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Arlindo Ugulino Netto ● MEDRESUMOS 2016 ● FISIOLOGIA 1 www.medresumos.com.br REGULAÇÃO DO EQUILÍBRIO ACIDOBÁSICO O nosso organismo é capaz de realizar diversos mecanismos no intuito de nos manter vivos. Como exemplos desses mecanismos, já conhecidos por nós, temos a manutenção constante das taxas de glicose, a manutenção da calemia, da volemia e do pH (concentração hidrogeniônica). Este, de maneira especial, é de extrema importância uma vez que interfere diretamente na atividade enzimática. Se o pH do sangue é alterado (fuja de seus valores padrões e fisiológicos), a atividades das enzimas também é alterada, o que pode, inclusive, levar a morte. A regulação do balanço de íons H + deve ser, portanto, mais precisa possível. A atividade dos sistemas enzimáticos é influenciada pela concentração de íons hidrogênio e as alterações funcionais das enzimas alteram as funções celulares e corporais. A concentração normal de H + no organismo é extremamente baixa (0,00004 Eq/l) e com isso, a variação normal deve ser muito pequena. Antes de iniciarmos os nossos estudos sobre os mecanismos que regulam e estabelecem um equilíbrio acidobásico no nosso corpo, devemos relembrar alguns conceitos como: Ácidos: é qualquer substancia que libera prótons (H + ) em meio aquoso. HCl + H2O H3O + + Cl - H2CO3 + H2O H3O + + HCO3 - H2SO4 + 2H2O 2H2O + + SO4 = Bases: segundo Bronsted, é qualquer substancia que recebe prótons (H + ). HCO3 - + H3O + H2CO3 HPO4 = + H3O + H2PO4 - Proteínas (carga negativa): aceitam H + Par conjugado: a partir do momento que temos uma substancia que doa prótons e outra que recebe, temos a formação de um par conjugado. A concentração normal de H + no sangue é de 0,00004 Eq/l ou 40 nEq/l, e esta concentração nas soluções é expressa em escala logarítmica: pH = log 1/[H+] ou – log [H+] [H+] = 0,00004 Eq/l = 0,00000004 mEq/l pH = - log [0,00000004] pH = 7,4 Acidose: pH > 7,2 Alcalose: pH < 7,4 Morte: 6,8 > pH > 8,0 OBS 1 : As únicas enzimas que fogem ao pH ótimo padrão de todas as enzimas de nosso sistema enzimático (pH= 7,2 a 7,4) são as enzimas que, segundo alguns autores, não estão no nosso organismo, mas sim, na luz do nosso trato gastrointestinal (ou seja, “externo ao nosso organismo”, e não no íntimo dele), e são elas: as enzimas do sistema gástrico (como a pepsina, que tem um pH ótimo em torno de 2) ou as do suco pancreático. OBS²: A concentração de hidrogênio no sangue arterial é de cerca de 4x10 -5 (ou seja, pH=7,4) ao passo em que a concentração deste próton no sangue venoso é de 4,5x10 -5 (ou seja, pH=7,35). Costuma-se dizer então que o sangue venoso tende a ser um pouco mais ácido de modo que o sangue arterial tende a ser um pouco mais básico, embora o pH do sangue não foge aos valores entre 7,2 e 7,4. MECANISMO DE REGULAÇÃO DA CONCENTRAÇÃO DE H + O sistema primário da regulação da concentração de H + é representado pelos tampões fisiológicos acidobásicos dos líquidos orgânicos, sendo o principal deles o sistema tampão bicarbonato-oxigênio. O exercício deste mecanismo é regulado por dois órgãos: Centro respiratório (formação reticular do bulbo): regula a remoção de CO2 e de H2CO3 do LEC Rins: promovem a excreção de urina ácida, ou alcalina, ajustando a concentração de íons H + do LEC Arlindo Ugulino Netto. FISIOLOGIA 2016 Arlindo Ugulino Netto ● MEDRESUMOS 2016 ● FISIOLOGIA 2 www.medresumos.com.br Os pulmões são os primeiros órgãos da escala hereditária fisiológica responsáveis pela excreção de ácidos, de modo que toda acidose metabólica leva a um quadro de hiperventilação pulmonar, uma vez que as altas concentrações de CO2, estimulam os centros respiratórios superiores e estes são responsáveis por desencadear uma resposta somática que culmina em um maior processo de expiração, no intuito de eliminar mais CO2. A reação acima, catalisada pela anidrase carbônica, demonstra o equilíbrio determinado pelo tampão de Bicarbonato/CO2, em que o bicarbonato representa o componente básico e o CO2, componente ácido do tampão. EQUAÇÃO DE HANDERSON-HASSELBACH A fórmula que expressa o valor do pH de soluções tampão, sabendo que um ácido se dissocia da seguinte maneira, temos: Sabendo que o pKa do bicarbonato é 6,1, temos: Quanto maior a concentração de HCO3 - elevação do pH alcalose. A concentração de HCO3 - é regulada pelos rins. Quanto maior a concentração de CO2 redução do pH acidose. A concentração de CO2 (PCO2) é controlada pela frequência respiratória. DISTÚRBIOS DO EQUILÍBRIO ACIDOBÁSICO Alteração primária da concentração de HCO3 - do LEC leva a distúrbios acidobásicos metabólicos. As acidoses e alcaloses são definidas como sendo metabólicas (quando há alterações nas concentrações do HCO3 - ) ou respiratórias (primárias, quando relacionadas há alterações nas concentrações de CO2). HCO3 - alcalose metabólica HCO3 - acidose metabólica PCO2 acidose respiratória (ex: pacientes com enfisema pulmonar) PCO2 alcalose respiratória (ex: pacientes histéricos) PROTEÍNAS: TAMPÕES INTRACELULARES As proteínas funcionam como tampões intracelulares, pois podem receber ou doar prótons. Como exemplo, temos a hemoglobina, que sai dos pulmões saturada em oxigênio (sangue arterial alcalino) e, ao chegar nos tecidos (onde ocorre o metabolismo e, consequentemente, mais produção de ácidos), o pH ácido dessa região faz com que a Hb perca a sua afinidade pelo oxigênio, liberando-o e se ligando a prótons de H + (Hb+H + ), equilibrando a acidez desta região e levando esses prótons de volta aos pulmões, onde a concentração de O2 é alta. Deste modo, o H + é liberado, reage com o bicarbonato e é liberado. O tamponamento total dos líquidos orgânicos depende do líquido intracelular (LIC). Ação tamponante do LIC é lenta (exceção = hemoglobina), dependendo do movimento lento do H + e do HCO3 - através da membrana celular. REGULAÇÃO RESPIRATÓRIA DO EQUILÍBRIO ACIDOBÁSICO PAPEL DO PULMÃO NA REGULAÇÃO DO EQUILÍBRIO ACIDOBÁSICO A expiração pulmonar de CO2 é equilibra pela própria produção de CO2 do organismo. Este gás é produzido continuamente pelas células e difunde-se livremente para o sangue, para ser eliminado pelos pulmões. A quantidade fisiológica dissolvida é de 1,2 mol/l de CO2 (Pco2 = 40 mmHg). O aumento do CO2 (ou do próprio Pco2) estimula a ventilação pulmonar. Este aumento faz com que haja uma maior eliminação de CO2, o qual, consequentemente, diminui no CO2 no LEC (Pco2). Diz-se que o aumento de CO2 desencadeia em um aumento de H2CO3 e de H + , o que ocasiona em uma diminuição do pH do sangue (acidemia). Diz-se que o aumento da ventilação diminui o Pco2, com a consequente queda dos níveis de H2CO3 e aumento dos níveis de HCO3 - , o que desencadeia um aumento do pH do sangue (alcalemia). pH = 6,1 + log HCO3 - 0,03 x Pco2 Arlindo Ugulino Netto ● MEDRESUMOS 2016 ● FISIOLOGIA 3 www.medresumos.com.br Um aumento das [H + ] (acidose) desencadeia um aumento da ventilação alveolar, o que diminui o Pco2 e as concentrações de H + . Porém, essa capacidade do pulmão de realizar um mecanismo respiratório de controle do pH tem eficiência de 50 a 75%. Portanto, o equilíbrio ácido-base não depende só do pulmão, mas tanto do pulmão quanto dos rins. OBS 3 : O comprometimento da função pulmonar, como no caso de enfisema grave, gera uma diminuição da capacidade pulmonar de eliminar CO2, gerando uma acidose respiratória. Os pulmões tornam-se incapazes de aumentar a eliminação de CO2, sobrecarregando a função renal. REGULAÇÃO RENAL DO EQUILÍBRIO ACIDOBÁSICO Os rins, por meio de um aumento da excreção urinária de ácidos ou de bases, tornando a urina ácida ou básica, são capazes de regular as concentrações de ácidos e basesno plasma. Os néfrons filtram grande quantidade de íons HCO3 - que é destinado à excreção urinária e, se não houver reabsorção, haverá uma redução das bases do sangue. Ou seja: Filtração (excreção) de HCO3 - > Secreção de H + perda renal de bases. A secreção de H + pelos rins, do mesmo modo como pré-citado, gera uma diminuição de ácidos do sangue. Ou seja: Secreção de H + > filtração (reabsorção) de HCO3 - perda renal de ácidos OBS 4 : Ácidos não-voláteis, produzidos pelo organismo (metabolismo das proteínas) são excretados pelos rins. OBS 5 : Os rins reabsorvem quase todo o bicarbonato filtrado: [H + ] no LEC (alcalose) rins não reabsorvem todo o HCO3 - filtrado excreção de HCO3 - [H + ] [H + ] no LEC (acidose) rins reabsorvem todo o HCO3 - filtrado + produção de HCO3 - [H + ] Com o aumento da acidose no sangue, a enzima anidrase carbônica das células tubulares é ativada a reagir com o CO2 e a H2O, produzindo H2CO3 e, a partir deste, HCO3 - e H + . O primeiro é reabsorvido (na tentativa de diminuir esta acidose), ao passo em que o segundo é excretado em troca de um Na + , de modo que, para cada molécula de HCO3 - reabsorvida nos rins, há a reabsorção de um íon Na + e a excreção de H + . Os íons HCO3 - filtrados difundem-se lentamente através das membranas epiteliais tubulares e não são reabsorvidos diretamente. Quando há excesso de HCO3 - em relação aos íons H + na urina (alcalose metabólica), este excesso não pode ser reabsorvido, sendo então destinado à excreção. Na acidose, os níveis de H + estão mais altos em relação ao HCO3 - , fazendo acontecer a reabsorção completa do HCO3 - e excreção do excesso de H + . Os íons H + são então tamponados pelo fosfato e pela amônia, sendo excretados como sais. Nas células mais distais túbulos renais, há duas reações de extrema importância: (1) Por meio da ação da enzima glutaminase, estas células convertem glutamina em ácido glutâmico a amônia (NH3) e esta excretada neste nível em troca de sódio. Esta amônia, responsável fornecer o odor amoniacal da urina, tem ainda um par de elétrons não compartilhado, e pode estabelecer uma ligação dativa com um H + , formando amônio (NH4 + ), o qual é capaz ainda de ligar ao cloreto, para formar NH4Cl, desempenhando uma importante função de realizar um tampão na urina, sendo responsável pela acidez da mesma. (2) O ácido fosfórico (HPO4 = ) pode se ligar a íons H + secretados ativamente pelas células intercalares dos túbulos renais. A concentração deste ácido fosfórico com a de amônia é a responsável pela acidez da urina (acidez titular da urina) Arlindo Ugulino Netto ● MEDRESUMOS 2016 ● FISIOLOGIA 4 www.medresumos.com.br A aldosterona, neste nível, é responsável por aumentar a atividade da secreção do H + e dos demais prótons (como o K + ). Se o paciente secreta menos prótons para a formação da urina, geralmente por uma disfunção na secreção da aldosterona, diz-se que ele vai desenvolver uma acidose hipercalêmica. Já no hiperaldosteronismo, há uma a alcalose hipocalêmica devido a estes mesmos fatores. Conclui-se, então: Na acidose, deve haver uma maior excreção de ácidos e de NH4 + + ácido titulável (NaH2PO4), sendo trocado por HCO3 - , o qual será adicionado para o sangue. A alcalose ocorre devido a um aumento da secreção tubular de H + e uma diminuição da excreção de HCO3 - . A excreção de NH4 + + ácido titulável (NaH2PO4) é muito baixa. ACIDOSE RESPIRATÓRIA O aumento da Pco2 no sangue desencadeia o mesmo aumento nas células tubulares. O CO2 + H2O são convertidos em H2CO3 por meio da anidrase carbônica, sendo depois dissociados em H + (secretado ativamente) + HCO3 - (reabsorvido), o que diminui cada vez mais a acidose. Portanto, toda acidose metabólica é primariamente controlada por uma alcalose metabólica na medida em que os rins produzem uma maior quantidade de bicarbonato, embora esta acidose influencie na ventilação. A aldosterona, por sua vez, induz á secreção de H + e a reabsorção de HCO3 - , induzindo a uma alcalose: secreção de H + + excreção de HCO3 - e Pco2 extracelular (alcalose respiratória). A correção renal da acidose: Acidose: HCO3 - plasmático (metabólica, fazendo com que haja uma hiperventilação para reverter o quadro) ou PCO2 (respiratória, em que os rins tentam reabsorver mais HCO3 - para sair deste quadro) Túbulos renais: íons H + + reabsorção completa de HCO3 - + tampões urinários NH4 + e HPO4 = ACIDOSE METABÓLICA O excesso de H + no líquido tubular diminui a filtração tubular de HCO3 - ( HCO3 - no LEC). Logo a acidose metabólica é caracterizada por uma carência de HCO3 - no sangue. Diferentemente da acidose respiratória, causada pelo excesso de H + no líquido tubular ou pelo Pco2 (LEC), estimula a secreção de H + . OBS 6 : Segunda a Equação de Handerson-Hasselbach, se sabemos que o valor fisiológico de Pco2 é de 40 mmHg e que a quantidade normal de HCO3 - é de 24 mEq/l, temos que a razão fisiológica do HCO3 - /Pco2 seja de 20. Por tanto, enquanto a razão for mantida em 20, o pH sanguíneo será 7,4. DESEQUILÍBRIO ACIDOBÁSICO Acidose respiratória: pH [H + ] PCO2 Compensação renal: HCO3 - plasmático HCO3 - novo + reabsorção de HCO3 - + excreção renal de ácidos Acidose metabólica: pH [H + ] HCO3 - plasmático Compensação pulmonar: ventilação alveolar PCO2 Adição de HCO3 - novo + reabsorção de HCO3 - + excreção renal de ácidos Correção renal da alcalose: Relação HCO3 - / CO2 aumenta pH ( [H + ]) Líquido tubular: HCO3 - e [H + ] aumenta a excreção urinária de HCO3 - (= adição de H + ao LEC) Alcalose respiratória: Hiperventilação PCO2 [H + ] pH Líquido tubular: [H + ] reabsorção de HCO3 - filtrado excreção de H + Alcalose metabólica: [H + ] pH HCO3 - (LEC) Compensação: ventilação alveolar + HCO3 - filtrado reabsorção de HCO3 - Arlindo Ugulino Netto ● MEDRESUMOS 2016 ● FISIOLOGIA 5 www.medresumos.com.br CAUSAS CLÍNICAS DE DESEQUILÍBRIO ACIDOBÁSICO ACIDOSE RESPIRATÓRIA (pH [H + ] PCO2) Redução da ventilação pulmonar PCO2 no LEC + H2CO3 Depressão do centro respiratório: como por uso de drogas (barbitúricos, benzodiazepínicos, etanol, opioides, etc.) Obstrução das vias aéreas Pneumonia Diminuição da superfície pulmonar Interferência das trocas sangue/ar alveolar ALCALOSE RESPIRATÓRIA ( PCO2 [H + ] pH) Hiperventilação pulmonar: medicamentos salicilatos são estimulatórios do próprio centro respiratório. Psiconeurose (histeria) Grandes altitudes: concentração de O2 frequência respiratória (PCO2) ACIDOSE METABÓLICA (pH [H + ] HCO3 - plasmático) Incapacidade dos rins de excretar os ácidos metabólicos (acidose tubular renal). Formação de grande quantidade de ácidos metabólicos Adição de ácidos metabólicos ao corpo por ingestão, ou infusão Perda de bases dos líquidos corporais: Acidose tubular renal: defeito na excreção renal de H + ou na reabsorção de HCO3 - , ou de ambos Diarreia: perda de grande quantidade de bicarbonato nas fezes Vômitos do conteúdo intestinal Diabete melito: Aumento da produção de ácidos metabólicos (ácido acetoacético) Ingestão de ácido (AAS, álcool metílico) Insuficiência renal: FG excreção de fosfatos e NH4 + + reabsorção de bicarbonato ALCALOSE METABÓLICA ([H + ] pH HCO3 - ) concentração de HCO3 - Perda de H + do LEC Administração de diuréticos (exceto os inibidores da anidrase carbônica): FG Fluxo tubular reabsorção de sódio e excreção de potássio + secreção de H + + reabsorção de HCO3 - Excessode aldosterona: reabsorção de sódio + secreção de H + + reabsorção de HCO3 - + [K + ] Vômito do conteúdo gástrico: perda de HCl Ingestão de substâncias alcalinas TRATAMENTO DA ACIDOSE/ALCALOSE O tratamento visa corrigir a condição que provocou a anormalidade, o que pode ser difícil quando a etiologia se dá por uma doença pulmonar crônica ou por insuficiência renal. Primeiramente, para o diagnóstico laboratorial, deve-se fazer uma amostra de sangue arterial (e não venoso), realizando uma punção arterial para a medição do pH para observar os seguintes parâmetros: Observa-se o próprio pH do sangue para diferenciar a acidose da alcalose; pH > 7,4 Alcalose; pH < 7,4 Acidose Observam-se as concentrações e possíveis alterações de Pco2 (N: 40 mmHg) e de HCO3 - (N: 24mEq/l) para avaliar se a acidose/alcalose é respiratória ou metabólica, respectivamente. O tratamento definitivo do distúrbio depende muito da identificação da causa e tratamento do distúrbio de base.
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