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1Fuvest/Unicamp Literatura Fuvest Unicamp Parte integrante do livro Fuvest/Unicamp – Literatura e não pode ser vendido separadamente • Viagens na minha terra • Til • Memórias de um sargento de milícias • Memórias póstumas de Brás Cubas • O cortiço • A cidade e as serras • Vidas secas • Capitães da Areia • Sentimento do mundo Célia A. N. Passoni Roteiro de leitura guia de leitura.indd 1guia de leitura.indd 1 26/02/2013 10:27:3826/02/2013 10:27:38 guia de leitura.indd 2guia de leitura.indd 2 26/02/2013 10:27:3926/02/2013 10:27:39 3Fuvest/Unicamp Cronologia e características dos movimentos literários PORTUGAL BRASIL T RO VA D O RI SM O 1189/1198 – “A Ribeirinha” Paio Soares de Taveirós Gêneros: cantigas (poesia), novelas de cava- laria, nobiliários, hagiografias. Características Cantigas de amor: sofrimento, idealização, eu lírico masculino, ambiente da Corte, dama inacessível, caráter analítico-discursivo. Cantigas de amigo: eu lírico feminino, confessional, ambiente popular, paixão incorrespon- dida, realista, narrativo-descritiva. Cantigas de escárnio e maldizer: críticas indiretas ou diretas de pessoas ou fatos de uma época. Rica fonte de documentação. PORTUGAL BRASIL H U M A N IS M O 1418 – Fernão Lopes Guarda-mor da Torre do Tombo. Gêneros: historiografia, teatro popular, pro- sa doutrinária. Gil Vicente (teatro). Características Teatro: em poesia, versa sobre assuntos profanos ou religiosos; carpintaria teatral rudimen- tar; ausência de regras; sem unidade de ação, tempo e espaço. Aspectos críticos de uma sociedade em transição. PORTUGAL BRASIL Q U IN H EN TI SM O 1527 – Sá de Miranda Introdução da medida nova. Gêneros: poesia lírica, épica, teatro e crônicas. Camões (poesia). 1500 – 1º documento escrito em terras bra- sileiras: Carta a D. Manuel. Gêneros: poesia lírica e épica, teatro (crôni- cas). Pero Vaz de Caminha (cartas) e José de An- chieta (teatro). Características Valorização do homem (antropocentrismo); paganismo (maravilhoso pagão); superio- ridade do homem sobre a natureza; objetividade; racionalismo; universalidade; saber concreto em detrimento do abstrato; retomada dos valores greco-romanos; rigor métrico, rímico e estrófico: equilíbrio e harmonia. guia de leitura.indd 3guia de leitura.indd 3 26/02/2013 10:27:3926/02/2013 10:27:39 4 Fuvest/Unicamp PORTUGAL BRASIL BA RR O CO 1580 – Morte de Camões. Portugal sob domínio espanhol. Gêneros: oratória sacra, política e social; poe- sia religiosa, satírica e lírico-amorosa. Pe. Antônio Vieira (oratória). 1601 – Bento Teixeira. Publicação de Prosopopeia. Pe. Antônio Vieira (oratória) e Gregório de Matos (poesia). Características Arte dos contrastes; antinomia homem-céu/homem-terra; visualização e plasticidade; fugacidade; não racionalismo; unidade e abertura (perspectivas múltiplas para o obser- vador); luta entre o profano e o sagrado. Culto a elementos evanescentes (água/vento). Sentido de transitoriedade da vida; carpe diem (aproveitar o momento); valorização do presente, movimento ligado ao espírito da Contrarreforma; jogos de metáforas; riqueza de imagens; gosto pelo pormenor; malabarismo verbal – uso de hipérbato, hipérbole, metá- foras e antíteses. PORTUGAL BRASIL A RC A D IS M O 1756 – Fundação da Arcádia Lusitana. Gênero: poesia. Bocage (poesia). 1768 – Cláudio Manuel da Costa. Obras poéticas. Cláudio Manuel da Costa, Tomás Antônio Gonzaga (poesia lírica), Basílio da Gama e Santa Rita Durão (poesia épica). Características Arte do equilíbrio e harmonia; busca do racional, do verdadeiro e da natureza; retorno às concepções de beleza do Renascimento; poesia objetiva e descritiva; aurea mediocritas: o objetivo arcádico de uma vida serena e bucólica; pastoralismo; valorização da mitologia; técnica da simplicidade. Literatura linear e regrada: inutilia truncat (cortar o inútil). PORTUGAL BRASIL RO M A N TI SM O 1825 – Almeida Garrett Publicação do poema “Camões”. Gêneros: prosa (romance, novela); poesia e teatro. Garrett (poesia e prosa), Herculano (romance histórico) e Camilo Castelo Branco (romance passional). 1836 – Gonçalves de Magalhães Publicação de Suspiros poéticos e saudades. Poesia: Gonçalves Dias, Álvares de Azevedo, Casimiro de Abreu e Castro Alves. Prosa: Alencar, Joaquim Manuel de Macedo, Manuel Antônio de Almeida (urbanos); Alencar, Bernardo Guimarães, Taunay (re- gionalistas); Alencar (indianista/histórico). Características 1ª geração: nacionalismo, ufanismo, natureza, religião (cristianismo), indianismo/medieva- lismo. 2ª geração: mal do século, evasão, solidão, profundo pessimismo, anseio da morte. 3ª geração: condoreirismo, liberdade, oratória reivindicatória, transição para o Parnasianis- mo, literatura social e engajada. Geral: imaginação, fantasia, sonho, idealização, sonoridade, simplicidade, subjetivismo, sin- taxe emotiva, liberdade criadora. guia de leitura.indd 4guia de leitura.indd 4 26/02/2013 10:27:3926/02/2013 10:27:39 5Fuvest/Unicamp PORTUGAL BRASIL RE A LI SM O /P A RN A SI A N IS M O /N AT U RA LI SM O 1865 – Questão Coimbrã: Antero de Quental contra Castilho. (Novos × velhos). Gêneros: prosa (romance, conto, crônica), poesia, crítica. Prosa: Eça de Queirós. Poesia: Antero de Quental, Cesário Verde e Guerra Junqueiro. 1881 – Machado de Assis Publicação de Memórias póstumas de Brás Cubas (Realismo). Aluísio Azevedo Publicação de O mulato (Naturalismo). Década de 1880 Definição do ideário parnasiano. Prosa: Machado de Assis, Aluísio Azevedo e Raul Pompeia. Poesia: Olavo Bilac, Alberto de Oliveira, Rai- mundo Correia e Vicente de Carvalho. Características Realismo: preocupação com a verdade exata, observação e análise, personagens tipifica- das, preferência pelas camadas altas da sociedade. Objetividade. Descrições pormenori- zadas. Linguagem correta, embora mais próxima do falar corriqueiro; maior interesse pela caracterização que pela ação – tese documental. Naturalismo: visão determinista do homem (animal, presa de forças fatais e superiores – meio, herança genética, fisiologia, momento). Tendência para análise dos deslizes de per- sonalidade. Deturpações psíquicas e físicas. Preferência por camadas menos privilegiadas. Patologia social: miséria, adultério, criminalidade, etc. – tese experimental. Parnasianismo: arte pela arte, objetividade, poesia descritiva, versos impassíveis e perfei- tos, exatidão e economia de imagens e metáforas, poesia técnica e formal, retomada de valores clássicos, apego à mitologia greco-romana. PORTUGAL BRASIL SI M BO LI SM O 1890 – Eugênio de Castro Publicação de Oaristos. Gêneros: poesia e prosa. Poesia: Camilo Pessanha. 1893 – Cruz e Sousa Publicação de Missal (prosa poética) e Bro- quéis (poesias). Poesia: Cruz e Sousa e Alphonsus de Gui- maraens, Pedro Kilkerry, Augusto dos Anjos, Emiliano Perneta. Primeiras décadas do século XX – Pré-Mo- dernismo. Prosa: Monteiro Lobato, Euclides da Cunha, Lima Barreto. Características Simbolismo: reação contra o Positivismo, o Naturalismo e o Parnasianismo; individualismo, subjetivismo, atitude irracional e mística, respeito pela música, cor, luz; procura das possi- bilidades do léxico. Pré-Modernismo: tendências das primeiras décadas do século XX, sentido mais crítico, fi- xando diferentes facetas da realidade social, política, ou alterações na paisagem e cor local. guia de leitura.indd 5guia de leitura.indd 5 26/02/2013 10:27:3926/02/2013 10:27:39 6 Fuvest/Unicamp PORTUGAL BRASIL M O D ER NIS M O 1915 – 1ª fase Revista Orpheu 1940 – 2ª fase Alves Redol Publicação de Gaibéus. Mais recentemente: Surrealismo. Gêneros: poesia, prosa (crônica, conto, ro- mance), teatro. Poesia: Fernando Pessoa, Mário de Sá-Car- neiro, Florbela Espanca, José Régio, etc. Prosa: Fernando Namora, Vergílio Ferreira, Alves Redol, Ferreira de Castro, Branquinho da Fonseca, Miguel Torga, José Rodrigues Miguéis, Jorge de Sena, José Saramago, An- tónio Lobo Antunes, Agustina Bessa-Luís, etc. 1922 – Semana de Arte Moderna. 1922-1930 – 1ª fase: revolucionária. Mário de Andrade Publicação de Pauliceia desvairada. 1930-1945 – 2ª fase: estabilidade. José Américo de Almeida: A bagaceira. 1945 ... – 3ª fase: reação. Nelson Rodrigues: Vestido de noiva. Guimarães Rosa: Sagarana (1946). Geração de 45 1ª geração Poesia: Mário de Andrade, Oswald de Andrade, Manuel Bandeira, Cassiano Ricardo, Raul Bopp, Guilherme de Almeida, Menotti del Picchia. Prosa: Antônio de Alcântara Machado. 2ª geração Poesia: Carlos Drummond de Andrade, Mu- rilo Mendes, Jorge de Lima, Cecília Meireles, Frederico Schmidt, Andrade Murici, Vinicius de Moraes. Prosa: Graciliano Ramos, Jorge Amado, José Lins do Rego, Raquel de Queirós, Érico Verís- simo, Ciro dos Anjos. 3ª geração Poesia: João Cabral de Melo Neto; concretismo: Haroldo e Augusto de Campos, Décio Pignatari. Prosa: João Guimarães Rosa, Clarice Lispector, Lygia Fagundes Teles, Herberto Salles, José J. Veiga, Dalton Trevisan, Fernando Sabino, Pau- lo Mendes Campos, Rubem Braga, etc. Teatro: Nelson Rodrigues, Gianfrancesco Guarnieri, Augusto Boal, Dias Gomes, Jorge Andrade, etc. Características 1ª geração – revolucionária: negação da tradição cultural, antipurista, antiacademicista, lin- guagem coloquial, verso livre, nacionalismo crítico. Ironia, sarcasmo, irreverência. Poema- -piada, liberdade de criação. Predomínio da poesia. 2ª geração – estabilidade: herança de 22, acrescentando aprimoramento da linguagem (in- clusive metalinguagem), busca da expressão universal, recuperação de valores tradicionais (Neossimbolismo), engajamento religioso e social, literatura de denúncia das condições humanas. Predomínio da prosa (romance) de tendências neorrealistas. 3ª geração – reação: retomada de aspectos formais da poesia. Culto à forma e à linguagem (Geração de 45 e poetas concretistas). Na prosa, domínio do conto e da crônica, cujos vá- rios aspectos marcam: a análise e observação do cotidiano; as linhas que demarcam os limites do real e do fantástico; a análise das diferentes formas do comportamento humano sob o signo da literatura psicológica, não raro em forma de exposição do fluxo da cons- ciência; a análise de crises de caráter existencial com tendências a reflexões metafísicas. No campo regional, investigam-se as novas possibilidades linguísticas e preocupações de ordem filosófica tradicional, que se misturam com o meio retratado, permitindo abertura (universalidade); pesquisas temáticas e formais desabrocham em novas técnicas narrativas. Importante o desenvolvimento do teatro psicológico e social. guia de leitura.indd 6guia de leitura.indd 6 26/02/2013 10:27:3926/02/2013 10:27:39 7Fuvest/Unicamp Viagens na minha terra Almeida Garrett Movimento literário: Romantismo (Por- tugal). Características estilo: linguagem correta, domínio do léxico, experimentações linguísticas com a criação de neologismos, uso de termos de outros idiomas ou aportuguesados. Mistura crônica de viagem, ficção e di- gressões que refletem tendências ideo- lógicas do escritor. narrador: narrado em 1ª pessoa pelo próprio autor, que relata suas observa- ções acerca da paisagem que percorre entre Lisboa e Santarém e reconta a his- tória de Joaninha, relatada por um de seus companheiros de viagem. cenário: caminhos percorridos pelo nar- rador, em que se destacam as paragens de Azambuja, Cartaxo e Santarém. personagens: � Joaninha: órfã criada pela avó, jo- vem singela e pura, representa Portugal agrícola. � D. Francisca Joana: avó cega e amar- gurada. Guarda um grande segredo. � Frei Dinis: clérigo que representa o poder da Igreja. Guarda um grande se- gredo. � Carlos: primo de Joaninha. Oficial que luta em prol de causas liberais. Noi- vo da inglesa Georgina, enamora-se da prima. No final, torna-se barão. enredo: Garrett tem por base uma via- gem que faz a convite do político Pas- sos de Manuel, partindo de Lisboa para Santarém. A viagem propriamente dita é feita em nove dias. Os viajantes atra- vessam cerca de setenta quilômetros, subindo a vapor o estuário do rio Tejo e seguindo em montaria a outra parte da viagem. Como trama romântica, tem- -se a história de Joaninha, a menina dos rouxinóis. Joaninha é órfã e foi criada por sua avó, D. Francisca Joana, mulher cega e amargurada. Frei Dinis é um fra- de que acompanha a trajetória das duas mulheres. Carlos é outro neto de D. Fran- cisca, também órfão, cujo pai havia de- saparecido misteriosamente, tal como o pai de Joaninha, em uma cheia do Tejo. Há uma aura de mistério em torno das personagens e das mortes apresenta- das, e um segredo é guardado a sete chaves, sendo enunciado principalmen- te entre Frei Dinis e D. Francisca. Garrett sabe entreter o leitor, mesmo quando está perdido em uma excessiva rede de intrincados pensamentos. Quando re- torna à bela quinta de Santarém, Carlos é um oficial que defende causas liberais. Primo e amigo de Joaninha desde a in- fância, volta para balançar o coração da menina. Mas ele é volúvel e oscila entre o amor despertado pela bela e meiga portuguesa e o amor já amadurecido que nutre pela inglesa Georgina. Geor- gina chega a Portugal em busca de seu amor. Carlos, em campanha na guerra civil, defendendo a deposição de D. Mi- guel, foi ferido e recolhido ao conven- to por Frei Dinis. Mediante explicações de Georgina, o frade abre as portas do guia de leitura.indd 7guia de leitura.indd 7 26/02/2013 10:27:4026/02/2013 10:27:40 8 Fuvest/Unicamp convento para que a moça servisse de enfermeira ao ferido. Conhecendo Joa- ninha, Georgina percebe que é ao lado dela que Carlos encontrará a felicidade. No entanto, tudo volta a se complicar, uma vez que se descobre a verdade so- bre a morte dos pais de Carlos e de Joa- ninha. A culpa recai sobre o frade, que os confundiu com ladrões e os assassi- nou. Enquanto Carlos procura vingança, outro mistério é desfeito: o verdadeiro pai de Carlos é o frade. Carlos opta por fugir, Joaninha ensandece e, em segui- da, morre. A história contada pelo nar- rador surgiu da conversa entre ele e Frei Dinis, tendo por ouvinte a velha D. Fran- cisca, que segue solitária e amargurada após a morte de sua neta. Carlos conti- nua sua vida sem crises ou remorsos e torna-se barão. guia de leitura.indd 8guia de leitura.indd 8 26/02/2013 10:27:4026/02/2013 10:27:40 9Fuvest/Unicamp Til José de Alencar Movimento literário: Romantismo, sé- culo XIX. Características estilo: grande domínio da língua, pro- cura, por meio da literatura, descobrir o Brasil no tempo (passado e presen- te) e espaço (urbano e regional). Nesse sentido, escreve romances históricos, indianistas, urbanos e regionalistas. Til pertence ao grupo de romances re- gionalistas. Excesso de comparações, linguagem excessivamente adjetivada, vocábulos preciosos. narrador: em 3ª pessoa, mas algumas vezes o autor interfere na narrativa, co- mentando aspectos em 1ª pessoa. cenário: século XIX, na fazenda Palmas, às margens do rio Piracicaba, entre Campinas e Santa Bárbara. Coincide com a expansão da cultura cafeeira na região. personagens: � Luís Galvão: dono da fazenda Pal- mas, é casado com D. Ermelinda e tem dois filhos gêmeos (Linda e Afonso). � Brás: jovem com problemas men-tais. Ao descobrir o sinal do til, fica en- cantado e dá esse nome à Berta, jovem a qual se afeiçoa. � Berta: heroína da narrativa e eixo do mistério. Moça sensível e meiga, exerce profunda influência sobre todas as per- sonagens. � Miguel: jovem por quem Berta nutre grande afeição. É filho de Nhá Tudinha, que criou Berta. � Jão Fera: aparente antagonista, nu- tre por Berta grande apreço, mas tem fama de fascínora. � Barroso: antagonista, homem vin- gativo, responsável pelas articulações criminosas. � outros: Besita, mãe de Berta; Zana, escrava enlouquecida. enredo: a fazenda Palmas é o cenário da trama e localiza-se às margens do rio Piracicaba. Seu proprietário, Luís Galvão, é casado com D. Ermelinda e tem dois filhos, o casal de gêmeos Linda e Afonso. Também mora na casa um jovem que tem problemas mentais, Brás, sobrinho do proprietário. Outras duas personagens jovens são necessá- rias para a formação de pares: Berta e Miguel. Como se trata de um romance romântico, são necessários os antago- nistas, representados por Jão Fera e Barroso, e a personagem ligada a um mistério, no caso, Zana, escrava ensan- decida. Dois eixos constituem o enredo: a formação do par amoroso – Linda e Miguel – e o eixo do mistério que envol- ve a personagem Berta, que é chamada de Til por Brás. Planejam-se emboscadas e incêndios contra a casa-grande, mas sempre existem pessoas que se inter- põem para socorrer Luís Galvão, quer seja Berta, que o salva da emboscada, quer seja Jão, que o socorre no incên- dio. Todos os incidentes têm por man- dante Barroso, que busca vingança à traição sofrida no passado, envolvendo guia de leitura.indd 9guia de leitura.indd 9 26/02/2013 10:27:4026/02/2013 10:27:40 10 Fuvest/Unicamp Besita, mãe de Berta. Os nós vão sendo desfeitos: Besita era casada com Ribei- ro, que, após ter assassinado a esposa, mudou o nome para Barroso. A beleza de Besita atraíra a atenção de dois ami- gos: Jão e Luís Galvão. Jão fora verda- deiramente apaixonado pela moça, já Luís procurara somente uma aventura. O marido de Besita tinha partido para Itu. Certa noite, Zana anunciou o retor- no de Ribeiro. Besita se entrega, então, a Luís Galvão, pensando que ele fosse seu marido. Dessa união nasceu Berta. Luís não assumiu a criança e Ribeiro, enciumado, matou Besita. Zana, que ti- nha presenciado o crime, enlouqueceu e a criança foi salva por Jão e criada por Nhá Tudinha, mãe de Miguel. Era desejo de Ribeiro acabar com a vida de Berta e assim lavar a sua honra. Volta para exe- cutar sua vingança, mas é assassinado por Jão, que se entrega à polícia. Após alguns outros intrincados momentos, Luís Galvão reconhece Berta como fi- lha, convida-a para morar na casa, mas a moça acha que seu lugar é ao lado dos que sofrem. Miguel e Linda partem para São Paulo. guia de leitura.indd 10guia de leitura.indd 10 26/02/2013 10:27:4026/02/2013 10:27:40 11Fuvest/Unicamp Movimento literário: embora escrito em pleno Romantismo, é um volume de difícil classificação: já foi considerado precursor do Realismo, remanescente do romance picaresco. Atualmente, é mais aceita a classificação como romance romântico, mas excêntrico. Características estilo: linguagem simples, clara, des- pojada, próxima da oralidade e do co- loquialismo, condizente com o estilo jornalístico da obra. narrador: em 3ª pessoa, o narrador é um observador bem-humorado dos costumes da época, mantendo cons- tantes diálogos com o leitor. cenário: subúrbios do Rio de Janeiro no início do século XIX, à época da vinda da família real (D. João VI – 1808). personagens: � Leonardo: malandro, traquinas, sim- pático e desordeiro. É o primeiro ma- landro da literatura brasileira. Filho ile- gítimo da saloia Maria da Hortaliça e de Leonardo Pataca. É ele quem dá unida- de à novela. � Leonardo Pataca: meirinho, envolve- -se em inúmeros e complicados casos até amancebar-se com Chiquinha, filha da comadre. � Luisinha: heroína antirromântica, ma- gra e excessivamente tímida, é a primeira paixão do herói. Casou-se com o esperta- lhão e caça-dotes José Manuel. Depois de viúva, uniu-se a Leonardo. � Vidinha: mulata desinibida, tipo po- pular, bonita e de boa voz. Após desco- brir a traição de Leonardo com a moça do caldo, fica com o toma-largura. � Major Vidigal: representa a ordem, a lei e a força policial do volume e, por isso, contrapõe-se a toda espécie de malandragem do herói. Autoritário e despótico, perde suas características no final, quando, por interferência de Maria Regalada, promove Leonardo a sargento. � Uma série de outros personagens é designada por suas funções, como o barbeiro, a parteira, o mestre de ceri- mônia, o mestre de rezas, entre outros, formando uma galeria de tipos em que sobressaem as ações em detrimento de aspectos psicológicos. Através deles obtém-se um panorama da sociedade suburbana da época. enredo: o narrador conta, em forma de novela, uma série de histórias que tem como elo as peripécias do herói Leonar- do, filho de beliscões e pisadelas. Cria- do pelo padrinho, que o queria clérigo, e pela madrinha, que o queria artesão, o menino saiu-se bem somente nas traquinagens. Na adolescência apai- xona-se por Luisinha, mas suas malan- dragens o carregam para os braços de Vidinha, enquanto Luisinha acaba se ca- sando com o interesseiro José Manuel. Leonardo é preso por vadiagem, caindo nas garras do major Vidigal; mas o rapaz sabe escapar das responsabilidades, foge e deixa o major furioso. Uma série de acontecimentos ocorre, focalizando Memórias de um sargento de milícias Manuel Antônio de Almeida guia de leitura.indd 11guia de leitura.indd 11 26/02/2013 10:27:4026/02/2013 10:27:40 12 Fuvest/Unicamp a vida das camadas mais populares do Rio de Janeiro. O livro tem seu término quando José Manuel morre, e Luisinha, viúva, casa-se com Leonardo. guia de leitura.indd 12guia de leitura.indd 12 26/02/2013 10:27:4026/02/2013 10:27:40 13Fuvest/Unicamp Memórias póstumas de Brás Cubas Machado de Assis Movimento literário: Realismo. Características estilo: linguagem clara, precisa, enxuta. Exploração do aspecto psicológico. Ca- pítulos curtos, digressões com finalidade argumentativa, reflexiva ou explicativa. Constantes interferências do narrador por meio de comentários/diálogos diri- gidos ao leitor. Ironia, pessimismo, hu- mor. narrador: 1ª pessoa, Brás Cubas. Narra- dor onisciente, já morto. Analítico, cético. cenário: Rio de Janeiro, século XIX, ca- madas mais privilegiadas. personagens: � Brás Cubas: personagem-narrador. Apresenta-se como morto que preten- de analisar sua vida e a sociedade que o cerca, e, por meio disso, registra a hi- pocrisia das instituições burguesas. Sua forma de ver o mundo permite a escrita de um romance de memórias em que sobressaem símbolos e metáforas com as quais coloca a volubilidade perante o mundo e a inefabilidade em relação a outros personagens. � Marcela: prostituta espanhola, co- nhecedora profunda da arte de seduzir. Primeira experiência amorosa do nar- rador, que durou “quinze meses e onze contos de réis”. � Virgília: filha do conselheiro Dutra, jovem sedutora que encantou Brás Cubas. Ambiciosa, trocou o narrador- -personagem por Lobo Neves, que lhe prometera um título de nobreza. Tor- nou-se amante de Brás Cubas. � Eugênia: filha ilegítima de D. Euzé- bia e Vilaça, por isso chamada de “flor da moita”. Coxa de nascença. Brás Cubas teve um breve namoro com ela tão logo retornou da Europa. � Quincas Borba: filósofo fundador de uma teoria filosófica chamada Humani- tismo, que pode ser resumida na máxi- ma “Ao vencedor as batatas”. Colega de escola do narrador, torna-se mendigoe rouba o relógio de Brás Cubas. Herda enorme fortuna e aproxima-se do antigo colega. Morre louco após queimar todos os seus manuscritos. � D. Plácida: viúva e antiga ama de Virgília. Acoberta as relações ilícitas de Brás Cubas com Virgília mediante pe- queno pecúnio. � Outros personagens: Sabina (irmã de Brás Cubas), casada com Cotrim. Ar- ranja um casamento para o irmão com Nhá Loló, que não chegou a ser consu- mado pois a jovem faleceu. O pai de Brás Cubas interfere no relacionamento com Marcela, manda o filho para Euro- pa e arranja seu relacionamento com Virgília, visando colocá-lo na política. enredo: romance datado de 1881, tor- na-se um divisor de águas na obra de Machado de Assis e na literatura brasi- leira. Antes dele, o Romantismo; depois, o Realismo. Escrito em primeira pessoa por um defunto autor, isto é, por um morto que se propõe a repassar sua vida escrevendo suas memórias. Para- guia de leitura.indd 13guia de leitura.indd 13 19/03/2014 10:17:1919/03/2014 10:17:19 14 Fuvest/Unicamp doxalmente, Brás Cubas morreu perse- guindo a imortalidade. Ao idealizar um emplasto que levaria seu nome, contrai uma pneumonia e falece com pouco mais de sessenta anos. Após revelar al- gumas características de sua morte e dos momentos finais da vida, o narra- dor-personagem dá um salto e volta à infância, revela suas origens familiares, relata o caso amoroso com a prostitu- ta espanhola Marcela, que o amou por “quinze meses e onze contos de réis”, narra sua paixão por Eugênia, a quem abandona por ser coxa e, finalmente, revela seus amores adúlteros por Virgí- lia, esposa de Lobo Neves. Brás Cubas é um hábil observador e revela as hi- pocrisias da sociedade em que vive, sempre tingindo a realidade com boa dose de humor e ironia. Destaca-se ain- da no livro o reencontro com o filósofo Quincas Borba, autor de uma saborosa doutrina filosófica – o Humanitismo – sintetizada na máxima “ao vencedor as batatas”. O estilo de Machado de Assis é único. Em linguagem concisa e preci- sa, procura dar vazão a seu dom de ob- servar com olhos críticos a sociedade mais abastada do Rio de Janeiro, bem como a alma humana e suas fraquezas. A segunda metade do século XIX é re- tratada por meio das relações humanas e sociais, tingidas com as marcas ma- chadianas por excelência: pessimismo, ironia e humor. Destacam-se capítulos que são verdadeiras joias do romance brasileiro, entre eles, “O velho diálogo de Adão e Eva”, “Das negativas”, “O delí- rio” e “O que escapou a Aristóteles”, sem esquecer a irônica e bem-humorada dedicatória feita ao verme que primeiro roeu suas frias carnes. guia de leitura.indd 14guia de leitura.indd 14 26/02/2013 10:27:4126/02/2013 10:27:41 15Fuvest/Unicamp O cortiço Aluísio Azevedo Movimento literário: Naturalismo. Características estilo: linguagem correta e culta, com frases bem-talhadas e precisas, mes- clada com o registro fiel da oralidade em diálogos que retratam os falares do povo. Outro traço marcante é o empre- go de sinestesias, bem como o largo uso de metáforas e imagens que associam os homens a animais (zoomorfismo). narrador: 3ª pessoa. Narrador oniscien- te e, por vezes, parcial. Ele força as tintas na denúncia da vida parasitária, viciosa e torpe das camadas abastadas; já as camadas populares – e sofredoras – são expostas com flagrantes de simpatia e vivacidade, mas sempre cumprindo a tese de que o meio determina o ho- mem. cenário: Rio de Janeiro, no século XIX. É a época do desenvolvimento da cida- de grande, que, ao crescer, recebe um imenso contingente de trabalhadores pobres e paupérrimos. O cenário, es- quematicamente, pode ser visto como ponto (espaço do cortiço, de João Ro- mão) e contraponto (espaço do sobrado, de Miranda). É do embate inevitável desses dois meios contíguos que irão despontar os dramas, as humilhações, a ganância, a inveja, as misérias e toda a degradação humana e moral das per- sonagens. personagens: � O cortiço: a rigor, não constitui um personagem, e sim um ente abstrato. No contexto da obra, todavia, o cortiço é delineado de uma forma orgânica e viva; ele é um grande organismo, cujas célu- las são os moradores que nele habitam. Com efeito, as mudanças psicológicas dos moradores se traduzem em mudan- ças físicas do cortiço, e vice-versa. � João Romão: é o elemento-chave da narrativa. O português é o exemplo aca- bado da ganância, avareza e mau-ca- ráter. Fisicamente, é baixo, desleixado, malvestido; humanamente, é o retrato perfeito da abjeção e chega a ser re- pulsivo. Sua ânsia por rivalizar e vencer Miranda leva-o a um comportamento doentio, no qual o roubo, a explora- ção e a falsificação são condutas nor- mais. Chega a comer restos de comida para economizar e, assim, enriquecer. Conforme ascende socialmente, vai se transformando: veste-se melhor, com- pra móveis e utensílios, escova os den- tes, etc. O compromisso de ascensão social surge com o casamento arranja- do com Zulmira, a filha do comendador Miranda. � Miranda: o grande êmulo de João Romão. Português de origem humilde, ex-caixeiro que enriqueceu ao se casar com Dona Estela; vive um matrimônio de aparências e de ódio. Suspeita de adultério da esposa. Guarda um título de nobreza e mora num sobrado luxuo- so. Leva a vida mundana da alta socie- dade e é, em tudo, invejado e copiado por João Romão. guia de leitura.indd 15guia de leitura.indd 15 26/02/2013 10:27:4126/02/2013 10:27:41 16 Fuvest/Unicamp � Bertoleza: escrava que vendia pei- xes na quitanda. Torna-se empregada e amante de João Romão, que mente para ela, alegando ter comprado sua alforria. No final da trama, com João Romão já rico, ele irá descartá-la, entregando-a para o antigo senhor. Revoltada e hu- milhada, Bertoleza se suicida com a faca que fatiava peixe. � Rita Baiana: mulata insinuante, sen- sual, desperta uma tara em Jerônimo, que a deseja como um animal no cio. Cheio de luxúria e cobiça, Jerônimo manda matar, a pauladas, o namorado de Rita, Firmo. � Firmo: mais que namorado de Rita Baiana, Firmo simboliza o cortiço rival e vizinho, o “Cabeça de Gato”, que vai se deteriorando progressivamente, na mesma medida em que o cortiço de João Romão ganha força e cresce. � Jerônimo: português, adotado como símbolo de uma tese determinista – a da influência do meio. De homem ínte- gro e laborioso, Jerônimo vai se “abra- sileirando”, e se faz malandro, lascivo e rude. Foge com Rita Baiana, deixando a mulher à míngua, que também se dete- riora e perde-se na promiscuidade. � Pombinha: a menina mantém uma relação homossexual com a prostituta Léoni. A primeira menstruação é a linha divisória da vida de Pombinha, vista daí em diante como mulher. Pombinha pas- sa de símbolo da inocência e meiguice para desregrada e decaída. � Albino: tipifica o elemento homos- sexual, que vive entre as mulheres. � Bruxa: figura importante, pois ateará fogo ao cortiço, permitindo sua reforma e posterior melhoria de clientela. enredo: o enredo é bastante simples. João Romão, pequeno comerciante, desvia o dinheiro da negra Bertoleza, destinado à sua carta de alforria, e, com ele e algumas poucas economias, cons- trói um armazém e algumas casas po- pulares (barracos) para aluguel. Numa dinâmica capitalista, reinveste o lucro dos aluguéis no próprio negócio e, às custas de economia sobre economia, sacrifício pessoal e descarado roubo, vai erguendo um pequeno império, que compreende os barracos, uma pedreira e a sua venda. À margem do enriqueci- mento de João Romão, desenrolam-se os dramas pessoais dos moradores do cortiço, que se veem continuamente endividados e presos à usura do co- merciante. Com o tempo, João Romão atinge o statuspretendido, ingressando na vida fútil da fina sociedade. O cortiço, paralelamente, se desfaz (pelo incên- dio) e se refaz como fênix, tornando-se agora moradia de gente mediana, de melhor situação social e econômica. guia de leitura.indd 16guia de leitura.indd 16 26/02/2013 10:27:4126/02/2013 10:27:41 17Fuvest/Unicamp A cidade e as serras Eça de Queirós Movimento literário: Realismo (Por- tugal). Características estilo: linguagem correta, perfeita, com extremo domínio do léxico. O estilo flui sem interrupções, preciso, contínuo e maleável. O volume é vazado dosando a ironia, a irreverência e a sensatez. narrador: narrado em 1ª pessoa por José Fernandes, personagem de segun- do plano; bom observador, ouve com atenção as opiniões e acata a suprema- cia do protagonista Jacinto. cenário: os círculos mais abastados de Paris e as serras de Tormes, em Portugal, no final do século XIX. personagens: � Jacinto: personagem central da obra. Por seu berço abastado, por sua boa sorte e boa saúde era conhecido como “Príncipe da Grã-Ventura”. Acredi- tando que o homem só é “superiormen- te feliz quando é superiormente civiliza- do”, reúne, em sua residência de Paris, aquilo que a tecnologia, os avanços da ciência, a cultura e a riqueza podem dar. Suas investidas e sua enorme cultura o fazem passar da mais completa euforia (deslumbramento) ao maior pessimis- mo (cansaço da civilização). Reconci- lia-se com a vida ao desembarcar em Tormes e defrontar-se com a beleza da natureza. Uma pequena nuvem embaça a vivência de Jacinto em Tormes, quan- do descobre a pobreza dos camponeses de suas terras, esforçando-se para lhes oferecer melhores condições de vida. Casa-se com Joaninha, que lhe dá dois saudáveis filhos, fazendo-o esquecer-se definitivamente de Paris. � José Fernandes: é amigo do prota- gonista. De origem fidalga, foi expulso de Coimbra, sendo mandado pelo tio a Paris para estudos. Acamaradou-se com Jacinto, tornando-se atento observador das transformações por que passa a per- sonagem. Na volta de alguns anos em Portugal, após a morte do tio e protetor, envolve-se em uma aventura amorosa com Madame Colombe, que lhe furta joias e ouro. Constata a descrença e o pessimismo de Jacinto e o acompanha a Tormes, em Portugal. Após a conver- são do amigo, José Fernandes retorna a Paris e, já não vendo encanto na cidade, resolve regressar definitivamente à sua terra. � Outras personagens: na linhagem familiar do protagonista, tem-se o avô Jacinto Galeão, miguelista extremado, que se refugiou em Paris quando da der- rota de D. Miguel; e há o pai Cintinho, homem de pouca saúde que não co- nheceu o filho. O círculo de Jacinto em Paris é composto peIos elementos da aIta roda, personagens caricaturescas sempre apontadas por suas veleidades, como as da mundana Madame d’Oriol, as do grã-duque Casimiro e as do ban- queiro judeu Efraim, representantes da burguesia que fazem do progresso uma fonte de lucro a gerar a desigualdade guia de leitura.indd 17guia de leitura.indd 17 26/02/2013 10:27:4126/02/2013 10:27:41 18 Fuvest/Unicamp social. Dotado de inegável capacidade filosofante, está o criado GriIo. Do lado oposto, estão os representantes da ser- ra, a nobreza rural e os trabalhadores braçais miseráveis que são focalizados para acirrar os contrastes. enredo: na primeira parte, o narrador faz um retrato de Paris, centro do pro- gresso e da civilização que se, a um tem- po, constrói a grandeza, a outro, destrói a individualidade humana e marginaliza os menos privilegiados. Jacinto resolve partir para as serras, tendo como pre- texto a reconstrução de sua proprieda- de. Embarca os trastes do progresso, mas perde sua bagagem, chegando a Tormes só com a roupa do corpo. Eu- fórico com a vida no campo, gradativa- mente assimila os valores da natureza, embora, em contato com a miséria, pro- cure reformar e remodelar a estrutura rural arcaica de Portugal. guia de leitura.indd 18guia de leitura.indd 18 26/02/2013 10:27:4126/02/2013 10:27:41 19Fuvest/Unicamp Vidas secas Graciliano Ramos Movimento literário: Modernismo (2ª ge- ração/1930-1945). Características estilo: seco e econômico. O autor usa poucas palavras, e palavras exatas. A ad- jetivação farta, os ornamentos linguísti- cos, a expressão rara, etc. cedem lugar a uma redação concisa. As frases são curtas, diretas e nos remetem apenas ao essencial, ao “concreto” descrito nas cenas. Por meio de seu estilo e vocabu- lário, Graciliano Ramos ambienta seu li- vro no mundo desolador das secas, que, em muitas passagens, remete o leitor às características do Naturalismo. estrutura: Vidas secas é o último ro- mance de Graciliano Ramos e a única experiência do autor com foco narrativo em terceira pessoa. A obra é construída em forma de espiral, cujo início fechado (“Mudança”, cap. I) abre-se no final, com o último capítulo (“Fuga”) conduzindo as personagens para um destino inusi- tado, mas que mantém o elo da desdita, da miséria, da fome e da pobreza. Entre os dois capítulos-limite são constituídos 11 quadros, que, aparentemente, nada têm em comum a não ser os persona- gens e a paisagem. Um tênue fio narra- tivo faz o leitor conhecer a história de uma família de retirantes nordestinos que foge da seca, encontra período de passageira estabilidade e parte nova- mente em retirada, quando as chuvas deixam de cair, prenunciando novo pe- ríodo de seca. A economia (de estilo, de linguagem, de vida e de cenário) pode ser destacada como característica bási- ca do volume. personagens: � Fabiano: homem rude, de pouco fa- lar. Assusta-se com o desconhecido, é desconfiado e manipulado pelos pode- rosos. Identifica-se com os bichos, o que denuncia a condição subumana a que está confinado. Seu modo de ser e de viver muitas vezes aproxima-o do modo de ser e viver de um animal, no proces- so conhecido como zoomorfização. � Sinha Vitória: versão feminina de Fabiano. Seu sonho é ter uma cama de couro, igual à de seu Tomás da bolan- deira. � Os meninos: referidos como “o meni- no mais novo” e “o menino mais velho”, não recebem nomes. O texto deixa en- tender que os garotos perpetuarão o mesmo tipo de vida dos pais, compon- do um círculo vicioso. � Baleia: a cadela é a personagem que mais se assemelha a um “ser humano”. É solidária, atenciosa e amiga. Baleia é o elemento que confere humanidade ao grupo, sendo exemplo de antropomor- fização. � Soldado amarelo: símbolo do poder autoritário, que subjuga Fabiano e to- dos aqueles que como ele vivem. guia de leitura.indd 19guia de leitura.indd 19 26/02/2013 10:27:4126/02/2013 10:27:41 20 Fuvest/Unicamp Capitães da Areia Jorge Amado Movimento literário: Modernismo (2ª ge- ração/1930 - 1945). Características estilo: é um dos pontos altos do romance, que, com pitadas de documentário, os- cila entre o jornalístico e o poético. Os Capitães da Areia, em seus diálogos, se valem do registro oral, da fala objetiva e inculta que os caracteriza. Já a narrativa do romance, como um todo, é ágil, pre- cisa, vazada em linguagem culta, mas simples, conduzindo o leitor com segu- rança e mestria. narrador: 3ª pessoa. Embora imparcial, é um narrador onisciente, que vasculha as personagens e as situações que as afligem. Isso confere ao romance o teor engajado da denúncia social. cenário: cidade de Salvador. O ponto de encontro é um trapiche à beira da praia. personagens: � Pedro Bala: chefe do bando, tem quinze anos, cabelos loiros e uma cica- triz na face (provocada por um golpe de navalha dado pelo caboclo Raimundo). É o líder natural, eleito por suas virtudes de mediador, orientador e “homem for- te”, que dá segurança e traz coesão aogrupo. Vive um romance com Dora. No futuro, irá tornar-se um agitador político, revolucionário, “militante proletário, o camarada Pedro Bala”. � Professor: João José, autodidata, lia para os menores e tinha pendor para as artes. Irá se tornar, depois, um grande pintor, retratista dos oprimidos. Apaixo- na-se platonicamente por Dora. � Dora: órfã cujos pais morreram de bexiga (varíola), cuida de Fuinha, seu ir- mão menor. Entre menina e mulher, na visão dos moleques, acaba por assumir o papel de mãe coletiva dos trapichei- ros. Adoece, morre e “vira uma estrela” no céu. � João Grande: moleque de 13 anos, possui bom coração e senso de justiça. É muito forte e é temido por isso, embo- ra seja pouco sagaz. Acaba ingressando na Marinha Mercante. � Pirulito: o místico do bando. Guar- dava imagens sagradas, alimentando a sua já natural vocação religiosa. Antes violento, e até sádico, fora convertido pelo padre José Pedro. Posteriormente, virará frade capuchinho. � Sem-Pernas: espião do grupo e coxo. Valia-se de seu defeito para chantagear as pessoas e tirar proveito próprio. Ran- coroso e revoltado. � Querido-de-Deus: “pescador valente e capoeirista sem igual”, admirado por todos por sua arte de luta. � Boa-Vida: feio, mas malandro, com seu violão canta e encanta as pessoas. � Volta Seca: admira Lampião e os can- gaceiros. Nutre ódio pelos ricos, pelos fazendeiros e pelos soldados. Preso e torturado, ingressa no bando de Lam- pião para se vingar. � Gato: o malandro do bando, vivia às custas de uma prostituta, Dalva. Perso- guia de leitura.indd 20guia de leitura.indd 20 26/02/2013 10:27:4226/02/2013 10:27:42 21Fuvest/Unicamp nagem-símbolo da vigarice. � Don’Aninha: mãe de santo, é quem por vezes acode e acolhe os capitães. � Padre José Pedro: contrariando as disposições do clero, visita os garotos em seu esconderijo; é abnegado, cor- reto e tipifica o “cristão primitivo” – per- seguido e incompreendido justamente por suas virtudes de altruísmo e solida- riedade. � Barandão e Almiro: casal que tipifica a homossexualidade. � João de Adão: estivador. Conta a Pe- dro Bala a história do pai do menino, que também fora estivador e morrera durante uma greve, em confronto com o Exército. enredo: não há uma história, no senti- do formal da palavra: o enredo é uma sucessão de quadros envolvendo a vida marginal de meninos de rua. Pedro Bala (elemento humano) e o trapiche (ele- mento físico) são os núcleos, em torno dos quais orbitam as personagens em suas peripécias e desventuras. Os capí- tulos se entretecem mais pelo contexto geral da obra do que por um único fio da meada. No entanto, o amor, carregado de carência e poesia, entre Pedro Bala e Dora (e, na sequência, a morte desta) e a formação progressiva do futuro agita- dor social e político que será Pedro Bala (sem dúvida, uma visão de Jorge Amado simpatizante ao marxismo) são os pon- tos altos da trama. guia de leitura.indd 21guia de leitura.indd 21 26/02/2013 10:27:4226/02/2013 10:27:42 22 Fuvest/Unicamp Sentimento do mundo Carlos Drummond de Andrade Movimento literário: Modernismo (2ª ge- ração/1930 -1945). Características Sentimento do mundo reúne 28 poe- mas escritos entre 1935 e 1940, ano da publicação do volume. Com pleno domínio da linguagem poética, ama- durecido após a publicação de Alguma poesia e Brejo das almas, Drummond se apresenta cético em relação à situa- ção do homem e do mundo. A seleção de poemas segue os seguintes eixos temáticos: sob o prisma do “eu todo retorcido”, encontram-se poemas que refletem a visão do sujeito que já se li- berta do individualismo que marcou sua poesia inicial e parte para reflexões mais profundas, posicionando-se com maturidade e sendo consciente de sua importância como poeta. Outro eixo gira em torno das lembranças do ho- mem de Itabira, aquele que é “triste, orgulhoso: de ferro” em “Confidência do itabirano”. Drummond traz para sua poesia seu sentimento particular e a meditação amargurada que reflete sua vida no interior de Minas Gerais: de seus versos nasce uma profunda melancolia que transfere da terra natal para a família, tal como aparece em “Os mortos de sobrecasaca” e “Álbum de fa- mília”. Também existem os poemas em que o poeta compromete sua poesia, vazando versos metalinguísticos e, de forma engajada, coloca-se a serviço de causas sociais. Surgem dessa tendência os poemas que registram profundas marcas do tempo em que ele vive. É por essa consciência que o poeta tem, de que novos tempos estão surgindo, tempos de temores e de tensões – tem- pos difíceis que antecedem a Segunda Guerra Mundial e, no Brasil, a Era Vargas e suas opressões – que o leitor encon- tra as produções mais significativas do autor, como “Sentimento do mundo”, “Mãos dadas” e “Os ombros suportam o mundo”. Sabendo-se comprometido com o fazer poético e com a sua reali- dade, o poeta ousa dizer que não será o poeta de um mundo caduco, fazendo de sua poesia uma arma de combate à alienação e de sua palavra um grito de reflexão sobre o que pode e deve ser pensado e repensado no mundo mo- derno: “Não serei o poeta de um mundo caduco”, diz ele, pois “o tempo é a minha matéria, o tempo presente, os homens presentes, a vida presente”. guia de leitura.indd 22guia de leitura.indd 22 26/02/2013 10:27:4226/02/2013 10:27:42 23Fuvest/Unicamp Quadro e algumas características dos poemas de Sentimento do mundo. 1) “Sentimento do mundo” Psicologia do fazer poético, reflexão sobre as impossibili- dades do eu e do mundo, pessimismo e negativismo. 2) “Confidência do itabirano” Heranças pessoais, amargura, melancolia e sensação de impotência diante do destino. Autobiografia. 3) “Poema da necessidade” Verificação das necessidades tanto individuais como coleti- vas. Visão apocalíptica. 4) “Canção da moça fantasma de Belo Horizonte” Lirismo fabuloso, trabalho com o imaginário popular, mar- ginalidade e purificação. 5) “Tristeza do império” Desejos e necessidades. Ironiza os anseios burgueses. 6) “Operário no mar” Crônica poética, reflexões sobre classes e antagonismos sociais, mistério poético da realidade. 7) “Menino chorando na noite” Lirismo utópico. Incorporação do sofrimento alheio, dor universal em busca da fraternidade e da solidariedade. 8) “Morro da Babilônia” Alusão ao samba, à música, ao poder e à “Babilônia” em que se transformou o morro. 9) “Congresso internacional do medo” Medo como motor das possibilidades de poesia, medo que paralisa e esteriliza tanto o indivíduo quanto a sociedade. 10) “Os mortos de sobrecasaca” Autobiográfico. Sondagem do passado a partir da contempla- ção de fotos: da ironia zombeteira à explosão do sentimento. 11) “Brinde ao juízo final” Poesia antiacadêmica. Reflexão sobre a participação do poeta no mundo. 12) “Privilégio do mar” Alegoria que trata do problema social e das diferenças hu- manas. 13) “Inocentes do Leblon” Poesia de caráter social que critica certas esferas da bur- guesia. Sobre a alienação. 14) “Canção do berço” Desde o berço o destino está traçado: o amor, a carne, a vida e os beijos não têm a importância que a sociedade de consumo lhes dá. 15) “Indecisão do Meier” Poesia do cotidiano. Ressalta possibilidades de escolha. 16) “Bolero de Ravel” Poesia lúdica: dialoga com a melodia de Ravel e expressa impossibilidades. 17) “La possession du monde” Poesia lúdica, explorando contraste entre o acessório e o essencial. Ironia. 18) “Ode no cinquentenário do poe- ta brasileiro” Ode a Manuel Bandeira, poesia que enaltece os 50 anos do poeta. 19) “Os ombros suportam o mundo” Poesia de grande significação existencial, passagem do tempo e a vida sem mistificações. 20) “Mãos dadas” Sentimentodo mundo: metalinguagem, explorando ne- cessidade de valorizar o presente como matéria poética. 21) “Dentaduras duplas” Sátira bem-humorada revelando a passagem do tempo e as reflexões sobre a velhice. 22) “Revelação do subúrbio” Minas, o subúrbio como forma de revelar a pequenez de algumas cidades. guia de leitura.indd 23guia de leitura.indd 23 26/02/2013 10:27:4226/02/2013 10:27:42 24 Fuvest/Unicamp 23) “A noite dissolve os homens” Contraste entre a noite que dissolve os homens e a aurora que simboliza a revitalização (perspectiva da luz). 24) “Madrigal lúgubre” Confronto entre o suave e o real, o campestre (madrigal) e o lúgubre (tempo de guerra). 25) “Lembrança do mundo antigo” Revisitando o tempo e a vida passada em confronto com o mundo presente. 26) “Elegia 1938” Desconstrução da utopia. Angústia e pessimismo diante da indiferença. 27) “Mundo grande” Intertextualidade: Drummond e Tomás António Gonzaga, dualidade, esperança no futuro. 28) “Noturno à janela do aparta- mento” Contemplação da noite e do farol da Ilha Rasa. Fluxo da vida. guia de leitura.indd 24guia de leitura.indd 24 26/02/2013 10:27:4226/02/2013 10:27:42
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