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Enfoque holístico e visão sistêmica da criatividade Alessandra Jungblut Introdução A atitude criativa é o que move o ser humano a criar. Para isso, é preciso curiosidade, capaci- dade de questionar e se abrir para o novo. A realização pessoal ocorre por meio da satisfação de criar algo que se considera bom, é brincar com as ideias, é testar hipóteses diferentes. Objetivos de aprendizagem Ao final desta aula, você será capaz de: • conhecer os âmbitos comportamentais da criatividade por intermédio dos modos de pensar e expressar-se; • entender as inter-relações entre criatividade e espontaneidade. 1 A atitude criativa Ações criativas iniciam a partir de questionamentos sobre situações. O ser humano observa as situações e investiga novos modos de olhar e novas soluções possíveis. Atitude, segundo Rodri- gues (1981, apud GOULART, 2006), é uma predisposição a favor ou contra um objeto social. Ela surge da percepção e do sentimento que temos sobre algo e pode influenciar nosso comporta- mento em determinadas ocasiões. A atitude criativa deriva da curiosidade, do hábito de questionar, da vontade de desenvolver algo. São as atitudes mentais e emocionais que desenvolvemos ao investigar uma realidade. Pro- mover a atitude criativa é motivar o indivíduo a desenvolver suas criações, fazendo com que ele perceba que existem opções disponíveis. O indivíduo com atitude criativa vê o mundo com a inge- nuidade de uma criança e o conhecimento de um adulto – possui grande capacidade de atenção e de observação e, para ele, o mundo é cheio de surpresas (FERREIRA et al, 2011). Todas as pessoas criativas são uma síntese de muitas atitudes aparentemente contraditórias. Trata-se do direito de ser ao mesmo tempo lógico e ilógico ou in- trovertido e extrovertido. Todos esses “eus” coabitam e são utilizados sabiamente. Em interação constante e ativa com seu meio ambiente, a criatividade se abre para receber as mensagens. Ao fazê-lo, corre o risco de receber informações in- quietantes e dissonantes. Admite-se que ser curioso é ser um explorador, o que investiga vários territórios. O ser curioso procura verificar o que foi dito e tenta descobrir aquilo que ainda não tenha sido dito (FERREIRA et al, 2011, p. 162). Predebon (2010) afirma que, entre os métodos disponíveis para desenvolver a criatividade, estão as abordagens atitudinais, cujo objetivo é justamente ampliar a atitude criativa por meio de um trabalho psicológico, com técnicas de reflexão e assimilação de novos valores. Ele se refere a uma teoria das aberturas, na qual uma pessoa se torna mais criativa quando está mais aberta. Pessoas tornam-se mais abertas ao aprimorar algumas características como flexibilidade, articu- lação, comunicabilidade, inquietude e leveza. O desenvolvimento dessas características objetiva ampliar a atitude criativa. Figura 1 – F.A.C.I.L.: aberturas à criatividade Leveza Caracteriza o sujeito que não leva o mundo muito a sério, sem que isso se traduza em superficialidade. Pessoas que mantêm o bom humor com mais facilidade, naturalmente. Inquietude Característica de pessoas questinadoras e prospectivas, as que duvidam de muita coisa e sempre querem conferir se normas e consensos são realmente “respeitáveis”. Comunicabilidade Qualidade dos extrovertidos. Pessoas que conseguem estabelecer fáceis pontes de comunicação com o mundo. Articulação Encontrada em pessoas com alto grau de conciliação e participação no ambiente. Gostam de se manter informadas e vivenciam muito uma posição gregária Flexibilidade Característica de pessoas que não adotam posições definitivas, podendo rever suas convicções e valores, sem maiores traumas. Fonte: adaptado de PREDEBON, 2010, p. 51. SAIBA MAIS! Assista ao vídeo “Mude, mas comece...”, sobre mudanças de atitude e a abertura ao novo. <https://www.youtube.com/watch?v=A2hk9jtL7WA>. Indivíduos com atitude criativa, segundo Ferreira (2011), são persistentes mesmo diante de grupos opostos às suas ideias e confrontam o ceticismo e até a hostilidade. A atitude inovadora resiste e persiste ao buscar constantemente o estado de harmonia. FIQUE ATENTO! A atitude criativa tem origem na interação do homem com o mundo e é própria de pessoas abertas ao novo, curiosas e dispostas a lidar com o pensamento divergente. 2 Conduta encaminhada à autorrealização O ser humano é motivado a satisfazer necessidades. Maslow (1970, apud FELDMAN, 2015) desenvolveu um modelo chamado Hierarquia das Necessidades Humanas e as dividiu em neces- sidades fisiológicas, de segurança, de amor e pertencimento, de estima e de autorrealização. Esta última “é um estado de satisfação em que as pessoas realizam seu mais alto potencial da maneira que lhes é peculiar” (FELDMAN, 2015, p. 293). Para atingir esse nível, o ser humano deve suprir primeiro as necessidades fisiológicas mais básicas, depois a necessidade de segu- rança, e assim por diante. Figura 2 – Pirâmide das Necessidades Humanas de Maslow Necessidades fisiológicas Necessidades de segurança Amor e pertencimento Estima Autorrealização Impulsos primários: necessidades de água, alimento e sexo Necessidade de um ambiente seguro e protegido Necessidade de receber e dar afeição Necessidade de desenvolver um sentimento de autovalorização Estado de satisfação Fonte: FELDMAN, 2015, p. 293. Segundo Rogers (2009), a criatividade está presente em todos, esperando as condições adequadas para se manifestar e existe em função da tendência do ser humano em realizar suas potencialidades. A autorrealização é, portanto, o objetivo maior da criação. Para o autor, a maior parte das descobertas consideradas de grande valor social foi motivada por objetivos pessoais dos criadores, ou seja, o ser humano cria porque isso o satisfaz. FIQUE ATENTO! A autorrealização é o estado máximo de satisfação humana. Ela é conquistada no momento em que o indivíduo está motivado a desenvolver seu potencial criativo. Para que o produto criativo seja construtivo e positivo, Rogers (2009) enfatiza a importância do autoconhecimento, de estar aberto às experiências. Ao ficar na defensiva e não aceitar a si mesmo, o indivíduo não permite a livre circulação dos estímulos e não consegue criar algo bom – torna-se rígido. Outra condição interna para a criatividade é o sentimento positivo em relação à sua própria criação. Não é o julgamento do outro que vai satisfazer o indivíduo, mas sim, a consciência de que fez um bom trabalho e realizou suas potencialidades emergentes. Além disso, a autorrealização passa pela capacidade de brincar com as ideias, criar hipóte- ses improváveis, unir elementos impossíveis. Esse exercício amplia a visão criativa da vida e pode efetivamente resultar em descobertas valorosas. 3 A criatividade e a urgência em transformar estilos de pensar e expressar Para Maslow, segundo Feist, Feist e Roberts (2015), pessoas autorrealizadas são criativas, conseguem sentir prazer mesmo em atividades triviais e são resistentes à aculturação. Isso não significa que ignoram as normas ou agem de maneira antissocial, mas apresentam autonomia, padrões próprios e não seguem o senso comum. Figura 3 – Abertura ao desconhecido Fonte: Image Flow/Shutterstock.com Para ter criatividade e autonomia é preciso estar aberto às emoções e aprender a dominar os condicionamentos. Segundo Predebon (2010), é necessário fugir das limitações impostas. A aprendizagem de conceitos, valores e regras é importante para a formação da personalidade e o bom convívio em sociedade, mas a extrema rigidez é um obstáculo ao processo criativo, quando insistimos em obter verdades definitivas, sem conciliar o que já existe com o novo. EXEMPLO Uma pessoa é recebida no novo emprego. Em um primeiro momento, é possível que alguns não simpatizem com ela, pois representa o novo,o desconhecido. Com o tem- po, mudam sua opinião sobre ela e ficam amigos. É essa abertura ao novo que pos- sibilitou isso. A abertura ao pensamento criativo funciona de maneira semelhante. Christiansen (2016) afirma que a codependência pode interferir negativamente na expressão de ideias. A necessidade de sempre agradar ao outro, a baixa autoestima, o sentimento de não ser importante, a dificuldade de comunicação, o medo da crítica e da rejeição, o perfeccionismo e a negação de suas próprias necessidades e sentimentos são alguns aspectos que indicam depen- dência do outro e dificultam a expressão autônoma. Além de tomar consciência e buscar a autovalorização, o ser humano também pode contri- buir para o estímulo à expressão, criando ambientes cooperativos que incentivam as novas ideias. SAIBA MAIS! Leia o artigo “A Criatividade e a Aventura do Novo”, de José Predebon. Acesse: <http://www.predebon.com.br/textos/IM00001.html>. 4 A arte da criatividade e o estado de espontaneidade A visão sistêmica compreende o ser humano como criativo por natureza, e o mundo, como algo em constante transformação e evolução. O próprio mundo é para o indivíduo a fonte de novas ideias – influencia ao mesmo tempo em que é influenciado, como um ciclo de reciprocidade (Moreira, 2008). Segundo Moreno (1974, apud FATOR, 2010), a ação espontânea tem um caráter transforma- dor e permite ao indivíduo manter sua condição criativa. Pois, no momento em que o indivíduo se preocupa mais com o resultado do que com o processo criativo, acaba se tornando conservador e menos receptivo a mudanças e tende a repetir os resultados. Desta forma, a espontaneidade não é algo que está armazenado no indivíduo – simplesmente surge de maneira livre e não depende da vontade, mas sim, das situações que se apresentam em determinado momento. EXEMPLO Conta-se que Newton descobriu a Lei da Gravidade quando uma maçã caiu em sua cabeça. Nessa história, a espontaneidade ocorre no momento em que ele tem a ideia repentina de que, se a maçã caiu, é porque há uma força que a atraiu. A espon- taneidade é resposta a um acontecimento (Guimarães, 2011). Figura 4 – A descoberta de Newton Fonte: corbac40/Shutterstock.com Segundo Ostrower (2011), a espontaneidade existe mesmo com a influência do meio social sobre a criatividade humana. O ser humano atinge sua maturidade e seleciona o que considera mais relevante na sua interação com o mundo. Ser espontâneo é estar aberto a essa interação, sem rigidez ou preconceitos. A espontaneidade é o que nos torna flexíveis e garante nossa adap- tação ao meio social e a tudo que é novo. FIQUE ATENTO! A espontaneidade não é uma energia que permanece no indivíduo. Ela surge de repente, motivada por uma situação. É o ponto de partida da criatividade e, para ser espontâneo, é preciso estar receptivo. Fechamento Nesta aula, você teve a oportunidade de: • aprender sobre a atitude criativa e as aberturas à criatividade; • conhecer a teoria de Maslow sobre as necessidades humanas; • identificar modos de pensar que facilitam o desenvolvimento da criatividade; • compreender o conceito de espontaneidade. Referências CHRISTIANSEN, James. Codependência: quebre o ciclo e liberte-se. [E-book].Teaneck: Babelcube Inc., 2016. FATOR, Tânia. A teoria psicodramática e o desenvolvimento do papel profissional. São Cae- tano do Sul: USCS, 2010. Disponível em: <http://repositorio.uscs.edu.br/handle/123456789/131>. Acesso em 17 fev. 2017. FEIST, Jess; FEIST, Gregory e ROBERTS, Tommi-Ann. Teorias da Personalidade. 8. ed. Porto Alegre: Artmed, 2015. FELDMAN, Robert S. Introdução à Psicologia. 10. ed. Porto Alegre: Artmed, 2015. FERREIRA, Cristiano Vasconcellos, et. al. Projeto do Produto. Rio de janeiro: Elsevier: ABEPRO, 2011. GOULART, Iris B. Temas de Psicologia e Administração. São Paulo: Casa do Psicólogo, 2006. GUIMARAES, Gustavo Queiroz. Uma nova resposta ao conceito de espontaneidade. Rev. bras. psicodrama [online]. 2011, v.19, n.1, p. 135-142. Disponível em: <http://pepsic.bvsalud.org/scielo. php?script=sci_arttext&pid=S0104-53932011000100011>. Acesso em: 15 mar. 2017. PREDEBON, José. Criatividade: abrindo o lado inovador da mente. 7. ed. São Paulo: Atlas, 2010. ROGERS, Carl R. Tornar-se pessoa. 6. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2009. MOREIRA, Mafalda Vaz Pinto. Criatividade organizacional: uma abordagem sistêmica e pragmá- tica. Portugal: Repositário Aberto da Universidade do Porto, 2008. Disponível em: <http://hdl.han- dle.net/10216/12180>. Acesso em: 15 mar. 2017. OSTROWER, Fayga. Criatividade e processos de criação. 28. ed. Petrópolis: Vozes, 2011. TV CULTURA DIGITAL. Mude, mas comece. Provocações, 2004. Disponível em: < https://www. youtube.com/watch?v=A2hk9jtL7WA>. Acesso em 17 mar. 2017.
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