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Gisele Mano e Lucianna Schmitt Disciplina Saúde Coletiva 03 Sumário CapítuLo 4 – Disciplina Informação em saúde ........................................................................... 05 4.1 o modelo de atenção à saúde no Brasil ............................................................................... 05 4.1.1 Níveis de atenção à saúde ............................................................................................ 07 4.1.2 Forma de estruturação do sistema de saúde ............................................................. 09 4.1.3 Níveis de prevenção de doenças ................................................................................. 10 4.1.4 promoção da saúde ........................................................................................................ 11 4.1.5 atributos constitutivos da atenção primária à saúde ............................................... 20 4.2 Estratégia Saúde da Família.................................................................................................... 23 4.3 a composição das equipes de saúde da família ................................................................. 24 4.4 Núcleos de apoio à Saúde da Família (Nasf) ...................................................................... 25 4.5 assistência ambulatorial e hospitalar especializada no Brasil .......................................... 25 4.6 Redes de atenção à saúde no sistema de saúde brasileiro .............................................. 27 4.7 Fundamentos e atributos das Redes de atenção à Saúde (RaS) ...................................... 30 05 Introdução Modelos de atenção à saúde, modelos assistenciais, ou modos de intervenções em saúde, são expressões utilizadas para conceituar o campo da prestação da atenção em saúde. Há vários estudos e reflexões sobre os modelos assistenciais vigentes que são definidos como uma espécie de intermediação de técnicas de prestação dos serviços nos âmbitos individual e coletivo. Esses modelos orientam as diversas ações em saúde seguindo uma lógica racional do uso dos diversos aparatos técnicos, de infraestrutura e de recursos humanos. a única função desses modelos de atenção é orientar as intervenções técnicas sobre os problemas de saúde, construindo um modo de intervenção em saúde. 4.1 o modelo de atenção à saúde no Brasil Segundo alves e Silva Júnior, o modelo assistencial diz respeito ao modo como são organizadas, em uma dada sociedade, as ações de atenção à saúde, envolvendo os aspectos tecnológicos e assistenciais. ou seja, é uma forma de organização e articulação entre os diversos recursos físicos, tecnológicos e humanos disponíveis para enfrentar e resolver os problemas de saúde de uma coletividade. Existem, no mundo, diversos modelos assistenciais calcados na compreensão da saúde e da doença, nas tecnologias disponíveis em determinada época para intervir na saúde e na doença e nas escolhas políticas e éticas que priorizam os problemas a serem enfrentados pela política de saúde. “O tema de qualquer modelo de atenção à saúde faz referência não a programas, mas ao modo de se construir a gestão de processos políticos, organizacionais e de trabalho que estejam comprometidos com a produção dos atos de cuidar do indivíduo, do coletivo, do social, dos meios, das coisas e dos lugares. E isso sempre será uma tarefa tecnológica, comprometida com necessidades enquanto valores de uso, enquanto utilidades para os indivíduos.” Fonte: Merhy (2000). Capítulo 4Disciplina Informação em saúde 06 Informação em Saúde Laureate International Universities No Brasil, dois modelos antagônicos de assistência à saúde garantem o acesso aos serviços de saúde para a população brasileira. Esses modelos são extremamente contraditórios por apresentarem formas de orientação muito diferentes. Em alguns momentos, eles se complementam, garantindo assim a assistência em grande parte das intervenções em saúde. os dois modelos existentes em nosso país são: modelo médico-assistencial privatista e modelo assistencial sanitarista. Há autores ainda que incluem um terceiro modelo, chamado de saúde da família, pautado em uma estratégia de (re)organização da atenção primária em nosso país, que será abordado melhor mais à frente. os dois principais modelos assistenciais constituídos no decorrer da história do sistema de saúde no Brasil estão voltados para dois aspectos importantes: demanda espontânea de saúde e necessidades de saúde da população. Modelo médico-assitencial privatista Modelo assitencial sanitarista O modelo médico-assistencial privatista está destinado a conter a demanda espontânea dos usuários. A população tem livre iniciativa para procurar os serviços de saúde, seja em hospitais, centros de saúde, unidades de saúde, prontos-socorros, consultórios particulares ou laboratórios. Caracteriza-se por ser um modelo voltado para o imediatismo, isto é, o indivíduo o procura por apresentar algum sinal ou sintoma de alguma enfermidade. O objetivo da população é apenas resolver o sofrimento naquele momento. É uma abordagem centrada na doença e na resolução imediata do problema. Por esse motivo, é o mais difundido e o mais prestigiado por grande parte das pessoas. O grande entrave desse modelo é o fato de estar atrelado ao grau de conhecimento e/ou sofrimento dos indivíduos sobre determinadas doenças. Logo, aqueles que não percebem a existência de agravos ou de doenças propriamente ditas deixarão de ser abordados pelo sistema de saúde. Esse modelo reforça a ideia de saúde como sendo a ausência de doença e por isso só necessitam de cuidados os que estão verdadeiramente doentes ou que apresentam algum mal físico. É um modelo que tem sua gênese na assistência filantrópica e na medicina liberal e que se consolidou com o desenvolvimento da medicina capitalizada. Reproduz-se tanto no setor público como no setor privado de saúde com um único objetivo: caráter curativo. Isso tende a prejudicar o atendimento integral do indivíduo e da comunidade da qual ele faz parte, além de interferir negativamente no impacto sobre o nível de saúde da população. (Rouquaryol, 2003) Esse modelo, quando citado, na maioria das vezes é abordado como sinônimo de saúde pública. É caracterizado por campanhas e programas focalizados em algum problema específico de saúde, o qual o modelo hegemônico anterior não conseguiu resolver ou dar conta. No século XX, o Brasil passou por diversos problemas de saúde que só foram contidos graças a campanhas específicas como, por exemplo, as diversas epidemias que acometeram nossa população no passado (febre amarela, varíola, peste, entre outras). Recentemente, vivenciamos as epidemias de dengue e, mais especificamente, a pandemia de gripe pelo vírus influenza A H1N1. Esse controle também se deve à instituição do calendário vacinal obrigatório, que conseguiu obter bons resultados no controle e erradicação de determinadas doenças. A campanha de reidratação oral conseguiu diminuir consideravelmente o índice de mortes por desidratação em crianças em áreas desprovidas de serviços adequados de saúde. Alguns programas focais, como os da tuberculose, hanseníase, hipertensão, diabetes e saúde da criança, também são exemplos desse modelo de intervenção em saúde. Essas ações são extremamente importantes, porém não contemplam os problemas de saúde em sua real dimensão, pois priorizam determinados agravos ou grupos de risco em detrimento de políticas mais gerais e que gerem um verdadeiro impacto no modo de estruturação e prestação de serviços em saúde. Outra grande dificuldade dessas políticas é o caráter temporário que elas assumem. Com exceção de alguns programas que se tornaram permanentes, as campanhas focais têm caráter efêmero e, no momento em que ocorrem, desviamrecursos federais para sua execução, modificando também todo um planejamento previamente elaborado, sem contar com a infraestrutura e a disposição de recursos humanos para tais políticas. Na verdade, podemos instituir a metáfora do “apagar incêndios” para designar as ações que essas campanhas desempenham. Entretanto, acabam se constituindo em um mal necessário. Os programas focais também geram problemas no sistema de saúde, pois dispõem de administração vertical e única que individualiza os serviços e desintegra o sistema, uma vez que não conseguem integrar as diversas ações desses programas às outras atividades do sistema. Esse modelo é desenvolvido exclusivamente pelo setor público e tem vínculo e financiamento direto do Ministério da Saúde e de suas subsecretarias de gestão. atualmente, no Brasil, o sistema de saúde é fragmentado e organizado por níveis de atenção. E é exatamente essa descentralização a responsável por promover um melhor atendimento à população, uma vez que cada um desses níveis corresponde a determinado conjunto de serviços assistenciais disponibilizados aos usuários (sendo alguns de maior complexidade e outros mais básicos). Essa forma de organização e hierarquização das redes assistenciais do modelo de atenção à saúde envolve uma imagem em pirâmide, bem como a ideia da complexidade crescente em direção ao topo, com o hospital no topo e a rede básica como porta de entrada do sistema de saúde. a pirâmide organiza a assistência em graus crescentes 07 de complexidade, com a população fluindo de forma organizada entre os vários níveis por meio de mecanismos formais de referência e contrarreferência (normas de fluxos de usuários na busca de alternativas de assistência). 4.1.1 Níveis de atenção à saúde Nos sistemas de saúde, são organizados níveis de atenção à saúde a partir da combinação dos recursos assistenciais disponíveis. Eles dependem de tecnologia material incorporada (máquinas e equipamentos de diagnóstico e terapêutica), capacitação de pessoal (custo social necessário para formação) e perfil de morbidade da população-alvo. São, então, identificados três níveis de atenção à saúde: nível primário (primeiro nível: atenção primária à saúde); nível secundário (nível intermediário: atenção secundária); e nível terciário (atenção terciária). No entanto, deve-se advertir que os arranjos possíveis na distribuição desses três elementos em sistemas de saúde frequentemente não apresentam a mesma regularidade, pois dependem das características do sistema em termos dos meios financeiros, materiais e de pessoal disponíveis e das políticas de saúde implementadas em cada país. o nível primário é aquele em que estão os equipamentos com menor grau de incorporação tecnológica do sistema (os equipamentos de geração tecnológica mais antiga, como aparelhos básicos de raio-X, sonar e, eventualmente, ultrassom). a capacitação de pessoal para esse nível apresenta necessidades de uma formação geral e abrangente para atender aos eventos mais prevalentes na população (os problemas de saúde mais frequentes), e o quadro de profissionais é preenchido por médicos de família e clínicos gerais. Estima-se que entre 85 a 90% dos casos demandados à atenção primária são passíveis de serem resolvidos nesse nível da atenção. ao nível secundário cabem os equipamentos com grau intermediário de inovação tecnológica (aparelhos de raio-X com alguma sofisticação, ecocardiógrafo, ultrassom de geração mais nova, aparelhos para endoscopia). a capacitação de pessoal – a dos médicos, em particular – situa-se em áreas especializadas originárias (clínica médica, cirurgia geral, ginecologia e obstetrícia, pediatria) e em outras, como oftalmologia e psiquiatria. Essas especializações, no caso dos médicos, requerem 2 a 3 anos após a graduação para atingir a formação, que se realiza por meio da residência médica. os serviços de atenção secundária devem estar aparelhados com pessoal e equipamentos para atender às situações que forem encaminhadas pelo nível primário. o nível terciário concentra os equipamentos com alta incorporação tecnológica, aqueles de última geração e, portanto, mais caros (ressonância magnética e pEt scan). o pessoal que trabalha nesse nível necessita de formação especializada mais intensiva, no caso dos médicos até em áreas superespecializadas (neurocirurgia, cirurgia de mão, nefrologia pediátrica, cancerologia, entre outras) que demandam de 3 a 5 anos de residência médica para obter a capacitação. o nível terciário deve estar aparelhado para atender a situações que o nível secundário não conseguiu resolver e eventos mais raros ou aqueles que demandam assistência desse nível do sistema. para dar os resultados esperados, um sistema de saúde com esse tipo de organização exige que um determinado número de pessoas vincule-se a um determinado serviço (unidade básica, ambulatório de especialidade, hospital) – a adscrição de clientela –, e requer uma distribuição homogênea dos serviços para garantir que as pessoas possam ser atendidas em suas necessidades assistenciais. Em linguagem mais técnica, significa usar a noção de escala na distribuição de serviços, ou seja, os serviços de atenção primária devem estar distribuídos de 08 Informação em Saúde Laureate International Universities modo que cada um esteja preparado para atender até 20 mil habitantes. assim, para cada grupo de serviços de atenção primária (um certo número de unidades básicas de saúde) deve existir um serviço secundário de referência (ambulatório de especialidades e hospital geral) e, da mesma forma, para cada conjunto de serviços de atenção secundária (grupo de hospitais) deve haver hospital e ambulatórios especializados de referência. Atenção terciária: incorpora um alto grau de complexidade e precisa ser desenvolvida essencialmente em nível hospitalar, no qual os universitários são de grande importância. Congrega equipamentos com alta incorporação tecnológica e, portanto, mais caros (ressonância magnética, pEt scan). o pessoal incorporado necessita de formação especializada mais intensiva, no caso dos médicos até em áreas superespecializadas (neurocirurgia, cirurgia de mão, nefrologia pediátrica, cancerologia, entre outras), que demandam de 3 a 5 anos após a graduação para completar a capacitação. o nível terciário deve estar aparelhado para atender situações que o nível secundário não conseguiu resolver, eventos mais raros ou aqueles que demandem assistência desse nível do sistema. Atenção secundária: congrega os equipamentos com grau intermediário de inovação tecnológica (como raio-X com alguma sofisticação, ecocardiógrafo, ultrassom e aparelhos para endoscopia), capacitação de pessoal, em particular dos médicos, e geralmente situa-se em áreas especializadas originárias (clínica, cirurgia, ginecologia, obstetrícia, pediatria) e em outras, como oftalmologia e psiquiatria. os serviços de atenção secundária devem estar aparelhados com pessoal e equipamentos para atender às situações que o nível primário não absorveu – geralmente cursos atípicos ou complicações dos eventos mais frequentes e outros mais raros que demandam assistência compatível a esse nível. Atenção primária: caracteriza-se como a entrada do usuário no sistema de saúde. Estudos mostram que possui um grau de 85 a 90% de resolutividade. Consegue alocar os equipamentos com baixo grau de incorporação tecnológica como, por exemplo, eletrocardiógrafo, aparelhos básicos de raio-X, sonar, eventualmente ultrassom e laboratório básico. A capacitação dos profissionais para este nível apresenta necessidades de uma formação geral e abrangente para atender aos eventos mais prevalentes na população-alvo, respeitadas as possibilidades de intervenção neste nível de complexidade assistencial. É o nível de atenção que vem ganhando notoriedade dentro dospaíses que querem atingir excelência em seu grau de desenvolvimento. Esses níveis de atuação devem estar relacionados entre si para que consigam resolver e atender às necessidades de saúde de toda população. para cada serviço de atenção primária deve haver um serviço de referência para atenção secundária e terciária. Esse serviço de referência serve para apoio no processo de resolutividade das enfermidades da população. 09 um dos grandes dilemas atuais de qualquer sistema de saúde é fazer que haja, de fato, a integração dos diversos níveis do sistema, e que eles cumpram realmente com seus respectivos papéis. a atenção primária deve cumprir com sua função e assumir literalmente a porta de entrada do sistema. os demais níveis, secundário e terciário, devem servir como referência para os problemas que não puderam ser finalizados no nível anterior, assumindo suas verdadeiras funções. 4.1.2 Forma de estruturação do sistema de saúde Figura 1. Nível terciário: atenção hospitalar (resolve cerca de 5% dos problemas de saúde) Nível secundário: centros de especialidades e serviço de apoio diagnóstico terapêutico (SADT) (resolve cerca de 15% dos problemas de saúde) Atenção básica: unidades básicas de saúde e estratégia de saúde da família (resolve mais de 80% dos problemas de saúde) Santos discorre que a organização do SuS em nosso país está assentada em três pilares: rede (integração dos serviços interfederativos), regionalização (região de saúde) e hierarquização (níveis de complexidade dos serviços). Estes são os pilares que sustentam o modelo de atenção à saúde, conforme dispõe o art. 198 da Constituição Federal. a Constituição, ao estatuir que o SUS é um sistema integrado, organizado em rede regionalizada e hierarquizada, definiu o modelo de atenção à saúde e a sua forma organizativa. A organização dos serviços de saúde promove um ordenamento de fluxo de usuários entre os níveis de atenção, constituindo o nível primário/atenção básica o local de primeiro contato com o sistema de saúde e de atendimento às necessidades dos usuários ao longo da vida – ressalvadas as situações de urgência e emergência médicas. assim, à assistência primária compete ordenar o fluxo de usuários nos sistemas de saúde – tarefa das mais complexas se imaginarmos o número e a natureza das situações envolvidas, bem como os requisitos de formação técnica e os meios operacionais necessários para identificar adequadamente o que encaminhar e quando fazê-lo. Esse sistema de encaminhamento interníveis de atenção denomina-se referência e geralmente se dá de modo crescente, isto é, do nível primário para o secundário e desse para o terciário. Já o fluxo inverso, isto é, o retorno do usuário para um nível mais abaixo, denomina- se contrarreferência e pode se dar tanto em ordem imediatamente decrescente ou, às vezes, do terciário diretamente para o primário. a boa norma recomenda que os encaminhamentos interníveis sejam realizados por meio de relatórios detalhados. Claro está que, para funcionar, um sistema de saúde assim organizado exige adscrição de clientela (vinculação de clientela a serviços, especialmente no nível primário) e uma distribuição homogênea dos serviços para garantir, de modo igualitário, o acesso e atender adequadamente às necessidades assistenciais dos usuários. 10 Informação em Saúde Laureate International Universities 4.1.3 Níveis de prevenção de doenças Leavell & Clark, em 1965, propuseram o modelo da história natural da doença, composto por três níveis de prevenção, descritos no Quadro 1 a seguir. São eles: prevenção primária, secundária e terciária. Nesse modelo, a promoção da saúde limitava-se e compunha um nível de atenção da medicina preventiva (prevenção primária), constituindo ações destinadas ao desenvolvimento da saúde e bem-estar gerais no período de pré-patogênese. Quadro 1 - Modelo da história natural da doença Prevenção primária Prevenção secundária Prevenção terciária Reabilitação Limitação da invalidez Proteção específica Promoção da saúde Diagnóstico e tratamento precoce • Prestação de serviços hospitalares e comunitários para a reeducação e treinamento a fim de possibilitar a utilização máxima das capacidades restantes. • Educação do público e indústria, no sentido de que empreguem o reabilitado. • Emprego tão completo quanto possível. • Colocação seletiva. • Terapia ocupacional em hospitais. • Utilização de asilos. • Tratamento adequado para interromper o processo mórbido e evitar futuras complicações e sequelas. • Provisão de meios para limitar a invalidez e evitar a morte. • Medidas individuais e coletivas para descoberta de casos. • Pesquisas de triagem e exames seletivos. • Objetivos: - curar e evitar o processo da doença. - evitar complicações e sequelas. - encurtar o período de invalidez. • Uso de imunizações específicas. • Atenção à higiene pessoal. • Hábito de saneamento do ambiente. • Proteção contra riscos ocupacionais. • Proteção contra acidentes. • Uso de alimentos específicos. • Proteção contra substâncias carcinogênicas. evitação contra alérgenos. • Educação sanitária; • Bom padrão de nutrição, ajustado às várias fases de desenvolvimento da vida. • Atenção ao desenvolvimento da personalidade. • Moradia adequada, recreação e condições agradáveis de trabalho. • Aconselhamento matrimonial e educação sexual e genética. • Exames seletivos periódicos. Fonte: adaptado por Demarzo. Existe um quarto conceito mais recente de prevenção, o de prevenção quartenária, que apareceu após reflexões de que as ações em saúde, tanto preventivas quanto curativas, têm sido consideradas, em algumas situações, excessivas e agressivas, tornando-se também um fator de risco para a enfermidade e a doença. por essa razão, em 1995, Jamoulle e Roland propuseram o conceito de prevenção quartenária (prevenção da Iatrogenia), aceito pelo Comitê Internacional da organização Mundial dos Médicos de Família (WoNCa) em 1999. Esse novo nível de prevenção pressupõe ações clínicas centradas na pessoa e pautadas na epidemiologia clínica e na saúde baseada em evidências, visando melhorar a qualidade da prática em saúde, bem como a racionalidade econômica. Portanto, as ações devem ser cultural e cientificamente aceitáveis, necessárias e justificadas, prezando pelo máximo de qualidade da atenção com o mínimo de quantidade/intervenção possível. ainda neste contexto, almeida10 descreve outro objetivo da prevenção quartenária, que é construir a autonomia dos usuários e pacientes por meio de informações necessárias e suficientes para poderem tomar suas próprias decisões, sem falsas expectativas, conhecendo as vantagens e os inconvenientes dos métodos diagnósticos, preventivos ou terapêuticos propostos. portanto, consiste na construção da autonomia dos sujeitos e na detecção de indivíduos em risco de sobretratamento ou excesso de prevenção, para protegê-los de intervenções profissionais inapropriadas e sugerir-lhes alternativas eticamente aceitáveis. 11 Neste contexto, esse modelo contribuiu para destacar as ações sobre o ambiente e sobre os estilos de vida, além de ações clínicas, o que foi fundamental dentro do processo de transição epidemiológica vivenciado no último século, com as doenças crônico-degenerativas ocupando um lugar de destaque. Dessa maneira, a promoção da saúde, além de se associar a medidas preventivas, passou a englobar a promoção de ambientes e estilos de vida saudáveis. 4.1.4 promoção da saúde a promoção da saúde vai além dos cuidados de saúde. o enfoque biológico e social do processo saúde-doença esteve no centro do debate entre saúde pública e medicina durante boa parte do século XX, até que, em abril de 1974, o Relatório Lalonde, produzido na gestão do Ministroda Saúde canadense Marc Lalonde, destacou a importância do estilo de vida (comportamento) como foco principal, ao lado da biologia humana e de fatores ambientais como as principais causas de morbimortalidade, passando a ser um referencial importante nos debates e documentos que foram produzidos desde então. a primeira Conferência Internacional de promoção da Saúde realizada em ottawa, no Canadá, em novembro de 1986, enfatizou a importância da atenção primária em saúde defendida pela oMS como a chave para uma promoção da saúde de caráter universal. Nessa conferência, em decorrência dos progressos alcançados após a Declaração de alma-ata para a atenção primária à saúde, em 1978, e a partir do documento da oMS as Metas da Saúde para todos, foi elaborada a Carta de ottawa, que passou a ser uma referência permanente na reflexão sobre os determinantes sociais em saúde em todas as conferências que se seguiram e na evolução conceitual da promoção da saúde. a Carta de ottawa ampliou o conceito de promoção da saúde para além de um estilo de vida saudável, e lista os seguintes pré-requisitos como básicos para alcançar a saúde: paz, habitação, educação, alimentação, renda, ecossistema estável, recursos sustentáveis, justiça social e equidade. as dimensões socioeconômicas, políticas e culturais incidem sobre as condições de saúde, não sendo, assim, responsabilidade exclusiva do setor de saúde. além disso, a Carta de ottawa indica que a promoção da saúde demanda uma ação coordenada entre governo, setor de saúde e outros setores sociais e econômicos a fim de: estabelecer estratégias que devem refletir as necessidades locais e as diferenças socioeconômicas e culturais para a construção de políticas públicas saudáveis, ambientes favoráveis; reforçar a ação comunitária na direção dos assuntos de saúde; desenvolver habilidades pessoais por meio da divulgação de informação, desenvolver uma educação para a saúde; e reorientar os serviços de saúde para a promoção da saúde com a participação da comunidade e de outros setores. Desde a Carta de Ottawa, a OMS vem organizando novas conferências sobre promoção da saúde no sentido de reforçar, aprimorar e aprofundar s conceitos e ações definidos em 1986. São elas 1. Segunda Conferência Internacional sobre promoção da saúde, realizada em Adelaide em 1988. 2. Terceira Conferência Internacional sobre promoção da saúde, realizada em Sundsval em 1991. 3. Quarta Conferência Internacional sobre promoção da saúde, realizada em Jacarta em 1997. 4. Quinta Conferência Internacional sobre promoção da saúde, realizada no México em 2000. 5. Sexta Conferência Global de promoção da saúde, realizada em Bancoc em 2005. (DEMARZO, 2008) • Educação sanitária; • Bom padrão de nutrição, ajustado às várias fases de desenvolvimento da vida. • Atenção ao desenvolvimento da personalidade. • Moradia adequada, recreação e condições agradáveis de trabalho. • Aconselhamento matrimonial e educação sexual e genética. • Exames seletivos periódicos. 12 Informação em Saúde Laureate International Universities Seguiu-se, em 1988, a II Conferência Internacional sobre promoção de Saúde, em adelaide, na austrália, cujo tema central foi voltado para as políticas públicas saudáveis. a conferência identificou quatro áreas prioritárias para promover ações imediatas em políticas públicas saudáveis: apoio à saúde da mulher, alimentação e nutrição, tabaco e álcool e ambientes saudáveis. Os participantes da Conferência de Adelaide reafirmaram os compromissos assumidos na Carta de ottawa, e a III Conferência Internacional sobre promoção da Saúde, realizada em Sundsvall (Suécia), em 1991, precedendo a Conferência Mundial sobre o Meio Ambiente, pautou como tema principal os ambientes favoráveis à saúde, identificando que a expressão “ambientes favoráveis” refere-se, no contexto da saúde, aos aspectos físico e social e à sua importância para a saúde. Essa conferência elencou quatro estratégias para o desenvolvimento das ações em saúde pública, visando promover a criação de ambientes favoráveis e promotores da saúde: • reforçar a defesa da proposta por meio de ações comunitárias, particularmente pelos grupos organizados de mulheres; • capacitar comunidades e indivíduos sobre saúde e ambiente por meio da educação e maior participação nos processos de tomada de decisão; • construir alianças para a saúde e os ambientes favoráveis, de maneira a reforçar a cooperação entre as campanhas e estratégias nas áreas da saúde e do ambiente; • mediar os interesses conflitantes na sociedade, de modo que se possa assegurar o acesso igualitário a ambientes favoráveis à saúde. Na américa Latina, o primeiro Encontro Internacional sobre promoção da Saúde ocorreu em Santa Fé de Bogotá (Colômbia), em 1992, e reuniu os representantes de 21 países da américa Latina, Canadá e Espanha, com o objetivo de debater princípios e definir o significado da promoção da saúde na américa Latina. a situação de saúde vigente caracterizava-se pela persistência ou ressurgimento de endemias, como malária, cólera, tuberculose e desnutrição; pelo aumento de problemas como câncer e doenças cardiovasculares; pelo surgimento de novas enfermidades, como aids e as resultantes da deterioração ambiental; e pelo aumento da violência, causando inúmeros problemas psicossociais e um aumento de riscos para a saúde. a partir dessa análise, é destacada a importância de trabalhar a promoção da saúde voltada prioritariamente para a identificação dos fatores que favorecem a inequidade e a proposição de ações que diminuam seus efeitos (oMS, 1992). Foram destacadas como principais estratégias definidas no Encontro Internacional: Considerar os princípios da Carta de Ottawa como indispensáveis para a promoção da saúde na América Latina. Reorientar o setor de saúde, colocando em relevo a estratégia de promoção da saúde. Impulsionar o conceito de saúde condicionado por fatores políticos, econômicos, sociais, culturais, ambientais, de conduta e biológicos. Promover a saúde como estratégia para modificar esses fatores condicionantes. Articular as forças sociais para aplicar a estratégia de promoção da saúde, colocando os propósitos sociais à frente dos interesses econômicos a fim de criar e manter ambientes familiares, físicos, naturais, de trabalho, sociais, econômicos e políticos que tenham a intenção de promover a vida, e não de degradá-la. Incentivar políticas públicas que garantam a equidade e favoreçam a criação de ambientes e opções saudáveis. 13 Em 1997, é realizada a IV Conferência Internacional de promoção da Saúde em Jacarta (Indonésia). Essa foi a primeira conferência a ter lugar em um país em desenvolvimento e a incluir o setor privado no apoio à promoção da saúde. Foi uma ocasião para refletir sobre o que se aprendeu sobre promoção da saúde, reconhecendo que cada vez mais é um elemento essencial para a redução das inequidades em questões de saúde mediante ações sobre os determinantes sociais. a Declaração de Jacarta sobre a promoção da saúde oferece uma visão e um enfoque para a promoção da saúde no século XXI. após 10 anos, as precondições para a saúde estabelecidas na Carta de ottawa são ampliadas. São elas: paz, abrigo, instrução, segurança social, relações sociais, alimento, renda, direito de voz das mulheres, ecossistema estável, uso sustentável dos recursos naturais, justiça social, respeito aos direitos humanos e equidade. São recomendações da Conferência para a promoção da saúde no século XXI: • promover a responsabilidade social para com a saúde; • aumentar os investimentos para fomentar a saúde; • consolidar e expandir parcerias em prol da saúde entre os diferentes setores e em todos os níveis de governabilidade e da sociedade; • aumentar a capacidade comunitária e dar direito de voz ao indivíduo.para conseguir infraestrutura para a promoção da saúde, faz-se necessário encontrar novos mecanismos para seu custeio nos níveis local, nacional e mundial. Localidades para a saúde representam a base organizacional necessária para a promoção da saúde. a V Conferência Internacional sobre promoção da Saúde, realizada na Cidade do México (México), em 2000, constata que, nos últimos anos, houve melhoria significativa da saúde e aumento do acesso aos serviços de saúde em muitos países do mundo. Mas, apesar desse progresso, ainda persistem muitos problemas de saúde que prejudicam o desenvolvimento social e econômico. É recomendada a necessidade urgente de abordar os determinantes sociais, econômicos e ambientais da saúde, sendo preciso fortalecer os mecanismos de colaboração para a promoção da saúde em todos os setores e níveis da sociedade e colocar a promoção da saúde como prioridade fundamental das políticas e programas locais, regionais, nacionais e internacionais. além disso, é necessário um papel de liderança para assegurar a participação ativa de todos os setores e da sociedade civil na implementação das ações de promoção que fortaleçam e ampliem as parcerias na área da saúde. Em 2005, foi realizada a VI Conferência Global de promoção da Saúde, em Bangcoc, na Tailândia. Nessa conferência, foram identificadas as ações para abordar os determinantes da saúde por meio da promoção da saúde e alguns fatores críticos que influenciam a saúde. Foram propostas algumas estratégias a fim de abordar os determinantes da saúde em um mundo globalizado por meio de intervenções efetivas do setor de saúde, com o objetivo de que mais avanços sejam obtidos na implementação das ações de promoção da saúde, e a fim de complementar os valores e princípios da promoção da saúde estabelecidos pela Carta de ottawa para a promoção da saúde, assim como as recomendações das conferências internacionais subsequentes. Em novembro de 2009, foi realizada em Nairóbi a VII Conferência Global de promoção da Saúde, organizada pela oMS e pelo Ministério da Saúde pública do Quênia, que reafirmou os compromissos das conferências anteriores. O tema dessa conferência foi “promovendo a Saúde e o Desenvolvimento: quebrar as lacunas de implementação”. 14 Informação em Saúde Laureate International Universities as discussões desenvolveram-se em torno dos seguintes assuntos: Empoderamento da comunidade (autonomia comunitária). Conhecimento sobre saúde e comportamento (autonomia individual). Reforço dos sistemas de saúde. Parcerias e ação intersetorial. Construção de competências para a promoção da saúde. No Brasil, o conceito ampliado de saúde e a associação entre determinantes sociais e condições de saúde tiveram contribuição significativa a partir do movimento da reforma sanitária brasileira, especialmente nas discussões ocorridas durante a VIII Conferência Nacional de Saúde Brasil, de 1986, que definiu que a “saúde é resultante das condições de alimentação, habitação, educação, renda, meio ambiente, trabalho, transporte, emprego, lazer, liberdade, acesso e posse da terra e acesso a serviços de saúde” e que “há necessidade de o Estado assumir explicitamente uma política de saúde consequente e integrada às demais políticas econômicas e sociais”, condições asseguradas posteriormente em 1988 no texto constitucional – seção II da Saúde – e na Lei orgânica da Saúde. Atenção primária à saúde Internacionalmente, tem-se apresentado atenção primária à Saúde (apS) como uma estratégia de organização da atenção à saúde voltada para responder, de forma regionalizada, contínua e sistematizada, à maior parte das necessidades de saúde de uma população, integrando ações preventivas e curativas, bem como a atenção a indivíduos e comunidades. Esse enunciado procura sintetizar as diversas concepções e denominações das propostas e experiências que se convencionaram chamar internacionalmente de apS. No Brasil, a apS incorpora os princípios da Reforma Sanitária, levando o Sistema Único de Saúde (SuS) a adotar a designação atenção Básica à Saúde (aBS) para enfatizar a reorientação do modelo assistencial a partir de um sistema universal e integrado de atenção à saúde. Historicamente, a ideia de atenção primária foi utilizada como forma de organização dos sistemas de saúde pela primeira vez no chamado Relatório Dawson, em 1920. Esse documento do governo inglês procurou, por um lado, contrapor-se ao modelo flexineriano americano de cunho curativo, fundado no reducionismo biológico e na atenção individual, e, por outro, constituir-se numa referência para a organização do modelo de atenção inglês, que começava a preocupar as autoridades daquele país devido ao elevado custo, à crescente complexidade da atenção médica e à baixa resolutividade. 15 Primeiro contato (porta de entrada ao sistema de saúde) Significa acesso e utilização do serviço de saúde para cada novo evento de saúde ou novo episódio de um mesmo evento. Um serviço é porta de entrada quando a população e a equipe identificam-no como o primeiro recurso de saúde a ser buscado quando há uma necessidade/problema de saúde. Para isso, deve ser de fácil acesso e disponível. Se não o for, a procura será adiada, talvez a ponto de afetar negativamente o diagnóstico e o manejo do problema. O acesso tem dois componentes: a) o acesso geográfico, que envolve características relacionadas à distância e aos meios de transporte a serem utilizados para obter o cuidado; b) o acesso sócio-organizacional, que inclui aquelas características e recursos que facilitam ou impedem os esforços das pessoas em receber os cuidados de uma equipe de saúde. Por exemplo, o horário de funcionamento, a forma de marcação de consulta e a presença de longas filas podem significar barreiras ao acesso. O mesmo ocorre com: as horas de disponibilidade da unidade de saúde; a oferta de cobertura após o horário de funcionamento e a explicitação dos serviços a serem utilizados pela população quando a unidade de saúde não está disponível; a facilidade de acesso para idosos e portadores de deficiências físicas; o tempo médio gasto na sala de espera; a ausência de dificuldades com linguagem; as barreiras relacionadas a gênero; as acomodações; a aceitabilidade das diferenças culturais; a disponibilidade de brechas para consultas de emergências; o intervalo de tempo entre marcação e consulta; a disponibilidade para visitas domiciliares; a oferta de cuidados para grupos que não procuram espontaneamente o serviço; a busca ativa; etc. A organização da agenda para garantir consultas programadas permite que as ações de promoção e prevenção em saúde – como acompanhamento pré-natal e aconselhamento em doenças crônicas – sejam realizadas. A utilização dos serviços de APS pela população depende da boa resolutividade das equipes, do acolhimento, da capacidade de delimitar os recursos necessários para resolver os problemas e de uma prática baseada na pessoa (e não na doença), na família e na comunidade. As equipes de saúde da família têm inovado na busca de formas que garantam acessibilidade e maior utilização da APS como primeiro contato com o sistema de saúde. O acolhimento, a exposição de cartazes com horários de funcionamento e disponibilidade dos integrantes da equipe, os turnos vespertinos e agenda aos sábados são alguns exemplos de esforços nesse sentido. O trabalho em parceria com as comunidades para diminuir as barreiras de acesso e melhorar a utilização dos serviços é essencial. As diretrizes da Estratégia Saúde da Família buscam a ampliação do acesso e da utilização dos serviços de APS como porta de entrada ao sistema ao proporem que as unidades de saúde estejam próximo do local de moradia das pessoas, que haja vinculação populacional e a responsabilidade pelo território. As vantagens do primeiro contato A utilização de um serviço de APS como o primeiro recursode saúde por uma determinada população traz as seguintes vantagens: • Ocorre redução dos seguintes aspectos: número de hospitalizações, tempo de permanência no hospital quando ocorre hospitalização, número de cirurgias, uso de especialistas em doenças, número de consultas para um mesmo problema e número de exames complementares. • São maiores: o número de ações preventivas, a adequação do cuidado, a qualidade do serviço prestado e a oportunidade da atenção (maior chance de que ocorra no tempo certo). • As equipes de saúde, especialistas em APS, lidam melhor com problemas de saúde em estágios iniciais, utilizando a adequada abordagem ver, esperar e acompanhar, diferente dos especialistas em doenças que, acostumados a ver problemas em fases mais adiantadas, solicitam mais exames complementares e realizam mais procedimentos. Os desafios da porta de entrada no SUS A utilização da atenção primária à saúde como porta de entrada ao sistema de saúde brasileiro melhorou muito desde a criação da Estratégia Saúde da Família, seja ampliando o acesso das populações aos serviços, seja disponibilizando uma gama maior de ações de promoção, prevenção e tratamento. Porém, muitos desafios precisam ainda ser enfrentados para alcançar mais equidade e observar, traduzidos nos indicadores de morbimortalidade, melhores resultados em saúde. Dentre esses desafios, destacam-se a valorização da APS na rede de serviços de saúde, o aumento da resolutividade da APS e o cuidado de enfocar as necessidades em saúde da população. Os serviços de emergência são ainda inadequadamente utilizados por grande parcela da população. Embora sejam as melhores portas de entrada na ocorrência de emergências, não contemplam a integralidade da atenção, a longitudinalidade do cuidado e a coordenação das ações. A cultura da busca pelo especialista e da livre demanda, próprias do modelo médico hospitalocêntrico, já é questionada. Vários países restringem o acesso a especialistas ao encaminhamento do médico da atenção primária, com repercussões positivas nos custos e na eficiência do sistema. As vantagens da longitudinalidade A longitudinalidade está associada a diversas vantagens: menor utilização de serviços de saúde, melhor cuidado preventivo, atendimentos mais precoces e adequados, menor frequência de doenças passíveis de prevenção, maior satisfação das pessoas com o atendimento e custo total mais baixo. Quando há estabilidade dos profissionais e dos serviços, observa-se com maior frequência que: • Os tratamentos instituídos são completados e são realizadas mais ações de prevenção. » há melhor utilização dos serviços de saúde pela população, que compreende e respeita os alcances e os limites das equipes de saúde. • Ocorre menor proporção de hospitalizações. » aumenta a capacidade dos profissionais em avaliar adequadamente as necessidades das pessoas; há maior integralidade do cuidado e coordenação das ações e serviços; e há maior satisfação dos usuários. A longitudinalidade é especialmente vantajosa para pessoas com doenças crônicas e em comorbidades, situações muito frequentes e que exigem da APS uma reestruturação dos serviços, cuja tradição é se organizarem para o enfrentamento de problemas agudos. Os desafios da longitudinalidade no SUS Os desafios da longitudinalidade no Brasil estão especialmente relacionados à rotatividade de profissionais nas equipes de saúde e à qualidade do registro das informações em prontuários. Longitudinalidade do cuidado (ou vínculo e responsabilização) A essência da longitudinalidade é uma relação pessoal que se estabelece ao longo do tempo, independentemente do tipo de problema de saúde ou mesmo da presença de um problema de saúde, entre indivíduos e um profissional ou uma equipe de saúde. Uma equipe de APS tem a oportunidade de acompanhar os diversos momentos do ciclo de vida dos indivíduos, de suas famílias e da própria comunidade, e assim, por meio dessa relação, conhecer as pessoas, suas famílias e comunidade, os quais, por sua vez, conhecem a equipe de saúde. O vínculo e a responsabilização contidos na proposta brasileira referem-se a esse conceito. A longitudinalidade pressupõe a existência de uma fonte regular de atenção e seu uso ao longo do tempo, o que significa uma unidade de saúde com equipes estáveis. A rotatividade de pessoal nas equipes de saúde é um fator impeditivo do alcance da longitudinalidade. A continuidade do cuidado, por outro lado, significa o acompanhamento durante um episódio de doença. Não é uma particularidade da APS, ocorrendo também nos demais níveis de atenção. Integralidade Cuidado integral é a capacidade da equipe de saúde em lidar com a ampla gama de necessidades em saúde do indivíduo, da família ou das comunidades, seja resolvendo-os, o que pode ocorrer em 85% das situações por meio da oferta de um conjunto de ações e serviços, descritos no Capítulo 3, seja referindo-se aos outros pontos de atenção à saúde, que podem ser aos cuidados secundários, terciários ou a outros setores (educação, saneamento, habitação, entre outros). A integralidade pressupõe um conceito amplo de saúde, no qual: necessidades biopsicossociais, culturais e subjetivas são reconhecidas; a promoção, a prevenção e o tratamento são integrados na prática clínica e comunitária; e a abordagem é voltada para o indivíduo, sua família e seu contexto. A integralidade depende da capacidade de identificar as necessidades percebidas e as não percebidas pelos indivíduos, da abordagem do ciclo vital e familiar e da aplicação dos conhecimentos dos diversos campos de saberes. Uma condição essencial para a integralidade é a atuação interdisciplinar das equipes de saúde, pois cotidianamente se apresentam, nas unidades de saúde e territórios das equipes de APS, situações cuja complexidade exige a intervenção coordenada de profissionais de diversas disciplinas. A condição estrutural para que a integralidade se dê é a disponibilidade de uma variedade de serviços, incluindo recursos que normalmente não são utilizados nos cuidados secundários, como visitas domiciliares, ações em organizações comunitárias (creches, clubes de mães, grupos de apoio, etc.) e articulações intersetoriais para estratégias de promoção da saúde e prevenção de doenças. Decidir quais são os serviços adequados é uma importante atividade que deve estar baseada no conhecimento das necessidades da população. As vantagens da integralidade A integralidade do cuidado está associada a mais ações de prevenção, maior adesão aos tratamentos recomendados e maior satisfação das pessoas. Os desafios da integralidade no SUS Os desafios da integralidade no Brasil estão menos relacionados ao conceito amplo de saúde e mais relacionados a problemas estruturais, que limitam a gama de serviços oferecidos, e a problemas na organização dos serviços. As vantagens da coordenação Muitas vantagens estão associadas à coordenação do cuidado: melhor identificação dos problemas de saúde; melhor adesão a tratamentos, dietas, execução de exames e consultas de encaminhamento; menos hospitalizações e menor solicitação de exames complementares. Os desafios da coordenação no SUS Esse componente da APS ainda precisa ser fortalecido no Brasil, salientando-se alguns desafios: melhora da qualidade da informação nos prontuários de saúde, para permitir que haja coordenação do cuidado dentro da equipe multidisciplinar de saúde; implantação de prontuários eletrônicos; constituição de redes de atenção, otimizando o acesso e a utilização dos demais recursos de saúde da rede, assegurando os mecanismos de comunicação, o que qualifica o cuidado (a referência e a contrarreferência); informatização dos sistemas de informações, permitindo que as informações relacionadas aos pacientes estejam disponíveis em qualquer ponto da rede de atenção à saúde.Coordenação do cuidado (ou organização das respostas ao conjunto de necessidades) Coordenação, o quarto componente, é essencial para o sucesso dos demais. Um conceito amplo de saúde permite que as várias necessidades dos indivíduos, suas famílias e comunidades sejam identificadas, e a ação de uma equipe multidisciplinar é necessária para responder a tais necessidades. Contudo, é fundamental que haja coordenação das ações/respostas. Sem coordenação, a longitudinalidade perde muito de seu potencial, a integralidade não é viável e o primeiro contato torna-se uma função puramente administrativa. A essência da coordenação é a informação − a disponibilidade de informação (sobre a pessoa, sua história, seus problemas, as ações realizadas, os recursos disponíveis, informação propiciada pelos sistemas de informação, mecanismos de transmissão da informação e comunicação) e a utilização da informação, possibilitada pela fácil obtenção das informações, por registros facilmente disponíveis, por reconhecimento de informações prévias, por mecanismos de referência e contrarreferência e recomendações escritas aos pacientes. Os desafios da coordenação estão situados em diferentes contextos: Na unidade de saúde, quando vários membros da equipe dispõem de diferentes aspectos da informação do paciente. Entre diferentes serviços, nos casos de referência e contrarreferência. Entre diferentes setores, como educação, saneamento, transporte, etc. A melhora da coordenação do cuidado é um desafio crucial para que a APS ocupe seu papel no sistema de saúde (APS como base, estrutura do sistema de saúde). 16 Informação em Saúde Laureate International Universities Primeiro contato (porta de entrada ao sistema de saúde) Significa acesso e utilização do serviço de saúde para cada novo evento de saúde ou novo episódio de um mesmo evento. Um serviço é porta de entrada quando a população e a equipe identificam-no como o primeiro recurso de saúde a ser buscado quando há uma necessidade/problema de saúde. Para isso, deve ser de fácil acesso e disponível. Se não o for, a procura será adiada, talvez a ponto de afetar negativamente o diagnóstico e o manejo do problema. O acesso tem dois componentes: a) o acesso geográfico, que envolve características relacionadas à distância e aos meios de transporte a serem utilizados para obter o cuidado; b) o acesso sócio-organizacional, que inclui aquelas características e recursos que facilitam ou impedem os esforços das pessoas em receber os cuidados de uma equipe de saúde. Por exemplo, o horário de funcionamento, a forma de marcação de consulta e a presença de longas filas podem significar barreiras ao acesso. O mesmo ocorre com: as horas de disponibilidade da unidade de saúde; a oferta de cobertura após o horário de funcionamento e a explicitação dos serviços a serem utilizados pela população quando a unidade de saúde não está disponível; a facilidade de acesso para idosos e portadores de deficiências físicas; o tempo médio gasto na sala de espera; a ausência de dificuldades com linguagem; as barreiras relacionadas a gênero; as acomodações; a aceitabilidade das diferenças culturais; a disponibilidade de brechas para consultas de emergências; o intervalo de tempo entre marcação e consulta; a disponibilidade para visitas domiciliares; a oferta de cuidados para grupos que não procuram espontaneamente o serviço; a busca ativa; etc. A organização da agenda para garantir consultas programadas permite que as ações de promoção e prevenção em saúde – como acompanhamento pré-natal e aconselhamento em doenças crônicas – sejam realizadas. A utilização dos serviços de APS pela população depende da boa resolutividade das equipes, do acolhimento, da capacidade de delimitar os recursos necessários para resolver os problemas e de uma prática baseada na pessoa (e não na doença), na família e na comunidade. As equipes de saúde da família têm inovado na busca de formas que garantam acessibilidade e maior utilização da APS como primeiro contato com o sistema de saúde. O acolhimento, a exposição de cartazes com horários de funcionamento e disponibilidade dos integrantes da equipe, os turnos vespertinos e agenda aos sábados são alguns exemplos de esforços nesse sentido. O trabalho em parceria com as comunidades para diminuir as barreiras de acesso e melhorar a utilização dos serviços é essencial. As diretrizes da Estratégia Saúde da Família buscam a ampliação do acesso e da utilização dos serviços de APS como porta de entrada ao sistema ao proporem que as unidades de saúde estejam próximo do local de moradia das pessoas, que haja vinculação populacional e a responsabilidade pelo território. As vantagens do primeiro contato A utilização de um serviço de APS como o primeiro recurso de saúde por uma determinada população traz as seguintes vantagens: • Ocorre redução dos seguintes aspectos: número de hospitalizações, tempo de permanência no hospital quando ocorre hospitalização, número de cirurgias, uso de especialistas em doenças, número de consultas para um mesmo problema e número de exames complementares. • São maiores: o número de ações preventivas, a adequação do cuidado, a qualidade do serviço prestado e a oportunidade da atenção (maior chance de que ocorra no tempo certo). • As equipes de saúde, especialistas em APS, lidam melhor com problemas de saúde em estágios iniciais, utilizando a adequada abordagem ver, esperar e acompanhar, diferente dos especialistas em doenças que, acostumados a ver problemas em fases mais adiantadas, solicitam mais exames complementares e realizam mais procedimentos. Os desafios da porta de entrada no SUS A utilização da atenção primária à saúde como porta de entrada ao sistema de saúde brasileiro melhorou muito desde a criação da Estratégia Saúde da Família, seja ampliando o acesso das populações aos serviços, seja disponibilizando uma gama maior de ações de promoção, prevenção e tratamento. Porém, muitos desafios precisam ainda ser enfrentados para alcançar mais equidade e observar, traduzidos nos indicadores de morbimortalidade, melhores resultados em saúde. Dentre esses desafios, destacam-se a valorização da APS na rede de serviços de saúde, o aumento da resolutividade da APS e o cuidado de enfocar as necessidades em saúde da população. Os serviços de emergência são ainda inadequadamente utilizados por grande parcela da população. Embora sejam as melhores portas de entrada na ocorrência de emergências, não contemplam a integralidade da atenção, a longitudinalidade do cuidado e a coordenação das ações. A cultura da busca pelo especialista e da livre demanda, próprias do modelo médico hospitalocêntrico, já é questionada. Vários países restringem o acesso a especialistas ao encaminhamento do médico da atenção primária, com repercussões positivas nos custos e na eficiência do sistema. As vantagens da longitudinalidade A longitudinalidade está associada a diversas vantagens: menor utilização de serviços de saúde, melhor cuidado preventivo, atendimentos mais precoces e adequados, menor frequência de doenças passíveis de prevenção, maior satisfação das pessoas com o atendimento e custo total mais baixo. Quando há estabilidade dos profissionais e dos serviços, observa-se com maior frequência que: • Os tratamentos instituídos são completados e são realizadas mais ações de prevenção. » há melhor utilização dos serviços de saúde pela população, que compreende e respeita os alcances e os limites das equipes de saúde. • Ocorre menor proporção de hospitalizações. » aumenta a capacidade dos profissionais em avaliar adequadamente as necessidades das pessoas; há maior integralidade do cuidado e coordenação das ações e serviços; e há maior satisfação dos usuários. A longitudinalidade é especialmente vantajosa para pessoas com doenças crônicas e em comorbidades, situações muitofrequentes e que exigem da APS uma reestruturação dos serviços, cuja tradição é se organizarem para o enfrentamento de problemas agudos. Os desafios da longitudinalidade no SUS Os desafios da longitudinalidade no Brasil estão especialmente relacionados à rotatividade de profissionais nas equipes de saúde e à qualidade do registro das informações em prontuários. Longitudinalidade do cuidado (ou vínculo e responsabilização) A essência da longitudinalidade é uma relação pessoal que se estabelece ao longo do tempo, independentemente do tipo de problema de saúde ou mesmo da presença de um problema de saúde, entre indivíduos e um profissional ou uma equipe de saúde. Uma equipe de APS tem a oportunidade de acompanhar os diversos momentos do ciclo de vida dos indivíduos, de suas famílias e da própria comunidade, e assim, por meio dessa relação, conhecer as pessoas, suas famílias e comunidade, os quais, por sua vez, conhecem a equipe de saúde. O vínculo e a responsabilização contidos na proposta brasileira referem-se a esse conceito. A longitudinalidade pressupõe a existência de uma fonte regular de atenção e seu uso ao longo do tempo, o que significa uma unidade de saúde com equipes estáveis. A rotatividade de pessoal nas equipes de saúde é um fator impeditivo do alcance da longitudinalidade. A continuidade do cuidado, por outro lado, significa o acompanhamento durante um episódio de doença. Não é uma particularidade da APS, ocorrendo também nos demais níveis de atenção. Integralidade Cuidado integral é a capacidade da equipe de saúde em lidar com a ampla gama de necessidades em saúde do indivíduo, da família ou das comunidades, seja resolvendo-os, o que pode ocorrer em 85% das situações por meio da oferta de um conjunto de ações e serviços, descritos no Capítulo 3, seja referindo-se aos outros pontos de atenção à saúde, que podem ser aos cuidados secundários, terciários ou a outros setores (educação, saneamento, habitação, entre outros). A integralidade pressupõe um conceito amplo de saúde, no qual: necessidades biopsicossociais, culturais e subjetivas são reconhecidas; a promoção, a prevenção e o tratamento são integrados na prática clínica e comunitária; e a abordagem é voltada para o indivíduo, sua família e seu contexto. A integralidade depende da capacidade de identificar as necessidades percebidas e as não percebidas pelos indivíduos, da abordagem do ciclo vital e familiar e da aplicação dos conhecimentos dos diversos campos de saberes. Uma condição essencial para a integralidade é a atuação interdisciplinar das equipes de saúde, pois cotidianamente se apresentam, nas unidades de saúde e territórios das equipes de APS, situações cuja complexidade exige a intervenção coordenada de profissionais de diversas disciplinas. A condição estrutural para que a integralidade se dê é a disponibilidade de uma variedade de serviços, incluindo recursos que normalmente não são utilizados nos cuidados secundários, como visitas domiciliares, ações em organizações comunitárias (creches, clubes de mães, grupos de apoio, etc.) e articulações intersetoriais para estratégias de promoção da saúde e prevenção de doenças. Decidir quais são os serviços adequados é uma importante atividade que deve estar baseada no conhecimento das necessidades da população. As vantagens da integralidade A integralidade do cuidado está associada a mais ações de prevenção, maior adesão aos tratamentos recomendados e maior satisfação das pessoas. Os desafios da integralidade no SUS Os desafios da integralidade no Brasil estão menos relacionados ao conceito amplo de saúde e mais relacionados a problemas estruturais, que limitam a gama de serviços oferecidos, e a problemas na organização dos serviços. As vantagens da coordenação Muitas vantagens estão associadas à coordenação do cuidado: melhor identificação dos problemas de saúde; melhor adesão a tratamentos, dietas, execução de exames e consultas de encaminhamento; menos hospitalizações e menor solicitação de exames complementares. Os desafios da coordenação no SUS Esse componente da APS ainda precisa ser fortalecido no Brasil, salientando-se alguns desafios: melhora da qualidade da informação nos prontuários de saúde, para permitir que haja coordenação do cuidado dentro da equipe multidisciplinar de saúde; implantação de prontuários eletrônicos; constituição de redes de atenção, otimizando o acesso e a utilização dos demais recursos de saúde da rede, assegurando os mecanismos de comunicação, o que qualifica o cuidado (a referência e a contrarreferência); informatização dos sistemas de informações, permitindo que as informações relacionadas aos pacientes estejam disponíveis em qualquer ponto da rede de atenção à saúde. Coordenação do cuidado (ou organização das respostas ao conjunto de necessidades) Coordenação, o quarto componente, é essencial para o sucesso dos demais. Um conceito amplo de saúde permite que as várias necessidades dos indivíduos, suas famílias e comunidades sejam identificadas, e a ação de uma equipe multidisciplinar é necessária para responder a tais necessidades. Contudo, é fundamental que haja coordenação das ações/respostas. Sem coordenação, a longitudinalidade perde muito de seu potencial, a integralidade não é viável e o primeiro contato torna-se uma função puramente administrativa. A essência da coordenação é a informação − a disponibilidade de informação (sobre a pessoa, sua história, seus problemas, as ações realizadas, os recursos disponíveis, informação propiciada pelos sistemas de informação, mecanismos de transmissão da informação e comunicação) e a utilização da informação, possibilitada pela fácil obtenção das informações, por registros facilmente disponíveis, por reconhecimento de informações prévias, por mecanismos de referência e contrarreferência e recomendações escritas aos pacientes. Os desafios da coordenação estão situados em diferentes contextos: Na unidade de saúde, quando vários membros da equipe dispõem de diferentes aspectos da informação do paciente. Entre diferentes serviços, nos casos de referência e contrarreferência. Entre diferentes setores, como educação, saneamento, transporte, etc. A melhora da coordenação do cuidado é um desafio crucial para que a APS ocupe seu papel no sistema de saúde (APS como base, estrutura do sistema de saúde). 17 Primeiro contato (porta de entrada ao sistema de saúde) Significa acesso e utilização do serviço de saúde para cada novo evento de saúde ou novo episódio de um mesmo evento. Um serviço é porta de entrada quando a população e a equipe identificam-no como o primeiro recurso de saúde a ser buscado quando há uma necessidade/problema de saúde. Para isso, deve ser de fácil acesso e disponível. Se não o for, a procura será adiada, talvez a ponto de afetar negativamente o diagnóstico e o manejo do problema. O acesso tem dois componentes: a) o acesso geográfico, que envolve características relacionadas à distância e aos meios de transporte a serem utilizados para obter o cuidado; b) o acesso sócio-organizacional, que inclui aquelas características e recursos que facilitam ou impedem os esforços das pessoas em receber os cuidados de uma equipe de saúde. Por exemplo, o horário de funcionamento, a forma de marcação de consulta e a presença de longas filas podem significar barreiras ao acesso. O mesmo ocorre com: as horas de disponibilidade da unidade de saúde; a oferta de cobertura após o horário de funcionamento e a explicitação dos serviços a serem utilizados pela população quando a unidade de saúde não está disponível; a facilidade de acesso para idosos e portadores de deficiências físicas; o tempo médio gasto na sala de espera; a ausência de dificuldades com linguagem; as barreiras relacionadas a gênero; as acomodações; a aceitabilidade das diferenças culturais; a disponibilidade de brechas para consultas de emergências;o intervalo de tempo entre marcação e consulta; a disponibilidade para visitas domiciliares; a oferta de cuidados para grupos que não procuram espontaneamente o serviço; a busca ativa; etc. A organização da agenda para garantir consultas programadas permite que as ações de promoção e prevenção em saúde – como acompanhamento pré-natal e aconselhamento em doenças crônicas – sejam realizadas. A utilização dos serviços de APS pela população depende da boa resolutividade das equipes, do acolhimento, da capacidade de delimitar os recursos necessários para resolver os problemas e de uma prática baseada na pessoa (e não na doença), na família e na comunidade. As equipes de saúde da família têm inovado na busca de formas que garantam acessibilidade e maior utilização da APS como primeiro contato com o sistema de saúde. O acolhimento, a exposição de cartazes com horários de funcionamento e disponibilidade dos integrantes da equipe, os turnos vespertinos e agenda aos sábados são alguns exemplos de esforços nesse sentido. O trabalho em parceria com as comunidades para diminuir as barreiras de acesso e melhorar a utilização dos serviços é essencial. As diretrizes da Estratégia Saúde da Família buscam a ampliação do acesso e da utilização dos serviços de APS como porta de entrada ao sistema ao proporem que as unidades de saúde estejam próximo do local de moradia das pessoas, que haja vinculação populacional e a responsabilidade pelo território. As vantagens do primeiro contato A utilização de um serviço de APS como o primeiro recurso de saúde por uma determinada população traz as seguintes vantagens: • Ocorre redução dos seguintes aspectos: número de hospitalizações, tempo de permanência no hospital quando ocorre hospitalização, número de cirurgias, uso de especialistas em doenças, número de consultas para um mesmo problema e número de exames complementares. • São maiores: o número de ações preventivas, a adequação do cuidado, a qualidade do serviço prestado e a oportunidade da atenção (maior chance de que ocorra no tempo certo). • As equipes de saúde, especialistas em APS, lidam melhor com problemas de saúde em estágios iniciais, utilizando a adequada abordagem ver, esperar e acompanhar, diferente dos especialistas em doenças que, acostumados a ver problemas em fases mais adiantadas, solicitam mais exames complementares e realizam mais procedimentos. Os desafios da porta de entrada no SUS A utilização da atenção primária à saúde como porta de entrada ao sistema de saúde brasileiro melhorou muito desde a criação da Estratégia Saúde da Família, seja ampliando o acesso das populações aos serviços, seja disponibilizando uma gama maior de ações de promoção, prevenção e tratamento. Porém, muitos desafios precisam ainda ser enfrentados para alcançar mais equidade e observar, traduzidos nos indicadores de morbimortalidade, melhores resultados em saúde. Dentre esses desafios, destacam-se a valorização da APS na rede de serviços de saúde, o aumento da resolutividade da APS e o cuidado de enfocar as necessidades em saúde da população. Os serviços de emergência são ainda inadequadamente utilizados por grande parcela da população. Embora sejam as melhores portas de entrada na ocorrência de emergências, não contemplam a integralidade da atenção, a longitudinalidade do cuidado e a coordenação das ações. A cultura da busca pelo especialista e da livre demanda, próprias do modelo médico hospitalocêntrico, já é questionada. Vários países restringem o acesso a especialistas ao encaminhamento do médico da atenção primária, com repercussões positivas nos custos e na eficiência do sistema. As vantagens da longitudinalidade A longitudinalidade está associada a diversas vantagens: menor utilização de serviços de saúde, melhor cuidado preventivo, atendimentos mais precoces e adequados, menor frequência de doenças passíveis de prevenção, maior satisfação das pessoas com o atendimento e custo total mais baixo. Quando há estabilidade dos profissionais e dos serviços, observa-se com maior frequência que: • Os tratamentos instituídos são completados e são realizadas mais ações de prevenção. » há melhor utilização dos serviços de saúde pela população, que compreende e respeita os alcances e os limites das equipes de saúde. • Ocorre menor proporção de hospitalizações. » aumenta a capacidade dos profissionais em avaliar adequadamente as necessidades das pessoas; há maior integralidade do cuidado e coordenação das ações e serviços; e há maior satisfação dos usuários. A longitudinalidade é especialmente vantajosa para pessoas com doenças crônicas e em comorbidades, situações muito frequentes e que exigem da APS uma reestruturação dos serviços, cuja tradição é se organizarem para o enfrentamento de problemas agudos. Os desafios da longitudinalidade no SUS Os desafios da longitudinalidade no Brasil estão especialmente relacionados à rotatividade de profissionais nas equipes de saúde e à qualidade do registro das informações em prontuários. Longitudinalidade do cuidado (ou vínculo e responsabilização) A essência da longitudinalidade é uma relação pessoal que se estabelece ao longo do tempo, independentemente do tipo de problema de saúde ou mesmo da presença de um problema de saúde, entre indivíduos e um profissional ou uma equipe de saúde. Uma equipe de APS tem a oportunidade de acompanhar os diversos momentos do ciclo de vida dos indivíduos, de suas famílias e da própria comunidade, e assim, por meio dessa relação, conhecer as pessoas, suas famílias e comunidade, os quais, por sua vez, conhecem a equipe de saúde. O vínculo e a responsabilização contidos na proposta brasileira referem-se a esse conceito. A longitudinalidade pressupõe a existência de uma fonte regular de atenção e seu uso ao longo do tempo, o que significa uma unidade de saúde com equipes estáveis. A rotatividade de pessoal nas equipes de saúde é um fator impeditivo do alcance da longitudinalidade. A continuidade do cuidado, por outro lado, significa o acompanhamento durante um episódio de doença. Não é uma particularidade da APS, ocorrendo também nos demais níveis de atenção. Integralidade Cuidado integral é a capacidade da equipe de saúde em lidar com a ampla gama de necessidades em saúde do indivíduo, da família ou das comunidades, seja resolvendo-os, o que pode ocorrer em 85% das situações por meio da oferta de um conjunto de ações e serviços, descritos no Capítulo 3, seja referindo-se aos outros pontos de atenção à saúde, que podem ser aos cuidados secundários, terciários ou a outros setores (educação, saneamento, habitação, entre outros). A integralidade pressupõe um conceito amplo de saúde, no qual: necessidades biopsicossociais, culturais e subjetivas são reconhecidas; a promoção, a prevenção e o tratamento são integrados na prática clínica e comunitária; e a abordagem é voltada para o indivíduo, sua família e seu contexto. A integralidade depende da capacidade de identificar as necessidades percebidas e as não percebidas pelos indivíduos, da abordagem do ciclo vital e familiar e da aplicação dos conhecimentos dos diversos campos de saberes. Uma condição essencial para a integralidade é a atuação interdisciplinar das equipes de saúde, pois cotidianamente se apresentam, nas unidades de saúde e territórios das equipes de APS, situações cuja complexidade exige a intervenção coordenada de profissionais de diversas disciplinas. A condição estrutural para que a integralidade se dê é a disponibilidade de uma variedade de serviços, incluindo recursos que normalmente não são utilizados nos cuidados secundários, como visitas domiciliares, ações em organizações comunitárias (creches, clubes de mães, grupos de apoio, etc.) e articulações intersetoriais para estratégias de promoção da saúde e prevenção de doenças. Decidir quais são os serviços adequados é uma importanteatividade que deve estar baseada no conhecimento das necessidades da população. As vantagens da integralidade A integralidade do cuidado está associada a mais ações de prevenção, maior adesão aos tratamentos recomendados e maior satisfação das pessoas. Os desafios da integralidade no SUS Os desafios da integralidade no Brasil estão menos relacionados ao conceito amplo de saúde e mais relacionados a problemas estruturais, que limitam a gama de serviços oferecidos, e a problemas na organização dos serviços. As vantagens da coordenação Muitas vantagens estão associadas à coordenação do cuidado: melhor identificação dos problemas de saúde; melhor adesão a tratamentos, dietas, execução de exames e consultas de encaminhamento; menos hospitalizações e menor solicitação de exames complementares. Os desafios da coordenação no SUS Esse componente da APS ainda precisa ser fortalecido no Brasil, salientando-se alguns desafios: melhora da qualidade da informação nos prontuários de saúde, para permitir que haja coordenação do cuidado dentro da equipe multidisciplinar de saúde; implantação de prontuários eletrônicos; constituição de redes de atenção, otimizando o acesso e a utilização dos demais recursos de saúde da rede, assegurando os mecanismos de comunicação, o que qualifica o cuidado (a referência e a contrarreferência); informatização dos sistemas de informações, permitindo que as informações relacionadas aos pacientes estejam disponíveis em qualquer ponto da rede de atenção à saúde. Coordenação do cuidado (ou organização das respostas ao conjunto de necessidades) Coordenação, o quarto componente, é essencial para o sucesso dos demais. Um conceito amplo de saúde permite que as várias necessidades dos indivíduos, suas famílias e comunidades sejam identificadas, e a ação de uma equipe multidisciplinar é necessária para responder a tais necessidades. Contudo, é fundamental que haja coordenação das ações/respostas. Sem coordenação, a longitudinalidade perde muito de seu potencial, a integralidade não é viável e o primeiro contato torna-se uma função puramente administrativa. A essência da coordenação é a informação − a disponibilidade de informação (sobre a pessoa, sua história, seus problemas, as ações realizadas, os recursos disponíveis, informação propiciada pelos sistemas de informação, mecanismos de transmissão da informação e comunicação) e a utilização da informação, possibilitada pela fácil obtenção das informações, por registros facilmente disponíveis, por reconhecimento de informações prévias, por mecanismos de referência e contrarreferência e recomendações escritas aos pacientes. Os desafios da coordenação estão situados em diferentes contextos: Na unidade de saúde, quando vários membros da equipe dispõem de diferentes aspectos da informação do paciente. Entre diferentes serviços, nos casos de referência e contrarreferência. Entre diferentes setores, como educação, saneamento, transporte, etc. A melhora da coordenação do cuidado é um desafio crucial para que a APS ocupe seu papel no sistema de saúde (APS como base, estrutura do sistema de saúde). o Relatório Dawson organizava o modelo de atenção em centros de saúde primários e secundários, serviços domiciliares, serviços suplementares e hospitais de ensino. os centros de saúde primários e os serviços domiciliares deveriam estar organizados de forma regionalizada, e a maior parte dos problemas de saúde deveria ser resolvida por médicos com formação em clínica geral. os casos que o médico não tivesse condições de solucionar com os recursos disponíveis nesse âmbito da atenção deveriam ser encaminhados para os centros de atenção secundária, em que haveria especialistas das mais diversas áreas, ou, então, para os hospitais, quando existisse indicação de internação ou cirurgia. Essa organização caracteriza-se pela hierarquização dos níveis de atenção à saúde. os serviços domiciliares de um dado distrito devem estar baseados num centro de saúde primária, uma instituição equipada para serviços de medicina curativa e preventiva a ser conduzida por clínicos gerais daquele distrito em conjunto com um serviço de enfermagem eficiente e com o apoio de consultores e especialistas visitantes. Os centros de saúde primários variam em seu tamanho e complexidade de acordo com as necessidades locais e com sua localização na cidade ou no país. Mas a maior parte deles é formada por clínicos gerais dos seus distritos, pertencendo os pacientes aos serviços chefiados por médicos de sua própria região (Ministry of Health, 1920). Essa concepção elaborada pelo governo inglês influenciou a organização dos sistemas de saúde de todo o mundo, definindo duas características básicas da APS. A primeira seria a regionalização, ou seja, os serviços de saúde devem estar organizados de forma a atender às diversas regiões nacionais, através da sua distribuição a partir de bases populacionais, e devem identificar as necessidades de saúde de cada região. A segunda característica é a integralidade, que fortalece a indissociabilidade entre ações curativas e preventivas. os elevados custos dos sistemas de saúde, o uso indiscriminado de tecnologia médica e a baixa resolutividade preocupavam a sustentação econômica da saúde nos países desenvolvidos, fazendo-os pesquisar novas formas de organização da atenção com custos menores e maior eficiência. Em contrapartida, os países pobres e em desenvolvimento sofriam com a inequidade dos seus sistemas de saúde, com a falta de acesso a cuidados básicos, com a mortalidade infantil e com as precárias condições sociais, econômicas e sanitárias. Em 1978, a organização Mundial da Saúde (oMS) e o Fundo das Nações unidas para a Infância (unicef) realizaram a I Conferência Internacional sobre Cuidados primários de Saúde em alma-ata, no Cazaquistão, na antiga união Soviética, e propuseram um acordo e uma meta entre seus países-membros para atingir o maior nível de saúde possível até o ano 2000, através da APS. Essa política internacional ficou conhecida como Saúde para Todos no Ano 2000. A Declaração de alma-ata, como foi chamado o pacto assinado entre 134 países, defendia a seguinte definição de APS, aqui denominada cuidados primários de saúde: 18 Informação em Saúde Laureate International Universities “Os cuidados primários de saúde são cuidados essenciais de saúde baseados em métodos e tecnologias práticos, cientificamente bem-fundamentados e socialmente aceitáveis, colocados ao alcance universal de indivíduos e famílias da comunidade, mediante sua plena participação e a um custo que a comunidade e o país possam manter em cada fase de seu desenvolvimento, no espírito de autoconfiança e autodeterminação. Fazem parte integrante tanto do sistema de saúde do país, do qual constituem a função central e o foco principal, quanto do desenvolvimento social e econômico global da comunidade. Representam o primeiro nível de contato dos indivíduos, da família e da comunidade com o sistema nacional de saúde, pelo qual os cuidados de saúde são levados o mais proximamente possível aos lugares onde pessoas vivem e trabalham, e constituem o primeiro elemento de um continuado processo de assistência à saúde.” (Opas/OMS, 1978) No que diz respeito à organização da apS, a Declaração de alma-ata propõe a instituição de serviços locais de saúde centrados nas necessidades de saúde da população e fundados numa perspectiva interdisciplinar envolvendo médicos, enfermeiros, parteiras, auxiliares e agentes comunitários, bem como a participação social na gestão e controle de suas atividades. o documento descreve as seguintes ações mínimas, necessárias para o desenvolvimento da apS nos diversos países: educação em saúde voltada para a prevenção e a proteção; distribuição de alimentos e nutrição apropriada; tratamento da água e saneamento; saúde materno-infantil;
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