. Geralmente, os não-usuários vivem em comunidades carentes dos centros urbanos e se defrontam não só com a falta de bibliotecas públicas, mas também com os problemas econômicos, culturais e educacionais. São as chamadas populações marginalizadas. No Brasil é comum a formação de favelas, onde não há as condições mínimas de higiene e serviços públicos, como luz, água, telefone etc. A grande maioria dessas pessoas, no Brasil, é analfabeta e não tem emprego. A organização e eficácia dos serviços bibliotecários ou de informação é de fundamental importância para a criação dos hábitos de necessidade informativa. Nice Menezes de Figueiredo (24) cita as barreiras e fatores que causam a subutilização da informação: a) Acesso à informação: - falta de controles bibliográficos em nível nacional; - barreiras linguísticas; - falta de serviços de referência; - falta de recursos para a aquisição de fontes de dados; b) Disponibilidade de documentos: - falta de um catálogo coletivo nacional; - falta de um depósito e reposição de documentos; - restrições políticas, de segurança nacional, de copyright; c) Absorção e uso eficaz da informação: - nível educativo dos usuários; - falta de motivação para o uso da informação; - falta de treinamento do usuário; - falta de promoção do uso da informação; - prestação deficiente dos serviços/sistemas de informação. Para a promoção do uso da informação, esta mesma autora propõe que se realizem: a) um estudo de usos/usuários definindo hábitos, motivações, necessidades, percepções e atitudes com relação ás suas necessidades e aos serviços/produtos existentes; b) a evolução dos recursos informativos existentes para atender ás demandas de informação; c) uma análise do aspecto físico e da disposição geral da coleção/serviço, para acondicioná-lo às necessidades e prioridades que requeira a difusão da informação; d) atualização permanente do pessoal, treinando-o na prestação de serviços de referência/informação e preparação dos instrumentos de difusão da informação; e) adequação do usuário para um uso eficiente dos recursos informativos disponíveis em sua área de atuação; f) uso do marketing e promoção dos serviços/produtos através de guias, folhetos informativos, contatos, comunicação, campanhas etc. As necessidades de informação dos não-usuários são muito distintas e compreendem o que poderíamos denominar como informação utilitária, destinada a resolver os problemas cotidianos. Ana Maria Polke (25), bibliotecária dedicada em grande parte ao estudo desta informação utilitária, estrutura esta informação em seus aspectos essenciais: 1) saúde: problemas de assistência médica e hospitalar; como, onde e a quem recorrer para a solução dos problemas referentes à saúde, planejamento familiar, prevenção de doenças, vacinação; 2) emprego: problemas para obter trabalho, estabilidade ou flutuação, agências, conciliação das atividades fora de casa com as tarefas domésticas; 3) legislação: problemas de obtenção de documentos, conhecimento de direitos e deveres legais, assistência jurídica, existência de associações de moradores, aposentadoria e obtenção de benefícios; 4) educação: problemas de vagas escolares, abandono da escola, reprovação, alfabetização de adultos, formação profissional, obtenção de bolsas, orientação sexual, educação para adultos (trabalhos manuais, artesanais); 5) lazer: problemas relacionados com o tempo livre, quais são os horários preferidos para distração, obstáculos ao lazer, papel da televisão e do rádio, leitura para o lazer (o que, como e para que ler); 6) moradia: problemas de posse da terra, aluguel, invasão de terras, serviços de água, esgoto e luz, condições da residência, vizinhança. A referida bibliotecária chegou a essas conclusões baseando-se em um estudo realizado no bairro de Pompéia, em Belo Horizonte (Brasil), tendo o objetivo de analisar como a informação utilitária circulava na comunidade, quais eram as informações necessárias de maneira cotidiana e quais as dificuldades com que a comunidade se defrontava em sua busca. As respostas mostram que a informação mais usada por esta população é a oral, obtida geralmente de vizinhos, amigos e parentes. Enquanto nos níveis superiores socioeconomicamente a informação registrada ou impressa é utilizada para complementar a informação oral, nos níveis mais baixos isso não é possível, devido ao analfabetismo, á falta do hábito de leitura e ao baixo poder aquisitivo. A obtenção da informação é tanto mais difícil e penosa quanto mais baixo seja o nível socioeconômico do individuo que a busca. A demanda de informação na área de emprego tem revelado ser a mais solicitada e onde a comunidade se encontra com maiores obstáculos. Existem instituições que prestam assistência (ofertas de emprego), mas, na opinião dos que as utilizam, não atendem a suas necessidades. O grande "não-público" da Biblioteca de Pompeya indica ao bibliotecário as possibilidades de atenção que se requerem para a provisão de informação utilitária. O desemprego faz com que todos os anos milhares de emigrantes do Norte e Nordeste brasileiro vão a São Paulo e Brasília em busca de melhores condições de vida. A grande maioria são operários sem especialização e analfabetos. No "Estudo das Necessidades de Informação dos Migrantes do Nordeste Brasileiro que Foram a São Paulo e Brasília", realizado por Angele R. F. A. dos Santos e outros (26), o objetivo era diagnosticar se a falta de informação pode ser um dos fatores que motivaram esta gente a não permanecer em tais cidades. Os objetivos específicos do mencionado estudo eram averiguar se existia uma necessidade de informação por parte dos emigrantes, determinar o que era preciso para assentar-se numa região que não era a sua de origem e diagnosticar os fatores que determinaram o grau de informação dos emigrantes. Além do mais, se propunha a avaliar as condições que concorreram para a sua residência em tais cidades, caracterizar o grupo de emigrantes que chegou a Brasília e São Paulo, os quais finalmente não se instalaram, detectar as diferentes necessidades de informação entre os que chegaram a uma e outra cidade e definir os serviços básicos de informação necessários para sua adaptação social nestas localidades. Por último se tentava comprovar se os serviços de assistência ao grupo de emigrantes foram satisfatórios, propondo a participação da biblioteca em um serviço não-convencional de informação utilitária compatível com o tipo de necessidade de informação desses emigrantes. O estudo apresentava também uma revisão da literatura com a definição e caracterização que do emigrante se fazia, assim como as causas e motivos das emigrações, a seletividade migratória, a região Nordeste do Brasil e o emigrante próprio dessa zona, a afluência do mesmo até São Paulo e Brasília e a adaptação do emigrante no meio social urbano, além da política de emigração, o papel social da biblioteca e a informação comunitária-utilitária. O passo seguinte consistiu em apresentar a metodologia com os parâmetros utilizados para medira falta de informação nos imigrantes do Nordeste, a limitação de estudos e o processo de aquisição de dados, que neste caso se realizou com uma entrevista estruturada. A análise continuava com uma interpretação dos dados, oferecendo no último capítulo algumas conclusões e sugestões. A metodologia apresentada no referido trabalho serve de modelo para diagnosticar necessidades de informação à comunidade. Na realidade, para os emigrantes que chegavam a São Paulo, pouco importava que a Biblioteca Municipal Mário de Andrade fosse a principal da América Latina e tivesse mais de dois milhões de livros em seu acervo. Os emigrantes não necessitavam da informação bibliográfica mas sim a referente à educação de seus filhos, saúde, moradia e principalmente questões de emprego. Por outro lado, devemos contemplar também o fato de que o número de analfabetos no Brasil é muito grande, o qual conduz à falta de interesse que o tipo de pessoa nessa situação tem pela informação bibliográfica e dai que sejam não-usuários das bibliotecas públicas. Quando se fala de educação e de bibliotecas destinadas a pessoas marginalizadas não podemos esquecer de Paulo Freire. Seu trabalho contribuiu em grande medida à educação brasileira e funde suas raízes em um contexto sócio-histórico muito concreto: o Nordeste brasileiro. Sua pedagogia se dirige às classes oprimidas, subalternas, marginalizadas, classes que se encontram longe do desenvolvimento educacional, cultural e socioeconômico. Daí que seu trabalho entende ser um processo de transformação das estruturas sociais (27). Os aspectos antropológicos constituem a base de sua pedagogia: seu método se enlaça com um processo de educação libertadora, em que o homem é sujeito criador de cultura: "cultura como resultado de seu trabalho, de seu esforço criador e recriador. A cultura como aquisição sistemática da experiência humana” (28). Freire (29) ensina que" o homem é um ser de relações e não de contatos; não só está no mundo senão com o mundo". O homem como ser de relações implica uma integração com o mundo e com os outros numa atividade dinâmica que o faz sujeito de sua ação. Disto se deduzem também possibilidades ilimitadas de criação no homem, fazendo com que cada um assuma sua identidade. O autor acrescenta que, na medida em que o homem se relaciona, cria e recria. Por outro lado, o homem, como um ser de contatos, tem um nível de adaptação e acomodação no processo educativo. Isto lhe conduz a uma posição de objeto, convertendo-se em depositário de atos alheios, sacrificando desta maneira sua capacidade criadora. Na educação libertadora, a alfabetização não é um mero jogo de palavras, nem sempre memorização; não se limita ao ensino da leitura e escrita de uma maneira mecânica, pois o conhecimento não é um ato de doação ou transferência que deva ser aceito pelos analfabetos de uma forma passiva ou receptiva, onde se é, então, objeto da ação. Ao contrário, toda ação educativa deve estar vinculada à realidade, e dessa maneira se aprender a entender o mundo. Desde esta perspectiva, o analfabeto buscaria manifestar suas atitudes básicas ante esta realidade de uma maneira critica. Isso "implica a negação do homem abstrato, ilhado, solto, fora do mundo". Paulo Freire baseia-se na informação ontológica de que todos os homens são iguais ante a natureza e o conhecimento e o tratamento que se deve dispensar ao adulto em sua prática educativa se centra neste mesmo aspecto. Não há homem ignorante em sua totalidade, em quem falte um conhecimento sistematizado, pois “o homem, por ser inacabado, incompleto, não sabe de maneira absoluta" (30), e como ser inacabado está em constante busca, já que "ninguém ignora tudo, ninguém sabe tudo" (31). A preocupação de Freire centra-se na participação e emancipação da pessoa. Destaca fortemente uma valorização positiva do homem e uma fé em sua liberdade e em seu poder de criação e critica. Freire destaca também a necessidade do homem de ter consciência de seu lugar na sociedade. Para substituir a realidade da escola, propõe o âmbito da leitura, que é um contexto mais flexível e dinâmico. No lugar do professor aparece o moderador de debates e seu papel é o de criar os estímulos necessários para o ato de conhecimento, onde, juntamente com o educando, se procura refletir a situação real desde uma postura critica. Os ensinamentos de Paulo Freire são de grande importância para a biblioteca pública por dirigirem-se às classes marginalizadas da sociedade e especialmente aos analfabetos. O nome mesmo "biblioteca pública" pressupõe uma biblioteca aberta a todas as pessoas, sem nenhum tipo de discriminação. No entanto, o certo é que muitos grupos sociais não utilizam a biblioteca, já que não empregam metodologias para integrar em si as diversas pessoas que compõem a comunidade. Atender adequadamente a este não-público é um objetivo fundamental da biblioteca pública. Como já dissemos, a porcentagem dos não-usuários é altamente superior em relação aos usuários nas bibliotecas públicas. Para atrair esta nova e importante clientela é necessária uma nova postura por parte dos profissionais da informação, pois, em muitas regiões, o próprio pessoal da biblioteca pública tem contribuído para que as pessoas marginalizadas do ponto de vista educacional, econômico e social não utilizem a biblioteca. Ao ser construída no centro da cidade, a biblioteca facilita o acesso dos habitantes da zona urbana, mas até hoje não tem conseguido ampliar os serviços à periferia, à zona rural, a hospitais, presídios etc. Muitas bibliotecas públicas têm passado a reservar um espaço físico para as academias de letras, os intelectuais, mas jamais se têm preocupado em promover reuniões com os trabalhadores da construção civil ou com os habitantes das favelas, para discutir problemas relacionados com a moradia ou com a dignidade humana. Devido a este tipo de comportamento, as populações mais humildes têm sido paulatinamente desmotivadas a freqüentar a biblioteca. É verdade que o primeiro contato do indivíduo com a biblioteca deve ser feito por meio da escola nos primeiros anos de ensino e, muitas vezes, a falta do bibliotecário não tem tomado possível a concretização dessa iniciação à biblioteca. Com poucas exceções, não tem havido promoção ou divulgação dos serviços bibliotecários e o marketing tampouco tem chegado a ser utilizado pela biblioteca pública. Por isso, a maioria da população desconhece as atividades bibliotecárias. É chegada a hora em que os bibliotecários se unam a outros profissionais, como sociólogos e psicólogos, para investigar as barreiras que separam os usuários da biblioteca pública. Na realidade, o problema econômico está em primeiro lugar, pois a população menos favorecida tem obrigatoriamente de ter mais de um emprego, e dedicar-se ao comércio ambulante para sobreviver. Com isso não há tempo para satisfazer as necessidades intelectuais. Devemos considerar também a inibição natural dessas populações quando entram em uma biblioteca pública para solicitar informações. Por outro lado, a falta de tempo e escassez de informação necessária são seguramente as desculpas mais comuns das pessoas que não utilizam a biblioteca pública. Mas neste círculo vicioso a biblioteca tem também parte da culpa, pois na maioria dos casos não prolonga o horário de atendimento ao público usuário. Se a comunidade não encontra realmente a informação que requer, o problema é muito grave, pois não é correto denominar esta instituição de "biblioteca pública"; se seu principal objetivo é o de manter um acervo suficiente e adequado, e oferecer as informações de que a comunidade
Compartilhar