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14/03/2017 As roupas novas do gene – Darwinianas https://darwinianas.com/2016/11/15/asroupasnovasdogene/ 1/9 Darwiniana toda a terça-feira A roupa nova do gene A compreenão atual do itema genômico no ditancia da vião poderoa que a dupla hélice e o dogma central da iologia molecular no propiciaram, e no lançam na aventura de encontrar uma nova vião, que eja igualmente poderoa m 1953, Jame Waton (1928-) e Franci Crick (1916-2004) apreentaram um modelo que explicou a etrutura do DNA, o modelo da dupla hélice, que etaeleceu eta molécula como a ae da herança iológica. Como dicute Rudolf Haumann, em eu livro ore a hitória da iologia molecular, até a pulicação do modelo da dupla hélice, ainda havia deate na comunidade científica ore qual molécula preente no cromoomo eria a ae da herança, o DNA ou a proteína. Foi omente então que, uma vez etaelecido o DNA como ae material da herança, uma vião realita ore o gene, como uma unidade etrutural e funcional que era parte dea molécula, ganhou larga aceitação. 14/03/2017 As roupas novas do gene – Darwinianas https://darwinianas.com/2016/11/15/asroupasnovasdogene/ 2/9 Até então prevalecia na comunidade científica uma vião intrumentalita ore o gene, de acordo com a qual o gene é uma ferramenta para fazer cálculo experimentai, em er aumida qualquer hipótee de correpondência com a realidade, como já dicutimo aqui no Darwiniana. Deta perpectiva intrumental, podia er aceita uma premia importante para o etudo da genética da primeira metade do éculo XX, a de um mapeamento imple entre genótipo e fenótipo: um gene podia er aumido como determinante do fenótipo ou de uma diferença fenotípica (no termo de Mo, um gene-P). O gene era, nea época, inferido a partir do fenótipo e cumpria papel fundamental na previão e explicação do padrõe de herança. É claro que geneticita aiam que o deenvolvimento tem uma natureza tal que não permite aumir relação tão imple entre gene e caracterítica. A longa polêmica ore a explicação do deenvolvimento, opondo teoria da epigênee e da pré-formação, havia ido decidida a favor da primeira, como dicutido num intereante texto de Jane Maienchein: a forma do organimo adulto não etava preente, em miniatura, no gameta ou no zigoto, ma tinha origem gradualmente, ao longo do proceo de deenvolvimento. Aim, não era poível aumir, em termo realita, que alguma caracterítica do adulto poderia etar pré-formada no genótipo, ela deveria formar-e gradualmente, durante o deenvolvimento. Não epanta, então, que geneticita como Thoma Hunt Morgan (1866-1945) e opueem a ideia determinita ore o papel do genótipo. Uma premia determinita podia er aumida, ma omente e o gene foe interpretado em termo intrumentai, e não realita. O gene era empregado na genética cláica para explicar diferença entre fenótipo por meio de diferença entre genótipo. te continua endo o fundamento de etudo de aociação genótipo-fenótipo até hoje: trata-e de explicar a variação de um fenótipo de interee numa população com ae na variação genética, etaelecendo-e que percentual da primeira é explicado pela variação da egunda. te é um ponto muito importante para entender a explicaçõe genética, ore o qual já falamo aqui no log, ma não cuta initir: quando no referimo a “gene para” caracterítica, não etamo propondo explicaçõe que relacionam gene a fenótipo de um organimo individual, etamo explicando diferença oervada em fenótipo do organimo com ae em diferença no gene do organimo. 14/03/2017 As roupas novas do gene – Darwinianas https://darwinianas.com/2016/11/15/asroupasnovasdogene/ 3/9 Gene ão, deta perpectiva, diferença que produzem diferença. Gene intrumentai (“gene para”) podem dar vez a hipótee funcionai que no levem a elucidar o papel de gene no deenvolvimento de caracterítica. Ma ao invetigarmo tai hipótee já não etamo mai tratando de gene que determinam caracterítica. tamo tratando de gene moleculare que participam de proceo complexo atravé do quai caracterítica têm origem no deenvolvimento. Podemo aumir um princípio de paridade caual: gene, fatore epigenético, fatore amientai, ão igualmente importante no deenvolvimento do traço, como é dicutido por Paul Griffith e Ro Knight. Quando etamo lidando com o gene molecular, temo uma ituação muito ditinta daquela do gene intrumental: memo que uma mudança epecífica de um nucleotídeo no DNA poa reultar numa mudança notável num traço, muito ítio no DNA, muita etrutura e proceo na célula e no organimo etão envolvido na cauação complexa de um traço. Por exemplo, uma criança não é acometida por fenilcetonúria apena porque exie certo alelo mutante, ma tamém devido à dieta, um fator ocioamiental. Logo, preença de fenilananina na dieta é tão importante quanto a preença de um alelo mutante, ama etão em paridade caual. A aceitação de uma vião realita ore o gene, a partir da dupla hélice, levou a uma grande confuão entre gene molecular e gene intrumental, uperpondo-e ao conceito molecular do gene uma interpretação do gene advinda da genética cláica, fazendo com o gene molecular foe entendido como e determinae fenótipo. O “dogma central” da iologia molecular, introduzido por Crick em eu artigo eminal “ore a íntee proteica” (On protein nthei), teve papel importante na contrução dea leitura determinita. Como todo devem aer, o “dogma central” da iologia Molecular conite na ideia de um fluxo de “informação” do DNA até a proteína (ma não em entido contrário). a ideia foi frequentemente relacionada a ideia determinita, como motra a apreentação do dogma como “DNA faz RNA, RNA faz proteína, a proteína no fazem (vejam um exemplo aqui). O próprio Crick coniderava inadequada ea verõe implita do dogma. Contudo, não parece fortuito que formulaçõe determinita do dogma ejam comun. Como dicutem William echtel e Andrew Hamilton, em artigo de 2007, o dogma central implica uma vião gene- cêntrica e reducionita, de acordo com a qual tanto fenótipo moleculare quanto caracterítica manifeta em nívei uperiore da organização iológica, em 14/03/2017 As roupas novas do gene – Darwinianas https://darwinianas.com/2016/11/15/asroupasnovasdogene/ 4/9 tecido, itema orgânico, organimo, ão explicado em termo genético. m eu termo, o DNA e torna uma epécie de reervatório de onde flui toda “informação” numa célula ou organimo! É fundamental, para uma compreenão apropriada do papel do gene no itema vivo, diferenciar gene intrumental de gene molecular, como dicutimo em potagem anterior. No entanto, até ano recente, era difícil ter clareza da importância dea ditinção diante de uma vião tão poderoa do gene como a que foi contruída pela iologia molecular, na eteira da dupla hélice. O gene não era difícil de er entendido conforme uma definição que ainda hoje domina a ciência ecolar: um trecho de DNA que codifica um produto funcional (uma cadeia polipeptídica única ou molécula de RNA funcional). A eta definição, oma-e com frequência a ideia de que ee trecho de DNA determina uma caracterítica. Pronto, ei aí a confuão entre gene intrumental (interpretado de maneira determinita apena porque é intrumental) e um gene molecular (que, e interpretado de modo realita, não determina fenótipo por i ó). Uma definição encontrada no gloário de Cell and Molecular iolog: Concept and xperiment, de Karp, ilutra em ea confuão: “Gene: m termo não- moleculare, uma unidade de herança que governa o caráter de um traço particular. m termo moleculare,um egmento de DNA contendo a informação para um polipeptídio ou molécula de RNA única, incluindo regiõe trancrita ma não-codificante”. É muito difícil que alguém entenda claramente o que ignifica falar em “gene para caracterítica” e falar em “gene molecular” com uma definição como eta. m vita dea confuão, podemo coniderar intereante que o gene molecular eteja, por aim dizer, derretendo diante de noo olho. Dede o ano 1970, vário achado da pequia genética, molecular e genômica têm deafiado noa compreenão do gene. ntre ee achado, temo o gene interrompido, no quai a equência de DNA é trancrita num pré-RNA, a partir do qual o trancrito final, ou RNA maduro, é produzido por um proceamento regulado. Gene interrompido apreentam regiõe que formam parte do mRNA maduro apó proceamento, chamada de éxon, e regiõe que não ão parte do mRNA maduro, o íntron. Contudo, a fronteira de éxon e íntron podem variar e diferente éxon podem er cominado no RNA maduro, acarretando a produção de proteína ditinta. 14/03/2017 As roupas novas do gene – Darwinianas https://darwinianas.com/2016/11/15/asroupasnovasdogene/ 5/9 te é o fenômeno da emenda ou plicing alternativo, que tamém deafia noo entendimento do gene. Como ele leva à expreão de múltiplo produto a partir de uma região de DNA, ele rompe com o potulado de uma relação unitária entre gene e produto gênico, que era parte do entendimento do gene molecular. le etá tamém relacionado a uma da caracterítica mai notávei do animai, uma maiva expanão do número de proteína (proteoma) em aumento correpondente do número de gene (genoma), uma economia favorecida pela eleção natural: por exemplo, o gene Dcam em droófila pode dar origem a até 30.016 produto diferente. É um fenômeno comum: de 92 a 94% do gene humano ofrem emenda alternativa. Um último exemplo é a chamada herança epigenética não-mendeliana de informação extragenômica ou “retauração genética”, por meio da qual planta e animai podem reecrever eu DNA com ae em RNA herdado da geraçõe paada, deafiando não omente noo entendimento do gene ma tamém noa concepção de herança. te é um do fenômeno invetigado na epigenética, que tem motrado como padrõe de expreão gênica ão modificado pelo amiente e pela experiência, diolvendo quetõe relativa à importância da natureza ou da cultura/experiência na origem de caracterítica, como dicute David . Moore em “O genoma em deenvolvimento” (The developing genome). Ma nee cao algo mai radical do que uma mudança no padrão de expreão gênica ocorre: o próprio DNA etá endo reecrito! tamo diante de novo tempo. Como Mike mith ecreveu, eta não é mai a genética do tempo de eu avó. Ma é mai grave ainda! ta não é nem memo a genética que você aprendeu há mero dez ano atrá. Vivemo hoje na genética, iologia molecular e genômica algo imilar ao que a comologia experimentou quando foi propota a exitência da matéria e da energia ecura: achávamo que aíamo tanto, ma decorimo que tudo que aíamo era de uma porção limitada do que exite no univero. Do memo modo, contruímo noo entendimento do genoma invetigando regiõe do DNA que correpondem a meno de 2% dea molécula, o gene que codificam proteína. Hoje aemo, contudo, que o retante dea molécula não é contituído por DNA lixo (ou, ao meno, não por DNA lixo apena), ma por regiõe trancrita em RNA de diferente tipo, com diferente funçõe celulare, epecialmente regulatória. ta é a matéria ecura do genoma e etamo apena começando a compreendê- la. Ma ante que alguém declare o limite da ciência e o começo do mitério, é 14/03/2017 As roupas novas do gene – Darwinianas https://darwinianas.com/2016/11/15/asroupasnovasdogene/ 6/9 om lemrar que noo conhecimento egue crecendo, por meio da oa e velha ciência, que tem no levado a entender cada vez mai o genoma, tanto em ua regiõe codificante quanto em ua matéria ecura. O deenvolvimento da última década propiciam uma oportunidade ímpar para penar ore genoma de maneira mai dinâmica e meno reducionita, ditanciando-no da vião poderoa que a dupla hélice e o dogma central no propiciaram, lançando-no na aventura de encontrar uma nova vião, que eja igualmente poderoa. Charel N. l-Hani (Intituto de iologia/UFA) PARA AR MAI: l-Hani, C. N. (2007). etween the crond the word: the crii of the gene concept. Genetic and Molecular iolog 30: 297-307. Keller, . F. (2002). O éculo do gene. elo Horizonte: Criálida. Moore, D. . (2015). The developing genome. Oxford: Oxford Univerit Pre. Mo, L. (2003). What gene can’t do. Camridge, MA: The MIT Pre. Oama, . (1985). The ontogen of information. Durham, NC: Duke Univerit Pre. Portin, P. (2009). The eluive concept of the gene. Heredita 146: 112–117. hapiro, J. A. (2009). Reviiting the central dogma in the 21t centur. Natural Genetic ngineering and Natural Genome diting: Annal of the New York Academ of cience 1178: 6-28. mith, M. U. (2014). It’ not our grandmother’ genetic anmore! The American iolog Teacher 76: 224-229. 14/03/2017 As roupas novas do gene – Darwinianas https://darwinianas.com/2016/11/15/asroupasnovasdogene/ 7/9 Curtir 5 comentário em “A roupa nova do gene” Angela Maria Freire novemro 15, 2016 à 3:39 pm Como empre, luz na ecuridão dee tempo de treva em que etamo mergulhado… Adoro ete log! Valeu, Charel. Autore Darwiniana novemro 17, 2016 à 6:22 pm Oi Ângela, Legal aer que o texto etão produzindo alegria e alento. O tempo ão difícei para a humanidade, ma é om aer que, apear de tudo, noo conhecimento egue crecendo, incluive para motrar o limite do que já aemo. O que empre me epanta é tanta gente com tanta convicção diante de um mundo tão complexo, natural e ocialmente. Figura: A vida tem ua matéria negra. (De: http://new.cnr.fr/article/life-ha- it-dark-matter) Darwiniana novemro 15, 2016 ducação, Filoofia da Ciência, Genética, Hitoria da Ciência Compartilhe io: Twitter Facebook 77 Curtir Seja o primeiro a curtir este post. / / 14/03/2017 As roupas novas do gene – Darwinianas https://darwinianas.com/2016/11/15/asroupasnovasdogene/ 8/9 Curtir Curtir Curtir Araço Charel João Paulo Franco Cairo novemro 17, 2016 à 7:53 pm Muito om texto profeor! ainda vejo no comentario profeora Angela cheio de ânimo! into muita audade da aula de amo, vc foram minha referência durante a graduação e impulionaram dentro de mim uma curioidade científica e filoofica ainda maior! Depoi do doc terminado vejo como amo foram importante! Um Forte araco! Joao Paulo io2003.1 Autore Darwiniana novemro 20, 2016 à 1:58 am Oi João Paulo, Que legal que tem eguido o log. Fiquei feliz demai pela ua menagem. e reconhecimento de noo traalho como profeore é da melhore coia na carreira! Depoi conte-no por onde anda, apó o doutorado. eguimo no vendo aqui pelo log. Araço Charel Pingack: xplorando a matéria ecura do genoma – Darwiniana 14/03/2017 As roupas novas do gene – Darwinianas https://darwinianas.com/2016/11/15/asroupasnovasdogene/ 9/9 Darwiniana log no WordPre.com./
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