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FACULDADE DOM ALBERTO CURSO DE DIREITO TRABALHO ACADEMICO DE DIREITO CONSTITUCIONAL I Halana Schwantes Luz Santa Cruz do Sul, setembro de 2017 ATIVIDADE ACADEMICA Trabalho apresentado a disciplina de Direito Constitucional l do curso de Direito da Faculdade Dom Alberto. Como requisito parcial para aprovação na disciplina. Professor (a) orientador (a): Adam Hasselmann Teixeira Santa Cruz do Sul, setembro de 2017 RAZÕES CONTRA O FINANCIAMENTO PUBLICO DE CAMPANHAS ELEITORAIS Introdução A discussão acerca do financiamento de campanhas eleitorais é importante para se compreender os limites da nossa democracia e buscar formas de aprimorá-la e assim garantir a igualdade de representação entre todos os cidadãos. A influência do poder econômico nas eleições é uma grave fonte de distorção geradora de resultados onde na maioria das vezes os representantes eleitos são aqueles com maior financiamento empresarial. Contudo apesar de prevista sua regulamentação, as campanhas eleitorais no Brasil continuam a cada ano mais caras e a influência do poder econômico é regra sobre os candidatos eleitos. Com base nisso, em setembro de 2011 a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) deu entrada no Supremo Tribunal Federal (STF) com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) sobre o financiamento empresarial de campanhas eleitorais. Em abril de 2014 iniciou-se a votação e seis ministros votaram a favor da inconstitucionalidade da doação de empresas às campanhas eleitorais, apesar de já constituída maioria, o Ministro Gilmar Mendes pediu vista e travou o processo, mesmo com intensas manifestações da sociedade civil pelo seu prosseguimento, só em setembro de 2015 a votação foi concluída com a declaração de inconstitucionalidade dos dispositivos legais que autorizavam as contribuições de pessoas jurídicas às campanhas eleitorais. A inconstitucionalidade do financiamento empresarial de campanhas ganha ainda mais relevância com o cenário atual da política brasileira. A operação Lava Jato e os absurdos jurídicos e políticos do processo de impeachment revelam um sistema político caótico. Na Operação Lava Jato ficaram nítidas as relações entre as massivas doações para campanhas eleitorais por parte das empreiteiras e os benefícios econômicas que as mesmas recebiam dos políticos eleitos com seu financiamento. Tais empresas dependem da atuação do poder público para obter seus lucros e financiam as campanhas visando seu favorecimento. O Problema do Financiamento Empresarial de Campanhas É recorrente em qualquer sociedade democrática a discussão sobre os formatos e as regras do próprio sistema democrático, e isso se deve ao fato de que a depender do enquadramento institucional, diferentes grupos são beneficiados na sua representatividade política. Sendo assim toda democracia vulnerável à interesses políticos que se utilizam de brechas para perpetuar-se no poder e que buscam evitar qualquer mudança que retorne à capacidade de escolha legítima à maioria da população. Dentre os diversos temas da Reforma Política, a questão do financiamento das campanhas é uma das que mais possui relevância social e que desperta as maiores polêmicas. Na sociedade capitalista em que vivemos, a distribuição de renda e de riqueza é profundamente desigual e isso afeta diretamente as oportunidades garantidas a cada cidadão e o resultado do pleito eleitoral. Para além dessa desigualdade financeira, é especialmente problemática a relação que as grandes empresas possuem com as eleições. Mesmo não podendo ser votadas, quando se excluem as doações feitas pelos próprios candidatos à sua campanha, as doações provenientes de empresas corresponderam a 98% do total na campanha de 20104. Esse disparte é ainda mais problemático por levar em consideração que as empresas podem não estar agindo pelo que acreditam ser o melhor para a sociedade, mas sim com base no que trouxer mais lucro para seus negócios. Nas campanhas eleitorais, um maior aporte financeiro significa maior capacidade de produção de material impresso como panfletos e placas, maior capacidade de contratar empresas de pesquisa de público e produção de conteúdo de mídia e, sobretudo, a capacidade de contratar equipes de campanha e cabos eleitorais para atingir um maior número de eleitores. Dessa forma, é criado um movimento onde as campanhas eleitorais são decididas cada vez mais com recursos financeiros se tornando, em média, cada vez mais caras. Em seu voto na ADI 4650/2011 o ministro Luiz Fux apresentou que o gasto per capita das eleições no Brasil são maiores até mesmo que o de países desenvolvidos. Segundo dados utilizados por ele, apresentados na audiência pública sobre a ADI 4650 se gasta hoje $10,93 por pessoa em campanhas eleitorais em nosso país, contra $2,21 na Alemanha, $0,77 no Reino Unido e irrisórios $0,45 na França. No ranking organizado pela comparação com o Produto Interno Bruto também nos encontramos no topo, sendo que 0,89% de todas as riquezas geradas em nosso país são usadas em campanhas. Materializando esses dados podemos compreender melhor a barreira monetária que deve ser ultrapassada para eleger-se no Brasil. Nas eleições de 2010 o custo médio de uma campanha vitoriosa foi de mais de1,1 milhões de reais para a Câmara de Deputados e mais de 4 milhões de reais para o Senado Federal, já para se tornar governador, o gasto médio foi de 23 milhões, sendo que uma campanha presidencial custaria em torno de 300 milhões de reais. Isso tudo se consolida num processo eleitoral enviesado em favor daqueles candidatos que possuem mais recursos, sobretudo provenientes de empresas. Em seu estudo sobre o financiamento de campanhas, Sarmento percebe que existe um padrão das eleições ficarem cada vez mais caras e dos candidatos com maior financiamento serem eleitos. O caso ainda mais importante é a questão das empreiteiras, estas muitas vezes dependem das licitações de obras estatais para atuar e, visando maximizar seu lucro, fazem doações massivas aos candidatos, com o intuito de posteriormente garantir contratos e influenciar políticas públicas que as favoreçam. A Operação Lava-Jato explicitou inúmeras dessas relações desonestas: segundo dados em 2012 das dez maiores doadoras para os diretórios partidários seis eram construtoras. Assim então política deixa de ser a arte de ouvir os anseios da população, ser eleito com um programa popular e governar para o povo. Ao invés disso, os políticos passam a pensar a política nacional como desejam as empresas financiadoras de campanha. Sarmento assim coloca: ‘’aqueles que não se adaptam ao jogo, não se elegem’’. Com efeito, tal quadro empírico dá ensejo a graves distorções produzidas pela excessiva infiltração do poder econômico no meio político. Em primeiro lugar, do ponto de vista dos candidatos, o resultado mais diretoé o desestímulo a candidaturas de indivíduos desprovidos de recursos próprios e de “contatos” com o mundo empresarial, através dos quais pudessem arrecadar os fundos necessários para entrar na disputa. Por essa lógica, cidadãos comuns simplesmente não têm condições de se eleger. Além disso, como, de um lado, as doações de campanha provêm em sua quase totalidade de grandes empresas e de indivíduos muito ricos e, de outro, o volume de recursos arrecadados influi diretamente sobre as chances de eleição, os candidatos que representam os interesses do empresariado e das classes mais elevadas têm uma vantagem desproporcional na corrida eleitoral. Considerando-se a totalidade das candidaturas, conclui-se que o financiamento de campanhas é uma das bases de sustentação de um sistema que transforma o poder econômico em poder político e sequestra a representatividade democrática do povo para colocar no poder os representantes dos interesses político-econômicos das empresas. Os argumentos constitucionais O primeiro princípio a ser utilizado em favor da inconstitucionalidade é o Princípio Democrático, que baseia todos os outros argumentos ao expressar o povo como fundamento do poder político, no parágrafo único do artigo 1° que destaca: “Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição”. Dessa forma, compreendendo que a soberania popular é a única base aceita constitucionalmente para o poder político, percebe-se que tal pratica e sua perversa influência nas campanhas eleitorais está evidentemente em desacordo com as premissas de nossa constituição. Pois se as empresas não votam, não poderiam fazer doações, então as pessoas jurídicas, entidades artificiais a quem o direito empresta personalidade jurídica, não são titulares dos mesmos direitos atribuídos a pessoas naturais. Isso significa que os direitos políticos não são a elas aplicados, pois não constituem parte da soberania popular. O segundo princípio é princípio da igualdade que tem por finalidade garantir o mesmo peso do voto de cada cidadão. Ressaltasse que a dimensão de igualdade concebida pela constituição de 1988 não se dá apenas no voto, mas na capacidade de influir no processo eleitoral sem distinção de fatores sociais. O princípio da igualdade política, por sua vez, além de estar previsto de forma genérica no caput do art. 5 o da Carta de 1988, encontra-se consagrado em seu art. 14, que prevê que o voto deve ter “valor igual para todos. ” E por último seguido dos princípios democrático e da isonomia, o princípio republicano é outro potente argumento contrário ao financiamento eleitoral por parte de empresas. Está presente no núcleo essencial da nossa constituição, logo no art. 1°, e não diz apenas sobre a forma de governo, mas também da forma como a res publica, ou “coisa pública”, deve ser gerida. Os efeitos do financiamento empresarial de campanhas por parte de empresas chocam-se diretamente com o princípio republicano. Conforme Barroso em seu voto: ‘’ a ideia de República está associada à circunstância de que os agentes públicos, os administradores, gerem alguma coisa que não lhes pertence; é uma coisa pública, algo que pertence à coletividade. E o pacto que muitas vezes se faz, por conta do sistema eleitoral brasileiro, entre esses agentes políticos responsáveis pela gestão pública e os interesses privados que participam do processo eleitoral compromete este caráter republicano, reforçando a pior tradição brasileira de patrimonialismo, essa nossa tradição ibérica, essa tradição de um modelo de Estado que não separava a fazenda do rei da fazenda do reino, e consequentemente não distinguia adequadamente o público do privado. Estes princípios (democrático, igualitário e republicano) orientam os argumentos pela inconstitucionalidade do financiamento empresarial de campanhas eleitorais. Salienta-se que a própria constituição não apenas os elenca como expressa sua direção no sentido de reduzir o impacto da influência do poder econômico nas eleições. Considerações finais Por fim percebe-se que as democracias modernas se deparam cada vez mais com o desafio de conciliar o financiamento de partidos políticos e campanhas eleitorais com o respeito aos valores básicos de democracias e justiça, e dentre as questões problemáticas está a de assegurar ‘’ a igualdade dos cidadãos na decisão eleitoral, a liberdade de eleição dos eleitores, a independência dos representantes em relação a pressões externas e seu compromisso como bem comum’’ (SPECK, 2004ª, p1; 2003ª, p1). O financiamento político, apesar de ser necessário para que a democracia representativa se verifica de maneira satisfatória, pode colocar estes valores democráticos em risco, caso o dinheiro tenha valor decisivo no processo eleitoral pois, aqueles com maior poder aquisitivo e consequentemente maior capacidade de contribuir com altos valores terão seus interesses levados em conta com maior frequência por parte dos governantes e se os candidatos eleitos dependerem de seus financiadores a autonomia no exercício do mandato será ameaçada. O financiamento político, uma das estratégias utilizadas para fazer valer seus interesses apesar de necessária, pode trazer sérios riscos ao valor equitativo das liberdades, desviando-se muitas vezes para o terreno da corrupção. Referencias SARMENTO, Daniel; OSÓRIO, Aline. ELEIÇÕES, DINHEIRO E DEMOCRACIA: a ADI 4.650 e o modelo brasileiro de financiamento de campanhas eleitorais. CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 3.ed. Coimbra: Almedina, 1999. BARROSO, Luís Roberto. Curso de Direito Constitucional Contemporâneo - 5ª Ed. 2015 https://jus.com.br/artigos/44592/as-doacoes-para-as-campanhas-eleitorais. Acesso em: 21 setembro 2017 NICOLAU, Jairo Marconi. Eleições No Brasil - do Império Aos Dias Atuais. Zahar, 2012 RUBIO, Delia F. (2005). ‘’Financiamento de partidos e campanhas – fundos públicos versus fundos privados’’ in Novos Estudos Cabrap, São Paulo SPECK, Bruno W. (2006) ‘’ O financiamento de campanhas eleitorais’’ in AVRITZER, Leonardo & ANASTASIA, Fatima, Reforma Política no Brasil.
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