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Anais do IX Seminário Nacional de História da Matemática Sociedade Brasileira de História da Matemática Apontamentos Históricos sobre Matemática Védica Historical Notes about Vedic Mathemathics Freud Romão 1 Resumo Este artigo é parte integrante de uma pesquisa em andamento, cuja finalidade é investigar as possibilidades didáticas da Matemática Védica para o ensino-aprendizagem das quatro operações ─principalmente multiplicação e divisão─ no Ensino Fundamental. Neste trabalho são apresentados apontamentos históricos sobre a Matemática Védica, com vista a esclarecer e explicar o que é Matemática Védica, onde, quando e por qual povo foi desenvolvida e utilizada, tudo isto, dentro de uma perspectiva histórica atual. Neste sentido, discorre sucintamente acerca da abordagem de alguns livros de história da Matemática utilizados nos cursos de Licenciatura, no tocante ao tema em questão. Para alcançar os objetivos, lançou-se mão de uma pesquisa bibliográfica de caráter exploratório, valendo-se de diversos autores, além de artigos em periódicos e sites especializados, que dão conta da História da Matemática na Índia Antiga. Este trabalho reúne elementos que apontam a Matemática Védica como anterior a qualquer outro sistema de Matemática organizado no mundo. Para fundamentar tal afirmação, utiliza-se dos argumentos: (a) de que não houve a invasão Ariana, (b) tão pouco a civilização védica iniciou-se no Vale do rio Ganges, conforme citado por alguns historiadores da Matemática, e (c) que a historiografia utilizada para descrever esta parte da história da Matemática, encontra-se ainda em acordo com a historiografia do final do século XIX e das primeiras décadas do Século XX. Tal historiografia se apresentava impregnada do ranço colonialista eurocêntrico, que muitas vezes induzia ao erro, por adotar na metodologia de trabalho a cronologia bíblica, para datar as civilizações do Oriente, juntamente com a ausência de uma metodologia de pesquisa que considerasse as informações dos próprios textos sagrados, além da carência tecnológica da época, que nas últimas décadas possibilitou à Arqueologia realizar grandes progressos, e se firmar como Ciência. Para facilitar o entendimento o texto fornece uma rápida descrição de como era formada e de como estava organizada a antiga cultura do vale do rio Indo-Sarasvati. Ao longo do texto também se apresenta uma descrição sucinta e oportuna das principais obras da literatura védica, pontuando o saber matemático contido nos Shulba-Sūtras (códigos da corda). Palavras-chave: Matemática Védica. Matemática na Índia Antiga. Civilização do vale do rios Indo-Sarasvati. Abstract This article is part of an ongoing research whose purpose is to investigate the didactically possibilities of the Vedic mathematics for teaching and learning of the four operations ─especially multiplication and division─ in elementary school. In this paper I propose historical notes about the Vedic mathematics, in order to clarify and explain what is Vedic mathematics, where, when and by which people were developed and used, all within a historical perspective today. In this sense, I wonder briefly about the approach of some books of history of mathematics used in undergraduate courses, as regards the issue at hand. For my goals I laid the hand of an exploratory literature and a bibliographical research; many authors in addition, articles in periodicals and specialized sites that tell the history of mathematics in ancient India. This work brings together elements that link the Vedic mathematics as earlier than any other organized system of mathematics in the world, to support this assertion, we use the arguments: (a) that there was no Aryan invasion, (b) so little to Vedic civilization began in the Ganges Valley as cited by several historians, and (c) that the historiography used to describe that part of the history of mathematics, are also in agreement with the historiography of the late nineteenth and early decades of the twentieth century, which had to be imbued with the colonialist Eurocentric, 1 UFRN. E-mail: frnaval@ig.com.br Anais do IX Seminário Nacional de História da Matemática 2 often misleading and, by adopting the methodology of work to Biblical chronology, dating to the civilizations of the East, together with the absence of a research methodology to consider the information from the sacred texts besides the lack of technology in recent decades that allowed the Archaeological make great progress, and establish himself as Science. To facilitate the understanding of the text provides a brief description of how it was formed and was organized as the ancient culture of the valley of the Indus-Sarasvati. Throughout the text also presents a succinct and timely description of the major works of Vedic literature, pointing out the mathematical knowledge contained in Shulba-sutras (codes of the string). Keywords: Vedic Mathematics, Mathematics in Ancient India, Civilization of the Indus-Sarasvati valley. Introdução A antiga cultura do vale do rio Indo-Sarasvati, estendia-se por uma área de aproximadamente 250000 milhas quadradas (aprox. 400000 km²) e ocupava parte dos territórios da Índia e do Paquistão, no chamado subcontinente Indiano e suas principais cidades eram: Harappa, Mohenjo-daro e a cidade portuária de Lothal. (Fig.1). Historiadores do século passado a chamavam de civilização Ariana, contudo após os trágicos acontecimentos da 2ª Guerra Mundial este termo caiu em desuso. Atualmente alguns autores usam o termo “cultura Harapiana”, como se encontra em Katz:”A civilization called Harappan arose in India on the banks of the Indus River in the third millennium b.c.e.”(KATZ, 1998, p. 4), isto ocorre devido a divulgação das escavações arqueológicas ocorridas no Vale do Indu e que levou à descoberta de Mohenjo-Daro e mais tarde Harappa, como é relatado pelo trabalho de Ashfaque e Shaikh publicado pela Unesco em 1981, que diz o seguinte: “The remarkable discovery of Moenjodaro in 1922 was at first nothing more than the result of routine explorations by the Archaeological Survey of British Índia” (ASHFAQUE and SHAIKH, 1981,p.9). O resultado das escavações chefiadas pelo arqueólogo, Sir John Marshall, são reportadas em uma obra de 03 volumes publicada em 1931, intitulada “Mohenjo-Daro and the Indus civilization”, com o progresso das descobertas em 1936 E.J.H. Mackay, publica em 02 volumes “Further excavatios at Mohenjo-Daro”. Tais trabalhos ao mostrarem que as ruínas Figura 1 Região do vale dos rios Indo-sarasvati. Anais do IX Seminário Nacional de História da Matemática 3 descobertas revelaram uma civilização desenvolvida datada de aproximadamente 3500 a.C, causaram grande impacto no mundo da Arqueologia ─e consequentemente da Historiografia─, iniciando uma quebra de paradigma acerca da História das civilizações orientais, principalmente do subcontinente Indiano. Neste trabalho a metodologia investigativa utilizada apoiou-se em uma perspectiva histórico-interpretativa, onde assume que: (a) Não houve a invasão Ariana, conforme afirma a historiografia tradicional adotada pelos principais livros de História da Matemática utilizados nos cursos de Licenciatura em Matemática. (b) Existiu o rio Sarasvati, e este secou por volta de 1500 a.C. conforme pesquisas atuais, onde se destaca aqui o trabalho de S. Kalyanaraman, na qual afirma: ”The Sarasvati was a mighty and perennial river circa 3000 B.C. when the so- called Harappan civilization flourished, flowing from the Har-ki-dun glacier of the Himalayas in W. Garhwal into the Gulf of Khambat near Lothal.”(KALYANAMARAN,1997, p. 5) cuja seca, foi responsável pelo declínio da civilização. O rio Sarasvati nascia do degelo do Himalaia e percorria o atual território paquistanês, indo desaguar na antiga cidade portuária de Lothal, no Oeste da Índia onde atualmente é o estado de Gujarat, mais precisamente a cidade de Ahmedabad. A afirmação encontrada na obra de Katz intitulada “A History of Mathematics” avança no sentido que já informa a existência de uma civilização no vale do rio Indo há aproximadamente 3000 a.C, contudo ainda se verifica o vínculo com a historiografia tradicional, que não teve acesso ao espólio arqueológico dos sítios como Harappa, Mohenjo- Daro, Lothal e outros, isso fica claro quando Katz faz a seguinte referência: [...] but there is no evidence of its mathematics the earliest Indian civilization for which there is such evidence was formed along the Ganges river by Aryan tribes migrating from the Asian steppes late in the second millennium B.C.E. (KATZ,1998,p.4). Os estudos recentes encontraram evidências que Mohenjo-Daro constituía-se em um centro comercial desenvolvido da época, (Cf. KNOYER, 2010). Ora, uma cidade com comércio e arquitetura desenvolvidos, conforme revelam as escavações, reportadas por Jonh Marshall e E.J.H.Mackay, haveria com certeza de possuir um sistema matemático que atendesse as necessidades cotidianas de seus habitantes. Para sustentar a tese de que havia sim um conhecimento matemático desenvolvido no período do auge da civilização do Indo-Sarasvati, será abordada a importância que a Matemática exercia naquela sociedade. Informo que o objetivo deste trabalho, não é estabelecer uma nova ordem cronológica, para a História, ou tão pouco apresentar a Matemática Védica como algo mágico. A esse Anais do IX Seminário Nacional de História da Matemática 4 respeito, informa-se, que o interesse maior é retomar os resultados de pesquisas, nos quais são demonstrados que no vale dos rios Indo-Sarasvati existiu uma civilização com um grau de desenvolvimento matemático-tecnológico avançado, cujo saber matemático era compatível com esse desenvolvimento, apontado como anterior ao mundo Ocidental. Tais resultados fazem ver que afirmações contidas em alguns livros de História da Matemática─ainda usados nas universidades, em cursos de Licenciatura─ não fazem mais sentido, como por exemplo, em um trecho de Boyer (1974), quando menciona a região do Indo-Sarasvati como “(...) o país [que] foi ocupado por invasores arianos que introduziram o sistema de castas e desenvolveram a literatura sânscrita” (BOYER, 1974, p. 150). Há, ainda, outra informação segundo a qual foi nas margens do rio Ganges que se originou a civilização védica (Cf. SMITH, 1998, p. 4). Em ambos os casos as afirmações são contestadas pelos resultados oriundos de estudos e pesquisas recentes. A distorção na datação dos textos védicos, segundo José Carlos Calazans é originada em um erro metodológico do século XIX, e foi, portanto a geratriz da teoria da invasão ariana. Contudo, a pesquisa em curso verificou que esta historiografia é tida como padrão ainda hoje, isto fica claramente demonstrado no livro “Mathematics in Índia” de Kim Plofker: This, the standard account of the origin and growth of Vedic India, is sometimes referred to as the Aryan invasion theory (AIT). However, most modern Indologists prefer other terms such as “immigration” or “influx” to “invasion”, which connotes earlier assumptions, now discarded large-scale military conquest in the Punjab. (PLOFKER, 2009, p.6). O trabalho de Plofker inicialmente publicado em 1963, sob o selo da “Princeton Univertsity Press”, constituí-se, sem dúvida em um trabalho de referencia que reuniu e condensou grande parte da Matemática Védica, contida na Kalpa-sūtra, já dentro de uma nova perspectiva, contemplando as descobertas arqueológicas de então. É importante lembrar que o matemático David Munfold (vencedor da Medalha Field), escreveu um ensaio de seis páginas sobre o livro, onde diz não haver evidências de que a Matemática Grega tenha logo cedo chegado à Índia, como afirmam alguns historiadores tradicionais. Esta afirmação vai na direção das pesquisas que apontam a civilização do Indo-sarasvati como um local onde cedo se desenvolveu uma Matemática própria. Contudo, mesmo diante da grandeza do trabalho de Plofker, fica claro o vínculo com a historiografia tradicional dos historiadores, indologistas e filologistas do Indo-europeu que segundo Calazans: Anais do IX Seminário Nacional de História da Matemática 5 Adotaram três postulados falaciosos (evidência linguística, teoria ariana invasionista e cronologia bíblica), a partir dos quais determinam com imprecisão positivista alguns estudos indológicos e a cronologia da história da Índia pré-clássica. (CALAZANS, 2006 p.227). Apesar das inúmeras pesquisas e publicações que corrigem a cronologia adotada para datar as civilizações do Oriente, sabe-se que um paradigma não se muda da noite para o dia, porém no caso particular da civilização védica, os textos sagrados fornecem narrativas que permitem identificar com clareza o período astronômico correspondente a sua compilação ─quando o sábio Srila Vyasadeva compilou os vedas, o equinócio vernal do Hemisfério Norte se encontrava na constelação de Orion, hoje com o cálculo regresso e programas de computador pesquisadores do Birla Science Museum de Delhi encontraram a data de 3102 a.C, além disso os hinos do Rig-Veda já eram cantados por gerações antes de sua compilação─ e o fato dos historiadores e indologistas tradicionais do Indo-europeu (ou indo- ariano) terem excluído de suas análises, este ponto fundamental é que Calazans chama a atenção: O resultado desta errada atitude metodológica no trabalho de investigação científica em História, levou àqueles investigadores a excluírem alguns dos elementos mais importantes de todo o processo evolutivo do pensamento pré-clássico indiano. A Astronomia e a necessidade de cálculo matemático foram justamente dois desses elementos, utilizados para resolver os problemas básicos da sobrevivência das populações ligados à construção do espaço urbano, religioso e astronômico. (CALAZANS, 2006, p227) O autor ainda chama a atenção que, ao não utilizarem a Matemática e a Astronomia como instrumentos de auxílio à investigação histórica, eles reduziram a pesquisa a uma leitura deficiente dos textos védicos. Este erro o autor mostra ter sido corrigido: A ultima grande contribuição científica para correção deste erro metodológico no trabalho cientifico em História, foi sem dúvida a investigação realizada pelo grande historiador da ciência A. Seindenberg (1962, 1978). Não é a primeira vez, nem será a última, que as ciências como a Matemática, a Física e a Astronomia concorrem para a correção de desvios na metodologia de trabalho em outras ciências auxiliares. (CALAZANS, 2006, p.230-229). Cultura védica: literatura, religião e matemática. A palavra Veda significa em Sânscrito conhecimento, mas adquiriu o sentido de designar o grande corpo de textos originários da Índia Antiga, além de denominar a Anais do IX Seminário Nacional de História da Matemática 6 civilização que se desenvolveu no vale dos rios Indo-Sarasvati. Os textos antigos que, portanto, são denominados de védicos, por muito tempo; acreditou-se que eles tratavam apenas de literatura ou religião, talvez pelo fato destes se constituírem em hinos e apresentarem os temas em forma de verso e usando metáforas. Neste contexto, porém, há que se apresentar a importância que a Matemática exercia na vida daquele grupo cultural, uma vez que para a construção dos altares destinados às cerimônias religiosas; medidasprecisas eram requeridas. E o mais curioso que conforme mudava o tipo de cerimônia ou o semi-deus, a quem ela se destinava, outros altares com medidas próprias eram requeridos. Uma característica destes rituais era a combinação de deuses em um único deus. Como um deus era representado por um quadrado, a combinação de deuses conduzia ao problema de encontrar um quadrado equivalente em área à soma dos dois ou mais quadrados dados. A preocupação com a medição do tempo foi outro fator que conduziu ao desenvolvimento da Matemática e também da Astronomia, pois permitiam a determinação precisa dos períodos dos rituais, e, portanto a Matemática estava diretamente presente no cotidiano daquele povo. Neste sentido Calazans afirma : “[...] É precisamente o que representa o centro das atenções de todo ritual védico: a preocupação de medir o tempo de tal forma precisa, que não haja nenhuma falha nos rituais ao longo do ano.” (CALAZANS, 2006, p.228). Portanto, a evolução da Matemática na Cultura Védica tem início a partir da necessidade de cerimônias religiosas, onde eram exigidos altares de medidas precisas, e onde a medição do tempo era primordial para que determinado ritual surtisse o efeito desejado, Calazans explica: A medição do tempo religioso foi coincidente com a do tempo astronômico sideral. Sem ela, todo ritual e toda a cosmogonia não teriam nenhum sentido; sem ela, não teria sentido manter a tradição (oral) e registrar no período fonético (utilizando um novo alfabeto, o devanâgari), um ritmo de tempo determinado por configurações únicas e irrepetíveis. (CALAZANS, 2006, p.228). Por isso, fica claro que durante o período da civilização do vale do Indo-Sarasvati, havia sim uma Matemática desenvolvida. É fundamental lembrar que o registro dos saberes desta cultura (inclusive matemáticos) era feito de forma oral. Um mecanismo utilizado para preservar tais registros, era colocá-los em verso que eram cantados. Um trabalho de História da Matemática, publicado originalmente em 1919, cujo autor é o Prof. Florian Cajori, já trazia esta informação: Os Indianos tinham por hábito colocar em verso todos os resultados matemáticos que obtinham, e vesti-los com roupas com significados obscuros e místicos, que embora fossem Anais do IX Seminário Nacional de História da Matemática 7 bem adaptados para ajudar a memória daquele que já tinha entendido o assunto eram muitas vezes ininteligíveis para o iniciante. (CAJORI, 2007, p.133). Várias releituras vêm sendo realizadas, sobre os relatos das escavações de Mohenjo- daro ─desde a descoberta em 1922 e as primeiras publicações na década de 30─ também a descoberta de outros sítios arqueológicos tem contribuído de forma decisiva para lançar luz sobre as investigações em andamento. Literatura védica, uma explicação necessária. Os mais antigos escritos védicos são quatro, conforme Stephen Knapp explica: “The Vedic literature is composed of many books. The oldest texts are: the Rig-veda, Yajur-veda, Sama-veda, and the Atharva-veda.” (KNAPP, e-book disponível em: http://www.stephen- knapp.com. Eles foram compilados por um sábio chamado Srila Vyasadeva e segundo os próprios vedas no início da era de Kaliuga quando o equinócio vernal do Hemisfério Norte estava na constelação de Órion, conforme Knapp afirma: With the use of astronomical calculations, some scholars date the earliest hymns of the Rig- veda to before 4500 B.C. Others, such as Lokmanya Tilak and Hermann Jacobi, agree that the major portion of the hymns of the Rig-veda were composed from 4500 to 3500 B.C., when the vernal equinox was in the Orion constellation. These calculations had to have been actual sightings, according to K. C. Verma, who states, at has been proved beyond doubt that before the discoveries of Newton, Liebnitz, La Place, La Grange, etc., back calculations could not have been made; they are based on observational astronomy (ibdem, Mahabharata: Myth and Reality Differing Views, p.124). Com isso se estima entre 4500a.C. a 3500a.C. os primeiros hinos do Rig-veda, porém há de se deduzir que a civilização então existente já possuía um conjunto de práticas sociais cotidianas com forte presença matemática. Os principais Vedas são normalmente chamados de Samhita (a composição). Estes quatro vedas tinham mais de 100 000 versos, agora, no entanto, só é possível encontrar algo em torno de 20 023 versos. Alguns estudiosos dizem que há 20 379 versos, no total dos quatro vedas. Só a título de exemplificação, O Rig-Veda, um dos Vedas com menor número de ramos, contém 1 017 hinos ou 10 522 versos dispostos em 10 livros ou mandalas, considerando o que ainda está disponível e pode ser encontrado. Os Shulba-Sūtras (códigos da corda), se encontram encravados no Atharva-Veda, e falam de Matemática, ou seja, do comprimento particular de cordas para medições precisas dos altares. Ele tinha 1180 agências a dar detalhes sobre tamanhos e formas de altares para os Anais do IX Seminário Nacional de História da Matemática 8 rituais do fogo (Agni ruga), e outros, e onde tais cerimônias teriam lugar. Os Shulba-Sūtras eram apenas uma parte do sistema mais amplo de Matemática, encontrado na Kalpa-Sūtra ─Aritmética, Álgebra e Geometria. De fato instrumentos geométricos foram encontrados em recentes escavações no vale do Indo como, por exemplo, a régua de Mohenjo-daro, datada de aproximadamente 2500 a.C. A fonte de Matemática Védica disponível Para se ter acesso a essa Matemática, a fonte de pesquisa disponível é o trabalho publicado em 1965, intitulado: “Vedic Mathematics or sixteen simple Mathematical formulae from the vedas” de autoria de sua divina graça Sri Shankaracharya Jagadguru Bharati Krishna Thirthaji Maharaja (1884-1960), cuja obra foi publicada em 1965, ou seja, cinco anos após o falecimento de sua santidade. Em um estudo profundo de oito anos, ele discerniu as “Ganitas Sūtras”, ou fórmulas matemáticas que faziam parte do antigo “Shulba-Sūtra”, ou códigos da corda, que estavam encravadas nos versos das mandalas do “Atharva-veda”, um dos quatro vedas principais compilados conforme descrito anteriormente. Em sua pesquisa o Swamiji descobre a chave para decodificar as “Ganitas Sūtras” e redescobre a Matemática Védica que se originou da necessidade de medições precisas para a construção de altares, que possuíam diferentes formas. Bem como do uso de cálculos para cerimônias religiosas que eram precisas e ligadas a efemérides e eventos astronômicos que deveriam ser corretamente previstos. Tudo se inicia por volta de 1911, quando sua santidade resolve estudar diversas secções do Atharva-veda Ele encontrou umas secções chamadas de “ganitas sūtras”(fórmulas matemáticas), mais elas misteriosamente não faziam nenhuma referencia óbvia à Matemática, (Cf.KANSARA, 2000). Ele, então determina-se a compreender as “referências” das Ganitas Sūtras e começou a estudar o léxico e a lexicografia antigas mais detalhadamente. Para isso se desloca para a remota região de florestas de Srigeri, Karnataka. Onde começou longos anos de estudos e meditação solitária. É oportuno informar que Sri Swamiji era exímio sânscritista e aos 16 anos recebeu o título de Saraswati da Associação Madras de Sânscrito, além de ser professor universitário com seis mestrados (em Filosofia, Sânscrito, Inglês, História, Matemática e Ciências) pelo Centro de Bombaim do American College of Science in Rochester, New York. Posteriormente, foi professor de Matemática e Ciências do colégio de Baroda. Mais tarde tornou-se diretor do Colégio Nacional de Rajamundary em Andhara Pradesh, na Índia. Anais do IX Seminário Nacional de História da Matemática 9 Após seu retiro de08 anos ele revela ter decifrado os 16 Sūtras fundamentais e os Sub- sūtras ou corolários que segundo afirma, cobrem todos os seguintes ramos da Matemática: Aritmética, Álgebra, Geometria Plana e Esférica, Trigonometria, Cônicas e Cálculo Diferencial e Integral, também a Matemática aplicada à Física, Astronomia e Engenharia nas áreas de Dinâmica e Hidrostática. Ele descobriu que para escrever números grandes os antigos autores védicos não utilizavam algarismos e, sim letras do alfabeto Sânscrito, chamado Devanagari. Nos Sūtras védicos uma palavra chave resolve muitos problemas e é dada em um código de sílabas dentro de um verso do Sūtra. O fato é que o código alfabético está em ordem natural e pode ser imediatamente interpretado, isso é a prova de que o código da língua era para facilitar a verificação. O Swamiji escreveu originalmente 16 volumes no campo da Matemática Védica.─um para cada Sūtra─ que seriam enviados aos EUA para serem corrigidos e publicados. Contudo, em 1956, em circunstâncias misteriosas tudo foi irreparavelmente perdido em um incêndio. Um ano depois, já com a saúde abalada, em apenas seis semanas, ele reuniu as informações sobre Matemática Védica em um único volume, que aborda de forma geral os dezesseis Sūtras, cuja obra, só foi publicado posteriormente, em 1965, após sua morte. Este foi o legado que ficou. A esse respeito os Sūtras traduzidos do Sânscrito e apresentados no livro Vedic Mathematics, mencionado anteriormente, são os seguintes: “Por um mais do que o anterior” “Tudo de 9 e o último de 10” “Verticalmente e transversalmente (multiplicações)” “Transponha e aplique” “Transponha e ajuste (o coeficiente)” “Se Samuccaya é o mesmo (em ambos os lados da equação), então isso e Samuccaya são (igual) zero" “Pela régua Parāvartya” “Se um está na relação, outro é zero.” “Pela adição e pela subtração”. “Pela conclusão ou pela não completação (do quadrado, do cubo, etc.)” “Cálculo diferencial” “Pela deficiência” “Específico e geral” “Os restantes pelo último dígito” Anais do IX Seminário Nacional de História da Matemática 10 “O final (binomial) e duas vezes o penúltimo (binomial), os iguais zeram” “Somente os últimos termos” “Por um a mais e a menos do que o anterior” “O produto da soma” “Todos os multiplicadores.” Além disso, no referido livro são apresentados também os seguintes Sub-sūtras ou corolários: “Proporcionalmente” “O restante permanece constante” “O primeiro pelo primeiro e o último pelo último” “Para 7 o multiplicando é 143” “Pela osculação” “Diminua pela deficiência” “O que quer que a extensão de sua deficiência, o diminui ainda mais a essa extensão; e ajustando também acima o quadrado (da deficiência)” “Por um mais do que o precedente” “Último do total de dez” “A soma dos produtos” “Pela eliminação e pela retenção (alternativos) (das potências os mais elevados e os mais baixos)” “Pela mera observação” “O produto da soma é a soma dos produtos” “Na bandeira” Considerações finais Levando em conta uma época na qual a Arqueologia não dispunha dos atuais recursos tecnológicos, portanto falhas de datação são compreensíveis. Contudo na mesma época outros autores trabalhavam de forma exaustiva partindo das referências dos hinos védicos e considerando a informação astronômica e o conhecimento matemático contido neles, os pesquisadores Herman Jacobi (1894) e P.C. Sengupta (1938, 1941) eles também viveram neste período, e não concordavam com as opiniões dos historiadores e indologistas que seguiam a corrente racionalista de pensamento do século dezenove representada entre outros por: Max Müler, A. B.Keith, J. Eggeling, W. D. Wthitney, e A. A. Macdonell. Tais Anais do IX Seminário Nacional de História da Matemática 11 pesquisadores utilizavam a cronologia bíblica e excluíam as informações contidas nos textos védicos. Estes apontamentos são apenas o início da pesquisa, pois as leituras e as investigações continuam. A dificuldade em adquirir publicações vem sendo vencida, e caminha pari passu com a elaboração de atividades para uso do professor no ensino das quatro operações, sob uma perspectiva da Matemática Védica ─apresentada no livro “Vedic Mathematics or sixteen simple Mathematical formulae from the vedas”─ que desde tempos imemoriais adotou o sistema de numeração posicional e decimal. Referências ASHFAQUE, S. M. and SHAIRK, K. H. Moenjodaro: a 5000-year-old legacy. Geneva, Switzerland: Unesco, 1981. BOYER, C. B. História da Matemática. Trad. de Elza F. Gomide. São Paulo: Editora Edgard Blücher Ltda., 1985. CALAZANS, J. C. Para uma revolução epistemológica dos estudos indológicos. Revista Lusófona de Ciência das Religiões, Lisboa, ano V, n. 9, p.227-237, 2006 CAJORI, F. Uma história da Matemática. Rio de Janeiro: Editora Ciência Moderna Ltda., 2007. KALYANARAMAN, S. Sarasvati River (circa 3000 to 1500 b.c.). Chennai, Indian: Sarasvati Sindhu Research Centre, 1997 KANSARA, N. M.. 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