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UNIDADE IV – DAS ESTIPULAÇÕES CONTRATUAIS EM RELAÇÃO A TERCEIROS 1. OBSERVAÇÕES INICIAIS. 2. ESTIPULAÇÃO EM FAVOR DE TERCEIRO. 3. PROMESSA DE FATO DE TERCEIRO: NATUREZA JURÍDICA, EXCLUSÃO DE RESPONSABILIDADE, INOVAÇÃO DO CÓDIGO DE 2002. 4. CONTRATO COM PESSOA A DECLARAR. DISTINÇÃO PARA A CESSÃO DE CONTRATO 1. OBSERVAÇÕES INICIAIS A presente unidade trata de mitigações ao princípio da relatividade subjetiva dos efeitos dos contratos estudado na unidade I. Estudaremos a partir de agora: a) Estipulação em favor de terceiros; b) Promessa de fato de terceiro; c) Contrato com pessoa a declarar. 2. ESTIPULAÇÃO EM FAVOR DE TERCEIROS Trata-se de um contrato, em que uma parte convenciona [ESTIPULANTE] com o devedor [PROMITENTE] que este deverá realizar determinada prestação em benefício de outrem [TERCEIRO/BENEFICIÁRIO], alheio à relação jurídica-base. O exemplo clássico citado pela doutrina é o contrato de seguro de vida, o qual será analisado com mais detalhes no momento adequado. Nesse tipo de contrato, uma vez verificada a contingência coberta pelo pacto (a morte do estipulante), a seguradora (promitente) será obrigada a pagar a terceiro (beneficiário), o valor devido a título de indenização. De acordo com o CCB: Art. 436. O que estipula [ESTIPULANTE] em favor de terceiro pode exigir o cumprimento da obrigação [DO PROMITENTE]. (SEM ANOTAÇÕES NO ORIGINAL) Parágrafo único. Ao terceiro, em favor de quem se estipulou a obrigação, também é permitido exigi-la, ficando, todavia, sujeito às condições e normas do contrato, se a ele anuir, e o estipulante não o inovar nos termos do art. 438. Observe que nesse caso, o terceiro, não obstante esteja fora da relação contratual- base, passará a ser credor do promitente. Observe-se, ainda, que a validade da estipulação não depende da anuência ou concordância do o beneficiário, mas sua eficácia sim. A partir do momento em que o beneficiário anuir, poderá exigir a prestação que foi estipulada em seu favor, contudo, nos termos da estipulação. A anuência do beneficiário, segundo Pablo Stolze e Rodolfo Pamplona Filho, deve ser expressa. Em sentido contrário, Maria Helena Diniz (2012, p. 129). JURISPRUDÊNCIA RELACIONADA AGRAVO REGIMENTAL. PLANO DE SAÚDE. REAJUSTE DE MENSALIDADE EM RAZÃO DE MUDANÇA DE FAIXA ETÁRIA. OMISSÃO DO ACÓRDÃO RECORRIDO. INEXISTÊNCIA. BENEFICIÁRIO. LEGITIMIDADE ATIVA. CLÁUSULA CONSIDERADA ABUSIVA. 1. Consoante dispõe o artigo 535 do CPC, destinam-se os Embargos de Declaração a expungir do julgado eventuais omissão, obscuridade ou contradição, não se caracterizando via própria ao rejulgamento da causa. 2. Ainda que o plano de saúde seja contratado por intermédio de terceiro, que é o estipulante, o beneficiário é o destinatário final do serviço, sendo portanto, parte legítima para figurar no polo ativo de ação que busque discutir a validade das cláusulas do contrato. 3. Desse modo, considerando que na estipulação em favor de terceiro, tanto o estipulante quanto o beneficiário podem exigir do devedor o cumprimento da obrigação (CC, art. 436, parágrafo único), não há que se falar, no caso, na necessidade de suspensão do presente feito até o julgamento final da ação proposta pela estipulante em nome de todos os contratados. 4. A jurisprudência deste Tribunal consagrou o entendimento de ser abusiva a cláusula contratual que prevê o reajuste da mensalidade de plano de saúde com base exclusivamente em mudança de faixa etária, mormente se for consumidor que atingir a idade de 60 anos, o que o qualifica como idoso, sendo vedada, portanto, a sua discriminação. 5. Agravo Regimental improvido. (AgRg no REsp 1336758/RS, Rel. Ministro SIDNEI BENETI, TERCEIRA TURMA, julgado em 20/11/2012, DJe 04/12/2012) _________________________ CIVIL E PROCESSO CIVIL. RECURSO ESPECIAL. INDENIZAÇÃO SECURITÁRIA. AÇÃO PROPOSTA DIRETAMENTE EM FACE DA SEGURADORA SEM QUE O SEGURADO FOSSE INCLUÍDO NO POLO PASSIVO. LEGITIMIDADE. 1. A interpretação de cláusula contratual em recurso especial é inadmissível. Incidência da Súmula 5/STJ. 2. Inexiste ofensa ao art. 535 do CPC, quando o tribunal de origem pronuncia-se de forma clara e precisa sobre a questão posta nos autos. 3. A interpretação do contrato de seguro dentro de uma perspectiva social autoriza e recomenda que a indenização prevista para reparar os danos causados pelo segurado a terceiro seja por este diretamente reclamada da seguradora. 4. Não obstante o contrato de seguro ter sido celebrado apenas entre o segurado e a seguradora, dele não fazendo parte o recorrido, ele contém uma estipulação em favor de terceiro. E é em favor desse terceiro - na hipótese, o recorrido - que a importância segurada será paga. Daí a possibilidade de ele requerer diretamente da seguradora o referido pagamento. 5. O fato de o segurado não integrar o polo passivo da ação não retira da seguradora a possibilidade de demonstrar a inexistência do dever de indenizar. 6. Recurso especial conhecido em parte e, nessa parte, não provido. (REsp 1245618/RS, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 22/11/2011, DJe 30/11/2011) Art. 437. Se ao terceiro, em favor de quem se fez o contrato, se deixar o direito de reclamar-lhe a execução, não poderá o estipulante exonerar o devedor. Portanto, a princípio, o estipulante tem o direito de exonerar o promitente do cumprimento da obrigação, salvo se o contrato previr cláusula atribuindo ao beneficiário o direito de exigir o cumprimento da obrigação, de modo que a estipulação será irrevogável. Art. 438. O estipulante pode reservar-se o direito de substituir o terceiro designado no contrato, independentemente da sua anuência e da do outro contratante. Parágrafo único. A substituição pode ser feita por ato entre vivos ou por disposição de última vontade. A possibilidade de substituição do terceiro, segundo Carlos Roberto Gonçalves (2004, p.100), não depende de cláusula contratual específica nem tampouco da anuência deste ou do promitente, sendo bastante uma declaração feita inter vivos ou disposição de última vontade, inserida num testamento, por exemplo. Stolze e Pamplona Filho (2009, p.110), por sua vez, entendem que “a faculdade de substituição do beneficiário deve estar expressa no contrato”. Deve-se observar, contudo, que apesar da faculdade que esta regra garante ao estipulante, este não está isento do cumprimento dos deveres anexos da Boa-Fé objetiva, devendo, por isso, comunicar ao terceiro sua substituição. Dito de outro modo, caso o estipulante opte por substituir o terceiro beneficiário, este deve ser comunicado, a fim de que tome conhecimento do fato, podo termo às expectativas que tenham sido criadas. 3. PROMESSA DE FATO DE TERCEIRO ou CONTRATO POR OUTREM É o estabelecimento de uma declaração de vontade na afirmação da realização de um ato por terceiro. A prestação, nesse caso, é exigida de um terceiro, o qual está fora da relação contratual-base e não do estipulante, restando flexibilizado, uma vez mais, o princípio da relatividade subjetiva dos contratos. Art. 439. Aquele que tiver prometido fato de terceiro responderá por perdas e danos, quando este o não executar. Parágrafo único. Tal responsabilidade não existirá se o terceiro for o cônjuge do promitente, dependendo da sua anuência o ato a ser praticado, e desde que, pelo regime do casamento, a indenização, de algum modo, venha a recair sobre os seus bens. A pessoa que se vincula é o que promete. Isso porque ninguém pode vincular terceiroa uma obrigação (Gonçalves, 2004, p.102). Aquele que prometeu, assegura o cumprimento da prestação prometida, devendo, em razão disso, ter a prudência de obter previamente do terceiro, a devida concordância. A situação ora analisada só se verifica na prática, se a pessoa que prometeu não agiu como mandatária do terceiro, hipótese em que, na verdade, estaria representando este último. A regra do parágrafo único visa proteger o cônjuge dos desatinos do outro. Assim, quando o promitente estipular que seu cônjuge realizará determinada prestação, deverá fazê-lo com a anuência deste. Além disso, essa promessa não poderá ser realizada, quando os bens do casal puderem ser atingidos em razão do descumprimento da promessa pelo terceiro. Seria o caso de o marido prometer que sua esposa (com a qual é casado sob o regime da comunhão universal ou parcial de bens) irá anuir com a venda de um imóvel adquirido na constância do seu casamento. Nesse caso, se sua esposa não concordar com a venda, eventual reparação de danos imposta ao seu marido recairá sobre o patrimônio do próprio casal, o que seria uma incongruência. Por isso a lei determina que, em situações como essa, não haverá responsabilidade do promitente. JURISPRUDÊNCIA RELACIONADA DIREITO CIVIL. SHOPPING CENTER. INSTALAÇÃO DE LOJA. PROPAGANDA DO EMPREENDIMENTO QUE INDICAVA A PRESENÇA DE TRÊS LOJAS-ÂNCORAS. DESCUMPRIMENTO DESSE COMPROMISSO. PEDIDO DE RESCISÃO DO CONTRATO. 1. Conquanto a relação entre lojistas e administradores de Shopping Center não seja regulada pelo CDC, é possível ao Poder Judiciário reconhecer a abusividade em cláusula inserida no contrato de adesão que regula a locação de espaço no estabelecimento, especialmente na hipótese de cláusula que isente a administradora de responsabilidade pela indenização de danos causados ao lojista. 2. A promessa, feita durante a construção do Shopping Center a potenciais lojistas, de que algumas lojas-âncoras de grande renome seriam instaladas no estabelecimento para incrementar a frequência de público, consubstancia promessa de fato de terceiro cujo inadimplemento pode justificar a rescisão do contrato de locação, notadamente se tal promessa assumir a condição de causa determinante do contrato e se não estiver comprovada a plena comunicação aos lojistas sobre a desistência de referidas lojas, durante a construção do estabelecimento. 3. Recurso especial conhecido e improvido. (REsp 1259210/RJ, Rel. Ministro MASSAMI UYEDA, Rel. p/ Acórdão Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 26/06/2012, DJe 07/08/2012). _______________________ RECURSO ESPECIAL. DIREITO DE ARENA. CONTRATOS. CLÁUSULA DE EXCLUSIVIDADE. DOIS PACTOS. VALIDADE. SUBSISTÊNCIA DA SEGUNDA AVENÇA, DIANTE DA RESOLUÇÃO DO PRIMEIRO CONTRATO, POR INADIMPLEMENTO. PROMESSA DE FATO DE TERCEIRO. OBRIGAÇÃO DE RESULTADO. INADIMPLEMENTO. RESPONSABILIDADE. PERDAS E DANOS. LESÃO. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULAS 282 e 356/STF. AUSÊNCIA DE INDICAÇÃO DE DISPOSITIVO DE LEI. SÚMULA 284/STF. CLÁUSULA PENAL. REDUÇÃO. INVIABILIDADE. REEXAME DE PROVAS. SÚMULA 7/STJ. INADIMPLEMENTO TOTAL DO CONTRATO. TERCEIRO QUE NÃO ANUIU. AUSÊNCIA DE RESPONSABILIDADE. INDENIZAÇÃO. DÓLAR. CONVERSÃO PARA REAIS DE ACORDO COM O CÂMBIO DA DATA DA SENTENÇA. INVIABILIDADE DE ANÁLISE DA MATÉRIA À LUZ DOS ARTIGOS APONTADOS COMO VIOLADOS. SÚMULA 284/STF. DECISÃO EXTRA PETITA. NÃO OCORRÊNCIA. FUNDAMENTOS DIVERSOS. POSSIBILIDADE. CONTEÚDO NORMATIVO DO ART. 918 DO CC/1916. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULA 211/STJ. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. CORREÇÃO DE PREMISSA EQUIVOCADA. EFEITOS INFRINGENTES. POSSIBILIDADE. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. FIXAÇÃO COM BASE NO ART. 20, §4º, DO CPC. BASE DE CÁLCULO. VALOR DA CAUSA. POSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE INSIGNIFICÂNCIA OU EXAGERO A JUSTIFICAR A ATUAÇÃO DESTA CORTE. 1. Válido o contrato celebrado entre duas pessoas capazes e aptas a criar direitos e obrigações, que ajustam um negócio jurídico tendo por objeto a prestação de um fato por terceiro. 2. Descumprida a obrigação de obter a anuência do terceiro ao contrato, responde o promitente inadimplente por perdas e danos, a teor do que dispunha o art. 929 do Código Civil de 1916, reproduzido pelo caput do art. 439 do Código Civil em vigor, "aquele que tiver prometido fato de terceiro responderá por perdas e danos, quando este o não executar". 3. In casu, não sendo a CBF titular do direito de transmissão dos jogos, reservado exclusivamente às entidades de prática desportiva, segundo o art. 24 da Lei 8.672/93, cumpria a ela obter dos clubes de futebol, a anuência ao contrato. O inadimplemento dessa obrigação, representada pela notificação endereçada à TVA, comunicando que não conseguira a anuência dos clubes, enseja a resolução (extinção) do contrato e a responsabilização por perdas e danos. 4. [...]. RECURSOS ESPECIAIS DESPROVIDOS. (REsp 249.008/RJ, Rel. Ministro VASCO DELLA GIUSTINA (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/RS), TERCEIRA TURMA, julgado em 24/08/2010, DJe 16/11/2010) Art. 440. Nenhuma obrigação haverá para quem se comprometer por outrem, se este, depois de se ter obrigado, faltar à prestação. Nesse caso, o terceiro assumiu a obrigação de realizar a prestação, motivo porque responderá pessoalmente. Nada obsta, segundo Stolze e Pamplona Filho (2009, p. 11) que se estipule no contrato uma responsabilidade solidária entre o promitente e o terceiro. No entanto, essa solidariedade somente se verificará na hipótese de previsão contratual, já que, de acordo com o art. 265 do CCB: A solidariedade não se presume; resulta da lei ou da vontade das partes. 4. CONTRATO COM PESSOA A DECLARAR Nesse tipo de contrato, se expressa uma cláusula especial denominada pro amico eligendo ou pro amico electo (Orlando Gomes), por meio da qual uma das partes se reserva ao direito de nomear outra pessoa (contraente in elegendo) para assumir a posição de contratante. Nessa situação, a pessoa nomeada assume a posição do nomeante na relação contratual, como se o contrato houvesse sido firmado por ela mesma. O nomeado assume, portanto, os direitos e as obrigações decorrentes do contrato. Nesse sentido, o art. 467 do CCB. Art. 467. No momento da conclusão do contrato, pode uma das partes reservar-se a faculdade de indicar a pessoa que deve adquirir os direitos e assumir as obrigações dele decorrentes. Esse tipo de negócio é muito comum nos contratos preliminares ou pré-contratos, notadamente nos contratos de promessa de compra e venda de imóveis. Na situação, o terceiro (contraente in elegendo) pode ter motivos para não tomar a frente da negociação, aparecendo apenas em momento futuro. Noutra hipótese, o contratante inicial, que se reserva ao direito de nomear terceira pessoa oportunamente, pode ser um investidor que firma o contrato com o intuito de, posteriormente, ceder onerosamente sua posição contratual a outro interessado. O art. 468 indica o prazo decadencial dentro do qual a indicação [direito potestativo do contratante] deve ser feita. O parágrafo único indica que a concordância da pessoa nomeada deve ser realizada da mesma forma adotada pelas partes contratantes. Dessa maneira, se a aceitação da proposta contratual se deu de forma expressa e escrita, a aquiescência do terceiro em relação à cláusula pro amico elegendo também deverá sê-lo. Vejamos: Art. 468. Essa indicação deve ser comunicada à outra parte no prazo de cinco dias da conclusão do contrato, se outro não tiver sido estipulado. Parágrafo único. A aceitação da pessoanomeada não será eficaz se não se revestir da mesma forma que as partes usaram para o contrato. O artigo seguinte indica que os efeitos da aceitação do terceiro, retroagem à data da celebração do contrato, isto é, possui efeitos ex tunc. Portanto, créditos e débitos pendentes entrarão na órbita jurídica do terceiro contraente in elegendo. Art. 469. A pessoa, nomeada de conformidade com os artigos antecedentes, adquire os direitos e assume as obrigações decorrentes do contrato, a partir do momento em que este foi celebrado. Os artigos abaixo elencam as situações em que os efeitos do contrato atingirão apenas os contratantes originários. Vejamos: Art. 470. O contrato será eficaz somente entre os contratantes originários: I – se não houver indicação de pessoa, ou se o nomeado se recusar a aceitá-la; II – se a pessoa nomeada era insolvente, e a outra pessoa o desconhecia no momento da indicação. Art. 471. Se a pessoa a nomear era incapaz ou insolvente no momento da nomeação, o contrato produzirá seus efeitos entre os contratantes originários. Há de se fazer, por fim, uma distinção entre contrato com pessoa a declarar e o instituto da cessão de contrato. No contrato com pessoa a declarar a faculdade de indicação do terceiro deve estar prevista no contrato, desde sua origem, apesar de poder nem mesmo ser exercida. Já a cessão de contrato, não está necessariamente pactuada previamente no contrato, podendo ser estipulada a qualquer tempo. Ademais, o contrato com pessoa a declarar reflete um direito potestativo do estipulante, dependendo, seu exercício, apenas da vontade do seu titular. A cessão do contrato, diferentemente, por envolver direitos e obrigações, requer a anuência ou a concordância do outro contratante.
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