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Felipe Porto e Helena Cohen - Teoria do Estado - Turma HB - Adriano Pilatti A Constituição Federal é um pilar fundamental na democracia brasileira, de 1988, pós ditadura militar, que garante diversos direitos e deveres do cidadão. Temos no artigo 5º alguns desses direitos explicitados. Em 1977, ainda em tempos de cerceamento dos direitos políticos e civis, na ditadura militar, Goffredo Telles Júnior faz a leitura de um manifesto, uma carta, endereçada aos brasileiros. Lida no Largo do São Francisco, em frente à Faculdade de Direito de São Paulo, a Carta Aos Brasileiros possui alguns pontos que fundam os princípios constitucionais que seriam adotados a partir de 88, após a ditadura militar. Logo abaixo, listamos o artigo 5º e alguns de seus incisos, comparando-os com trechos da carta, para identificar tal semelhança. > Constituição - Artigo 5º - Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: > Carta Aos Brasileiros - “O Direito à igualdade perante a lei” > Inciso I - “homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações;” > Carta Aos Brasileiros - “O Direito à igualdade perante a lei” > Inciso II - “ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei;” > Carta Aos Brasileiros - “o direito à liberdade justa, que é o direito de fazer ou de não fazer o que a lei não proíbe” > Inciso III - “ninguém será submetido a tortura nem a tratamento desumano ou degradante;” > Carta Aos Brasileiros - "direito de nunca ser submetido à tortura, nem a tratamento desumano ou degradante" > Inciso IV - “é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato;” > Carta Aos Brasileiros - "O direito de exprimir o pensamento, sem qualquer censura, ressalvadas as penas legalmente previstas, para os crimes de calúnia, difamação e injúria" > Inciso V - “é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem;” > Carta Aos Brasileiros - “...para os crimes de calúnia, difamação e injúria; o direito de resposta;” > Inciso VI - (é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias;) > Carta Aos Brasileiros - "O direito de exprimir o pensamento, sem qualquer censura…” > Inciso VII - (é assegurada, nos termos da lei, a prestação de assistência religiosa nas entidades civis e militares de internação coletiva) > A Carta não faz menção específica à tal assunto. > Inciso VIII - (ninguém será privado de direitos por motivo de crença religiosa ou de convicção filosófica ou política, salvo se as invocar para eximir-se de obrigação legal a todos imposta e recusar-se a cumprir prestação alternativa, fixada em lei; > Carta Aos Brasileiros - "O direito de exprimir o pensamento, sem qualquer censura, ressalvadas as penas legalmente previstas..." > Inciso IX - (é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença) > Carta Aos Brasileiros - "O direito de ter uma imprensa livre" ; "O direito de fruir das obras de arte e cultura, sem cortes ou restrições" > Inciso X - (são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação) > Carta Aos Brasileiros - "Para os crimes de calúnia, difamação e injúria; o direito de resposta" > Inciso XI - (a casa é asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo penetrar sem consentimento do morador, salvo em caso de flagrante delito ou desastre, ou para prestar socorro, ou, durante o dia, por determinação judicial; > Carta Aos Brasileiros - "O direito à intimidade e à inviolabilidade do domicílio"; "O direito à propriedade e o de conservá-la" > Inciso XII - (é inviolável o sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas, salvo, no último caso, por ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigação criminal ou instrução processual penal) > A Carta não faz menção específica à tal assunto. > Inciso XIII - (é livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer) > A Carta não faz menção específica à tal assunto. > Inciso XIV - (é assegurado a todos o acesso à informação e resguardado o sigilo da fonte, quando necessário ao exercício profissional) > A Carta não faz menção específica à tal assunto. > Inciso XV - (é livre a locomoção no território nacional em tempo de paz, podendo qualquer pessoa, nos termos da lei, nele entrar, permanecer ou dele sair com seus bens) > A Carta não faz menção específica à tal assunto. > Inciso XVI - (todos podem reunir-se pacificamente, sem armas, em locais abertos ao público, independentemente de autorização, desde que não frustrem outra reunião anteriormente convocada para o mesmo local, sendo apenas exigido prévio aviso à autoridade competente) > Carta Aos Brasileiros - "O direito de reunião e associação" > Inciso XVII - (é plena a liberdade de associação para fins lícitos, vedada a de caráter paramilitar) > Carta Aos Brasileiros - "O direito de reunião e associação"; "O direito de organizar livremente sindicatos de trabalhadores, para que estes possam lutar em defesa de seus interesses" Tanto o Artigo 5º quanto a carta mencionam o conceito do que seria a igualdade jurídica, algo que não é visto na prática, apenas na teoria. Na sociedade brasileira, que sofre de inúmeros problemas, suas instituições legais tendem a se revelar racistas e classistas. O direito de defesa/resposta e a presunção de inocência, muitas vezes, são completamente ignoradas. Inúmeros casos de falência do Estado em garantir os direitos fundamentais presentes na Constituição Federal já ocorreram no país inteiro. O emblemático caso do Amarildo, um ajudante de pedreiro que desapareceu em uma favela carioca, exemplifica bem o que fora dito. Sem bases legais ou provas, policiais o interceptaram voltando de uma pescaria, prendendo-o por te-lo confundido com um traficante da região (incisos II, III e X completamente ignorados pelos policiais atuantes no caso) A partir de então, o paradeiro de Amarildo é desconhecido e evidencia bem o problema grave que temos em nossas mãos. Recentemente, tivemos um outro caso ultrajante, envolvendo dois suspeitos de classes e cores diferentes. Rafael Braga e Breno Borges. Rafael Braga é um jovem negro e pobre que foi detido pela polícia em um flagrante, no mínimo, contestável. Ele portava 0,6g de maconha e 9g de cocaína no momento em que foiautuado. Posteriormente, ele fora condenado a 11 anos e três meses de prisão. Ferindo vários pontos do Artigo 5º de nossa CF, esse caso segue correndo normalmente. (Rafael recentemente foi liberado à prisão domiciliar, porém, apenas porque se encontra doente.) Já Breno Borges é um jovem branco e de classe média alta, que é filho de uma desembargadora, foi pego pela polícia portando 130kg de maconha, uma pistola com 199 cartuchos de fuzil de uso exclusivo das forças armadas. Breno não foi detido. Ele alegou ter problemas mentais e conseguiu, pasmem, o direito de responder em liberdade. A disparidade entre os dois casos é assustadora e apenas reflete o erro que estamos cometendo em nosso sistema judicial. (o Artigo 5º é literalmente inexistente nessa comparação de casos). Tais exposições demontram claramente que o princípio da igualdade jurídica, apesar de ser um bem jurídico protegido pela constituição, não é respeitada quando inserida no cotidiano da sociedade brasileira. Existem outros inúmeros casos, tanto em relação à esse assunto, quanto outros, como os movimentos recentes de querer censurar formas de artes (MBL e outros [vide religiosos]), que, protegida pelo inciso IX do artigo 5º, a expressão artística no Brasil vêm sofrendo represálias em movimentos que são pura e simplesmente inconstitucionais e violam direitos básico e inerentes ao ser humano. Exemplos não faltam, porém seria impossível registrar todos aqui. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . I – A legislação não acompanha a sociedade brasileira que se mostra na machista e patriarcal, formando uma realidade em que homens e mulheres não apresentam os mesmos direitos e oportunidades, tanto no meio público quanto no privado. Isso decorre de um contexto histórico, proveniente da colonização. A carta menciona a igualdade jurídica e de direitos. Mulheres, até hoje, não possuem as mesmas oportunidades de trabalho, só foram tecnicamente inseridas na esfera eleitoral 110 anos após a primeira constituição, e sua representatividade, ainda é extremamente baixa. II - A base constitucional se apresenta como um todo condizente com a realidade. A autonomia privada é respeitada no contexto atual brasileiro. III – Tanto a constituição, quanto a carta aos brasileiros postulam ser contra a tortura e o tratamento degradante, mas a realidade novamente não se aplica. A realidade é que todo o aparato da polícia vem de um longo processo de histórico de violência e repressão e ainda é possível afirmar que a polícia abusa, tortura e humilha a população como um todo. Além disso, os presídios brasileiros são o maior exemplo de omissão consciente do Estado como degradante e tortura. Histórias como Carandiru, Curado, Urso Branco e Compaj são o ápice de como a negligência de direitos básicos como alimentos, água, medicamentos e estrutura através da ineficácia do Estado. O preso encarcerado está sob tutela do Estado, ao submeter o indivíduo a semanas sem uma refeição digna, em locais insalubres e contagiosos é a violação do inciso III e detratados de direitos humanos cujos quais o Brasil é signatário. IV - Atualmente é respeitado, porém, múltiplas manifestações políticas ainda são reprimidas no país, isso se dá pela crise política existente e pelo legado da antiga Ditadura Militar brasileira. V – Se comparada a épocas anteriores, o sistema Judiciário presente torna o direito de resposta algo possível e acessível, mesmo com as limitações já mencionadas do Estado Brasileiro e seu judiciário. VI/VII/VIII - Apesar da legislação favorável, o Estado Brasileiro permite o contexto em que religiões minoritárias, como das crenças afro-brasileiras, e seus membros respectivos, são desrespeitados recorrentemente e possuem sua liberdade restringida por grupos criminosos e setores religiosos intolerantes. Além disso, ocorre supremacia da religião Cristã na sociedade brasileira, o que configura influência direta no próprio Estado, dessa forma constituindo restrição da liberdade religiosa de forma passiva. As instituições civis e militares não possuem a eficiência necessária para resguardar o direito à liberdade religiosa desses grupos minoritários, que é ameaçada constantemente. Logo, fere a laicidade do Estado. Casos como Kailane Santos, uma menina que foi agredida com uma pedrada ao sair do culto, ou neopentecostais quebrando ou mandando quebrar imagens de Santos são recorrentes no Brasil. Quanto a quebra da laicidade passiva é bem ilustrada ao se observar em instituições públicas como fóruns com crucifixos em suas paredes. IX – A Constituição de 1988, no momento em que foi redigida, possuía objetivo de ampliar os direitos antes restringidos pelo contexto da Ditadura. Dessa forma, a legislação, na atualidade, é desrespeitada parcialmente em frente aos interesses de setores conservadores que ganham cada vez mais espaço para censurar movimentos artísticos e de comunicação. Nos últimos meses, o noticiário cobriu massivamente a censura e até o encerramento de exposições artísticas com conteúdo explicito, tudo baseado em sensacionalismo e críticas de movimentos partidários e uma camada conservadora da sociedade. Os estados afetados foram São Paulo, Rio grande do Sul e Rio de Janeiro. X- A legislação não acompanha questões atuais relacionadas à tecnologia atual e os meios de comunicação amplamente usados pela população. XI - A situação social do país torna a legislação falsa para aqueles que vivem em "situação de risco", seja em áreas de baixa renda ou comunidades em conflito armado pelo tráfico de drogas, o aparelho do Estado quebra este valor constitucional recorrentemente, violando moradias de múltiplos cidadãos. Casos de morte de inocentes ocorridas por oficiais invadindo as moradias em favelas são pouco falados, mas muito recorrentes. XII – A legislação não acompanha o avanço digital visto no país durante a última década. Porém, pode ser adaptada para comunicações digitais, amplamente usadas pela população. XIII – A base constitucional apresenta-se condizente com a realidade brasileira. Porém, a "livre exercício de qualquer trabalho" é afetado pelas questões de gênero, raça e classe que são um impedindo à uma busca pela felicidade plena, já que favorece predominantemente homens brancos. XIV – Com a maior abertura política e a democratização do país pós-Ditadura o parágrafo se confirma na realidade. XV- A base constitucional se confirma parcialmente. Enquanto a locomoção de pessoas e bens é livre em território nacional, para sair ou entrar nele, muitos são impedidos pela questão social, em que sem ampla renda adquirida essa locomoção é dificultada. XVI – Apresenta-se na realidade brasileira o direito de livre organização de pessoas. Porém a legislação é afetada pelos impedimentos à múltiplas manifestações atualmente. XVII – Ocorre ampla liberdade de associação no Estado brasileiro. Pode-se concluir que a Constituição brasileira condiz com os direitos da "Carta aos brasileiros", ambos foram redigidos em uma época na qual a ditadura estava quase no fim ou já havia terminado. O povo urrava por liberdade, igualdade e direitos sociais e humanos, são textos humanistas de cunho liberal. O manual de instruções máximo parece ter sido esquecido a ponto de ser amplamente desrespeitado pelas instituições que deveriam resguardá-la. O Estado de Direito que os artigos acima e a Constituição defendem, não é mais tido como prioridade, flexibilizou-se os valores essenciais da carta magna por consequência do contexto global atual e as gerações já passadas. A ideia de uma república de atos institucionais não parece algo tão sombrio e impossível como já foi outrora. existe uma hierarquia, um ordenamento, para que exista um Estado de direito funcional e propriamentedito é preciso que haja respeito e comprometimento com a ordem máxima, isso é dito na constituição, na carta e pela história.
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