Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
UNIVERSIDADE VEIGA DE ALMEIDA FACULDADE DE DIREITO HERMENÊUTICA JURÍDICA PROF. JOSEMAR ARAÚJO – josemar@josemararaujo.com FOLHA DE APOIO 01 A hermenêutica e a Interpretação No mundo do Direito, hermenêutica e interpretação constituem um dos muitos exemplos de relacionamento entre princípios e aplicações. Enquanto que a hermenêutica é teórica e visa a estabelecer princípios, critérios, métodos, orientação, a interpretação é de cunho prático, aplicando os ensinamentos da hermenêutica. Não se confundem, pois, os dois conceitos apesar de ser muito frequente o emprego indiscriminado de um e de outro. A interpretação aproveita os subsídios da hermenêutica. A hermenêutica descobre e fixa os princípios que regem a interpretação. O Princípio "In Claris Cessat Interpretatio" Outrora, vigorava o princípio in claris cessat interpretatio. Pensavam os juristas antigos que um texto bem redigido e claro dispensava a tarefa do intérprete. Havia a ideia errônea de que o papel do intérprete era o de "torcer o significado das normas", para colocá-las de acordo com o interesse do momento. Napoleão Bonaparte, que nutria insatisfação para com os advogados, tendo, inclusive, fechado a "Ordem dos Advogados da França" por vinte anos, autorizando a sua reabertura apenas em 1810, quando soube que o Código Civil da França estava sendo interpretado pelos juristas, exclamou: "O meu Código está perdido". É bem verdade que este princípio ganhou força a partir da Escolástica, uma vez que o seu método de criar distinções e subdistinções impregnou a hermenêutica de sutilezas de raciocínio, até reduzi-la a um complexo de casuísmos. Para restabelecer a certeza do Direito e com isto a segurança, surgiu na hermenêutica, o princípio in claris non fit interpretatio, Concebia-se assim que o trabalho do intérprete era necessário apenas quando as leis fossem obscuras. A Inconsistência do Princípio Paulo Nader destaca que A inconsistência do princípio se revela a partir do conceito de clareza da lei, que é relativo, pois os textos são claros para alguns e oferecem dúvidas para outros. Por outro lado, a conclusão de clareza da lei já implica um trabalho de interpretação. Há situações normativas que exigem maior ou menor esforço do intérprete, para descobrir a mens legis. Às vezes, pelo simples exame gramatical do texto, revelam-se espontaneamente o sentido e o alcance das normas jurídicas. Outras vezes, porém, o aplicador do Direito tem de desenvolver fecundo trabalho de investigação, recorrendo aos diversos subsídios oferecidos pela hermenêutica. Outros autores, ao considerar que cessar é interromper, não continuar, pensam que o princípio não exclui a interpretação, Importância da Hermenêutica A hermenêutica estuda e sistematiza os critérios aplicáveis na interpretação das regras jurídicas. O magistrado não pode julgar um processo sem antes interpretar as normas reguladoras da questão. Além de conhecer os fatos, precisa conhecer o Direito, para revelar o sentido e o alcance das normas aplicáveis. O empresário, na gestão de seus negócios, não pode descurar do conhecimento do Direito. Orientado por seus assessores, descobre, em cada nova lei, a verdadeira mensagem do legislador. Também o cidadão necessita conhecer o Direito, para bem cumprir as suas obrigações e reivindicar os seus direitos. A Interpretação A palavra interpretação possui amplo alcance, não se limitando à Dogmática Jurídica. Interpretar é o ato de explicar o sentido de alguma coisa; é revelar o significado de certa expressão verbal, artística, entre outras, constituída por um objeto, atitude ou gesto. A interpretação consiste na busca do verdadeiro sentido das coisas e para isto o espírito humano lança mão de diversos recursos, analisa os elementos, utiliza-se de conhecimentos da lógica, psicologia e, muitas vezes, de conceitos técnicos, a fim de penetrar no âmago das coisas e identificar a mensagem contida. Todo objeto cultural, sendo obra humana, está impregnado de significados, que impõem interpretação. A primeira observação em um quadro de pintura moderna geralmente não é suficiente para descobrir-se a mensagem de seu autor. Parece um amontoado desconexo de traços e figuras. A nossa maior atenção, contudo, leva-nos a dissipar a primeira impressão, e aquilo que era confuso já revela o seu significado. O trabalho do intérprete é o de decodificar e, para isto, percorre inversamente o caminho seguido pelo codificador. Como todo objeto cultural, o Direito encerra significados: interpretar o Direito representa revelar o seu sentido e alcance. O trabalho de interpretação do Direito é uma atividade que tem por escopo levar ao espírito o conhecimento pleno das expressões normativas, a fim de aplicá-lo às relações sociais. Interpretar o Direito ' revelar o sentido e o alcance dessas expressões. Fixar o sentido de uma norma jurídica é descobrir a sua finalidade, é pôr a descoberto os valores consagrados pelo legislador, aquilo que teve por mira proteger. Fixar o alcance é demarcar o campo de incidência da norma jurídica, é conhecer sobre que fatos sociais e em que circunstâncias a norma jurídica tem aplicação. Normas Passíveis de Interpretação Toda norma jurídica pode ser objeto de interpretação. Não apenas a lei é interpretável, não apenas o Direito escrito, mas toda forma de experiência jurídica. Assim, a norma costumeira, a jurisprudência, os princípios gerais de Direito devem ser interpretados, para se esclarecer o seu real significado e o alcance de suas determinações. A hermenêutica jurídica não se ocupa apenas das regras jurídicas genéricas. Fornece também princípios e regras aplicáveis na interpretação das sentenças judiciais e negócios jurídicos. A interpretação pode apenas esclarecer, como é próprio da doutrina. Norma Jurídica Miguel reale afirma que “a norma jurídica é uma estrutura proposicional porque o seu conteúdo pode ser enunciado mediante uma ou mais proposições entre si correlacionadas, sendo certo que o significado pleno de uma regra jurídica só é dado pela integração lógico-complementar das proposições que nela se contêm.” Afirma que uma norma jurídica enuncia um dever ser porque nenhuma regra descreve algo que é, mesmo quando, para facilidade de expressão, empregamos o verbo ser. E exemplifica ao considerar que a Constituição declara que o Brasil é uma República Federativa, mas é evidente que a República não é algo que esteja aí, diante de nós, como uma árvore ou uma placa de bronze: aquela norma enuncia que "o Brasil deve ser organizado e compreendido como uma República Federativa". Esta, por sua vez, só tem sentido enquanto se ordena e se atualiza através de um sistema de disposições que traçam os âmbitos de ação e de competência que devem ser respeitados pelos poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios. Principais Tipos de Normas A primeira distinção que se impõe é entre normas de organização e normas de conduta. São chamadas normas de conduta as regras de direito cujo objetivo imediato é disciplinar o comportamento dos indivíduos, ou as atividades dos grupos e entidades sociais em geral; enquanto que as normas de organização possuem um caráter instrumental, visando à estrutura e funcionamento de órgãos, ou à disciplina de processos técnicos de identificação e aplicação de normas, a fim de assegurar uma convivência juridicamente ordenada. Cabe destacar que as regras de conduta são propriamente aquelas que têm os indivíduos como seus destinatários. É com referência a essas normas que podemos dizer que, do ponto de vista lógico, elas se estruturam como juízos hipotéticos, segundo o seguinte esquema: Se F é, C deve ser. No concernente a esse tipo denormas jurídicas cabe observar, inicialmente, que elas se estruturam de maneira binada, articulando logicamente dois elementos que podem ser chamados dispositivo (ou preceito) e sanção (ou sanção penal). Então, relativamente a essas regras de conduta, Reale afirma que Podemos, por conseguinte, dizer que, levando-se em conta a correlação essencial desses dois aspectos, toda a regra jurídica de conduta se desdobra em duas normas que se conjugam e se complementam, a saber: Se F é, C deve ser; Se não-C, SP deve ser. Normativismo Concreto Como se vê, há no modelo normativo a previsão de um fato ou de um complexo fático (F), que é a base necessária à formulação da hipótese, da qual resultará uma consequência (C). Se, por outro lado, se enuncia dada consequência, declarando-a obrigatória, é sinal que se pretende atingir um objetivo, realizando-se algo de valioso, ou impedindo a ocorrência de valores negativos. Finalmente, essa correlação entre fato e valor se dá em razão de um enlace deôntico, isto é, em termos lógicos de dever ser, com que se instaura a norma. Desse modo, verifica-se que o momento lógico expresso pela proposição hipotética, ou a forma da regra jurídica, é inseparável de sua base fática e de seus objetivos axiológicos: fato, valor e forma lógica compõem-se, em suma, de maneira complementar, dando-nos, em sua plenitude, a estrutura lógico-fático- axiológica da norma de direito. Quando, pois, dizemos que o Direito se atualiza como fato, valor e norma, é preciso tomar estas palavras significando, respectivamente, os momentos de referência fática, axiológica e lógica que marcam o processus da experiência jurídica, o terceiro momento representando a composição superadora dos outros dois, nele e por ele absorvidos e integrados. Fonte: NADER, Paulo. Introdução ao Estudo do Direito. 26. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2012. REALE, Miguel. Lições preliminares de direito. São Paulo: Saraiva, 2002.
Compartilhar