Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ HENRIETTE REGINA HOELLER O INSTITUTO DA ALIENAÇÃO PARENTAL CURITIBA 2016 HENRIETTE REGINA HOELLER O INSTITUTO DA ALIENAÇÃO PARENTAL Monografia apresentada ao Curso de Direito da Faculdade de Ciências Jurídicas da Universidade Tuiuti do Paraná, como requisito parcial para a obtenção do grau de Bacharel em Direito. Orientadora: Professora Adriana Coelho CURITIBA 2016 TERMO DE APROVAÇÃO HENRIETTE REGINA HOELLER O INSTITUTO DA ALIENAÇÃO PARENTAL Esta monografia foi julgada e aprovada para a obtenção do título de Bacharel no Curso de Direito da Universidade Tuiuti do Paraná Curitiba, ___ de ________ de 2016 Prof. Dr. PhD Eduardo de Oliveira Leite Universidade TUIUTI do Paraná Curso de Direito Orientadora: Professora Adriana Coelho Universidade TUIUTI do Paraná Curso de Direito Professor: Universidade TUIUTI do Paraná Curso de Direito Professor: Universidade TUIUTI do Paraná Curso de Direito AGRADECIMENTOS A Deus em primeiro lugar, que me deu força e saúde para superar obstáculos ao longo desse curso. A minha mãe que acompanhou minha luta diária para estudar e trabalhar. A minha filha Sabrina e meu genro Leandro que sempre me incentivaram quando eu desanimava e aos filhos Camila e Luan. Ao meu ilustre professor Eduardo Leite, que foi um exemplo de dedicação, sabedoria e humor. A minha orientadora, que me ajudou na elaboração do meu Trabalho de Conclusão de Curso. Aos meus amigos Satoshi e Nair. Aos meus irmãos Henrique e Celso. E... A minha Universidade que me proporcionou o meu título de bacharel em direito. RESUMO O instituto da alienação parental perfaz um instrumento que agride, sobremaneira, os direitos da criança e do adolescente, mormente nas questões atreladas a convivência familiar e ao seu desenvolvimento psicológico, posto que a sua instauração ocasiona confusões mentais, na medida em que a criança passa a acreditar em fatos que, definitivamente, não ocorreram. Tal fenômeno mostra-se devastador, eis que agride não apenas a prole, mas também o genitor alienado, que, induvidosamente, sofre com a separação do filho. Assim sendo, mostra-se necessário demonstrar, no presente estudo de que forma o fenômeno da alienação parental restará configurada nos casos concretos, mais precisamente as condutas do agente alienador que ensejam o surgimento de tal instituto, bem como de que forma o Poder Judiciário vem criando mecanismos que visem coibir, ou ao menos atenuar, a prática desta conduta abusiva. Palavras-chave: Alienação Parental. Família. Melhor interesse. SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO....................................................................................... 6 2 ASPECTOS GERAIS SOBRE A DISSOLUÇÃO DO VÍNCULO CONJUGAL........................................................................................... 8 2.1 O PRINCÍPIO DO MELHOR INTERESSE DA CRIANÇA...................... 8 2.2 A SEPARAÇÃO DOS GENITORES....................................................... 10 2.3 A GUARDA DA CRIANÇA...................................................................... 12 3 A SÍNDROME DA ALIENAÇÃO PARENTAL........................................ 15 4 A ALIENAÇÃO PARENTAL................................................................... 17 4.1 CONCEITO DE ALIENAÇÃO PARENTAL.............................................. 17 4.2 OS COMPORTAMENTOS CLÁSSICOS DO ALIENADOR.................... 18 4.3 A IMPLANTAÇÃO DE FALSAS MEMÓRIAS E A ACUSAÇÃO DE ABUSO SEXUAL.................................................................................... 21 4.4 AS CONSEQUÊNCIAS DA ALIENAÇÃO PARENTAL........................... 23 4.5 MECANISMOS PROCESSUAIS PARA A DISCUSSÃO DA ALIENAÇÃO PARENTAL....................................................................... 25 4.6 O PAPEL DAS EQUIPES MULTIDISCIPLINARES................................ 26 4.7 MEDIDAS JURÍDICAS PARA COIBIR A PRÁTICA DA ALIENAÇÃO PARENTAL............................................................................................. 28 5 CONCLUSÃO........................................................................................ 32 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS...................................................... 34 6 1 INTRODUÇÃO O instituto familiar mostra-se de suma importância para o desenvolvimento do menor, vez que por meio dele a criança e o adolescente adotam suas primeiras referências, e, paulatinamente, passam a se inserir na sociedade, convivendo com outras pessoas que lhes são estranhas. Assim, cabe a família, mormente os seus genitores, proporcionar mecanismos que visem resguardar de forma efetiva os seus direitos, observando-se, em todos os casos, aqueles que mais se coadune com os seus interesses. Para tanto, cabe aos pais corrigir as condutas que se mostram equivocadas, elogiar seu bom comportamento e, ainda, proceder de modo que seus atos sirvam de exemplo para a criança. Entretanto, em muitas ocasiões a entidade familiar, que até então serviu de substrato para o crescimento da criança, não se finda apenas com a morte dos genitores, eis que, ao longo dos anos, poderá subsistir a questão do rompimento do casamento. Em meio à dissolução da sociedade conjugal encontra-se inserta a criança e o adolescente, que, indubitavelmente, encontra-se em desenvolvimento, e, no meio de uma situação tão delicada, mostra-se plausível observar, in totum, o princípio do melhor interesse do menor. Diante disso, não pairam dúvidas de que a relação afetiva entre os genitores e seus filhos deve ser preservada, ainda que haja a dissolução do casamento. Contudo, em algumas hipóteses o direito a convivência entre o pai e a sua prole não restam resguardados na prática, eis que o alienador, imbuído por um sentimento de ódio e vingança, acaba não observando o contido no princípio do melhor interesse da criança e, assim, passa a efetivar o ato de alienação parental. Corriqueiramente, o alienador pratica diversos comportamentos que se coaduna com o fenômeno da alienação parental, que, drasticamente, ocasionam diversas consequências para o desenvolvimento psíquico da criança e do adolescente. Entretanto, tal conduta mostra-se repudiada pelo ordenamento jurídico brasileiro, assim como pelos Tribunais Pátrio, que, acertadamente, vêm criando mecanismos de modo a coibir, ou ao menos amenizar a incidência de tal instituto, consoante restará demonstrado no decorrer do presente estudo. 7 Assim sendo, faz-se necessário demonstrar no presente estudo a questão da alienação parental de modo mais acurado, enfatizando os principais comportamentos que ensejam o seu surgimento, as consequências que o aludido fenômeno acarretará no desenvolvimento da criança e do adolescente e, ainda, quais são os métodos utilizados para minimizar a incidência deste instituto.8 2 ASPECTOS GERAIS SOBRE A DISSOLUÇÃO DO VÍNCULO CONJUGAL 2.1 O PRINCÍPIO DO MELHOR INTERESSE DA CRIANÇA O princípio do melhor interesse da criança encontra-se atrelado ao fato de que os direitos das crianças e dos adolescentes devem ser tratados com absoluta prioridade, sobrepondo-se, inclusive, aos de seus genitores, posto que é um sujeito em desenvolvimento e, portanto, merece respeito e proteção integral. No direito brasileiro, o princípio do melhor interesse doa criança encontra respaldo no artigo 227, da Constituição Federal, além dos artigos 4.º e 5.º, do Estatuto da Criança e do Adolescente. Passando para a análise constitucional, denota-se que o artigo 227 elenca um rol de direitos que devem ser resguardados, obrigatoriamente, à criança, ao adolescente e ao jovem, como à dignidade e à convivência familiar, além de criar mecanismos que visem assegurá-los de qualquer conduta negligente, discriminatória, afastando, ainda, atos que ensejem exploração, violência e crueldade. Ressalta-se, desde logo, que tais direitos mostram-se ceifados quando a criança sofre, reiteradamente, alienação parental. Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. Partindo-se para a análise infraconstitucional, enfatiza-se que o artigo 4.º, do Estatuto da Criança e do Adolescente, dispõe acerca dos direitos das crianças e dos adolescentes, cujo dispositivo traz em seu bojo uma redação que muito se assemelha ao contido na Constituição Federal de 1988. Difere-se do texto constitucional na medida em que estabelecem diversos preceitos de modo a garantir a absoluta prioridade dos direitos a eles inerente, como a imprescindibilidade no recebimento de proteção e socorro, pouco importando as circunstâncias nas quais estejam insertas a criança e o adolescente, o atendimento preferencial acerca da formulação das políticas sociais públicas, além dos recursos sociais serem destinados, prioritariamente, à proteção da juventude. 9 Art. 4º É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária. Parágrafo único. A garantia de prioridade compreende: a) primazia de receber proteção e socorro em quaisquer circunstâncias; b) precedência de atendimento nos serviços públicos ou de relevância pública; c) preferência na formulação e na execução das políticas sociais públicas; d) destinação privilegiada de recursos públicos nas áreas relacionadas com a proteção à infância e à juventude. Da mesma forma, o artigo 5.º, do Estatuto da Criança e do Adolescente, dispõe acerca da tutela infantil, estabelecendo que “Nenhuma criança ou adolescente será objeto de qualquer forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão, punido na forma da lei qualquer atentado, por ação ou omissão, aos seus direitos fundamentais”. A Convenção Internacional dos Direitos da Criança, mormente em seu item 3.1, também consagrou o princípio do melhor interesse da criança, eis que determina, incisivamente, que "Todas as ações relativas às crianças, levadas a efeito por instituições públicas ou privadas de bem estar social, tribunais, autoridades administrativas ou órgãos legislativos, devem considerar, primordialmente, o interesse maior da criança". O Superior Tribunal de Justiça, reiteradamente, utiliza em seu arcabouço decisório o instituto do princípio do melhor interesse da criança, como meio de fundamentar seus posicionamentos. Na decisão abaixo colacionada, na qual se discutia a dissolução da sociedade conjugal e a guarda do filho, restou salientado a incidência do princípio em espeque, eis que, induvidosamente, deverá prevalecer sobre quaisquer outras hipóteses levantadas. PROCESSO CIVIL. CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. AÇÃO DERECONHECIMENTO E DISSOLUÇÃO DE UNIÃO ESTÁVEL C/C GUARDA DE FILHO. MELHOR INTERESSE DO MENOR. PRINCÍPIO DO JUÍZO IMEDIATO. COMPETÊNCIADO JUÍZO SUSCITANTE. 1. Debate relativo à possibilidade de deslocamento da competência em face da alteração no domicílio do menor, objeto da disputa judicial. 2. Em se tratando de hipótese de competência relativa, o art. 87 do CPC institui, com a finalidade de proteger a parte, a regra da estabilização da competência (perpetuatio jurisdictionis),evitando-se, assim, a alteração do lugar do processo, toda a vez que houver modificações supervenientes do estado de fato ou de direito. 3. Nos processos que envolvem menores, as medidas devem ser tomadas no interesse desses, o qual deve prevalecer diante de quaisquer outras questões. 10 4. Não havendo, na espécie, nada que indique objetivos escusos por qualquer uma das partes, mas apenas alterações de domicílios dos responsáveis pelo menor, deve a regra da perpetuatio jurisdictionis ceder lugar à solução que se afigure mais condizente com os interesses do infante e facilite o seu pleno acesso à Justiça. Precedentes. (STJ - Conflito de Competência 114782 RS - Relatora Nancy Andrighi - 2.ª Seção - Julgamento em 12/12/2012). Por conseguinte, Roberto Figueiredo e Luciano Figueiredo (2014, p. 76) enfatizam que "[...] o princípio do melhor interesse é fundamento para dirimir conflitos que envolvam crianças e adolescentes, conferindo uma proteção especial ao menor". 2.2 A SEPARAÇÃO DOS GENITORES Induvidosamente, a dissolução da sociedade conjugal alberga diversos fatores, como a incompatibilidade de gênios, infidelidade, além de diversas outras hipóteses, que, hodiernamente, assombram a coletividade brasileira, como, por exemplo, as questões econômicas. Sabe-se que a separação conjugal, por si só, já ocasiona para as partes envolvidas estresse e desequilíbrio emocional, cabendo aos pais criar mecanismos que visem ajudar a prole a compreender a atual situação vivenciada, com o escopo de que os mesmos superem a separação de seus genitores, nos moldes instituídos por Rolf Madaleno (2013). No entanto, muito embora a família seja considerada a base do indivíduo, devendo, para tanto, albergar a criança em um ambiente imbuído de afeto e respeito, nota-se que em muitas ocasiões seus direitos não restam resguardados, eis que acabam se tornando um objeto para atingir o outro genitor. Sobre o tema, Caroline de Cássia Francisco Buosi (2012, p. 41) assevera que no caso em espeque deve-se atentar para que não ocorra a implementação da Síndrome da Alienação Parental, vez que as modificações ocasionadas na vida da criança pela separação do núcleo familiar poderá ensejar o esquecimento de um dos genitores. Nessa formação familiar também é preciso estar atento para que não ocorra o estabelecimento da Síndrome de Alienação Parental, tendo em vista que como ocorre à união de indivíduos que podem adquirir papéis de pai ou mãe na vida da criança, esse novo núcleo familiar pode predispor que o real genitor da criança passe a ser "esquecido". Assim, é necessário que se 11 respeitem o afeto e a relação que existem entre esses, deixando claro a essa criança, mediante comportamentos adequados, que a família recomposta não irá diminuir ou anular os indivíduos que fazem parte da real parentalidadedaquele filho. Diante disso, partindo-se para a análise da dissolução da sociedade conjugal, Paulo Lôbo (2011, p. 149) esclarece que "O divórcio é o meio voluntário de dissolução do casamento. O meio não voluntário é a morte de um ou de ambos os cônjuges". Aliado a isso, enfatiza-se que o artigo 1.571, do Código Civil Brasileiro, traz em seu bojo as hipóteses nas quais resta findada a sociedade conjugal, como, por exemplo, a separação judicial e o divórcio. Art. 1.571. A sociedade conjugal termina: I - pela morte de um dos cônjuges; II - pela nulidade ou anulação do casamento; III - pela separação judicial; IV - pelo divórcio. Com supedâneo no conteúdo inserto no artigo acima colacionado, Fernando Frederico de Almeida Júnior e Juliana Zacarias Fabre Tebaldi (2012, p. 34) expõem que “Isso quer dizer que com o divórcio, a morte de um dos cônjuges, a declaração de nulidade, a anulação do casamento ou a separação judicial ou extrajudicial estará à sociedade conjugal finalizada, desaparecendo os direitos e deveres [...]”. Contudo, há de se enaltecer que a separação dos cônjuges não pode servir de aparato para afastar os genitores de seus filhos, eis que os direitos das crianças e adolescentes devem prevalecer sobre os interesses dos pais que estejam em conflito e, portanto, não cabe um dos genitores suprimir a convivência com o outro, eis que perfaz direito da criança preservar seu vínculo afetivo com aquele que não detenha sua guarda. Silvio de Salvo Venosa (2013, p. 159) corrobora o entendimento acima mencionado. Em qualquer situação, a separação ou divórcio deve traduzir essencialmente um remédio ou solução para o casal e a família, e não propriamente uma sanção para o conflito conjugal, buscando evitar maiores danos não só quanto à pessoa dos cônjuges, mas principalmente no interesse dos filhos menores. Contudo, em pese inúmeras mulheres conseguirem alcançar sua própria 12 autonomia após o divórcio, Caroline de Cássia Francisco Buosi (2012, p. 51) menciona que "[...] outras mulheres continuam sentindo-se presas em sentimentos negativos advindos do vínculo conjugal rompido, o que dificulta criar novas expectativas de uma vida melhor". 2.3 A GUARDA DA CRIANÇA Pontua-se que, sem sombra de dúvidas, antes do término da sociedade conjugal a guarda da criança mostra-se exercida por ambos os genitores, ante o instituto do poder familiar albergado pelo ordenamento jurídico pátrio. Contudo, após a dissolução do casamento, faz-se necessário proceder à implementação da guarda da criança, cabendo, ao outro genitor, exercer seu direito de visita, nos casos em que a mesma não seja compartilhada. Diante disso, mostra-se imperioso trazer à tona, inicialmente, a definição acerca do fenômeno da guarda, que, de acordo com Fábio Vieira Figueiredo e Georgios Alexandridis (2014, p. 35) "[...] constitui um desdobramento do direito de convivência mantido em relação aos filhos, consistindo na mesma atribuição de zelar pelo cuidado, proteção, educação e custódia dos filhos, por um dos genitores ou por ambos de forma simultânea". Seguindo a linha de raciocínio anteriormente adotada, César Fiuza (2009, p. 997) expõe que: A guarda é relação típica do poder familiar. É, em termos grosseiros, a "posse direta" dos pais sobre os filhos. Apesar de grosseiros os termos, a ideia de posse é tão atraente e expressa com tanta clareza em que consiste a guarda, que o próprio Estatuto da Criança e do Adolescente a utilizou no art. 33, § 1º, ao dispor que "a guarda destina-se a regularizar a posse de fato". Por conseguinte, salienta-se que o artigo 1.583, do Código Civil, é claro quando estabelece que "A guarda será unilateral ou compartilhada". Dispondo acerca do tema, Eduardo de Oliveira Leite (2011, p. 196/197) explica que o Código Civil é claro quando oferece duas opções de guarda (unilateral e compartilhada), sendo que as duas possuem a mesma importância, na medida em que a viabilidade acerca de sua aplicação somente poderá ser verificada diante do caso concreto. 13 Conforme já se informou, acima, a nova legislação sobre a guarda adotou um modelo dual que se esgota nas duas opções oferecidas pelo legislador: unilateral ou compartilhada. Ou seja, à exclusividade da guarda unilateral o legislador oferece o novo modelo de guarda compartilhada, sem, portanto, descaracterizar ou nulificar a possibilidade da guarda unilateral. [...] De qualquer maneira, a colocação das duas hipóteses no mesmo patamar, não mais legitima a consideração da guarda unilateral como regra e a guarda compartilhada como exceção. Ambas as formas de guarda passa a ter o mesmo status quanto à sua importância, devendo ser avaliada a situação concreta para escolha acerca de qual dos dois modelos melhor se ajusta à hipótese. Sem sombra de dúvidas, configurar-se-á a guarda unilateral quando conferida apenas a um dos pais, ao passo que a "Guarda conjunta ou compartilhada significa mais prerrogativas aos pais, fazendo com que estejam presentes de forma mais intensa na vida dos filhos", conforme ensina Maria Berenice Dias (2009, p. 401). Sobre o tema, Paulo Lôbo (2011, p. 190) explica que “A guarda consiste na atribuição a um dos pais separados ou a ambos dos encargos de cuidado, proteção, zelo e custódia do filho. Quando é exercida por um dos pais, diz-se unilateral ou exclusiva: quando por ambos, compartilhada”. Da mesma forma, o artigo 1.583, parágrafo 1.º, do Código Civil Brasileiro, dispõe acerca da definição da guarda unilateral e compartilhada, senão vejamos: § 1 o Compreende-se por guarda unilateral a atribuída a um só dos genitores ou a alguém que o substitua (art. 1.584, § 5 o ) e, por guarda compartilhada a responsabilização conjunta e o exercício de direitos e deveres do pai e da mãe que não vivam sob o mesmo teto, concernentes ao poder familiar dos filhos comuns. Assim sendo, há de se mencionar que o escopo maior da guarda é regular os aspectos atinentes à posse da criança e do adolescente, não emancipado. Roberto Figueiredo e Luciano Figueiredo (2014) mencionam, inclusive, que através da guarda restará pactuada a questão atinente a convivência do menor em relação a outrem. Diante disso, não pairam dúvidas de que a finalidade precípua da guarda é resguardar a assistência material e moral das crianças, além de prover-lhe a educação, eis que muito embora tenha havido a dissolução da sociedade conjugal, ambos os genitores permanecem imbuídos, igualitariamente, em criar mecanismos que visem assegurar o desenvolvimento do menor de modo efetivo. 14 O Tribunal de Justiça do Distrito Federal vem se posicionando no sentido de que a instituição da guarda deve observar, obrigatoriamente, o princípio do melhor interesse da criança, ou seja, deve-se atribuí-la aquele que demonstrar condições mais adequadas ao seu exercício, de modo a se coadunar com as necessidades do menor. Inclusive, restou assegurado o direito de visita, eis que o convívio com ambos os genitores mostra-se imprescindível para o desenvolvimento psíquico da criança. APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO CONSTITUCIONAL. DIREITO DE FAMÍLIA. GUARDA. DIREITO DE VISITAS. PRINCÍPIO DO MELHOR INTERESSE DO MENOR. ALIENAÇÃO PARENTAL. NÃO OCORRÊNCIA. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO. SENTENÇA MANTIDA. 1. Em consonância com o princípio consagrado na Constituição Federal de proteção integral da criança e adolescente, bem assim nos termos do artigo 1.584, caput, do Código Civil, tem-se que o instituto de guarda e responsabilidade destina-se à proteção do menor, de modo que a guarda será atribuída a quem revelar condições mais adequadas paraexercê-la, baseando-se em quem melhor atender os interesses da criança, nos moldes do artigo 1.612 do Código Civil. 2. O direito de visita envolve direito basilar no contexto das relações familiares. Trata-se de direito da personalidade inerente ao exercício do próprio poder familiar, propiciando aos genitores o convívio necessário apto a possibilitar aos filhos o desenvolvimento do afeto parental e da própria saúde psíquica e psicológica do infante, de modo que este cresça como pessoa plena nos atributos que o tornem mais propenso ao ajuste familiar e social. (TJ/DF - Apelação Cível 20130910142300 - Relator Rômulo de Araujo Mendes - 1.ª Turma Cível - Julgamento em 21/10/2015). Hodiernamente, com o escopo de minorar os efeitos negativos que a separação dos pais pode proporcionar aos filhos, bem como manter os laços de afetividade, o ordenamento jurídico pátrio passou a albergar, via de regra, a guarda compartilhada, somente sendo possível a implementação da guarda unilateral nos casos em haja consenso entre os genitores, ou quando seja determinada pelo magistrado. 15 3 A SÍNDROME DA ALIENAÇÃO PARENTAL A Síndrome da Alienação Parental perfaz um fenômeno destruidor na vida do indivíduo, eis que o indivíduo programa a prole a acreditar em fatos supostamente vivenciados, ocasião em que o agente alienador passa a figurar no papel de vítima, ao passo que o genitor alienado passa a ser conceituado como uma pessoa má, um agressor, que, na íntima convicção do menor, ocasionou danos para si, assim como para a sua genitora. Jorge Trindade (2007, p. 102) trouxe a conceituação acerca de tal fenômeno, mencionando, basicamente, que se trata de um transtorno psicológico, o qual tem o condão de impedir, ou até mesmo destruir, os vínculos da criança com o agente alienado, sem que haja quaisquer motivos que, efetivamente, justifique tais condutas. Assim sendo, o escopo maior do aludido instituto é desmoralizar a figura parental. A Síndrome da Alienação Parental é um transtorno psicológico que se caracteriza por um conjunto de sintomas pelos quais um genitor, denominado cônjuge alienador, transforma a consciência de seus filhos, mediante diferentes formas e estratégias de atuação, com o objetivo de impedir, obstaculizar ou destruir seus vínculos com o outro genitor, denominado cônjuge alienado, sem que existam motivos reais que justifiquem essa condição. Em outras palavras, consiste num processo de programar uma criança para odeie um de seus genitores sem justificativa, de modo que a própria criança ingressa na trajetória de desmoralização desse mesmo genitor. Por oportuno, Caroline de Cássia Francisco Buosi (2012, p. 54) menciona, basicamente, o momento em que resta instaurada a Síndrome da Alienação Parental, a qual “[...] ocorre exatamente no momento em que a mãe percebe o interesse do pai em preservar a convivência afetiva com a criança, e a usa de forma vingativa perante ressentimentos advindos da época do relacionamento ou da separação [...]”. Rolf Madaleno (2013), com supedâneo nos estudos provenientes de Richard A. Gardner, menciona que a Síndrome da Alienação Parental encontra-se atrelada em três estágios, quais sejam: leve, médio e severo. No primeiro, o comportamento do agente alienador inicia-se de modo involuntário, ao passo que no nível médio, embora um pouco mais avançado, subsiste, ainda, uma relação saudável entre a criança e o seu genitor, alvo da alienação. Contudo, na terceira fase o menor passa 16 a demonstrar preferência ao genitor alienador, momento em que o Poder Judiciário, de modo célere, deverá intervir no caso concreto. De modo a melhor elucidar os estágios da alienação parental colaciona-se, na íntegra, o entendimento exposto pelo autor Rolf Madaleno (2013, p. 462/463). Veja-se: Ela foi percebida pelo psiquiatra americano Richard A. Gardner em processos de guarda, quando o cônjuge na posse do filho desencadeia uma alienação obsessiva e está empenhado em desaprovar a aproximação do genitor visitante, reconhecendo esse autor a existência de três diferentes níveis de alienadores, que ficam divididos entre as categorias leves, médias e severas. Esses comportamentos alienadores podem iniciar de forma inconsciente e involuntária, para logo se transformarem em uma clara estratégia de lealdade. No nível médio, a criança tem ainda uma razoável relação saudável com seu progenitor não guardião, porém, em determinadas ocasiões a criança participa de uma campanha contra o outro, manifestando sua preferência pelo alienador e essa preferência vai aumentando gradativamente, convencendo-se a criança de que seu genitor não convivente não tem valor algum, entendendo Richard Gardner ser esse o momento de intervenção judicial, inclusive com a troca de guarda, antes de colocar a criança em risco de desenvolver uma SAP mais severa, com todos os componentes de rejeição, podendo ressentir-se o vínculo de níveis patológicos. O autor Roberto Palermo (2012, p. 27) corrobora o mesmo entendimento: A síndrome da alienação parental pode ser medida em estágios: leve, moderado e grave. No estágio leve, a criança se sente constrangida somente no momento em que os pais se encontram; afastada do guardião, a criança mantém um relacionamento normal com o outro genitor. Já no estágio moderado, a criança apresenta atitudes indecisas e conflituosas. Em certos momentos, já mostra sensivelmente o desapego ao não guardião. Quando a SAP atinge o estágio grave, é hora de se preocupar. A criança apresenta-se doente, perturbada a ponto de compartilhar todos os sentimentos do guardião, não só ouvindo as agressividades dirigidas ao não guardião como contribuindo com o processo de desmoralização do genitor. Por derradeiro, menciona-se que, atualmente, a Síndrome da Alienação Parental não se encontra inserta nos códigos internacionais de doenças, aliado ao fato de não ser possível mensurar o número de demandas que contemplam o aludido instituto, eis que conforme assevera Caroline de Cássia Francisco Buosi (2012), tais processos tramitam perante as varas de infância e de família, sendo, portanto, acobertadas pelo segredo de justiça. 17 4 A ALIENAÇÃO PARENTAL 4.1 CONCEITO DE ALIENAÇÃO PARENTAL Ressalta-se que o fenômeno da alienação parental possui delimitação conceitual na Legislação Regente, eis que o artigo 2.º, caput, da Lei n.º 12.318, de 26 de agosto de 2010, dispõe, acertadamente, acerca da definição do aludido fenômeno, senão vejamos: Art. 2 o Considera-se ato de alienação parental a interferência na formação psicológica da criança ou do adolescente promovida ou induzida por um dos genitores, pelos avós ou pelos que tenham a criança ou adolescente sob a sua autoridade, guarda ou vigilância para que repudie genitor ou que cause prejuízo ao estabelecimento ou à manutenção de vínculos com este. Denota-se, assim, que a alienação parental encontra-se intrinsecamente ligado ao fato do alienador, imbuído por um ressentimento infindável, atuar de forma depreciativa, com o escopo de prejudicar o vínculo existente entre o genitor e o filho, cuja consequência, além do afastamento de ambos, consubstancia na interferência psicológica da criança, o que acaba acarretando diversos danos em seu desenvolvimento psíquico. Por outro lado, Caroline de Cássia Francisco Buosi (2012, p. 116) assevera que a alienação parental perfaz “[...] uma tentativa formal de coibir familiares a restringir o convívio adequado entre a criança e algum ente querido, mediante interesses pessoais desse adulto, fazendo assim vigorar com mais efetividade o direito fundamentaldos envolvidos [...]”. O autor Jesualdo Almeida Júnior (2010, p. 8) também dispõe de valiosos ensinamentos acerca da definição do instituto da alienação parental, enfatizando, basicamente, que a mesma consiste na campanha de desmoralização efetuada por um genitor em relação ao outro, vez que, mediante a instauração de tortura psicológica na criança, a mesma passa a repudiar seu genitor, o que ensejará consequências drásticas, como, por exemplo, o afastamento definitivo de sua prole. A Alienação Parental é a campanha de desmoralização feita por um genitor em relação ao outro, geralmente a mulher (uma vez que esta normalmente detém a guarda do filho) ou por alguém que possua a guarda da criança. É utilizada uma verdadeira técnica de tortura psicológica no filho, para que esse passe a odiar e desprezar o pai e, dessa maneira, afaste-se do 18 mesmo. Nota-se que a alienação parental perfaz ato arbitrário do agente alienador, o qual se denota mediante a instauração de diversos comportamentos, conforme será demonstrado a seguir. 4.2 OS COMPORTAMENTOS CLÁSSICOS DO ALIENADOR Registre-se, inicialmente, que as condutas ensejadoras da alienação parental, em muitas ocasiões, advêm de situações que não foram resolvidas pelos ex-companheiros, que acabam alimentando um desejo de vingança e, assim, utilizam para a sua concretude os próprios filhos Maria Berenice Dias (2009, p. 418) pontua diversas atitudes consideradas como clássicas do alienador, como, por exemplo, a narração de fatos que não ocorreram, o que acaba ensejando uma contradição nos sentimentos da criança, eis que, paulatinamente, passa a se convencer dos fatos articulados pelo agente alienador. [...] desencadeia um processo de destruição, de desmoralização, de descrédito do ex-parceiro. Nada mais do que uma "lavagem cerebral" feita pelo genitor alienador no filho, de modo a denegrir a imagem do outro genitor, narrando maliciosamente fatos que não ocorreram ou que não aconteceram conforme a descrição dada pelo alienador. Assim, o infante passa aos poucos a se convencer da versão que lhe foi implantada, gerando a nítida sensação de que essas lembranças de fato aconteceram. No mesmo sentido, o artigo 2.º, parágrafo único, da Lei n.º 12.318, de 26 de agosto de 2010, traz em seu bojo algumas condutas que muito se assemelham a prática da alienação parental, como, por exemplo, a realização de campanha desqualificada do genitor alienado, o fato de dificultar o contato da criança com o genitor, a impossibilidade de se exercer a autoridade parental, a omissão de informações relevantes da criança, como, por exemplo, aquelas advindas da escola, assim como a mudança de domicílio, de modo injustificado. Parágrafo único. São formas exemplificativas de alienação parental, além dos atos assim declarados pelo juiz ou constatados por perícia, praticados diretamente ou com auxílio de terceiros: I - realizar campanha de desqualificação da conduta do genitor no exercício da paternidade ou maternidade; 19 II - dificultar o exercício da autoridade parental; III - dificultar contato de criança ou adolescente com genitor; IV - dificultar o exercício do direito regulamentado de convivência familiar; V - omitir deliberadamente a genitor informações pessoais relevantes sobre a criança ou adolescente, inclusive escolares, médicas e alterações de endereço; VI - apresentar falsa denúncia contra genitor, contra familiares deste ou contra avós, para obstar ou dificultar a convivência deles com a criança ou adolescente; VII - mudar o domicílio para local distante, sem justificativa, visando a dificultar a convivência da criança ou adolescente com o outro genitor, com familiares deste ou com avós. De acordo com Eduardo de Oliveira Leite (2015, p. 267), as condutas acima descritas são exemplificativas, agindo a legislação em vigor "[...] com cautela ao se jungir a meros exemplos, logo, o rol apresentado não é numerus clausus, mas, ao contrário, numerus apertus, como tem demonstrado, de forma irrefutável, a dinâmica familiar". Aliado a isso, há de se mencionar que subsistem diversas outras condutas que ensejam a configuração da alienação parental, como deixar de passar os recados que tenham sido deixados para a criança, desvalorizar as condutas provenientes do genitor alienado e, ainda, culpar o genitor pelo mau comportamento do filho. Caroline de Cássia Francisco Buosi (2012) pontua que mudanças drásticas na fisionomia da genitora também servem de aparato para a concretude de tal fenômeno, enfatizando, inclusive, que em muitas audiências denotam-se as transformações aparentes nas genitoras, como a perda ou o aumento excessivo de peso, a falta de cuidado com unhas, cabelos e roupas, além de aparentar um grande sofrimento ocasionado pelo rompimento do vínculo conjugal. Da mesma forma, Silvio de Salvo Venosa (2013, p. 332) traz à tona atitudes comportamentais típicas do agente alienador, como, por exemplo, denegrir a personalidade do genitor, manipulando a criança de modo que o mesmo passe a repudiar seu pai. O guardião em geral, seja ele divorciado ou fruto de união estável desfeita, passa a afligir a criança com ausência de desvelo com relação ao outro genitor, imputando-lhe má conduta e denegrindo sua personalidade sob as mais variadas formas. Nisso o alienador utiliza todo tipo de estratagemas. Trata-se de abuso emocional de consequências graves sobre a pessoa dos filhos. Esse abuso traduz o lado sombrio da separação dos pais. O filho é manipulado para desgostar ou odiar o outro genitor. 20 Já Roberto Palermo (2012, p. 20) traz à baila um fato exemplificativo de modo a melhor elucidar as condutas emanadas do agente alienador, que, corriqueiramente, são utilizadas na prática. Ressalta, ainda, que um dos recursos mais comumente é distorcer o contexto vivenciado, forjando situações que sequer existiram. Um exemplo: o genitor que detém a guarda, geralmente a mãe, avisa à criança que o pai virá buscá-la para passar o fim de semana com ele. Tudo está pronto e ambas ficam esperando o pai chegar. As horas passam e o pai não chega. A mãe demonstra tristeza, compaixão e, para salvar a criança de tamanha frustração, resolve que o melhor a ser feito é sair para tomar um sorvete. Nos casos de alienação, tudo isso pode ser forjado. O que a criança desconhece é que em momento nenhum o pai soube que ela o estava esperando. A intenção é mostrar até que ponto o pai é mau e como ela, abnegadamente, ama a criança, protege-a e está presente até em seus piores momentos. Cria-se cumplicidade por meio da manipulação. Oportuno mencionar que a prática da alienação parental não decorre apenas dos pais, mas também pode se originar de atos emanados pelos avôs, ou, inclusive, daqueles que detenham a guarda da criança, e, de certa forma, possua repulsa na relação entre o genitor e a criança. O Tribunal Pátrio já se posicionou nesse sentido: APELAÇÃO CÍVEL. ALTERAÇÃO DE GUARDA. GUARDA INICIALMENTE CONCEDIDA À AVÓ MATERNA. ALIENAÇÃO PARENTAL. PERDA DA GUARDA DE OUTRA NETA EM RAZÃO DE MAUS-TRATOS. GENITOR QUE DETÉM PLENAS CONDIÇÕES DE DESEMPENHÁ-LA. Inexistindo nos autos qualquer evidência de que o genitor não esteja habilitado a exercer satisfatoriamente a guarda de seu filho, e tendo a prova técnica evidenciado que o infante estaria sendo vítima de alienação parental por parte da avó-guardiã, que, inclusive, perdeu a guarda de outra neta em razão de maus-tratos, imperiosa a alteração da guarda do menino. (TJ/RS - Apelação Cível 70043037902 - Relator Ricardo Moreira Lins Pastl - 8.ª Câmara Cível - Julgamento em: 29/09/2011). Sendo assim, mostra-seimperioso mencionar que "A conduta é vedada também a terceiro como avôs, tios, tutores, padrinhos e todos que busquem se valer do convívio com a criança ou da autoridade parental que detém para prejudicar os genitores", conforme entendimento corroborado por Caroline de Cássia Francisco Buosi (2012, p. 120). 21 4.3 A IMPLANTAÇÃO DE FALSAS MEMÓRIAS E A ACUSAÇÃO DE ABUSO SEXUAL Acerca da implantação de falsas memórias, Caroline de Cássia Francisco Buosi (2012) explica que tal instituto perfaz o fato do indivíduo se lembrar de determinado acontecimento de modo distorcido, ou até mesmo que sequer ocorreu, restando à criança apenas o sentimento de repulsa quanto ao genitor alienado. Seguindo esta linha, Maria Berenice Dias (2009, p. 418) salienta que na implantação de falsas memórias a criança e o adolescente mostram-se convencidos da existência de determinado que não ocorreu, mas que devido a sua afirmação reiterada, passa a se convencer acerca de seu acontecimento. Mostra-se, portanto, manipulado, servindo de mero objeto para aquele que deseja afastá-lo de seu genitor alienado. O filho é convencido da existência de determinados fatos e levado a repetir o que lhe é afirmado como tendo realmente acontecido. Nem sempre consegue discernir que está sendo manipulado e acaba acreditando naquilo que lhe foi dito de forma insistente e repetida. Com o tempo, nem o alienador distingue mais a diferença entre verdade e mentira. A sua verdade passa a ser verdade para o filho, que vive com falsas personagens de uma falsa existência, implantando-se, assim, as falsas memórias. O autor Jorge Trindade (2007, p. 203) dispõe acerca do tema, mencionando que “A Síndrome das Falsas Memórias traz em si a conotação das memórias fabricadas ou forjadas, no todo ou em parte, na qual ocorrem relatos de fatos inverídicos, supostamente esquecidos por muito tempo e posteriormente relembrados”. Além do mais, não se deve olvidar que a implantação de falsas memórias poderá advir de forma espontânea, mediantes atos não intencionais e, ainda, serem sugeridas de modo proposital. Caroline de Cássia Francisco Buosi (2012, p. 70/71) corrobora os fatos articulados precedentemente: Diante disso, as falsas memórias podem surgir espontaneamente, por meio de confusões não intencionais sobre a situação vivenciada, ou até mesmo serem implantadas e sugeridas. Enquanto essas são alheias ao indivíduo, externas à percepção própria dele e internalizada por relatos de outrem, propositais ou não, muitas vezes tendo características que são coerentes com o evento, aquelas ocorrem a todo momento e fazem parte do processo de compreensão de uma situação qualquer. 22 Diante disso, é salutar mencionar que "A construção de falsas memórias advém de lembranças implantadas por pessoas que tenha o escuso interesse em prolongar uma estratégia de persuasão que nem sempre é percebida num primeiro momento", conforme ensina Rolf Madaleno (2013, p. 468). Os casos em que se vislumbram a implantação de falsas memórias ensejam maiores repulsas quando o agente alienador passa a acusar a vítima de suposta prática de abuso sexual. Caroline de Cássia Francisco Buosi (2012, p. 59) delimita de forma pontual o tema, mencionando que “Nesse processo de manipulação das crianças, a imagem do ex-parceiro passa a ser destruída e desmoralizada perante o filho, que é utilizado como instrumento de raiva e agressividade para com o pai”. Inclusive, a questão da falsa acusação de abuso sexual já vem sendo debatida, reiteradamente, nos Tribunais Pátrio. Vejam-se os julgados abaixo colacionados, que, sucintamente, tratam sobre a falsa acusação de abuso sexual, da alienação parental, além da regulamentação de visitas e da penalidade de advertência imposta a genitora: CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. REGULAMENTAÇÃO DE VISITAS. FALSA NOTÍCIA DE ABUSO SEXUAL. ATOS DE ALIENAÇÃO PARENTAL. 1. Decisão agravada que indeferiu o pedido de suspensão das visitas do genitor à filha do casal por considerar temerária e sem fundamento as alegações de abuso do genitor. 2. O resultado do segundo exame pericial, concluído durante o processamento do recurso, também resultou negativo e as circunstâncias dos autos indicam a prática de atos de alienação parental por parte da genitora, em prejuízo à criança. 3. O processo de alienação parental, quando desmotivado, e caso detectado em sua fase inicial e reversível, deve ser obstado a fim de se evitar as graves consequências da instalação da síndrome de alienação parental na criança e/ou adolescente, as quais tendem a se perpetuar por toda a sua vida futura. 4. Se por um lado a prática processual revela a dificuldade de se identificar e neutralizar os atos de alienação parental, por outro lado, não pode o Juiz condescender com os atos de desmotivada e evidente alienação parental, para fins de auxiliar o agente alienador a alcançar o seu intento, de forma rápida [e ainda mais drástica], em evidente prejuízo à criança. 5. Deve-se restabelecer a regular convivência entre a criança e o genitor, a qual, diante das circunstâncias que se revelam nos autos, sequer deveria ter sido interrompida, não fosse a temerária e insubsistente acusação da genitora. Deve ser ressaltado que, no caso, não há falta de provas, e sim provas de que os fatos relatados pela genitora são inverídicos. (TJ/SP - Agravo de Instrumento 20707345420148260000 - Relator Carlos Alberto Garbi - 10.ª Câmara de Direito Privado - Julgamento em 14/10/2014). DIREITO DE VISITAS. PAI. ACUSAÇÃO DE ABUSO SEXUAL. PEDIDO DE SUSPENSÃO. SUSPEITA DE ALIENAÇÃO PARENTAL. INTENSA BELIGERÂNCIA. 1. Como decorrência do poder familiar, o pai não-guardião tem o direito de 23 conviver com o filho, acompanhando-lhe a educação, de forma a estabelecer com ele um vínculo afetivo saudável. 2. A criança está vitimizada, no centro de um conflito quase insano, onde a mãe acusa o pai de abuso sexual, e este acusa a mãe de promover alienação parental. 3. As visitas foram restabelecidas e ficam mantidas sem a necessidade de supervisão, pois a acusação de abuso sexual não encontra nenhum respaldo na prova coligida. 4. A mãe da criança deverá ser severamente advertida acerca da gravidade da conduta de promover alienação parental e das graves conseqüências jurídicas decorrentes, que poderão implicar na aplicação de multa ou, até mesmo, de reversão da guarda. Recurso desprovido. (TJ/RS - Agravo de Instrumento 70060325677 - Relator Sérgio Fernando de Vasconcellos Chaves - 7.ª Câmara Cível - Julgamento em 25/07/2014). Caroline de Cássia Francisco Buosi (2012) ressalta que nos casos em que a vítima sofre o abuso sexual, a mesma tem vergonha de narrar tal situação, ao passo que nas hipóteses em que se coaduna a falsa acusação de abuso sexual, a criança fica repetindo reiteradamente os fatos articulados, destruindo, definitivamente, os vínculos com o genitor alienado. 4.4 AS CONSEQUÊNCIAS DA ALIENAÇÃO PARENTAL Indubitavelmente, a alienação parental perfaz um ato que causa tortura psicológica na criança, eis que denigre demasiadamente a figura paterna, fazendo com que o filho passe a demonstrar resistência com o genitor alienado, por razões que de fato não ocorreram. Acertadamente, Eduardo de Oliveira Leite (2015, p. 40) explica que: O cônjuge alienador anula (“mata”) a figura dos filhos para que o cônjuge alienado sofra o vazio da distância e do isolamento (embora os mesmos estejam vivos). Duplo sacrifício. Mudam os meios empregados de morte, mas o resultado do luto desejado é sempre igual. Os mesmos ingredientes que se visualizam na alienação parental atual. O cônjuge alienador precisa se vingar do cônjuge que passa a ser alienado,de forma que ele não possa mais encontrar um só instante de paz sobre a terra. E para isso usa os filhos como instrumento de sua vingança. De acordo com Caroline de Cássia Francisco Buosi (2012), os menores acometidos pela alienação parental apresentam diversos comportamentos que não se mostram comumente em outras crianças, como, por exemplo, baixa estima, insegurança, medo, depressão, culpa, além de transtornos atrelados a sua personalidade. 24 Por sua vez, Maria Berenice Dias (2009, p. 418) menciona que a alienação parental acarreta uma "[...] contradição de sentimentos e destruição do vínculo entre o genitor e o filho. Restando órfão do genitor alienado, acaba se identificando com o genitor patológico, passando a aceitar como verdadeiro tudo que lhe é informado". Além do mais, não se deve olvidar que a prática da alienação parental prejudica a convivência familiar saudável, constituindo abuso moral em face da criança. O artigo 3.º, da Lei n.º 12.318, de 26 de agosto de 2010, dispõe acerca da matéria: Art. 3 o A prática de ato de alienação parental fere direito fundamental da criança ou do adolescente de convivência familiar saudável, prejudica a realização de afeto nas relações com genitor e com o grupo familiar, constitui abuso moral contra a criança ou o adolescente e descumprimento dos deveres inerentes à autoridade parental ou decorrentes de tutela ou guarda. Enfatizando o tema, Caroline de Cássia Francisco Buosi (2012,) explica que o objetivo da Legislação Regente é resguardar o princípio da dignidade da pessoa humana, eis que é um dos fundamentos da República Federativa do Brasil, ora inserto no artigo 1.º, inciso III, da Constituição Federal, na medida em que o menor encontra-se em situação de desenvolvimento, e, portanto, o afastamento de seu genitor pode ensejar diversos danos na formação psicossocial do menor. Diante disso, nota-se a grandiosidade do instituto da dignidade da pessoa humana, vez que é considerado um dos fundamentos da República Federativa do Brasil, razão pela qual os aspectos que lhes são inerentes devem ser observados e respeitados, obrigatoriamente, na prática. O artigo 1.º, inciso III, da Carta Republicana, dispõe acerca do tema. Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: I - a soberania; II - a cidadania; III - a dignidade da pessoa humana; IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa; V - o pluralismo político. Parágrafo único. Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição. Rolf Madaleno (2013, p. 467) dispõe que "[...] nos casos severos de alienação parental, os menores encontram-se extremamente perturbados e as 25 visitas são muito difíceis ou sequer ocorrem e o vínculo é totalmente cortado entre o filho e o genitor alienado [...]". Por fim, oportuno demonstrar os ensinamentos insertos na obra de Roberto Palermo (2012), que, dentre outras circunstâncias ali elencadas, ressalta que a prática reiterada da alienação parental ceifa o direito fundamental da criança em conviver em um ambiente familiar saudável, na medida em que prejudica a relação afetiva entre os seus genitores, constituindo, inclusive, abuso moral em face da criança. 4.5 MECANISMOS PROCESSUAIS PARA A DISCUSSÃO DA ALIENAÇÃO PARENTAL Ressalta-se, inicialmente, que caberá ao magistrado, de ofício ou a requerimento, ouvido o Ministério Público, instituir determinadas medidas que se coadune com a urgência do caso, com o desiderato de resguardar a integridade psicológica da criança e do adolescente, conforme ensina Silvio de Salvo Venosa (2013). Sendo assim, é salutar mencionar que a discussão em torno da alienação parental poderá se instituir mediante ação autônoma, nos casos em que, por exemplo, a guarda da criança já tenha sido definida, ou, ainda, mediante discussão incidental, nas hipóteses em que a mesma mostrar-se notória no decorrer de determinada tramitação processual. Acerca do tema, Fábio Vieira Figueiredo e Georgios Alexandridis (2014) ensinam que o instituto da alienação parental perfaz um fenômeno complexo, razão pela qual se faz necessário a ingerência de um estudo multidisciplinar de modo a analisar qual a melhor forma de tratamento. Inclusive, a constatação da alienação parental pode se efetivar em diversas ocasiões, como, por exemplo, na ocasião em reste definida a guarda da criança, ou, ainda, durante o trâmite legal, decorrente de ação de guarda, regulamentação de visitas, separação ou divórcio. Com o escopo de dar mais efetividade ao repúdio do instituto da alienação parental, o artigo 4.º, da Lei n.º 12.318, de 26 de agosto de 2010, dispõe acerca da tramitação prioritária, assim como da garantia mínima de visitação assistida, nos casos em se vislumbrar a incidência da alienação parental. 26 Art. 4 o Declarado indício de ato de alienação parental, a requerimento ou de ofício, em qualquer momento processual, em ação autônoma ou incidentalmente, o processo terá tramitação prioritária, e o juiz determinará, com urgência, ouvido o Ministério Público, as medidas provisórias necessárias para preservação da integridade psicológica da criança ou do adolescente, inclusive para assegurar sua convivência com genitor ou viabilizar a efetiva reaproximação entre ambos, se for o caso. Parágrafo único. Assegurar-se-á à criança ou adolescente e ao genitor garantia mínima de visitação assistida, ressalvados os casos em que há iminente risco de prejuízo à integridade física ou psicológica da criança ou do adolescente, atestado por profissional eventualmente designado pelo juiz para acompanhamento das visitas. Corroborando o contido na legislação vigente, Caroline de Cássia Francisco Buosi (2012, p. 125) assevera que o artigo acima colacionado faz alusão a procedimentos “[...] nas quais a ação de julgamento de alienação parental pode ser uma ação ordinária autônoma, em vias próprias, ou pode ser requerida a averiguação dessa prática quando algum outro processo interligado já esteja em curso [...]”. Nota-se, assim, que o caráter de urgência contido na Lei de Regência se mostra necessário na medida em que visa "[...] impedir o agravamento do impedimento da convivência entre pais e filhos e garantir sua integridade psíquica e moral", de acordo com o entendimento de Caio Mário da Silva Pereira (2013, p. 334). Sendo assim, não pairam dúvidas de que a prática da alienação parental, por se tratar de matéria de ordem pública, pode ser arguida de ofício pelo magistrado, ou mediante manifestação do Ministério Público, na medida em que atua como fiscal da lei. Ademais, Fábio Vieira Figueiredo e Georgios Alexandridis (2014) dispõem que uma vez constatados indícios acerca da alienação parental, o aludido instituto poderá ser levantado em qualquer fase processual, pouco importando o grau de jurisdição no qual se encontre. 4.6 O PAPEL DAS EQUIPES MULTIDISCIPLINARES Não se deve olvidar que, havendo indícios acerca da prática da alienação parental, o magistrado determinará a realização de perícia psicológica ou biopsicossocial, que será realizada por equipes multidisciplinares. O artigo 5.º, da Lei n.º 12.318, de 26 de agosto de 2010, dispõe acerca do tema: 27 Art. 5 o Havendo indício da prática de ato de alienação parental, em ação autônoma ou incidental, o juiz, se necessário, determinará perícia psicológica ou biopsicossocial. § 1 o O laudo pericial terá base em amplaavaliação psicológica ou biopsicossocial, conforme o caso, compreendendo, inclusive, entrevista pessoal com as partes, exame de documentos dos autos, histórico do relacionamento do casal e da separação, cronologia de incidentes, avaliação da personalidade dos envolvidos e exame da forma como a criança ou adolescente se manifesta acerca de eventual acusação contra genitor. § 2 o A perícia será realizada por profissional ou equipe multidisciplinar habilitados, exigido, em qualquer caso, aptidão comprovada por histórico profissional ou acadêmico para diagnosticar atos de alienação parental. § 3 o O perito ou equipe multidisciplinar designada para verificar a ocorrência de alienação parental terá prazo de 90 (noventa) dias para apresentação do laudo, prorrogável exclusivamente por autorização judicial baseada em justificativa circunstanciada. Acerca do contido no dispositivo acima colacionado, Fábio Vieira Figueiredo e Georgios Alexandridis (2014, p. 65) ressaltam a necessidade da atuação das equipes multidisciplinares, eis que o magistrado não poderá deixar de proceder à colheita de “[...] subsídios técnicos por intermédio de profissionais de diferentes áreas, como psicólogos, assistentes sociais e psiquiatras, para que, por seus laudos, estudos e testes, promovam a análise cuidadosa do caso [...]”. Salienta-se, assim, que a escolha do profissional que irá atuar no caso concreto se mostra de suma importância para a análise psicológica e biopsicossocial. Silvio de Salvo Venosa (2013) menciona que o papel da equipe multidisciplinar é tão grandioso que se admite a participação de psiquiatras, pedagogos e assistentes sociais. Nesse sentido, Caroline de Cássia Francisco Buosi (2012, p. 91/98) explica que: O trabalho do psicólogo tem seu fundamento em compromisso social e a melhoria da qualidade de vida dos seres humanos. Nesses casos envolvendo a Síndrome da Alienação Parental, uma das punições estabelecidas pela justiça é o acompanhamento regular para tratamento psicológico dos membros da família que foram atingidos pela situação. [...] Dessa forma, em vista do que foi apresentado, os profissionais do direito, da psicologia, da assistência social dentre outros envolvidos estariam cumprindo o ápice de seus preceitos éticos, sendo agentes de mudanças para o desenvolvimento social, promovendo o bem-estar e saúde mental e não somente focando seus trabalhos em um tratamento singular de casos concretos. Seguindo o mesmo enfoque, Luciano Figueiredo e Roberto Figueiredo (2014) enfatizam que a perícia biopsicossocial mostra-se imprescindível para o 28 deslinde do feito, a qual será feita pela equipe multidisciplinar, mediante entrevistas e exames documentais, por exemplo, no prazo de noventa dias, sendo possível a prorrogação do aludido prazo pelo magistrado. 4.7 MEDIDAS JURÍDICAS PARA COIBIR A PRÁTICA DA ALIENAÇÃO PARENTAL Sendo a prática da alienação parental um instrumento que afeta sobremaneira os aspectos psicológicos da criança, algumas medidas devem ser tomadas com o escopo de coibir, ou ao menos amenizar a incidência do aludido instituto. Salienta-se, assim, que "Diante da prioridade do interesse do menor, deve ser preservada não só a sua integridade física, mas também a mental, sendo coibida a imputação de falsas memórias acerca de um dos genitores", conforme asseveram Roberto Figueiredo e Luciano Figueiredo (2014, p. 59). Nesse passo, considerando-se que o Poder Judiciário tem o dever de intervir nos casos em que haja manifesta configuração do instituto da alienação parental, Maria Berenice Dias (2009, p. 419) cita como medidas assecuratórias a reversão da guarda, ou, ainda, a suspensão das visitas, determinando, inclusive, o acompanhamento psicológico da criança ou adolescente. Essa notícia, levada ao Poder Judiciário, gera situação das mais delicadas. [...] Mas como o juiz tem a obrigação de assegurar proteção integral, reverte a guarda ou suspende as visitas e determina a realização de estudos sociais e psicológicos. Como esses procedimentos são demorados - aliás, fruto da responsabilidade dos profissionais envolvidos -, durante todo este período cessa a convivência entre ambos. Além do mais, o artigo 6.º, da Lei n.º 12.318, de 26 de agosto de 2010, traz em seu bojo um rol de medidas que visam atenuar ou até mesmo inibir a prática da alienação parental, como, por exemplo, a advertência, a ampliação do regime de convivência familiar, a aplicação de multa, a alteração da guarda e, ainda, a suspensão da autoridade parental, senão vejamos: Art. 6 o Caracterizados atos típicos de alienação parental ou qualquer conduta que dificulte a convivência de criança ou adolescente com genitor, em ação autônoma ou incidental, o juiz poderá, cumulativamente ou não, sem prejuízo da decorrente responsabilidade civil ou criminal e da ampla utilização de instrumentos processuais aptos a inibir ou atenuar seus 29 efeitos, segundo a gravidade do caso: I - declarar a ocorrência de alienação parental e advertir o alienador; II - ampliar o regime de convivência familiar em favor do genitor alienado; III - estipular multa ao alienador; IV - determinar acompanhamento psicológico e/ou biopsicossocial; V - determinar a alteração da guarda para guarda compartilhada ou sua inversão; VI - determinar a fixação cautelar do domicílio da criança ou adolescente; VII - declarar a suspensão da autoridade parental. Parágrafo único. Caracterizado mudança abusiva de endereço, inviabilização ou obstrução à convivência familiar, o juiz também poderá inverter a obrigação de levar para ou retirar a criança ou adolescente da residência do genitor, por ocasião das alternâncias dos períodos de convivência familiar. Importante esclarecer que o rol de medidas acima insertas são meramente exemplificativas, eis que outras providências que se mostrem necessárias para a solução das controvérsias podem ser utilizadas na prática. Silvio de Salvo Venosa (2013, p. 333/334) confirma o entendimento supramencionado, esclarecendo que se trata de um rol meramente exemplificativo, eis que, induvidosamente, “[...] o juiz deverá verificar qual a solução mais plausível no caso concreto. Nada impede que algumas dessas medidas sejam aplicadas cumulativamente”. Aliado a isso, vale trazer à tona de que forma o Tribunal de Justiça de Minas Gerais se posicionou acerca do tema, que, no caso em comento, a guarda da criança era disputada entre as avós maternas e o genitor. Na hipótese em apreço, restou enfatizado que o menor sofria agressões pelo seu genitor, mas que não restou comprovado nos autos, ocasião em que se vislumbrou a prática da alienação parental. APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE GUARDA - MEDIDA CAUTELAR INOMINADA - DISPUTA ENTRE AVÓS MATERNOS E GENITOR - AGRESSÕES PRATICADAS CONTRA O MENOR - ALEGAÇÕES INSUBSISTENTES - ATOS TÍPICOS DE ALIENAÇÃO PARENTAL - CONSTATAÇÃO - MEDIDAS TENDENTES À OBSTAR A INSTALAÇÃO DA SÍNDROME - ARTIGO 6º DA LEI 12.318/10 - OBSERVÂNCIA - HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS - MANUTENÇÃO - RECURSOS DESPROVIDOS. Demonstrada a insubsistência das agressões imputadas ao genitor que, contrariamente ao argumentado, reúne condições morais, psicológicas e financeiras para exercer a guarda do filho menor, deve ser mantida a sentença que julga procedente o pedido por ele formulado, rejeitando a pretensão de idêntica natureza apresentada pelos avós maternos. Caracterizados atos típicos de alienação parental, cumpre ao magistrado determinar a adoção de medidas necessárias para obstar a instalação da síndrome, na forma estabelecida no artigo 6º da Lei n. 12.318/10. Incabível a minoração dos honorários sucumbenciais fixadosem patamar condizente com os critérios delineados pelo § 3º, do artigo 20 do CPC. (TJ/MG - 30 Apelação Cível 10395110003872003 - Relator Afrânio Vilela - 2.ª Câmara Cível - Julgamento em 06/05/2014). Ademais, oportuno mencionar que "A alteração da guarda dar-se-á por preferência ao genitor que viabiliza a efetiva convivência da criança ou adolescente com o outro genitor nas hipóteses em que seja inviável a guarda compartilhada", conforme estabelece o artigo 7.º, da Lei n.º 12.318, de 26 de agosto de 2010. Com supedâneo no regramento inserto no artigo 7.º, da Lei n.º 12.318, de 26 de agosto de 2010, Fábio Vieira Figueiredo e Georgios Alexandridis (2014) explicam que uma vez vislumbrado no caso concreto o ato de alienação parental, haverá a possibilidade de se instaurar a perda da guarda da criança, em prol da vítima. Sendo assim, levando-se em consideração que aquele que pratica o fenômeno da alienação parental não possui condições psíquicas para conduzir a guarda da criança, proceder-se-á a sua destituição, conforme ensinam Fábio Vieira Figueiredo e Georgios Alexandridis (2014, p. 77). Assim, o genitor que detém a guarda do menor, mas que promova atos de alienação parental para com o outro genitor, ou qualquer parente, não demonstra ter a melhor aptidão para o exercício da guarda do menor, podendo, assim, ser destituído da guarda, ou nem sequer chegar a exercê- la, quando perceptível o processo de alienação quando da própria fixação da guarda, ou mesmo posteriormente à sua fixação, possibilitando a qualquer momento, enquanto a menoridade do filho perdurar, a modificação da guarda. Sobre a possibilidade em se implementar a alteração da guarda, o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul assim decidiu: AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO DE MENOR CONVERTIDA EM AÇÃO DE GUARDA. ALTERAÇÃO DE GUARDA. POSSIBILIDADE. No caso de guarda exercida por um dos pais, é dever do guardião incentivar o convívio do menor com o outro genitor. No caso, por se tratar de guarda na família extensa, sem histórico de abandono ou maus tratos pela genitora, tal regra também se aplicaria, sendo dever do guardião estimular a aproximação entre o infante e os genitores. A tarefa que competia à agravante não foi observada, pelo contrário, há fortes indícios de configuração de alienação parental, alteração da guarda que se mostra adequada. Manutenção da decisão agravada. (TJ/RS - Agravo de Instrumento 70061381042 - Relator Rui Portanova - 8.ª Câmara Cível - Julgamento em 30/10/2014). Nessa toada, consoante entendimento firmado pela autora Caroline de Cássia Francisco Buosi (2012), um método de se prevenir a alienação parental é por 31 meio do instituto da guarda compartilhada, na medida em que ambos os genitores, efetivamente, participarão do desenvolvimento da criança. A questão da reparação de danos também perfaz um método eficaz para se coibir a prática da alienação parental, eis que, induvidosamente, atingir a agente alienador financeiramente é um método eficaz para se compensar o desgaste sofrido pela vítima. Roberto Palermo (2012, p. 76) dispõe acerca do tema: Concluído o processo de separação em que foi caracterizada a alienação parental, a lei garante que aquele que não tem a guarda da criança tenha direito a reparação. Nesse caso, abre-se um novo processo contra o alienador. É nesse momento que o pai tende a relaxar. Depois de tanto desgaste com os processos judiciais da separação e da guarda, que podem se arrastar por anos, é compreensível que o pai fique satisfeito por voltar a conviver com a criança e não queira mais enfrentar processos. Não levar o processo até o fim, no entanto, é um grande erro. É fundamental que a mãe seja punida de forma que, quem sabe, não tente fazer o mesmo depois de alguns meses. Atingir o alienador financeiramente ainda é uma maneira de compensação pelo desgaste de lutar por um direito. Diante do exposto, percebe-se claramente que o Poder Judiciário poderá se valer de diversas medidas que visam coibir a prática da alienação parental, instituto tão perverso e destruidor do desenvolvimento psicológico da criança. 32 5 CONCLUSÃO Sem sombra de dúvidas, a criança e o adolescente, que se encontra em um estágio de desenvolvimento, deve ter seus direitos preservados de modo prioritário, dentre os quais se elenca o direito de conviver com os seus genitores, ainda que tenha havido a dissolução da sociedade conjugal. Entretanto, na prática, o aludido direito não se mostra resguardado, eis que em algumas ocasiões subsiste o fenômeno da alienação parental, o qual consiste, basicamente, no fato do agente alienador, imbuído por um sentimento de ódio, utilizar a criança como objeto, com o desiderato de atingir a vítima alienada. Configura-se tal instituto ante a prática de diversos atos, como, por exemplo, o fato de proceder de forma que desqualifique as condutas provenientes do genitor e/ou a forma de como exerce seu exercício paternal, além das hipóteses nas quais se vislumbram obstáculos para manter contato com a criança, assim como o exercício do direito de visita. Em algumas ocasiões, quiçá, as mais perversas, o alienador atua de modo a implementar falsas memórias, de modo que a criança e o adolescente passem a acreditar em fatos que nunca ocorreram, sendo que em diversos casos, argúi, inclusive, a falsa acusação de abuso sexual, cuja conduta causa repulsa, e, induvidosamente, deve ser reprimida pelo ordenamento jurídico pátrio. Diante disso, não pairam dúvidas de que a prática da alienação parental ocasiona diversas consequências para a criança, eis que o mesmo perde o direito de conviver com o genitor alienado, passando a rejeitá-lo por fatos que não ocorreram. Além disso, a criança que sofre com a prática da alienação parental apresenta baixa estima, insegurança, medo e transtornos intrinsecamente ligados a sua personalidade. Sendo assim, tendo em vista a amplitude do instituto da alienação parental, cabe ao Poder Judiciário intervir nos casos em que se constatar a presença do aludido fenômeno, ocasião em que o papel das equipes multidisciplinares mostrar- se-ão de suma importância para o deslinde do caso em espeque, eis que por meio de psiquiatras, pedagogos e assistentes sociais, mostra-se mais eficaz a sua constatação. Assim, após a análise das equipes multidisciplinares caberá ao Poder 33 Judiciário instituir as medidas que entender cabíveis para atenuar a prática da alienação parental, que, dentre outras hipóteses, poderá advertir o alienador, além de aplicar multa que se coadune com a realidade fática. Nos casos que se mostrarem mais gravosos, o magistrado poderá, inclusive, determinar a perda da guarda da criança, em prol do agente alienado. A questão da guarda compartilhada como forma de elidir a possibilidade de se instaurar a alienação parental, além da condenação por danos morais, também são medidas que se mostram interessantes para a sua coibição. 34 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ALMEIDA JÚNIOR, Fernando Frederico de; TEBALDI, Juliana Zacarias Fabre. Direito civil: família e sucessões. São Paulo: Manole, 2012. ALMEIDA JÚNIOR, Jesualdo. Comentários à lei da alienação parental: lei n.º 12.318, de 26 de agosto de 2010. Revista síntese de direito de família, vol. 12, n.º 62, out/nov 2010. BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 (Constituição Federal). Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm>.Acesso em: 30 ago. 2016. _____. Decreto n.º 99.710, de 21 de novembro de 1990 (Convenção sobre os Direitos da Criança). Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/1990-1994/D99710.htm>. Acesso em: 30 ago. 2016. _____. Lei n.º 8.069, de 13 de julho de 1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente). Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L8069.htm>. Acesso em: 30 ago. 2016. _____. Lei n.º 10.406, de 10 de janeiro de 2002 (Código Civil Brasileiro de 2002). Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/2002/L10406.htm>. Acesso em: 31 jul. 2016. _____. Lei n.º 12.318, de 26 de agosto de 2010 (Lei da Alienação Parental). Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007- 2010/2010/Lei/L12318.htm>. Acesso em: 16 ago. 2016. BUOSI, Caroline de Cássia Francisco. Alienação parental: uma interface do direito e da psicologia. Curitiba: Juruá, 2012. DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. 5. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009. FIGUEIREDO, Fábio Vieira. ALEXANDRIDIS, Georgios. Alienação parental. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2014. FIGUEIREDO, Luciano; FIGUEIREDO, Roberto. Direito civil: família e sucessões. Salvador: JusPODIVM, 2014. FIUZA, César. Direito civil: curso completo. 13. ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2009. 35 JUSBRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Conflito de Competência 114782 RS. Relatora Nancy Andrighi. 2.ª Seção. Julgamento em 12/12/2012. Disponível em: <http://stj.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/23034624/conflito-de-competencia-cc- 114782-rs-2010-0203232-0-stj>. Acesso em: 30 ago. 2016. _____. Tribunal de Justiça de Minas Gerais. Apelação Cível 10395110003872003. Relator Afrânio Vilela. 2.ª Câmara Cível. Julgamento em 06/05/2014. Disponível em: <http://tj-mg.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/120457400/apelacao-civel-ac- 10395110003872003-mg>. Acesso em: 30 ago. 2016. _____. Tribunal de Justiça de São Paulo. Agravo de Instrumento 20707345420148260000. Relator Carlos Alberto Garbi. 10.ª Câmara de Direito Privado. Julgamento em 14/10/2014. Disponível em: <http://tj- sp.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/146222382/agravo-de-instrumento-ai- 20707345420148260000-sp-2070734-5420148260000>. Acesso em: 30 ago. 2016. _____. Tribunal de Justiça do Distrito Federal. Apelação Cível 201309010142300. Relator Rômulo de Araujo Mendes. 1.ª Turma Cível. Julgamento em 21/10/2015. Disponível em: <http://tj-df.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/251850028/apelacao-civel- apc-20130910142300>. Acesso em: 30 ago. 2016. _____. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Agravo de Instrumento n.º 70060325677. Relator Sérgio Fernando de Vasconcellos Chaves. 7.ª Câmara Cível. Julgamento em 25/07/2014. Disponível em: <http://tj- rs.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/130202120/agravo-de-instrumento-ai- 70060325677-rs>. Acesso em: 30 ago. 2016. _____. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Agravo de Instrumento n.º 80061381042. Relator Rui Portanova. 8.ª Câmara Cível. Julgamento em 30/10/2014. Disponível em: http://tj-rs.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/151266539/agravo-de- instrumento-ai-70061381042-rs. Acesso em: 30 ago. 2016. _____. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Apelação Cível 700443037902. Relator Ricardo Moreira Lins Pastl. 8.ª Câmara Cível. Julgamento em 29/09/2011. Disponível em: <http://tj-rs.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/20636103/apelacao-civel- ac-70043037902-rs-tjrs>. Acesso em: 30 ago. 2016. LEITE, Eduardo de Oliveira. Estudos de família e pareceres de direito civil. Rio de Janeiro: Forense, 2011. _____. Alienação parental: do mito à realidade. Curitiba: RT, 2015. LISBOA, Roberto Senise. Direito civil de A a Z. São Paulo: Manole, 2008. 36 LÔBO, Paulo. Direito civil: famílias. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2011. LUZ, Valdemar da. Manual de direito de família. São Paulo: Manole, 2009. MADALENO, Rolf. Curso de direito de família. 5. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2013. PALERMO, Roberto. Ex-marido, pai presente: dicas para não cair na armadilha da alienação parental. São Paulo: Mescla, 2012. PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil: direito de família. 21. ed. Rio de Janeiro: Forense, 20163. TRINDADE, Jorge. Incesto e alienação parental: realidades que a justiça insiste em não ver. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007. VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil: direito de família. 13. ed. São Paulo: Atlas, 2013.
Compartilhar