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PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE SENADOR CANEDO-GOIÁS ____________________________________________________________________ EXCELENTÍSSIMA SENHORA DOUTORA JUÍZA DE DIREITO DA VARA DA FAZENDA PÚBLICA ESTADUAL DA COMARCA DE SENADOR CANEDO – ESTADO DE GOIÁS. O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS, por sua Representante Legal junto à Promotoria de Justiça da Comarca de Senador Canedo – Estado de Goiás, no uso de suas atribuições legais e com fulcro nos artigos 129, inciso III e 225, caput, ambos da Constituição da República e ainda, com base na Lei Federal nº 7.347/85, Lei Federal nº 6938/81, Lei Estadual nº 8.544/78, Resoluções CONAMA nºs 001/86 e 237/97, vem perante Vossa Excelência propor a presente AÇÃO CIVIL PÚBLICA AMBIENTAL em face do: MUNICÍPIO DE SENADOR CANEDO-GOIÁS, pessoa jurídica de direito público interno, representado pelo Sr. Prefeito Municipal – Vanderlan Vieira Cardoso, com sede na GO-403, Km 9, Conjunto Morada do Morro, Senador Canedo-GO, SECRETARIA MUNICIPAL DE MEIO AMBIENTE – SEMMA, com sede na Rua Santos Dumond, Qd. 21, Lt. 02, Setor Central, Senador Canedo, representada pelo seu Secretário Bonivaldo Pedro Silva,pelos fundamentos de fato e de direito que passa a aduzir: I - DOS FATOS Foi proposta, no dia 16 de abril de 2008, ação de desapropriação por utilidade pública, para fins de implantação da estação de tratamento de esgoto do município de Senador Canedo, relativamente à “faixa de terras, na margem esquerda do rio Meia Ponte que se estende desde as cercanias da Vila Galvão até as proximidades da GO-020”, zona rural, deste município. Por meio de despacho, proferido pela Excelentíssima Juíza em substituição, em 29 de maio de 2008, foi concedida imissão na posse do bem desapropriado, “conforme especificado no Decreto do Poder Executivo de nº 396 de 1º de abril de 2008, independentemente da perfeição do ato citatório.” Em 10 de junho de 2008, chegou ao conhecimento desta Promotoria de Justiça representação formulada pelo Sr. José Ferreira Pires Filho, proprietário da área em questão, noticiando que a área referida “ situa-se margeando o rio Meia Ponte e na sua distância máxima das margens do referido curso d´ água a divisa da propriedade possui menos de 600 (seiscentos) metros, o que fere o dispositivo do Decreto Estadual 5.496/2001”. Face à gravidade das informações contidas na representação supracitada, foi instaurado por esta Promotoria de Justiça o Procedimento Administrativo de nº 103/08, visando apurar a veracidade das notícias relativas à implantação da ETE, em área de preservação permanente, bem como à ausência de licenciamento ambiental. Consta dos autos da ação de desapropriação referidos (autos nº. 443/08 – protocolo 200801546391) que a propriedade objeto da ação consiste em 20.816 hectares de pastagens e 7.484 hectares de área de preservação permanente, formada pela faixa de proteção do Rio Meia Ponte e mata existente no local. Em 13 de junho de 2008, por volta das 11h, técnicos da Agência Goiana do Meio Ambiente, autuaram o Município de Senador Canedo, por iniciar as obras de implantação da ETE, sem o competente estudo e licenciamento ambiental, oportunidade em que lavraram o respectivo Auto de Infração nº 16497, assim como o Termo de Embargo e Interdição de nº 18422, onde embargaram toda atividade de estruturação do local, bem como o início de qualquer obra de implantação da ETE naquele local. (doc ). Do mesmo modo, em virtude do descumprimento do termo de embargo supracitado, em data de 16 de junho de 2008, técnicos ambientais, novamente, procederam à autuação do Município, lavrando o Auto de Infração de nº 16498, e novo Termo de Embargo e Interdição, este sob o nº 18423. Consta do Relatório Técnico Ambiental de nº 170-A/08, elaborado pelo técnico, Neri Caetano Barbosa, da Agência Ambiental de Goiás que: “Em atenção aos autos de nº 443, datado de 11 de junho de 2008, constando solicitação do Ministério Público desta Comarca, realizamos levantamento técnico nas margens do Rio Meia Ponte, quando constatamos a presença de equipes de trabalhadores que realizavam a construção de cercas de arame, visando isolar a área de implantação da ETE. No local verificamos também a presença de máquinas que realizavam a terraplanagem para instalação do escritório do canteiro de obras, a abertura de cercas da propriedade para a passagem de máquina, e o início da preparação do terreno e o levantamento de uma tenda para apoio da equipe de engenharia.(...) “Após vistoriar o local e constatar que as obras estavam sendo executadas sem os devidos estudos e o licenciamento ambiental, optamos por autuar o município de Senador Canedo e embargar as obras de execução da ETE. “Considerando ainda que a Prefeitura de Senador Canedo se negou a cumprir o termo de embargo de nº. 18422, datado de 13 de Junho de 2008, retornamos ao local, onde as atividades estavam sendo desenvolvidas normalmente e realizamos nova autuação e novo embargo das atividades, conforme cópias dos autos em anexo(...) “O município de Senador Canedo vem recebendo uma concentração industrial muito dinâmica, ao mesmo tempo em que o vale do Meia Ponte, tanto nesse município como no município de Goiânia reúne atividades diversas como os condomínios de alto luxo, onde se destaca o Flamboyant, o Portal do Sol I e II e o Goiânia Golf, contrastando como os cemitérios parque municipal, parque memorial de Goiânia, a ETE Ateneu, ETE do Distrito de Senador Canedo, 2 frigoríficos como o Goiás Carnes, o Frigoleles e um curtume, além de uma reciclagem de resíduos e um confinamento intensivo de bovinos. Ninguém está prevendo esta externalidade negativa e de alto risco que vem incomodando, alterando e interferindo na integridade dos recursos naturais e na sociedade, sem se considerar ainda que esse processo de ocupação concentrada esteja gerando uma expectativa geral, local e de conflito. “A ETE de Senador Canedo pode ser apenas mais uma fonte de alto potencial poluidor a ser instalada ou a gota d'água para acelerar o conflito que já é latente.” Outrossim, em resposta aos quesitos formulados pelo Ministério Público, restou constatado que: “(...) Questão nº 5. Consideramos, pela magnitude da obra, ser imprescindível a realização do estudo de impacto ambiental para a implantação do projeto, principalmente pela sensibilidade ambiental da área, pela presença de moradias e indústrias como os condomínios (Portal do Sol I, e II, Flamboyant, Goiás Carne – empresa de Exportação de carnes), ainda devido a necessidade da construção de emissários, elevatórias e outras intervenções, uma vez que o despejo só será direcionado ao local por meio de bombeamento. E até o momento esse estudo não foi realizado e nem obtido o licenciamento para a implantação do proejeto .(grifado) Questão nº 6. Será uma atividade de significativo impacto ambiental, pelo volume da obra, pela movimentação de terra, pela passagem de emissários e tubulações sobre outros cursos d'água, áreas consideradas de preservação permanente, oleodutos e gasodutos. Questão nº 7. Sim, embora entendemos tratar-se de uma obra de interesse público e social, cujo objetivo é a melhoria da qualidade de vida da população do município de Senador Canedo, a degradação ambiental decorrente da implantação do projeto é inevitável,e isso só poderia ser melhor avaliado através de estudos prévios, que pudessem apontar os método de atenuação, amenização e compensação do referido impacto. Questão nº 8. Embora se trate de uma obra de interesse público, social e coletivo, onde os da real dimensão da obra benefícios para a comunidade são evidentes e a área apresentar condições topográficas ideais para a execução do projeto, resguardando com segurança a APP do rio Meia Ponte, consideramos importante à apresentação dos estudos para que haja a demonstração de seus impactos, mesmo porque, certamente haverá no futuro precedente para o lançamento de esgoto industrial no sistema.” Foi apresentada, nesta Promotoria de Justiça, cópia da licença ambiental prévia, expedida pela Secretaria do Meio Ambiente de Senador Canedo (doc. ), datada do dia 30 de maio de 2008, contudo, eivada de vícios relativos à legitimidade do órgão licenciador, em total desacordo com a legislação ambiental (Resolução 69/06 – CEMAm), bem como inexistente o estudo exigido em lei, qual seja, o EIA-RIMA, acompanhado de audiência pública. Por tais razões, em 19 de junho de 2008, foi proposta Ação Cautelar Inominada preparatória da presente (Protocolo nº 200802756020, da Escrivania do Crime e Fazendas Públicas desta Comarca). Pretende-se, por meio da presente ação civil pública, a paralisação das obras de implantação da ETE de Senador Canedo, a qual deverá ser executada após o devido licenciamento ambiental válido, o qual deverá ser precedido do estudo de impacto ambiental definido em lei. Sendo assim, impende ressaltar que não se trata de uma ação de ressarcimento de dano ambiental, mas sim de pretensão relacionada com o impulso e a operacionalização forçada da tutela preventiva do meio ambiente. II - DA LEGITIMIDADE DO MINISTÉRIO PÚBLICO O artigo 129, inciso III, da Constituição da República é claro ao estabelecer a legitimidade do Ministério Público na defesa do Meio Ambiente, bem como aos termos do artigo 5º da Lei Federal nº 7.347/85, que confere iniciativa de ação para resguardar os interesses difusos e coletivos e, ainda, o artigo 14, § 1º, da Lei Federal nº 6.938/81. Assim, ao Ministério Público, como guardião da defesa da ordem jurídica e dos interesses indisponíveis da sociedade, compete, portanto, zelar pela fiel observância da Constituição e das leis, defendendo os interesses meta-individuais, sendo o detentor de legitimidade para referida defesa. III- DO DIREITO E DOS FUNDAMENTOS 1 - Da Necessidade Do Licenciamento Ambiental Válido O artigo 225 da Constituição da República, em seu inciso IV, estabelece para as obras que causem danos ao ambiente a exigência prévia de elaboração do estudo de impacto ambiental, in verbis: "Artigo 225 - Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações. Continua o § 1º, incisos IV e V, do citado artigo: “IV - exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente, estudo prévio de impacto ambiental, a que se dará publicidade. V - controlar a produção, a comercialização e o emprego de técnicas, métodos e substâncias que comportem risco para a vida, a qualidade de vida e o meio ambiente;" A Lei Federal n º 6.938, de 31 de agosto de 1981, que dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, estabelece em seu artigo 3º e incisos, o que se segue: "Artigo 3º. Para fins previstos nesta Lei, entende-se por: I - Meio Ambiente: o conjunto de condições, leis, influências e interações de ordem física, química e biológica, que permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas: II - Degradação da qualidade ambiental: a alteração adversa das características do meio ambiente; III - Poluição: a degradação da qualidade ambiental resultante de atividades que direta ou indiretamente: a) prejudiquem a saúde, a segurança e o bem estar da população; b) criem condições adversas às atividades sociais e econômicas; c) afetem desfavoravelmente a biota; d) afetem as condições estéticas ou sanitárias do meio ambiente; e) lancem matérias ou energia em desacordo com os padrões estabelecidos." O artigo 10 da mesma Lei de Política Nacional do Meio Ambiente diz, in verbis: “Artigo 10. A construção, instalação, ampliação e funcionamento de estabelecimentos e atividades utilizadoras de recursos ambientais, considerados efetiva e potencialmente poluidoras, bem como capazes, sob qualquer forma, de causar degradação ambiental, dependerão de prévio licenciamento do órgão estadual competente, ..., sem prejuízo de outras licenças exigíveis.” A Lei Estadual n º 8544, de 17 de outubro de 1978, que dispõe sobre o controle de poluição do meio ambiente, estabelece: “Artigo 2º. Considera-se poluição do meio ambiente a presença, o lançamento ou liberação, nas águas, no ar, no solo, de toda e qualquer forma de matéria ou energia, com intensidade, em quantidade de concentração ou com características em desacordo com as que forem estabelecidas em lei, ou que tornem ou possam tornar as águas, o ar ou o solo: I - impróprios, nocivos ou ofensivos à saúde; II - inconvenientes ao bem-estar público; III - danosos aos materiais, à fauna e à flora; IV - prejudiciais à segurança, ou uso e gozo da propriedade e às atividades normais da comunidade (...) Artigo 5º. A instalação, a construção ou ampliação, bem como operação ou funcionamento das fontes de poluição que forem enumeradas no regulamento desta lei, ficam sujeitos à prévia autorização do órgão estadual de controle de poluição do meio ambiente, mediante licenças de instalação e funcionamento.” O Decreto n º 1.745, de 06/12/79, que aprova o Regulamento da Lei Estadual n º 8.544/78, no art. 78, inciso IV, endossa a necessidade de licenciamento ambiental das fontes de poluição. A Lei Federal n º 9.605/98, que estabelece os crimes e infrações administrativas contra o meio ambiente, tipifica como crime: “Art. 60. Construir, reformar, ampliar, instalar ou fazer funcionar, em qualquer parte do território nacional, estabelecimentos, obras ou serviços potencialmente poluidores, sem licença ou autorização dos órgãos ambientais competentes, ou contrariando as normas legais e regulamentares pertinentes: Pena - detenção, de uma a seis meses, ou multa, ou ambas as penas cumulativamente.” Portanto é inequívoca a necessidade do Município Senador Canedo de possuir o prévio, válido e eficaz licenciamento ambiental, antes de iniciar a instalação da estação de tratamento de esgoto deste município. A política de proteção ao meio ambiente fez editar pelo Conselho Nacional de Meio Ambiente - CONAMA, a Resolução nº 01 de 23 de janeiro de 1986, a qual expressamente determina em seu artigo 1º, inciso IV: "Art. 1º - Para efeito desta Resolução, considera-se impacto ambiental qualquer alteração das propriedades físicas, químicas e biológicas do meio ambiente, causada por qualquer forma de matéria ou energia resultante das atividades humanas que, direta ou indiretamente, afetam: I – a saúde, a segurança e o bem estar da população; II – as atividades sociais e econômicas; III – à biota; IV - as condições estéticas e sanitárias do meio ambiente; V – a qualidade dos recursos ambientais.”Mais adiante, em seu artigo 2º enumera exemplificativamente uma série de obras ou atividades cuja elaboração do EIA/RIMA é obrigatória, senão vejamos: "Art. 2º - Dependerá de elaboração de estudo de impacto ambiental e respectivo relatório de impacto ambiental - RIMA, a serem submetidos a aprovação do órgão estadual competente, e da SEMA em caráter supletivo, o licenciamento, tais como: (...) V - Oleodutos, gasodutos, minerodutos, troncos coletores e emissários de esgotos sanitários; Assim, inquestionável a necessidade da administração, por meio do órgão ambiental competente, em controlar a atividade pretendida pela primeira requerida, através do licenciamento ambiental válido e eficaz. 2- Do credenciamento junto ao Ceman A Resolução nº 69 de 2006 do CEMAm – CONSELHO ESTADUAL DO MEIO AMBIENTE (doc. ) estabeleceu os procedimentos para a descentralização do licenciamento ambiental, com o fito de garantir a competência dos Municípios para o licenciamento das atividades de impacto local e a competência supletiva do Estado, evitando a duplicidade e omissão de ações, determinando, de consequência, a necessidade do credenciamento de cada município junto àquele Conselho. Desta maneira, para que seja providenciado tal credenciamento junto ao CEMAm, para a realização do licenciamento ambiental das atividades consideradas de impacto local, o Município deverá, de acordo com o art. 2º da mencionada Resolução: “(...) I. ter implantado Fundo Municipal de Meio Ambiente, através de lei, dotação orçamentária e conta bancária; II. ter implantado e em funcionamento Conselho Municipal de Meio Ambiente ou Conselho misto que tenha entre suas atribuições institucionais a proteção e conservação do meio ambiente, com caráter deliberativo, tendo em sua composição, no mínimo, 50% de entidades não governamentais; III. possuir nos quadros do órgão municipal do meio ambiente, ou a disposição deste órgão, profissionais legalmente habilitados para a realização do licenciamento ambiental; IV. possuir servidores municipais com competência para exercício da fiscalização ambiental; V. possuir legislação administrativa para aplicação do licenciamento ambiental e com as sanções administrativas pelo seu descumprimento; VI. possuir o levantamento das atividades potencialmente poluidoras e/ou degradadoras no Município.” Segundo extrai-se do documento anexo, (doc. ) oriundo da SEMARH – Secretaria do Meio Ambiente e Recursos Hídricos, em resposta ao Ofício de nº 195/08-PJ, não consta credenciamento do Réu, Município de Senador Canedo, junto ao CEMAm, nos termos da Resolução nº 69, porquanto “ até a presente data a prefeitura não apresentou documentos que solucionassem os problemas apresentados e, portanto, não foram transferidas atividades que hoje são licenciadas pelo Estado” . Assim considerado, temos que o Requerido, Município de Senador Canedo, não está autorizado a realizar licenciamento ambiental e emitir a licença ambiental das atividades de impacto local, por falta de credenciamento junto ao CEMAm, sendo assim, nula a licença expedida pela SEMA local. Outrossim, cumpre esclarecer que, em ato de legalidade questionável, a Assembléia Legislativa suspendeu os efeitos do item 24.06, Anexo único da Resolução n. 69, retrocitada, em 25de junho de 2008. Em se tratando de legislação afeta à proteção do meio ambiente, a competência legislativa é concorrente, competindo à União estabelecer normas gerais a serem observadas pelos Estados, ao passo que, aos municípios resta a competência para suplementar a legislação federal e estadual, no que couber (art. 24, c/c 30, II, CR). Dessa forma, se a Resolução CONAMA 01/86 conferiu aos Estados competência para aprovação de Estudo de Impacto Ambiental e expedição do licenciamento (art. 20), cabe exclusivamente a este ente definir a forma de sua atuação, assim como os critérios para delegar parcela dessa competência aos municípios, razão pela qual a descentralização da atividade de licenciamento não é obrigatória, tratando-se de mera faculdade daquele que detém a competência administrativa para exercitá-la. Ademais disso, impende ressaltar que a declaração de inconstitucionalidade de ato normativo do Poder Executivo e conseqüente nulidade só pode ser feita, em definitivo, pelo Poder Judiciário, razão pela qual a competência extraordinária conferida ao Poder Legislativo par suspender eficácia de atos normativos do Poder Executivo deve ser objeto de interpretação restrita. 3- Da Ausência do EIA/RIMA Cumpre salientar que, apesar da exigência legal do licenciamento ambiental para obras ou atividades potencialmente poluidoras, o empreendimento do Requerido, desde a sua concepção, não obedeceu aos trâmites formais estabelecidos na legislação pátria, eivando-o de vícios insanáveis, que foram, todavia, revestidos da aparência de legalidade por parte da Requerida Secretaria Municipal de Meio Ambiente. Desta maneira, em razão da atividade da primeira Requerida ser efetivamente a instalação de estação de tratamento de esgoto, ao não ser precedida da realização do EIA/RIMA – Estudo de Impacto Ambiental e o respectivo Relatório de Impacto Ambiental, desatendeu à determinação constitucional de prévia e eficaz avaliação do ambiente na tomada de decisões, uma vez que a atividade pretendida pela requerida comporta riscos de significativa degradação ambiental. A política de proteção ao meio ambiente fez editar pelo Conselho Nacional de Meio Ambiente - CONAMA, a Resolução nº 01 de 23 de janeiro de 1986, a qual expressamente determina em seu artigo 1º: "Art. 1º - Para efeito desta Resolução, considera-se impacto ambiental qualquer alteração das propriedades físicas, químicas e biológicas do meio ambiente, causada por qualquer forma de matéria ou energia resultante das atividades humanas que, direta ou indiretamente, afetam: I – a saúde, a segurança e o bem estar da população; II – as atividades sociais e econômicas; III – à biota; IV - as condições estéticas e sanitárias do meio ambiente; V – a qualidade dos recursos ambientais.” Mais adiante, em seu art.2º enumera exemplificativamente uma série de obras ou atividades cuja elaboração do EIA/RIMA é obrigatória, dentre elas tem-se expressamente a ACRESCENTAR: "Art. 2º - Dependerá de elaboração de estudo de impacto ambiental e respectivo relatório de impacto ambiental - RIMA, a serem submetidos a aprovação do órgão estadual competente, e da SEMA em caráter supletivo, o licenciamento, tais como: (...) V - Oleodutos, gasodutos, minerodutos, troncos coletores e emissários de esgotos sanitários; “O princípio da obrigatoriedade reza que o EIA não se encontra, essencialmente, no âmbito do poder discricionário da Administração. Ou seja, a aprovação do EIA é pressuposto indeclinável para o licenciamento da atividade. A regra é a elaboração do EIA: a exceção, sua dispensa. Por isso, esta última tem que ser justificada com o Relatório de Ausência de Impacto Ambiental Significativo (RAIAS). De acordo com esse princípio, a Administração deve, e não simplesmente pode, elaborar o EIA para aquelas atividades que causam danos substanciais ao meio ambiente. A margem de flexibilidade da Administração é mínima, prendendo-se somente a detalhes de execução do EIA. Presenteo pressuposto da ‘importância do impacto’, a atividade da Administração, na exigência do EIA, passa a ser vinculadamente, direcionada, não lhe cabendo fazer, in casu, apreciação da conveniência e oportunidade, pois carece de liberdade de abstenção. Conclui-se, de forma cabal, que em razão da atividade desenvolvida ser efetivamente a instalação de estação de tratamento de esgoto, fere os preceitos constitucionais demonstrados e eiva de nulidade o procedimento que culminou na Licença Ambiental de Instalação DCP nº 021/2008, por parte da Secretaria Municipal de Meio Ambiente, razão pela qual deve a mesma ser cassada – tanto pela falta de legitimidade para tal ato, como pela ausência de EIA-RIMA- e, de conseqüência, determinada a recuperação do meio ambiente degradado pela primeira parte Requerida. A conduta dos responsáveis na Secretaria Municipal de Meio Ambiente pela concessão das referidas licenças está tipificada no artigo 67, da Lei dos Crimes Ambientais, e está sendo objeto de investigação policial na Delegacia Estadual de Meio Ambiente.(Inquérito Policial n. 048/08 - DEMA) IV - DO ÔNUS DA PROVA Pelo princípio da prevenção, norteador de todo o Direito Ambiental, que se fundamenta nas características de irreversibilidade e de difícil quantificação e reparação dos danos ambientais, consubstanciada na velha máxima de que prevenir é melhor do que remediar, não se deve autorizar um empreendimento sem que se tenha certeza absoluta da não ocorrência de degradação ambiental. Em virtude da natureza difusa do interesse ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, a supremacia desse interesse público condiciona que a busca da certeza da não ocorrência dos danos recaia sobre o primeiro Requerido e não sobre a coletividade, isto é, ocorre a inversão do ônus da prova, devendo o empreendedor, município de Senador Canedo, apresentar os estudos que comprovem a não ocorrência de possíveis danos ou irregularidades aqui apontadas. V - DO OBJETIVO DA PRESENTE AÇÃO Aos termos do art. 3º da Lei nº 7.347/85, são três os objetivos da ação civil pública: obrigação de fazer, obrigação de não fazer e indenização. In casu, o Ministério Público materializa seu pedido, consoante da documentação inclusa nos autos do Procedimento Administrativo anexo, visando a declaração de nulidade do procedimento administrativo de licenciamento ambiental, que culminou na Licença Ambiental de Instalação nº 021/2008, bem como dos demais atos administrativos, que de qualquer forma autorizem qualquer alteração no meio ambiente na área objeto da presente ação, em que a requerida pretenda instalar uma estação de tratamento de esgoto. VI - DA NECESSIDADE DA MEDIDA LIMINAR Em razão da nulidade do licenciamento ambiental concedido, pelo não cumprimento da exigência legal de elaboração de EIA/RIMA (Estudo de Impacto Ambiental e Relatório de Impacto Ambiental), no não credenciamento junto ao CEMAm, e pelo fato do primeiro Requerido, com sua atuação, estar causando degradação ambiental de caráter irreversível na região, a concessão de MEDIDA LIMINAR é imprescindível para que cessem os danos e não acarrete maiores prejuízos ao meio ambiente e à saúde da coletividade. O artigo 12 da Lei nº 7.347/85, que contempla um procedimento especial, estabelece que é permitido ao Juiz o poder de conceder, sem justificação prévia, MEDIDA LIMINAR, onde lhe é permitido ainda cominar multa para o descumprimento (artigo 12, parágrafo 2º ), cuja exigência, no entanto, fica condicionada ao trânsito em julgado da decisão final. Trata-se de verdadeira medida antecipatória do provimento do mérito, tal qual nas liminares de procedimento especial, e não mera providência cautelar, perfeitamente possível, compatível e autorizada por lei, podendo ser concedida nos próprios autos da ação civil pública (cf. RTJ - JESP 113/312). A medida liminar tem, assim, perfeita aplicabilidade ao caso em questão, pois, a suspensão imediata da conduta lesiva ao meio ambiente praticada pelo Requerido Município de Senador Canedo é a única forma real de se garantir a sobrevivência dos recursos naturais afetados e a devolução da qualidade de vida à população diretamente prejudicada. Para tanto, bastam a presença do fumus boni juris e do periculum in mora, além da caracterização de possíveis danos irreparáveis ou de difícil reparação ao meio ambiente e às pessoas ou que mereçam a imediata ação do Poder Judiciário. O fumus boni juris está materializado na prova demonstrada da concessão indevida do licenciamento ambiental, sem a exigência do EIA/RIMA, e por órgão que não tinha atribuição para tanto, uma vez que não está credenciado junto ao CEMAm. Já o periculum in mora traduz-se no risco de se implantar a teoria do fato consumado, concernente no fato de que, se aguardarmos o julgamento final da presente ação, a implantação do empreendimento poderá ter tomado proporções irreversíveis. O perigo da demora em uma situação como esta eqüivale, nas palavras emprestadas do Promotor Jacson Correa1, “além do respaldo à própria ilegalidade, a um verdadeiro estímulo à destruição da natureza, permitindo também que persistam as reiteradas agressões à saúde humana, provocando por si só a irreparabilidade do dano face a impossibilidade de mensurá-lo concreta suficientemente, uma vez que o meio ambiente sadio, e por conta disso toda a natureza representam um patrimônio que pertence a todos, indistintamente”. 1 Revista de Direito Ambiental - Ed. Revista dos Tribunais nº 1 - pág. 277 Ademais, a defesa do meio ambiente é regida por princípios próprios, entre os quais encontra-se o princípio da precaução ou também denominado de princípio da cautela, da prudência, o qual exige, quando exista perigo grave ou irreversível ao meio ambiente, que não se imponha a certeza instrumental como meio de se postergar-se a adoção de medidas eficazes para impedir a degradação do meio ambiente. A certeza exigida pelo princípio da precaução dirige-se justamente para o lado oposto, isto é, para a afirmação da inexistência de prejuízo ao meio ambiente, a fim de que qualquer tipo de intervenção possa ser admitida. Assim, o Ministério Público requer, aos termos do artigo 12 da Lei nº 7.347/85, a concessão de MEDIDA LIMINAR, inaudita altera pars, consistente na ordem à primeira parte Requerida que cesse, incontinenti, as atividades de construção e instalação da estação de tratamento de esgoto, bem como qualquer alteração ao ambiente na área objeto da presente ação. Tudo sob pena do pagamento de multa diária a ser cominada, nos termos do 11, da Lei de Ação Civil Pública. Requer, ainda, nos mesmos termos do artigo 12 da Lei nº 7.347/85, a concessão de MEDIDA LIMINAR, inaudita altera pars, consistente na SUSPENSÃO da validade da Licença Ambiental de Instalação nº 021/2008 do empreendimento em questão, tudo sob pena do pagamento de multa diária a ser cominada, nos termos do 11, da Lei de Ação Civil Pública. VII - DO PEDIDO: ANTE O EXPOSTO, requer o Ministério Público do Estado de Goiás, por sua Representante Legal que assina a presente, no uso de suas atribuições Constitucionais (artigo 129, inciso II) Infra-Constitucionais e Institucionais, havendo substanciosa adequação entre o fato e o direito: I - Seja a presente ação recebida, autuada e processada na forma e no rito preconizado; II – O apensamento dos Autos nº 720/2008, da Escrivania das Fazendas Públicas à presente, nos termosdo artigo 809 do Código de Processo Civil. III - A concessão initio litis da LIMINAR, na forma requerida; IV – Digne-se sejam as partes Requeridas citadas na pessoa de seus Representantes Legais, para, querendo, virem responder aos termos da presente ação no prazo legal, sob pena de aplicação dos consectários jurídicos legais da revelia, o que desde já requer, produzindo as provas que porventura possuir, acompanhando-a até final julgamento, facultando ao Oficial de Justiça para a comunicação processual, a permissão estampada no artigo 172, § 2°, do Código de Processo Civil; Quanto ao MÉRITO, requer: Em relação à Requerida Secretaria Municipal de Meio Ambiente, visa o que se segue: I - Obrigação de não fazer, consistente em abster-se de autorizar, permitir e/ou licenciar qualquer obra ou atividade na área objeto da presente ação, ou em qualquer outra no Município de Senador Canedo, sem antes proceder o seu cadastramento junto ao CEMAN, nos termos da Resolução nº 69/2006. Em relação à Município de Senador Canedo, objetiva o seguinte: I – Obrigação de não fazer, consistente em: a) interromper, imediatamente, a realização das atividades da instalação de estação de tratamento de esgoto; b) não praticar qualquer alteração no ambiente na área objeto desta ação; II – Obrigação de fazer, consistente em: a) cadastrar-se junto ao CEMAm, nos termos da Resolução nº 69/2006; b) apresentar no processo de licenciamento ambiental referido, a elaboração de EIA/RIMA, a que deverá dar publicidade, com a realização de Audiência Pública. c) desocupar a área objeto da presente ação; d) recuperar a atual área degradada visando a restauração do ambiente ao status quo ante, mediante projeto técnico a ser apresentado, que atenderá às exigências técnicas definidas em perícia a ser realizada; e)indenizar os danos causados ao meio ambiente, cuja dimensão, caracterização e valoração serão estipulados em liquidação de sentença por artigos. V - a procedência in totum do pedido liminar e da ação proposta, com o julgamento definitivo de modo a satisfazer todos os objetivos expostos na presente peça vestibular inicial, fixando-se para isto prazo para o seu cumprimento, bem como cominação de sanção pecuniária, para o caso de descumprimento no prazo estipulado, nos termos do artigo 11 da Lei nº 7.347/85 VI – A publicação de Edital para dar conhecimento a terceiros interessados e à coletividade, considerando o caráter erga omnes da Ação Civil Pública. VII - Requer e protesta, ainda, provar o alegado por qualquer meio de prova admitida em direito, máxime provas testemunhais, periciais e documentais, e, inclusive pelo depoimento pessoal dos Representantes Legais das Requeridas, pleiteando desde já a juntada dos documentos anexos que fazem parte do conjunto probatório colhido no Procedimento Administrativo de nº 103/08, em trâmite nesta Promotoria de Justiça. VII - Protesta-se, ainda, por eventual emenda, retificação e/ou complementação da presente exordial, caso necessário. VIII – Sejam condenados as partes Requeridas ao pagamento da custas e demais cominações legais, em sendo o caso. Na forma do art. 18, da Lei Federal 7347/85, requer a dispensa do adiantamento e pagamento de custas, emolumentos, honorários periciais, e outros encargos. Conquanto de valor inestimável, dá-se à causa, para os efeitos legais, o valor de R$ 1.000.000,00 (um milhão de reais), ressalvando, no entanto, que este é um valor estimativo e formal, não impedindo o arbitramento de eventual indenização em nível superior. Nesses termos, P. deferimento. Senador Canedo, 15 de julho de 2008. MARTA MORIYA LOYOLA Promotora de Justiça EXCELENTÍSSIMA SENHORA DOUTORA JUÍZA DE DIREITO DA VARA DA FAZENDA PÚBLICA ESTADUAL DA COMARCA DE SENADOR CANEDO – ESTADO DE GOIÁS. AÇÃO CIVIL PÚBLICA AMBIENTAL II - DA LEGITIMIDADE DO MINISTÉRIO PÚBLICO III- DO DIREITO E DOS FUNDAMENTOS Marta Moriya Loyola Promotora de Justiça
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