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8. filosofando A crítica à modernidade

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15 
Detalhe do frontispício da Enciclopédia, ou 
Dicionário analítico de ciências, artes e ofícios. 
Charles Nicolas Cochin, o Jovem, 1764. 
E ETIMOLOGIA 
Enciclopédia. Do grego egkuklopaideía, literalmente 
"ensino circular" (panorâmico), por extensão, "educa-
ção completa ". 
Bem ao estilo do ideal iluminista, no 
centro desta ilustração que consta do 
frontispício da Enciclopédia, vemos a 
Verdade, envolta em intensa luz, ladeada 
à esquerda pela Imaginação (a poesia), 
prestes a enfeitá-la, e à direita pela Razão 
(a filosofia), que lhe retira o manto. 
Esse gesto faz alusão à palavra grega 
alétheia, "verdade", que etimologicamente 
signüica "não oculto", e, portanto, o que é 
"desvelado", "descoberto", "trazido à luz" 
pela razão. 
A obra grandiosa da Enciclopédia é 
composta de 28 volumes, sendo 17 de 
textos e 11 de estampas. Organizada 
por Denis Diderot, contou com mais de 
cem colaboradores, entre eles figuras de 
peso como Montesquieu, D'Alembert, 
Voltaire, Rousseau, Condorcet, D'Holbach. 
A obra divide-se em três partes: História 
(Memória), Filosofia (Razão) e Poesia 
(Imaginação). 
A parte de filosofia inclui a ciência, 
conhecida também como "filosofia 
natural". Observe que o subtitulo da 
obra - "Dicionário analítico de ciências, 
artes e oficios" -revela o crescente 
interesse pelas artes e pelos oficios, o 
que representa a valorização do artesão e 
do trabalho. Nela destaca-se a esperança 
depositada nos beneficios do progresso da 
técnica e no poder da razão de combater 
o fanatismo, a intolerância, inclusive 
religiosa, a escravidão, a tortura, a guerra. 
Discuta com seu colega em que medida 
os ideais iluministas foram cumpridos 
ou não - ao longo dos séculos 
subsequentes. 
179 
D De que trata o capitulo 
A reflexão que abre o capítulo nos dá a dimensão 
do que representou para o século XVIII e seguin-
tes o movimento intelectual da Ilustração. A crença 
na razão como guia na busca da verdade acentuou 
o processo que vinha da modernidade, desde que 
Descartes destacou o poder do sujeito de atingir o 
que era indubitável. 
Veremos como as dificuldades colocadas por 
outros pensadores diante da pretensão da razão 
levaram a uma primeira revisão crítica realizada por 
Kant. Por sua vez, já no século XIX, Hegel, Comte 
e Marx, entre outros, aprofundaram as divergên-
cias abrindo novas perspectivas, sobretudo a partir 
do desenvolvimento tecnológico e industrial, cujo 
impacto já era inegável. 
fJ A Dustração: o Século 
das Luzes 
O século XVIII é o período conhecido como 
Iluminismo, Século das Luzes, Ilustração ou 
Aufklarung (em alemão, "Esclarecimento''). Como 
as designações sugerem, trata-se do otimismo em 
reorganizar o mundo humano por meio das luzes 
da razão. 
Desde o Renascimento desenrolava-se a luta 
contra o princípio da autoridade e buscava-se o 
reconhecimento de que os poderes humanos por si 
mesmos seriam capazes de orientar-se sem tutela 
alguma. O racionalismo e o empirismo do sé-
culo XVII deram o substrato filosófico dessa 
reflexão. 
A filosofia do Iluminismo também sofreu a in-
fluência da revolução científica levada a efeito 
por Galileu no século XVII. O método experimen-
tal recém-descoberto teve a técnica como aliada, 
expediente que fez surgirem as chamadas ciên-
cias modernas. Posteriormente, a ciência seria 
responsável pelo aperfeiçoamento da tecnologia, 
o que provocou no ser humano o desejo de melhor 
conhecer a natureza para dominá-la. 
Por fim, a natureza passou a ser vista de maneira 
secularizada, desvinculada da religião. Livre de 
qualquer controle externo, sabendo-se capaz 
de procurar soluções para seus problemas com base 
em princípios racionais, o ser humano estendeu o 
uso da razão a todos os domínios: político, econô-
mico, moral e inclusive religioso. 
Roland Desné assim explica a exaltação do poder 
humano nesse período: 
[ ... ]a segurança do filósofo é a segurança do burguês 
que deve à sua inteligência, ao seu espírito de 
iniciativa e de previdência, o lugar que tem na 
sociedade[ ... ] A emancipação do homem, na 
qual Kant vê o traço distintivo do Iluminismo, é a 
emancipação de uma classe, a burguesia, que atinge 
sua maioridade.1 
1/;i,l PARA SABER MAIS 
O século XVIII é o período das revoluções burgue-
sas. Ainda no final do século anterior, em 1688, a 
Revolução Gloriosa na Inglaterra destronou os 
Stuarts absolutistas e, em 1789, no continente euro-
peu, os Bourbons foram depostos com a Revolução 
Francesa. No Novo Mundo ocorreram movimen-
tos de emancipação, como a Independência dos 
Estados Unidos (1776), e, no Brasil, a Conjuração 
Mineira (1789) e a Conjuração Ba iana (1798), com 
nítida influência dos ideais iluministas. 
A influência do Iluminismo estendeu-se por toda 
a Europa, principalmente na Inglaterra, na França 
e na Alemanha. 
D Kant: o criticismo 
No tempo de Kant (séc. XVIII), a ciência newto-
niana já estava plenamente constituída e as ques-
tões relativas ao conhecimento ainda giravam em 
torno da controvérsia entre racionalistas e empi-
ristas. Kant estava atento às dificuldades relativas 
à natureza do nosso conhecimento e debruçou-se 
sobre o assunto em sua obra Crítica da razão pura, 
mudando o rumo dessa discussão. 
Sua filosofia é chamada criticismo porque, 
diante da pergunta "Qual é o verdadeiro valor dos 
nossos conhecimentos e o que é conhecimento?", 
Kant coloca a razão em um tribunal para julgar o 
que pode ser conhecido legitimamente e que tipo 
de conhecimento não tem fundamento. Segundo 
o próprio Kant, a leitura da obra de Hume o des-
pertou do "sono dogmático" em que estavam mer-
gulhados os filósofos que não se questionavam 
se as ideias da razão correspondem mesmo à 
realidade. 
1 DESNÉ, Roland, citado por CHÂTELET, François (Org.). História da .filosofia: ideias, doutrinas. v. 4. 
Rio de Janeiro: Zahar, s.d. p. 74. 
Unidade 3 O conhecimento 
Pretendia superar a dicotomia racionalismo-em-
pirismo: condenou os empiristas (tudo que conhe-
cemos vem dos sentidos) e não concordava com os 
racionalistas (tudo quanto pensamos vem de nós 
mesmos). 
QUEM É? 
lmmanuel Kant (1 724-
-1804) nasceu na 
Prússia (Alemanha), em 
Kon igsberg, cidade de 
onde nunca saiu. Era 
profundamente religioso 
e levou vida metódica, 
dedicando-se a estudar e 
ensinar. Foi um dos maiores 
expoentes do Iluminismo, 
ao superar o racionalismo e 
o empirismo. Alertado pelo 
ceticismo de Hume, exami-
nou as possibilidades e limi-
lmmanuel Kant, 
s/d, autoria 
desconhecida. 
tes da ra zão em sua obra Crítica da razão pura, na 
qual indaga sobre "o que podemos conhecer"; em 
Crítica da razão prática trata das possibilidad es 
do ato moral ao perguntar sobre "o que devemos 
fazer"; em Crítica da faculdade do juízo investiga os 
juízos estéticos, distinguindo o belo do agradável 
e do útil. Defendeu sobretudo a autonomia moral 
do sujeito, a liberdade de pensa mento e a "paz 
perpétua", título de um texto famoso que até hoje 
merece atenção. Publicou também Fundamentos 
da metafísica dos costumes e A religião dentro dos 
limites da simples razão, entre outras obras. 
• Sensibilidade e entendimento 
Para superar a contradição entre racionalistas 
e empiristas, Kant explica que o conhecimento é 
constituído de algo que recebemos de fora, da expe-
riência (a posteriori) e algo que já existe em nós 
mesmos (a priori) e, portanto, anterior a qualquer 
experiência. 
lY ETIMOLOGIA 
A posteriori. Do latim posterus, posterioris, 
"posterior". 
• O que vem de fora é a matéria do conhecimento: 
nisso concorda com os empiristas. 
·O que vem de nós é a forma do conhecimento: 
com os racionalistas, admite que a razão não é 
uma "folha em branco". 
Qual é então a diferença entre Kant e os filósofos 
que o antecedem? É o fato de que matéria e forma 
atuam ao mesmo tempo.Para conhecer as coisas, 
precisamos da experiência sensível (matéria); mas 
essa experiência não será nada se não for orga-
nizada por formas da sensibilidade e do entendi-
mento, que, por sua vez, são a priori e condição da 
própria experiência. 
A sensibilidade é a faculdade receptiva, pela qual 
obtemos as representações exteriores, enquanto o 
entendimento é a faculdade de pensar ou produzir 
conceitos. Em cada uma dessas faculdades, Kant 
identifica formas a priori. 
• As formas a priori da sensibilidade ou intui-
ções puras são o espaço e o tempo. Ou seja, o 
espaço e o tempo não existem como realidade 
externa, são antes formas a priori que o sujeito 
precisa para organizar as coisas. Dizendo de 
outra maneira, fora de nós estão as coisas, mas 
quando as percebemos "em cima'', "embaixo'', 
"do lado'' ou então "antes", "depois", "durante" é 
porque temos a intuição apriorística do espaço 
e do tempo, caso contrário não poderíamos 
percebê-las. 
• As formas a priori do entendimento são as 
categorias. Como o entendimento é a faculdade 
de julgar, de unificar as múltiplas impressões dos 
sentidos, as categorias funcionam como concei-
tos puros, que não têm conteúdo, por serem for-
mas a priori, condição do conhecimento. Kant 
identifica 12 categorias, entre as quais destaca-
remos três: a substância, a causalidade e a exis-
tência. Quando observamos a natureza e afirma-
mos que uma coisa "é isto'', ou "tal coisa é causa 
de outra'', ou "isto existe", temos, de um lado, 
coisas que percebemos pelos sentidos, mas, de 
outro, algo lhes escapa, isto é, respectivamente 
as categorias de substância, de causalidade, de 
existência. Essas categorias não vêm da expe-
riência, mas são postas pelo próprio sujeito cog-
noscente. Portanto, segundo Kant: 
Nenhum conhecimento em nós precede a 
experiência, e todo o conhecimento começa com 
ela. Mas embora todo o nosso conhecimento 
comece com a experiência, nem por isso todo 
ele se origina justamente da experiência. Pois 
poderia bem acontecer que mesmo o nosso 
conhecimento de experiência seja um composto 
daquilo que recebemos por impressões e daquilo 
que nossa própria faculdade de conhecimento 
[ ... ] fornece de si mesma. [ ... ] Tais conhecimentos 
A crítica à metafísica 
denominam-se a priori e distinguem-se dos 
empíricos, que possuem suas fontes a posteriori, 
ou seja, na experiência. 2 
Lill PARA SABER MAIS 
Lembre-se de que Hume explica a causalidade pelo 
hábito e pela crença. Kant o refuta ao afirmar que 
a causal idade é uma condição da experiência e 
que não podia ser derivada dela. Posteriormente, 
outros filósofos criticaram Kant, até que na década 
de 1920 o físico alemão Werner Heisenbergformulou 
o princípio de incerteza, que põe em xeque o determi-
nismo e questiona a noção de causalidade (consultar 
o capítulo 31, "O método das ciências da natureza"). 
• As ideias da razão e a metafísica 
Com sua teoria, Kant garante a possibili-
dade do conhecimento científico como univer-
sal e necessário. No entanto, até aqui trata-se 
do conhecimento fenomênico, isto é, restrito ao 
conhecimento dos fenômenos, que percebemos 
inicialmente pelos sentidos e pelo entendimento. 
Poderíamos, porém, conhecer a "coisa em si" (o 
noumenon)? 
O que seria a coisa em si? São as ideias da razão 
para as quais a experiência não nos dá o conteúdo 
necessário. Nesse sentido, o noumenon pode ser 
pensado, mas não pode ser conhecido efetiva-
mente, porque, como vimos, o conhecimento 
humano limita-se ao campo da experiência. No 
entanto, o ser humano deseja ir além da experiên-
cia e nisso consiste o trabalho da razão, que inves-
tiga as ideias de alma, mundo e Deus, justamente 
os objetos da metafísica. 
Ao examinar cada uma dessas ideias, Kant se 
depara com as antinomias da razão pura, isto é, 
com argumentos contraditórios que se opõem em 
tese e antítese. 
Vamos dar alguns poucos exemplos, entre outros, 
a que Kant recorreu: 
• a ideia de liberdade tanto pode ter argumentos 
a favor como contra (determinismo); 
• pode-se argumentar tanto que o mundo tem 
um início e é limitado ou que não teve início e 
é ilimitado; 
• tanto se argumenta que o mundo existe a par-
tir de uma causa necessária, que é Deus, ou que 
não existe um ser absolutamente necessário 
que seja a causa do mundo. 
Kant conclui, portanto, não ser possível conhe-
cer as coisas tais como são em si. Decorre dessa 
constatação a impossibilidade do conhecimento 
metafísico. Devemos, portanto, nos abster de afir-
mar ou negar qualquer coisa a respeito dessas rea-
lidades. Trata-se de um agnosticismo. 
W ETIMOLOGIA 
Fenômeno. Do grego phainoménon, "aparência", o 
que "aparece" para nós. 
Noumenon. Do grego, "o que é pensado"; particípio 
passado de noein, "pensa r"; Kant usa o termo para 
designar "a coisa em si", em oposição a "fenômeno". 
Antinomia. Do grego anti-nomía, "contrad ição das 
leis", "confl ito de leis". 
Agnosticismo. Do grego a, "não", e gnosis, "conhe-
cimento". Para um agnóstico a razão é incapaz de 
afirmar ou negar a exi stência do mundo, da alma e 
de Deus. Com frequência o termo ficou reduzido à 
ideia de Deus e, nesse caso, distingue-se do ateísmo, 
que nega a ex istência de Deus. 
Entretanto, em outra obra, Crítica da razão prá-
tica, Kant recupera as realidades da metafísica que 
criticara no processo anterior. Enquanto a razão pura 
ocupa-se das ideias, a razão prática volta-se para a 
ação moral, que só é possível porque os seres huma-
nos- ao contrário da natureza, sujeita aos determi-
nismos - podem agir mediante ato de vontade, por 
autodeterminação. Pela análise do mundo ético, Kant 
recoloca as questões da liberdade humana, da imor-
talidade da alma e da existência de Deus, recuperadas 
como postulados. Trata-se de postulados, ou seja, de 
pressupostos que lhe permitem explicar a lei moral e 
seu exercício. Assim Kant justifica-se: "tive de supri-
mir o saber para encontrar lugar para a fê'. 
~PARA SABER MAIS 
Os temas referentes à Crítica da razão prática serão 
retomados no capítulo 20, "Teori as éticas". 
• A heranca kantiana 
' O pensamento kantiano é conhecido como idea-
lismo transcendental. A expressão "transcendental" 
em Kant significa aquilo que dá a condição de pos-
sibilidade da experiência, ou seja, o conhecimento 
transcendental é o que trata dos conceitos a priori 
dos objetos, e não dos objetos como tal. 
2 KANT, Immanuel. Crítica da razão pura. São Paulo: Abril Cultural, 1980. p. 23. (Coleção Os Pensadores). 
Unidade 3 O conhecimento 
:i 
ci 
~ 
Q 
o 
"" i g 
a: 
A liberdade guiando o povo. Eugene Delacroix, 1830. 
O próprio Kant descreveu sua filosofia crítica como 
uma "revolução copernicanà': tal como Copérnico 
levantara a hipótese de não ser o Sol que gira em torno 
da Terra, mas o contrário, também Kant afirma que 
se a metafisica anterior admitia que o nosso conhe-
cimento devia regular-se pelos objetos, agora admi-
timos que os objetos regulam-se pelo nosso conheci-
mento. Portanto, são os objetos que se adaptam ao 
conhecimento, e não o contrário. 
Mesmo fazendo a crítica do racionalismo e do 
empirismo, o procedimento kantiano redundou em 
idealismo: ainda que reconheça a experiência como 
fornecedora da matéria do conhecimento, é o nosso 
espírito, graças às estruturas a príori, que constrói a 
ordem do universo. 
Da crítica feita por Kant à metafísica, na Crítica 
da razão pura, surgiram duas linhas divergentes 
entre os filósofos do século XIX: 
• a primeira, representada pelos materialis-
tas (Feuerbach) e positivistas (Comte). Para 
Feuerbach, a matéria é anterior ao espiritual e 
o determina; posteriormente, os materialistas 
dialéticos Karl Marx e Friedrich Engels incor-
poraram ao materialismo de Feuerbach a noção 
hegeliana de dialética. Para Comte, a ciência 
(o saber positivo) é a formamais adequada 
de conhecimento, daí ter reduzido o conheci-
mento à descrição dos fenômenos, e a filosofia, 
à mera síntese dos resultados das diversas ciên-
cias particulares. 
Esta tela foi pintada no ano da 
revolução que depôs o rei Carlos X da 
França e representou uma inovação 
sob vários aspectos. Abandonando os 
princípios da representação acadêmica, 
que preferia cenas posadas em ateliê, 
Delacroix busca na rua a turbulência de 
um acontecimento daquele momento 
histórico. Em lugar de personagens 
importantes, prefere o povo anônimo, 
na luta destemida. A Liberdade é 
representada por uma mulher que ergue 
a bandeira tricolor da França e empunha 
um mosquete com baioneta. O menino 
armado simboliza a jovem República. 
A tela expressa düerentes niveis de tensão: 
entre classes, jovens e velhos, homens 
e mulheres, vivos e mortos. Observe a 
imagem com um colega e tentem localizar 
algumas dessas oposições. 
• a segunda, dos idealistas, que levaram às últi-
mas consequências a capacidade que Kant atri-
buía à razão de impor formas a priori ao con-
teúdo dado pela experiência. Os principais nomes 
foram Johann G. Fichte, Friedrich Schelling e 
Georg W. F. Hegel. Trataremos dos idealistas 
e positivistas em tópicos específicos, a seguir. 
1- Um novo tempo 
No final do século XV1II e começo do século XIX 
ocorreram significativas transformações. 
·As revoluções: a independência dos Estados 
Unidos (1776) e a Revolução Francesa (1789) 
foram celebradas como conquistas das Luzes. 
• A implantação do Terror na França por 
Robespierre e posteriormente a instauração do 
Império por Napoleão: tudo parecia contradizer 
o espírito do Iluminismo. 
• Prenúncio do romantismo na Alemanha (década 
de 1770) com o movimento Sturm und Drang 
("tempestade e ímpeto"), com o nacionalismo 
e a exaltação da natureza, do gênio, do senti-
mento e da fantasia. 
Esse foi um período de grande produção literária, 
com destaque para Goethe e Schiller, e filosófica, 
com]acobi e Herder. Esse movimento desembocou 
na recuperação da cultura clássica, no gosto pela 
arte e filosofia gregas, cujo equilíbrio se contrapôs à 
impetuosidade do período inicial do romantismo. 
A crítica à metafísica Capitulo 15 1 
O monge à beira-mar, de Caspa r David Friedrich, 1809. 
Nesse ambiente cultural surgiu o idealismo filosó-
fico, representado por Johann Gottlieb Fichte, Friedrich 
Schelling e Georg Hegel, sendo este último o que exer-
ceu maior influência no pensamento posterior. 
I] Hegel: o idealismo dialético 
O alemão Georg Wilhelm Friedrich Hegel (1770-
-1831) viveu a turbulência daqueles momentos que 
sacudiram a Europa e entusiasmou-se com eles. 
Conta-se que, ainda jovem, com 19 anos, ao lado de 
Schelling e Hõlderlin, celebrou a Revolução Francesa 
com o plantio simbólico de uma árvore. Sua admi-
ração por Napoleão, pela capacidade humana de 
transformação e pelo elogio aos movimentos polí-
ticos revolucionários refletiu-se em sua concepção 
filosófica de história e em sua epistemologia. 
Imbuído do espírito de sua época, fundou seu sis-
tema a partir da noção de liberdade do sujeito, cuja 
experiência não é solitária, mas se encontra envolvida 
pelo coletivo -instância essencial para a consciência 
de si mesmo. Nesse sentido, Hegel criticou a filoso-
fia transcendental de Kant por ser muito abstrata e 
alheia às etapas da formação da autoconsciência do 
indivíduo e deste na sua cultura. 
Hegel escreveu inúmeras obras, entre as quais 
Fenomenologia do espírito, Ciência da lógica, 
Enciclopédia das ciências filosóficas, Introdução à 
história da filosofia e Principias da filosofia do Direito; 
outras resultaram das anotações de seus alunos na 
universidade de Jena. 
A produção filosófica de Hegel talvez represente o 
último exemplo de teoria sistemática, que forma um 
todo acabado cujas partes se interligam de maneira 
Unidade 3 O conhecimento 
O pintor David Friedrich 
produziu inúmeras paisagens 
que exprimem o "sentimento do 
subli.me", tipico do romantismo. 
Nesta tela, observe a figura 
di.minuta do monge olhando o 
mar, enquanto tem a experiência 
simultânea de fascinio e terror em 
face do "demasiadamente grande" . 
Os sentimentos provocados pela 
visão do horizonte i.li.mitado do 
mar e a imensidão da natureza nos 
colocam diante do incomensurável, 
pelo qual nos damos conta de 
nossa pequenez e fi.nitude. 
coesa. No entanto, sua vasta erudição e a transforma-
ção que realiza em conceitos tradicionais tomam sua 
filosofia de dificil interpretação, às vezes hermética. 
Conceitos como ser, lógica, absoluto e dialética assu-
mem sentidos radicalmente novos. Por exemplo: o ser 
não é o ser da metafisica tradicional, mas designa uma 
realidade em processo, uma estrutura dinâmica. Além 
de que nenhum conceito é examinado por si mesmo, 
mas sempre em relação ao seu contrário: ser-nada, 
corpo-mente, liberdade-determinismo, universal-
-particular, Estado-indivíduo. Ou seja, o ser está em 
constante mudança: esta é a dialética hegeliana, ins-
pirada no pré-socrático Heráclito. 
liiYETIMOLOGIA 
Dialética. Do grego dialektiké, termo composto de 
lego, "falar", e dia, "através de", "por meio de". Entre 
os gregos, significa o diálogo, a arte da discussão. Em 
Hegel, expl ica a mudança pela contradição. 
• A dialética 
Hegel introduz uma noção nova, a de que a razão 
é histórica, ou seja, a verdade é construída no tempo. 
Partindo da noção kantiana de que a consciência 
(ou o suje i to) interfere ativamente na construção da 
realidade, propõe o que se chama filosofia do devir, 
do ser como processo, como movimento, como vir-
-a-ser. Desse ponto de vista, o ser está em constante 
transformação, donde surge a necessidade de fun-
dar uma nova lógica que não parta do princípio de 
identidade, que é estático, mas do princípio de con-
tradição, para dar conta da dinâmica do real. A sua 
nova lógica Hegel chama dialética. 
Hegel desenvolve, portanto, um novo conceito de 
história, também dialético: o presente é engendrado 
por longo e dramático processo; a história não é 
simplesmente acumulação e justaposição de fatos 
acontecidos no tempo. Resulta de um processo cujo 
motor interno é a contradição dialética, que conduz 
ao autoconhecimento do espírito no tempo. 
Segundo a dialética, todas as coisas e ideias sur-
gem e morrem. Como diz o poeta Goethe: "Tudo o 
que existe merece desaparecer". Mas essa força des-
truidora é também a força motriz do processo his-
tórico. A ideia central é a de que a morte é criadora, 
geradora. Todo ser contém em si mesmo o germe da 
sua ruína e, portanto, de sua superação. 
Em sua principal obra, Fenomenologia do espírito, 
o termo fenomenologia remete à noção de fenômeno 
como aquilo que nos aparece, que se manifesta, na 
medida em que é um objeto distinto de si, porque 
nele descobrimos a contradição, que por sua vez será 
superada em um terceiro momento. Vamos exempli-
ficar as três etapas da dialética com o desenvolvi-
mento da planta, que passa pelo botão, flor e fruto: 
• o botão: é a afirmação; 
• a flor: é a contradição, é a negação do botão; 
• o fruto: é uma categoria superior, a superação 
da contradição entre botão e flor. 
Napoleão sobre o cavalo na passagem de São Bernardo. 
Jacques Louis David, 1801. Hegel admirava Napoleão até 
que, em 1807, as tropas francesas acamparam em frente 
de sua casa, em Jena, na Alemanha. 
~PARA SABER MAIS 
É comum referir-se à tese, antítese e síntese como as 
trêsetapasda dialética hegeliana.Noentanto,o próprio 
Hegel não fez uso desses termos, que foram introduzi-
dos em 1837 por um comentador, Heinrich Chalybaus. 
Para melhor entender o processo dialético, lem-
bramos que Hegel usa a palavra alemã aufheben, 
"superar". A riqueza do termo está em significar 
"suprimir", "negar" e também "conservar". Essa 
ambivalência é adequadapara representar que, 
na superação da contradição, o que é negado é ao 
mesmo tempo mantido pela dialética. Portanto, a 
contradição não se reduz à alternativa de enuncia-
dos excludentes de tipo "ou-ou". 
U' PARA REFLETIR 
O que seria a crise da ado lescência senão a contra-
dição entre aquilo que fomos na infância e o que 
negamos dela? Por isso confrontamos nossos pais 
e seus valores, ao mesmo tempo que esses valores 
fazem parte de nós. A maturidade é que irá supe-
rar a contradição, ao nos const ituirmos como sujei-
tos livres ... até que outras cont rad ições surjam para 
serem superadas. Você viveu ou vive essas contradi-
ções em sua adolescência? Dê um exemplo. 
Desse modo, conhecer a gênese, o processo de 
constituição pelas mediações contraditórias, é 
conhecer o real. Por esse movimento, a razão passa 
por todos os graus, desde o da natureza inorgânica, 
da natureza viva, da vida humana individual até a 
vida social. 
Vejamos esse processo. 
Para explicar o devir, Hegel parte não da natu-
reza, da matéria, mas da ideia pura: 
• a ideia, para se desenvolver, cria um objeto 
oposto a si, a natureza; 
• a natureza é a ideia alienada, o mundo privado 
de consciência; da luta desses dois prinCípios 
opostos surge o espírito; 
• o espírito é ao mesmo tempo pensamento e 
matéria, isto é, a ideia que toma consciência 
de si por meio da natureza. 
• O idealismo 
O que Hegel entende por espírito? Num sentido 
geral, espírito ( Geist, em alemão) é uma atividade da 
consciência que se manifesta no tempo e se expressa 
em três momentos distintos: 
• o espírito subjetivo é o espírito individual, ainda 
encerrado na sua subjetividade (como ser de 
emoção, desejo, imaginação); 
• o espírito objetivo opõe-se ao espírito subjetivo: 
como tal, é o espírito exterior como expres-
são da vontade coletiva por meio da moral, do 
direito, da política. O espírito objetivo realiza-se 
naquilo que se chama mundo da cultura; 
A critica à metafísica Capítulo 15 
Mosaico de Minerva, 188o. 
M inerva é a versão latina da grega Atena, deusa da 
razão, das artes, da literatura e da filosofia, geral mente 
representada com a coruja, uma ave noturna. 
• o espírito absoluto, ao superar o espírito obje-
tivo, realiza a síntese final em que o espírito, ter-
minando o seu trabalho, compreende-o como 
realização sua. A mais alta manifestação do 
espírito absoluto é a filosofia, saber de todos 
os saberes, quando o espírito atinge a absoluta 
autoconsciência, depois de ter passado pela 
arte e religião. 
Por isso, Hegel chama a filosofia de ''pássaro de 
Minerva que chega ao anoitecer", ou seja, a crítica 
filosófica é feita ao final do trabalho realizado. 
O espírito absoluto na verdade é o mais complexo, 
porque ele é a totalidade ou síntese que resulta de 
todo o percurso anterior de autoconhecimento do 
espírito. 
Ao explicar o movimento gerador da realidade, 
Hegel desenvolve uma dialética idealista: a raciona-
lidade não é mais um modelo a se aplicar, mas é o 
próprio tecido do real e do pensamento. Na Filosofia 
do Direito, Hegel diz que o mundo é a manifestação 
da ideia: "o real é racional e o racional é real". A ver-
dade, nesse caso, deixa de ser um fato para ser um 
resultado do desenvolvimento do espírito. 
A razão nasce, portanto, no momento em que 
a consciência adquire "a certeza de ser toda a rea-
lidade" por meio das etapas fenomenológicas da 
razão no processo dialético. É esta uma contribui-
ção fundamental de Hegel: a defesa de uma concep-
ção processual de tudo o que existe. 
Unidade 3 O conhecimento 
Essa maneira de pensar é um idealismo porque 
os seres humanos pensam sobre si mesmos, mas 
também sobre a natureza, que inicialmente surge 
como um "outro'', diferente de mim, o que é supe-
rado quando ela é "idealizada'' pela razão. 
Na filosofia posterior a Hegel, tornou-se fecunda 
a ideia de que a razão é histórica e transforma-se a 
partir de conflitos e contradições. Como veremos, 
ora os pensadores reafirmam o caráter determi-
nante da razão e reforçam o idealismo, ora criticam 
esse idealismo. É o que fazem os marxistas, que 
enfatizam as contradições sociais e políticas como 
determinantes do processo que provoca a mudança 
da própria razão. 
Lill PARA SABER MAIS 
Voltaremos a Hegel no capítulo 25, ''Libera lismo e 
democracia". 
D Comte: o positivismo 
A Revolução Industrial no século XVIII, expressão 
do poder da burguesia em expansão, demonstrou 
a eficácia do novo saber inaugurado pela ciência 
moderna no século anterior. Ciência e técnica tor-
naram-se aliadas, provocando modificações jamais 
suspeitadas. Basta lembrar que, antes da máquina 
a vapor, era usada apenas a energia natural (força 
humana, das águas, dos ventos, dos animais) e, por 
mais que tenha havido avanços nas técnicas adota-
das pelos diversos povos através dos tempos, nunca 
um novo modo de produzir energia foi tão crucial 
como a obtida do vapor, que só se tornou possível 
com a Revolução Industrial. 
A exaltação diante dos novos saberes e for-
mas de poder levou à concepção do cientificismo, 
que se caracteriza pela valorização da ciência. 
Ela se tornou o único conhecimento possível, e o 
método das ciências da natureza passou a ser 
o único válido e que deveria, portanto, ser esten-
dido a todos os campos de conhecimento e de ati-
vidades humanas. 
A doutrina positivista, cujo principal represen-
tante foi o francês Augusto Comte (1798-1857), 
nasceu nesse ambiente cientificista - que o pró-
prio filósofo ajudou a exacerbar. Em sua obra 
Curso de fi losofia positiva, propôs-se a examinar 
como ocorreu o desenvolvimento da inteligência 
humana desde os primórdios, a fim de dar as dire-
trizes de como seria melhor pensar a partir do pro-
gresso da ciência. 
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• A lei dos três estados 
Comte diz ter descoberto uma grande lei funda-
mental, segundo a qual o espírito humano teria pas-
sado por três estados históricos diferentes: o teoló-
gico, o metafísico e finalmente o positivo. 
• No estado teológico, as explicações dos fenô-
menos supõem uma causalidade sobrenatural; 
os fenômenos da natureza, a origem dos seres, 
os costumes são explicados pela ação dos deuses. 
Tumba de Nefertari, esposa de Ramsés li (1 9ª dinastia), 
sécu lo XIII a.C. Osíris verde, deus da vida e da morte. 
No Egito Antigo, o culto de natureza mistura-se com 
o nascimento das divindades. Osíris é verde porque 
representa a fertilidade da terra, ao mesmo tempo que 
é o senhor da vida, da morte e da ressurre ição. 
• No estado metafísico, os agentes sobrenatu-
rais são substituídos por forças abstratas, por 
noções absolutas pelas quais são explicadas a 
origem e o destino do universo; por exemplo, na 
sua metafísica, Aristóteles explica a queda dos 
corpos pela essência dos corpos pesados, cuja 
natureza os faria "tender para baixo'', para o seu 
"lugar natural". 
· No estado positivo, que decorreu do desen-
volvimento das ciências modernas, as ilusões 
teológicas e metafísicas foram superadas pelo 
conhecimento das relações invariáveis dos 
fatos, por meio de observações e do raciocí-
nio, que visam a alcançar leis universais. Por 
exemplo, Galileu Galilei, espírito positivo, não 
indaga por que os corpos caem, não procura 
as causas primeiras e últimas, mas se con-
tenta em descrever como o fenômeno da queda 
ocorre. 
Para Comte, o termo "positivo'' designa o real 
em oposição ao quimérico, a certeza em oposição à 
indecisão, o preciso em oposição ao vago. Portanto, 
o estado positivo corresponde à maturidade do 
espírito humano, objetivo de toda educação daí em 
diante. É nesse sentido que diz: 
Todos os bons espíritos repetem, desde Bacon, 
que somente são reais os conhecimentos que 
repousam sobre fatos observados.Essa 
máxima fundamental é evidentemente 
incontestável, se for aplicada , como convém, 
ao estado viril de nossa inteligência.3 
Desse modo, o positivismo retoma a orientação 
daqueles que aproveitaram a crítica feita por Kant 
à metafísica, no século XVIII. E leva às últimas con-
sequências o papel reservado à razão de descobrir 
as relações constantes e necessárias entre os fenô-
menos, ou seja, as leis invariáveis que os regem. Ao 
se estender para as explicações sobre os fenôme-
nos humanos, essa concepção recusa a noção de 
liberdade. 
• A classüicação das ciências 
O determinismo cientificista do positivismo des-
considerou as expressões míticas, religiosas e meta-
físicas. E à filosofia, que papel lhe foi reservado? 
Segundo Com te, cabe a ela a sistematização das ciên-
cias, a generalização dos mais importantes resulta-
dos da física, da química, da história natural. 
Comte reconhece que a matemática, pela sim-
plicidade de seu objeto, constitui uma espécie de 
instrumento de todas as outras ciências e desde 
a Antiguidade teria atingido o estado positivo. 
Elaborou então a classificação das ciências -
cinco, ao todo: astronomia, física, química, fisiolo-
gia (biologia) e "física social" (sociologia). Essa clas-
sificação parte da ciência mais simples, mais geral 
e mais afastada do humano, que é a astronomia, 
até a mais complexa e concreta, a sociologia. 
3 COMTE, Augusto. Curso de filosofia positiva. São Paulo: Abril Cultural, 1973. p. 11. 
A crítica à metafísica 
• A sociologia, ciência soberana 
Comte afirmava ser o fundador da sociologia, 
por ter sido ele quem lhe deu o nome e o esta-
tuto de ciência. Definiu-a como física social, mas 
na verdade tomou os modelos da biologia e expli-
cou a sociedade como um organismo coletivo. 
Entusiasmara-se pela então recente teoria ~ 
~de Gall, que analisava a inteligência humana 
pela sua origem orgânica, inclusive buscando deli-
mitar a localização, no cerébro, das faculdades 
mentais - conhecer, sentir, querer - , sem con-
siderar conceitos como "eu'', "alma'', "consciência'', 
típicos da filosofia tradicional. 
Inspirado por essa teoria, Comte afirmava que 
apenas uma elite teria capacidade de desenvolver a 
parte frontal do cérebro, sede da faculdade superior, 
ou seja, da inteligência e dos sentimentos morais. 
Concluiu pela necessidade de a maioria dos seres 
humanos- dominados pela afetividade e, portanto, 
causadores da instabilidade social - ser moldada e 
dirigida em nome da harmonia e da ordem social, a 
fim de garantir o "progresso dentro da ordem". 
Reconhece que o indivíduo, submetido à cons-
ciência coletiva, tem pouca possibilidade de inter-
venção nos fatos sociais. A ordem da sociedade é 
permanente, à imagem da invariável ordem natu-
ral. A sociologia de Com te gira em torno de núcleos 
constantes, como a propriedade, a família, o traba-
lho, a pátria, a religião. 
Para alguns intérpretes, a filosofia comteana 
pode ser considerada uma reação conservadora à 
Revolução Francesa (1789). No entanto, a professora 
CRÁ NRS DE CRJM I N RLS 
Lelita de Oliveira Benoit não identifica seu pensa-
mento com o caminho contrarrevolucionário enca-
beçado por De Maistre, por exemplo. Comte não 
pensava em uma volta ao passado, à realeza e ao 
catolicismo, a fim de conservar a ordem burguesa 
abalada pela revolução. Não pretendia eliminar o 
progresso, mas desenvolver uma teoria da ordem 
com o progresso: ele queria participar da reconstru-
ção, instituindo a ordem de maneira soberana. 
É essa ideia de ordem que dominou seu trabalho 
de sistematização da filosofia, levando-o a classi-
ficar as ciências e todo o conhecimento em qua-
dros fechados, estanques. Vale observar que a pala-
vra ordem significa ao mesmo tempo "arranjo" e 
"mando''. É o próprio Comte que afirma: "Nenhum 
grande progresso pode efetivamente se realizar se 
não tende finalmente para a evidente consolida-
ção da ordem". 
A história não é mais pensada como vir-a-ser, mas 
como sequência congelada de estados definitivos. A 
evolução seria a realização, no tempo, daquilo que 
já existia em forma embrionária e que se desenvol-
veria até alcançar o seu ponto-final. O conceito de 
ciência comteano é o de um saber acabado, que se 
mostra sob a forma de resultados e receitas. Tendo 
colocado a ciência positiva como o ápice da vida 
e do conhecimento humanos, Comte estabeleceu 
uma série de postulados aos quais a ciência deve-
ria se conformar. O principal deles seria assegurar 
a marcha normal e regular da sociedade industrial. 
Ora, ao fazer isso, Comte trocou a teoria filosófica 
do conhecimento por uma ideologia. 
ARNIONI bri gan d 
Existe criminoso nato? Há quem pense que sim. O médico 
criminalista italiano Cesare Lombroso (1836-1909), igualmente 
influenciado pela frenologia de GaU, desenvolveu uma teoria 
para "identificar", na formação craniana e nos traços de 
fisionomia, os sinais da delinquência. Suas conclusões, de 
orientação positivista, tiveram larga aceitação por um certo 
periodo. Teria desaparecido sua influência? Você certamente 
VILLELLA 
t-: ~~~:!t~i~~~p~~:!l~ 11!11~;:~:~ut ARNI (IN I brigt nd 
C. Tu~•n:ulu ocuu~ d' tu <rôtn 
CH I ES I uunin, npl!!!- WJ!CCHI ~•le~r 
Unidade 3 O conhecimento 
já assistiu a telejornais de noticia policial. Na imprensa e nas 
conversas, sobretudo quando ocorre um crime bárbaro, é 
comum algumas pessoas tentarem explicar as ações criminosas 
com base em condicionantes psicológicos (distúrbios mentais, 
comportamento antissocial nato) ou fisiológicos (biológicos), 
que determinariam de modo incontrolável aqueles atos. 
Qual é seu ponto de vista? Para você, as teorias de 
Lombroso para explicar o comportamento criminoso são 
válidas ou não? Justifique sua resposta. 
Crânios de criminosos. Cesare Lombroso, 1887. 
• A religião da humanidade 
A rígida construção teórica de Comte culminou 
com a concepção da religião positivista. Não deixa 
de ser incoerente a criação de uma religião, pois, no 
contexto do seu pensamento, o estado teológico é o 
mais arcaico e infantil da humanidade. No entanto, 
desde seus primeiros escritos já aparecia essa noção 
de espiritualidade, que não se confundia com a reli-
gião tradicional. Diante do poder espiritual arrui-
nado de seu tempo, Comte via a necessidade de 
refundá-lo em princípios não teológicos, por meio 
da criação de uma Igreja Positivista, principalmente 
para convencer o proletariado a abandonar o pro-
jeto revolucionário. 
A religião do positivismo integra a sociedade dos 
vivos na comunidade dos mortos, na trindade for-
mada pelo Grande Ser (a humanidade), pelo Grande 
Feitiço (a Terra) e pelo Grande Meio (o Universo). Seria 
a religião da humanidade que forneceria o enquadra-
menta social para colocar os indivíduos ao abrigo das 
convulsões históricas. A religião positivista produzi-
ria então o milagre da harmonia social. 
Interior da Igrej a Posit ivista do Brasi l. Ri o de Janeiro, 
200 5 . O tem plo posit ivist a foi construído segundo 
orientações expressas de Augusto Comte. Nas 
paredes latera is, 13 bustos homenageiam grandes 
personalidades, responsáveis pelos progressos na 
ciência, na indústria, nas artes, na arq uitetura, como 
Moisés, Homero, Aristóte les, Dante e Gutenberg. No 
alta r principal, há uma pintura de Clot ilde de Vaux, por 
quem Comte se apaixonara: com uma criança no colo, 
ela simboliza a humanidade. 
• O positivismo no Brasil 
O positivismo exerceu grande influência no 
pensamento latino-americano. Em 1876, foi fim-
dada a Sociedade Positivista do Brasil e, em 1881, 
Miguel Lemos e Teixeira Mendes fundaram a Igreja 
e Apostolado Positivista do Brasil, cujo templo se 
situa na cidade do Rio de Janeiro. Foram eles tam-
bém os idealizadores da bandeira brasileira, com o 
seu dístico "Ordem e Progresso". 
Outros representantes foramLuís Pereira Barreto 
e Benjamin Constant, este último militar e matemá-
tico, conhecido pela participação atuante no movi-
mento político que culminou com a proclamação 
da República. Como ministro da Instrução (equiva-
lente ao da Educação), tentou transformar a tradi-
ção humanística do ensino com a introdução dos 
estudos científicos. 
Os adeptos do positivismo eram geralmente 
jovens da pequena burguesia comercial de cidades 
em crescimento, cujo anseio pela industrialização 
se contrapunha aos interesses dos proprietários 
de terra. Muitos positivistas eram militares, médi-
cos e engenheiros, o que denotava a valorização do 
conhecimento científico. 
• A herança positivista 
Além da influência na proclamação da República, 
o positivismo, no Brasil, repercutiu de maneira deci-
siva na concepção cientificista, a que já nos referi-
mos no início deste tópico. 
Essa orientação marcou a epistemologia das 
ciências humanas no início do século XX, dando 
origem à sociologia de Durkheim (1858-1917), que 
quis fazer dela uma ciência objetiva, examinando os 
fatos sociais como "coisas". 
Também a psicologia teve início na Alemanha, 
no final do século XIX, como psicofísica. Seus repre-
sentantes, como Wilhelm Wundt (1852-1920), eram 
médicos voltados para o exame de questões relati-
vas à percepção, com experiências controladas em 
laboratórios, deixando de lado questões que não 
pudessem ser observadas. 
til PARA SABER MAIS 
Voltaremos à influência de Comte no capítulo 32,"0 
método das ciências humanas". 
Frenologia. Teoria segundo a qual cada uma das 
faculdades mentais se localiza em uma parte do córtex 
cerebral. O tamanho ocupado por cada faculdade poderia 
ser percebido pela configuração externa do crânio. 
A aítica à metafísica Capítulo 15 .. . 
~-~- ~I! 
Moradores da vi la operária na Rua do Senado. 
Rio de Janeiro, 1906. 
Moradores diante de cortiço. A literatura 
naturalista do século XIX exemplifica bem a 
tendência ao materialismo e ao determinismo 
com a separação entre mente e corpo. 
São comuns as descrições de personagens 
como simples joguete do meio, da raça, 
do momento. Nos romances O mulato e O 
cortiço, de Aluisio Azevedo, o negro e o pobre 
são condicionados pelas circunstâncias, das 
quais não conseguem escapar. 
m Marx: materialismo e dialética 
Os alemães Karl Marx (1818-1883) e Friedrich 
Engels (1820-1895) escreveram juntos algumas 
obras e outras separadamente, mas sempre estive-
ram um ao lado do outro por convicções de pensa-
mento e por amizade. Engels, rico industrial, muitas 
vezes acolheu Marx e a família em momentos de 
dificuldades financeiras. 
Juntos observaram que o avanço técnico aumen-
tara o poder humano sobre a natureza e foi res-
ponsável por riquezas e progresso; mas, de outro 
lado, e contraditoriamente, trouxera a escraviza-
ção crescente da classe operária, cada vez mais 
empobrecida. 
Leitores de Hegel, aproveitaram dele a dialé-
tica. Porém, Marx e Engels perceberam que a teo-
ria hegeliana do desenvolvimento geral do espí-
rito humano não conseguia explicar a vida social. 
Dando sequência às críticas feitas por Feuerbach 
ao idealismo, Marx e Engels realizaram uma inver-
são, assentando as bases do materialismo dialético. 
Engels afirma que: 
[ ... ]a dialética de Hegel foi colocada com a cabeça 
para cima ou , dizendo melhor, ela , que se tinha 
apoiado exclusivamente sobre sua cabeça, fo i de novo 
reposta sobre seus pés4 
Ou seja, enquanto para Hegel o mundo material 
é a encarnação da "ideia absolutà', da "consciência", 
para o materialismo o mundo material é anterior 
ao espírito e este deriva daquele. Segundo a visão 
materialista, o movimento é a propriedade funda-
mental da matéria e existe independentemente da 
consciência. A matéria, como dado primário, é a 
fonte da consciência, e esta é um dado secundário, 
derivado, pois é reflexo da matéria. 
No contexto dialético, porém, a consciência 
humana, mesmo historicamente situada, não é 
pura passividade: o conhecimento das relações 
determinantes possibilita ao ser humano agir 
sobre o mundo, até mesmo no sentido de uma ação 
revolucionária. 
• Materialismo histórico 
O materialismo histórico é a aplicação dos princí-
pios do materialismo dialético ao campo da histó-
ria. Como o próprio nome indica, é a explicação da 
história a partir de fatores materiais (econômicos, 
técnicos). Pelo senso comum costuma-se explicar a 
história pela ação das grandes figuras, como César, 
Carlos Magno, Luís XVI, ou das grandes ideias, como 
o helenismo, o positivismo, o cristianismo, ou ainda 
pela intervenção divina. Marx inverte esse processo: 
no lugar das ideias, estão os fatos materiais; no lugar 
dos heróis, a luta de classes. 
4 ENGELS, G. "Ludwig Feuerbach e o fim da filosofia clássica alemã''. Em: MARX Karl e ENGELS. 
Friedrich. Antologia .filosófica. Lisboa: Estampa, 1971. p. 136. 
Unidade 3 O ~onhecimento 
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o \;l Cartaz, 
~ provavelmente 
s do início do ~ séculoXX. 
A Lei Áurea, que pôs fim à escravidão, 
resultou do crescente encarecimento da mão 
de obra escrava, das pressões internas em prol 
da abolição, incluindo as revoltas e as fugas de 
escravos, e do fortalecimento de fazendeiros do 
oeste paulista, os quais, de mentalidade mais 
capitalista, já tinham iniciado a experiência 
com a mão de obra livre. Sob essa perspectiva, 
os motivos econômicos tiveram maior força na 
abolição do que os ideológicos, ao contrário 
do que insinua a ilustração. Nela o branco 
cumprimenta o negro, e a expressão "Agora sim!" 
demonstra um otimismo que não se cumpriu, já 
que os ex-escravos não foram adequadamente 
integrados ao mercado de trabalho nem à 
sociedade, e lutam até hoje contra o preconceito e 
a discriminação. Discuta com seu colega por que 
esse tema foi escolhido para fazer parte em um 
tópico sobre a teoria de Marx. 
llill PARA SABER MAIS 
Consu lte também os capítulos 6, "Trabalho, al iena-
ção e consumo", e o 26, "As teorias social istas". 
O marxismo não nega o heroísmo de alguns nem 
as ideias, mas explica a realidade a partir da estrutura 
material de uma determinada sociedade. A ide ia é algo 
secundário, não no sentido de ser menos importante, 
mas sim por derivar de condições materiais, ou seja, 
as ideias do direito, da literatura, da filosofia, das artes 
ou da moral estão diretamente ligadas ao modo de 
produção econômico. Por exemplo: na moral medie-
val, a valorização da fidelidade do vassalo ao suserano 
decorre do modo de produção que estabelece os for-
tes liames da hierarquia. Sem a fidelidade, a relação de 
produção na sociedade feudal estaria arruinada. 
Com o comércio e a indústria nascente, que se 
baseava no modo de produção capitalista, deixam 
de existir senhores, vassalos e seus servos. As rela-
ções de trabalho estabelecidas por contratos e a 
ideia de cidadania se sobrepõem aos valores de fide-
lidade e servidão. 
Portanto, segundo Marx, para estudar a socie-
dade não se deve partir do que os indivíduos dizem, 
imaginam ou pensam, mas da identificação de 
como produzem os bens materiais necessários a 
sua vida. Analisando as forças produtivas e as rela-
ções de produção é que se descobre como os seres 
humanos produzem sua vida, suas ideias e como 
fazem a história. 
Assim dizem Marx e Engels em A ideologia alemã: 
Não é a consciência que determina a vida, mas a vida 
que determina a consciência.5 
E Marx, em Teses sobre Feuerbach: 
Os filósofos se limitaram a interpretar o mundo de 
diferentes maneiras; o que importa é transjormá-lo. 6 
O que os dois filósofos querem nos dizer? Que não 
basta teorizar, se nãopartirmos da vida concreta e 
a ela voltarmos para transformá-la. O movimento 
dialético entre teoria e prática chama-se práxis. Mas 
não se veja na teoria uma atividade anterior à prá-
tica e que a determina nem vice-versa, uma vez que 
ambas encontram-se dialeticamente envolvidas. 
No mesmo texto Teses sobre Feuerbach (Tese li), 
Marx diz: 
A questão de saber se cabe ao pensamento humano 
uma verdade objetiva não é uma questão teórica, 
mas prática. É na práxis que o homem deve 
demonstrar a verdade, isto é, a real idade e o poder, o 
caráter terreno de seu pensamento. A disputa sobre a 
realidade ou não realidade do pensamento isolado da 
práxis é uma questão puramente escoJástica. 
Escolástica. Com este termo, Marx ironiza a tradição 
aristotélico-tomista, que para ele é idealista, 
contemplativa e, portanto, desligada dos rea is 
interesses humanos. 
MARX, Karl e ENGELS, Friedrich. A ideologia alemã. São Paulo: Hucitec, 1984. p. 37. 
6 MARX, Karl. Teses sobre Feuerbach. São Paulo: Hucitec, 1984. p. 14. 
A crítica à metafísica Capítulo 15 1 
• A ideologia 
Segundo o materialismo dialético marxista, as 
ideias devem ser compreendidas no contexto his-
tórico vivido pela comunidade. No entanto, Marx 
vai além, mostrando que muitas vezes esse conhe-
cimento aparece de maneira distorcida, como ideo-
logia, ou seja, como conhecimento ilusório que tem 
por finalidade mascarar os conflitos sociais e garan-
tir a dominação de uma classe sobre outra, quando 
se vive em uma sociedade dividida em classes, com 
interesses antagônicos. 
Para Marx, as concepções filosóficas, éticas, poli-
ticas, estéticas, religiosas da burguesia são estendi-
das para o proletariado, perpetuando os valores a 
elas subjacentes como verdades universais. E desse 
modo, impedem que a classe submetida desenvolva 
uma visão do mundo mais universal e lute por sua 
autonomia. 
O quarto estado. Giuseppe Pel izza da Volpedo, 18g8-1g01. 
O títu lo da obra sugere que o proletariado seria o novo 
poder emergente. Os três estados eram no século XIX 
a nobreza, o clero e o "terceiro estado" (a burguesia). 
Se levarmos às últimas consequências a ideia de 
que, sob uma perspectiva dialética, a consciência 
nunca é cegamente determinada, pode-se concluir 
que caberá à classe dominada desenvolver o dis-
curso não ideológico, portador de universalidade 
Unidade 3 O conhecimento 
e não mais restrito aos interesses de uma classe 
dominante. E, como dirá Marx, o proletariado 
poderá lutar inclusive pela revolução, entendida 
como transformação radical do ser humano e da 
sociedade. 
6 Para uma visão de conjunto 
No século XVIII, Kant propôs superar a dicoto-
mia racionalismo-empirismo, que fora a principal 
discussão epistemológica do século anterior. Aliou 
as formas a priori da sensibilidade e do entendi-
mento ao conteúdo fornecido pela experiência sen-
sível, mas esbarrou nas antinomias da razão que o 
impediam de conhecer as realidades metafísicas. 
A filosofia de Kant desembocou, no século XIX, no 
idealismo e no materialismo, nos quais destacamos 
Hegel, Comte e Marx. 
Hegel inovou ao perceber a realidade como um 
processo dialético: a razão é histórica, a verdade 
é construída no tempo. O pensamento, posto em 
movimento na história, desferiu um golpe na visão 
estática e metafísica do mundo. Para o idealismo 
hegeliano, mais do que um modelo a ser aplicado, 
a racionalidade é o próprio tecido do real e do 
pensamento. 
Comte procurou entender o novo mundo criado 
pela ciência, pela tecnologia e pelo desenvolvimento 
industrial. Descartou a metafísica ao reconhecer a 
ciência positiva como um saber acabado, o ápice 
da vida e do conhecimento humanos, configurando 
assim a concepção cientificista que marcaria um 
longo período. 
Apropriando-se da dialética e baseado em uma 
visão materialista do mundo, Marx reforçou a 
dimensão comunitária da vida e viu no conheci-
mento uma maneira de intervir no mundo ( conhe-
cer para transformar). Com a crítica da ideologia -
esse saber ilusório - , antecipou questões que, no 
século seguinte, desencadearam a chamada "crise 
da razão". 
Deixamos aqui de examinar o pensamento de 
Nietzsche, para abordá-lo na próxima parte, tal a 
força iconoclasta de suas ideias e sua influência na 
filosofia do século XX. 
Iconoclasta. Que destrói imagens sagradas (ícones). 
No contexto, que se opõe à tradição, que destrói 
valores constituídos.

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