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História do Direito Brasileiro Estácio Natal Profa. Dra. Margarida Maria Knobbe 2018 Reprodução autorizada apenas para estudo dos alunos da disciplina. É vedado o uso para outros fins, publicação em sites da internet, etc. sem prévia autorização por escrito da autora. Aplicação: articulação teoria e prática aula 2 O Foral de Olinda de 1537 é o documento histórico mais antigo relativo à cidade e elevou o povoado de Olinda à condição de Vila, estabelecendo seu patrimônio público, bem como um plano de ocupação territorial. Foi produzido pelo primeiro capitão donatário de Pernambuco (Duarte Coelho) aos povoadores e moradores, cedendo o direito de uso da terra, mas sem transferir sua propriedade. Ainda hoje a Prefeitura Municipal se utiliza do documento para fundamentar a cobrança de “foro anual” e também de “laudêmio”. Inconformado, José, morador em terreno passível de cobrança, afirma que no Brasil não se reconhece um documento com quase cinco séculos de existência, além do que os forais não possuem força jurídica. Diante da informação acima, pesquise e responda: a) o que é uma Carta Foral? b) Com que fundamento o Município de Olinda continua cobrando o foro anual e laudêmio? ANTES DESTA AULA Acessar o ambiente virtual da disciplina no SAVA (no SIA, entrar em Sala de Aulas Virtuais e Minhas disciplinas presenciais), assistir às videoaulas 1, 2 e 3 e observar outras indicações de materiais para aprofundamento deste conteúdo. Ler o livro texto - Livro didático de História do Direito Brasileiro, da Estácio, até a página 48. Aula 3 O contexto do período pré-independência Relembrando.... Economia colonial: Grandes latifúndios Monocultura Cana-de-açúcar Mão de obra escrava Exploração exclusiva da Coroa portuguesa Sociedade patriarcal: Senhores de engenho: chefes incontestáveis. Mulheres: administravam a casa e controlavam os escravos domésticos. Estrutura judiciária no Brasil colônia 1ª. instância Ouvidor – funções administrativas, conhecer e julgar processos cíveis e criminais de partes interessadas, juízes, procuradores, fidalgos, etc. Juiz Ordinário ou da Terra – eleito entre os “homens bons” para processar e julgar processos cíveis e criminais. Juiz de Vintena - juiz de paz para lugares com mais de 20 famílias, eleito pela câmara de vereadores para julgar em processo verbal questões de pequena monta, sem direito a apelação. Almotacéis – 2 para cada município para resolver questões sobre servidões urbanas e obras novas. Juiz de Fora – bacharel em direito, nomeado pelo rei para garantir a aplicação das leis gerais (substituía o ouvidor da comarca). Juiz de Órfãos – eleito ou nomeado para processar e julgar inventários, partilhas, tutela, etc. que envolvessem menores ou incapazes Estrutura judiciária no Brasil colônia 2ª. e 3ª. instâncias 2ª. Instância: Relação da Bahia: fundada em 1609, como tribunal de apelação (de 1609 a 1758, teve 168 desembargadores). Relação do Rio de Janeiro: fundada em 1751, como tribunal de apelação. 3ª. Instância: Casa da Suplicação: tribunal supremo de uniformização da interpretação do direito português, em Lisboa. Desembargo do Paço: originariamente fazia parte da Casa da Suplicação, para despachar as matérias reservadas ao rei, tornou-se corte autônoma em 1521, como tribunal de graça para clemência nos casos de penas de morte e outras. Instância única: Mesa da Consciência e Ordens: Para as questões relativas às ordens religiosas e de consciência do rei. Política mercantilista Por intermédio das companhias de comércio, o Estado português busca garantir os impostos da Coroa e os lucros da burguesia com o bom funcionamento dos engenhos de açúcar e das plantações de algodão e fumo. Essas atividades dependem do transporte dos produtos entre Brasil e Portugal, do crédito para a compra de escravos e do fornecimento de utensílios, ferramentas, gêneros alimentícios e tecidos que a colônia não produz. Mesmo não sendo uma experiência muito bem-sucedida – por falta de capital suficiente ou má administração –, as companhias de comércio representam uma tentativa do Estado de dar maior eficiência à política mercantilista, orientando os investimentos para determinadas áreas e estimulando-os pela concessão de privilégios a comerciantes e acionistas. Mercantilismo - características Metalismo = acúmulo de ouro e prata (cunhagem de moedas); desenvolvimento de atividades comerciais ou exploração de novas terras. Um dos objetivos principais dos reis: a acumulação de metais preciosos. As reservas de ouro e prata que possuíam eram fundamentais para medir a riqueza do Estado. Balança comercial favorável - desenvolvimento de atividades comerciais. Lógica de acumulação de riquezas, quanto mais exportasse e menos importasse, mais o Estado enriquecia. Protecionismo – para manter a balança comercial favorável, o Estado protegia os produtores nacionais, incentivando as manufaturas locais (na metrópole) e dificultando a importação de produtos estrangeiros. Intervenção Estatal – o Estado desempenhava papel fundamental no controle de tarifas alfandegárias e proteção das manufaturas nacionais. Leis na economia colonial brasileira 1591 - Decreto fecha os portos do Brasil aos navios estrangeiros. 1603 - Governo português decreta o monopólio real da pesca da baleia. 1642 - Coroa portuguesa estabelece o monopólio sobre o tabaco. 1649 - Criada a Companhia Geral do Comércio do Brasil para auxiliar a resistência pernambucana às invasões holandesas e apoiar a recuperação da agricultura canavieira do Nordeste. 1658 - Imposto pela Coroa o monopólio do sal. 1682 - Governo português cria a Companhia de comércio do Maranhão para atuar na agricultura exportadora de açúcar e algodão com fornecimento de crédito, transporte e escravos aos produtores. 1731 – Carta-Régia estabelece o monopólio sobre a extração de diamantes. 1755 - Fundadas pelo marquês de Pombal as companhias gerais do comércio do Grão-Pará e do Maranhão. 1759 – Fundadas as companhias gerais do comércio de Pernambuco e Paraíba. 1785 - Governo português proíbe as manufaturas de tecidos no Brasil. Direito internacional Tratados para definir limites do território (invasões estrangeiras, bandeiras, entradas, mineração, pecuária, ação dos jesuítas) Primeiro Tratado de Utrecht – 1713 - Firmado entre Portugal e a França para estabelecer os limites entre os dois países na costa norte do Brasil. Segundo Tratado de Utrecht – 1715 – Firmado entre Portugal e Espanha, estabeleceu os limites entre as colônias dos dois, na América do Sul, respeitando a ocupação realmente exercida nos territórios e abandonando inteiramente a "linha de Tordesilhas" (a Colônia de Sacramento passaria para o domínio da Espanha). Com esse Tratado, o Brasil ganhou já um perfil próximo ao de que dispõe hoje. Tratado de Madri – 1750 – praticamente a definição geográfica atual – direito do “ uti possidetis, ita possideatis” (quem possui de fato, deve possuir de direito) – princípio do Direito Romano. As negociações basearam-se no chamado Mapa das Cortes, privilegiando a utilização de rios e montanhas para a demarcação dos limites. Tratado do Pardo – 1761 - Tornou nulas todas as disposições e feitos, decorrentes do Tratado de Madri. Tratado de Santo Ildefonso – 1777 - definiu que a colônia de Sacramento e a Ilha de São Gabriel, atualmente na região do Uruguai, e a região dos Sete Povos das Missões, atualmente na área oeste do estado do Rio Grande do Sul, ficariam de posse da Espanha, e Portugal exerceria posse sobre a margem esquerda do rio da Prata e novamentesobre a ilha de Santa Catarina, que tinha sido ocupada pelos espanhóis pouco tempo antes. Convenção (ou Paz) de Badajoz – 1801 - estabelece as condições de paz na Península Ibérica (sem fazer menção aos limites das colônias de Portugal e da Espanha na América do Sul). Com isso, tornou nulas, na prática, todas as disposições a respeito - entre estes dois países -, permitindo a expansão da ocupação gaúcha até o rio Uruguai. Invasão holandesa (1630-1654) Antecedentes O capital holandês passou a dominar todas as etapas da produção de açúcar, do plantio da cana-de-açúcar ao refino e distribuição. Com o controle do mercado fornecedor de africanos escravizados, passou a investir na região das Antilhas. O açúcar produzido nessa região tinha um menor custo de produção devido, entre outros aspectos, à isenção de impostos sobre a mão de obra (tributada pela Coroa portuguesa) e ao menor custo de transporte. Sem capitais para investir, com dificuldades para aquisição de mão de obra e sem dominar o processo de refino e distribuição, o açúcar português não consegue concorrer no mercado internacional, mergulhando a economia do Brasil em crise que atravessará a segunda metade do século XVII até à descoberta de ouro nas Minas Gerais. Primeiro os holandeses tentaram a Bahia, mas foram repelidos. Depois, conquistaram Pernambuco e se instalaram na região, em Olinda e Recife. De lá expandiram sua ocupação até o atual território de Sergipe, ao sul, e, ao norte, pelos atuais estados da Paraíba, Rio Grande do Norte e Ceará. Holandeses no Rio Grande do Norte (1633-1654) A invasão de Pernambuco se deu especialmente por sua produção açucareira, mas no RN havia apenas o engenho Cunhaú produzindo açúcar. Motivo de atração dos holandeses para o RN: abundância de gado bovino, produção de farinha de mandioca e peixe seco. Retaguarda fornecedora de alimentos, garantindo o abastecimento de outras áreas ocupadas pelos holandeses. Os holandeses trocaram o nome de Fortaleza dos Reis Magos por Castelo de Keulen, e Natal passou a ser chamada de Nova Amsterdã. No brasão de armas que Nassau deu a Nova Amsterdã (Natal) havia uma ema, homenagem aos janduís (indígenas aliados, tapuias). “ ” Os Janduís, nação indígena que ocupava diversas áreas das capitanias de Pernambuco, Paraíba, Itamaracá e, principalmente Rio Grande (do Norte), eram da etnia dos Tarairiús. Entre os índios dessa etnia havia o hábito de chamar o próprio povo pelo nome de seu líder. Assim, os Janduís (ancestrais dos índios Canindés) adquirem esse nome em virtude do seu antigo líder, Janduí. Quando morreu Janduí, quem o sucedeu na liderança do grupo foi Canindé, guerreiro de destaque. Os índios que descenderam das tribos comandadas por Canindé passaram a se chamar de Canindés, embora continuassem sendo conhecidos pelos portugueses como Janduís. Escola Kanindé (Disponível em: <http://escolakaninde-indio.blogspot.com.br/p/origem-historica- do-povo-kaninde.html>). Guerra dos bárbaros – 1660 – 1750 - Devido ao avanço das frentes pastoris, com o objetivo de expandir a pecuária, a ocupação do Sertão se intensificou. Entretanto, chegou o momento que a presença indígena se tornou um empecilho a essa expansão. As autoridades coloniais (portugueses) utilizaram, então, a estratégia de desocupação das terras pela eliminação dos nativos que resistissem aos interesses colonizadores. Conde Johann Moritz of Nassau-Siegen Nassau chegou em 1637 e partiu em 1644, deixando a marca do administrador. Seu período é o mais brilhante de presença estrangeira. Nassau renovou a administração. Foi relativamente tolerante com os católicos, permitindo-lhes o livre exercício do culto, como também com os judeus (depois dele não houve a mesma tolerância, nem com os católicos e nem com os judeus - fato estranhável, pois a Companhia das Índias contava muito com eles, como acionistas ou em postos eminentes). Pensou no povo, dando-lhe diversões, melhorando as condições do porto e do núcleo urbano, fazendo museus de arte, parques botânicos e zoológicos, observatórios astronômicos. Legislação holandesa Adaptaram a estrutura jurídica-administrativa de acordo com o modelo holandês. Instalaram os Conselhos de Escabinos, em substituição às Câmaras Municipais, presididos pelo escolteto (um holandês que acumulava várias funções, principalmente as de polícia e o que chamaríamos hoje de promotoria pública). Porém, a legislação propriamente dita é pouco conhecida. Leis penais: pena de morte para alguns delitos relacionados com qualquer possibilidade de insurreição contra os holandeses. A pena de morte era executada de várias maneiras: enforcamento, morte pela espada, pela fogueira, entrega aos índios, esquartejamento com o condenado ainda vivo. Outras penas menos severas eram aplicadas para crimes de extorsão, jogos de azar, incesto e adultério. Outros delitos: não plantar o número de covas de mandioca ordenado por lei; vender carne ou matar gado sem licença; casar-se ou amigar-se com índios; escarnecer de judeu, cristão de outra denominação ou blasfemar. Movimentos de rebelião Alguns movimentos evidenciaram a existência de fissuras na relação colônia/metrópole, principalmente a partir do final do Século XVII. Essas rebeliões eram geralmente motivadas por questões de ordem econômica, mas expressavam um descontentamento da população da colônia em razão do excessivo controle da metrópole sobre as províncias coloniais. Nessa linha, encontram-se a Revolta de Beckman (1684) no Maranhão, a Guerra dos Emboabas (1708) em Minas Gerais; Guerra dos Mascates (1710) em Pernambuco, Revolta de Felipe dos Santos (1720) em Vila Rica, mas principalmente, e com maior destaque, pela importância que tiveram, a Conjuração Mineira de 1789 e a Conjuração Baiana de 1798 (também conhecida como Conjuração dos Alfaiates). Em todos esses movimentos explicita-se a crise na relação entre colônia e metrópole e um crescente sentimento de identificação e pertencimento dos habitantes com seus núcleos coloniais. Descoberta do ouro em Minas Gerais (1694-1698) Publicação do Regimento do Superintendente Guarda Mores e Oficiais para as Minas de Ouro (Código das Minas) em 1702. A região passava a ser governada por uma administração (Intendência) diretamente subordinada à Corte portuguesa, sem ligação com o governo-geral da colônia). Atribuições da Intendência: policiamento da mineração; fiscalização e direção das explorações; cobrança de impostos; tribunal de primeira e última instância (nas questões referentes às suas atribuições). Aumento do fiscalismo e da taxação dos colonos. Controle sobre o escoamento do ouro e escravos. ENTRADAS E BANDEIRAS “ ” As fontes de ouro geraram um furacão de ganância e desordem. As cidades se esvaziaram, porque boa parte de seus moradores correu para o interior em busca da fortuna. Como disse o historiador Afonso Taunay, a região das Minas Gerais virou “uma república onde o atrevimento imperava armado e o direito vivia inerte”. Uma terra sem lei, portanto. Ele continua: “A região era percorrida por homens de toda a casta e de todas as partes, gente de cabedais e aventureiros sem vintém, em número enorme; os primeiros, arrogantes e prepotentes, acompanhados por espingadeiros, violentos, jogadores e devassos; os demais, em geral, vadios e ladrões, traidores e assassinos”. Corrida pelo ouro: faroeste mineiro (disponível em: <http://guiadoestudante.abril.com.br/aventuras-historia/corrida-pelo-ouro-faroeste-mineiro- 435262.shtml>) Os historiadores calculam que aproximadamente 35% das riquezas foram contrabandeadas para que os donos não pagassem impostos. Ainda assim, o dinheiro que chegou ao reidom João V foi mais do que suficiente para ajudar a reconstruir Lisboa quando ela foi completamente destruída por um terremoto, em 1755. O Brasil? Ganhou mais habitantes, alguns deles bem ricos. E, por estar mais perto das minas, o Rio de Janeiro passou Salvador para trás e se tornou a capital. O dinheiro também criou vida cultural em Minas. Foi ali que, entre um poema satírico e uma carta contra o governador, surgiram os primeiros movimentos pela independência do Brasil, começando pela Inconfidência Mineira. Tributos cobrados pela Intendência das Minas 1720 – Casas de Fundição – cobrança do quinto (20% ouro em pó) e uso da casa (Revolta Filipe dos Santos, em Vila Rica). 1735 – Taxa de Captação dos escravos e do Censo das Indústrias: cobrava 17 gramas de ouro do minerador por cada escravo que possuísse, além de cobrar a mesma taxa de pessoas livres que mineravam. 1751 – a Coroa aboliu o sistema anterior e implantou as cotas anuais. O pagamento mínimo do quinto seria de 100 arrobas (1.500 quilos) por ano. O valor, muito alto, dificilmente era cumprido. Os valores não pagos eram cumulativos, dando origem à derrama. Derrama – intensificação da cobrança dos valores devidos, confiscando-se bens e objetos de ouro. Prática extorsiva e excessiva para atingir a meta estipulada pela Coroa. Em 1789, motivou a chamada Conjuração ou Inconfidência Mineira. Inconfidência Mineira Objetivo: a criação de um regime republicano, tendo a Constituição dos Estados Unidos como modelo, o apoio à industrialização e a adoção de uma nova bandeira, tendo ao centro um triângulo com os dizeres em latim: “Libertas quae sera tamen” (Liberdade ainda que tardia). Principais inconfidentes: Tiradentes (Joaquim José da Silva Xavier) – alferes, minerador e tropeiro; Claudio Manuel da Costa – poeta; Inácio José de Alvarenga Peixoto – advogado; Tomás Antônio Gonzaga – poeta; Francisco de Paula Freire de Andrade – coronel; Carlos Correia – padre; Oliveira Rolim – padre; Francisco Antônio de Oliveira Lopes – coronel. O movimento foi delatado por Joaquim Silvério dos Reis ao governador da província, em troca do perdão de suas dívidas com o governo. Os inconfidentes foram presos e condenados. Sentença de Tiradentes pelo crime de lesa-majestade Pena, de acordo com o Livro V das Ordenações Filipinas, condenava o réu "a com baraço e pregão ser conduzido pelas ruas publicas ao lugar da forca e nella morra morte natural para sempre, e que depois de morto lhe seja cortada a cabeça e levada a Villa Rica aonde em lugar mais publico della será pregada, em um poste alto até que o tempo a consuma, e o seu corpo será dividido em quatro quartos, e pregados em postes pelo caminho de Minas“. O tribunal (uma comissão especial formada por desembargadores da Casa de Suplicação de Lisboa) culminou com a condenação de 28 réus, além de Tiradentes, chegando a impor penas à memória e aos descendentes de outros três falecidos na prisão. A pena de morte aplicada a dez dos conjurados, porém, foi comutada na última hora em degredo perpétuo pelo regente dom João, em nome da rainha dona Maria I. A forca restou só para o alferes. Há quem afirme que, dessa forma, Portugal quis fazer entender a conspiração como aventura de um reles e tresloucado dentista, que com lábia aliciou mentes mais ilustres. (F. G. Yasbeck, em <http://guiadoestudante.abril.com.br/aventuras-historia/joaquim-jose-tiradentes-539853.shtml>). foto da Revista Aventuras na História ed. 82 Martírio de Tiradentes, óleo sobre tela de Francisco Aurélio de Figueiredo e Melo (1854 — 1916). Segundo relatos da época, Tiradentes era alto, magro e muito feio. Ele nunca usou barba e cabelos longos. Como militar, o máximo que se permitia era um discreto bigode. Ele foi enforcado no Rio de Janeiro com a barba feita e o cabelo raspado, no dia 21 de abril de 1792. “Pois seja feita a vontade de Deus. Mil vidas eu tivesse, mil vidas eu daria pela libertação da minha pátria”, teria dito Tiradentes ao ouvir serenamente a sua sentença de morte. (Tiradentes, as faces de um mito – disponível em: <http://www.rondoniaovivo.com/noticias/tiradentes-as-faces-de-um-mito-aleks- palitot/99846#.UzBTCfldVCg>.) Mártir, herói ou bode expiatório? Kenneth Maxwell, numa das mais importantes obras sobre a Inconfidência, A Devassa da Devassa, esboça a tese de que Tiradentes seria mero "bode expiatório", elemento apenas periférico dentre os plutocratas e intelectuais que compunham o movimento nascido não apenas de ideais, mas fundamentalmente de interesses econômicos. O mesmo brasilianista, porém, não deixa de reconhecer o caráter ímpar do mártir, de exceção "em uma história particularmente carente de grandes homens". Durante os interrogatórios sempre reclamou Joaquim José a exclusiva culpa pela iniciativa da sedição, inocentando seus companheiros de outros crimes que não fosse o de ouvir suas ideias. Qualquer que tenha sido seu papel, Tiradentes tornou-se um autêntico herói nacional. Primeiro foi adotado pelo movimento republicano, que o elegeu como mártir cívico- religioso e antimonarquista, fazendo prosperar as representações que o aproximam de Cristo. O 21 de abril tornou-se feriado nacional em 1890. Tiradentes teve também exaltada sua imagem de militar patriota, quando nomeado patrono da nação pelo governo militar, em 1965, enquanto os movimentos de esquerda não deixaram de recorrer a ele como símbolo de rebeldia. "O segredo da vitalidade do herói talvez esteja afinal nessa ambiguidade, em sua resistência aos continuados esforços de esquartejamento de sua memória", diz o historiador José Murilo de Carvalho em A Formação das Almas. (Joaquim José, o Tiradentes – disponível em: <http://guiadoestudante.abril.com.br/aventuras-historia/joaquim-jose- tiradentes-539853.shtml>.) Alguns anos depois... Já no primeiro império (após a independência proclamada por D. Pedro I), em 1830 entra em vigor o primeiro Código Criminal brasileiro, alterando substancialmente os fundamentos das leis penais portuguesas em vigor até então no Brasil. Avança em relação ao que diz respeito à garantia da integridade física (abolindo penas cruéis), mantendo a pena de morte (sem tortura). Passa a considerar a inviolabilidade dos direitos civis e a igualdade jurídica, porém em uma sociedade escravista que mantém essas punições cruéis para os escravos. Este novo Código foi diretamente influenciado pelas ideias do pensador iluminista italiano Cesare Beccaria (1738-1794), em sua obra Dos delitos e das penas, escrita em 1764. “ ” Percorramos a História e constataremos que as leis, que deveriam constituir convenções estabelecidas livremente entre homens livres, quase sempre não foram mais do que o instrumento das paixões da minoria, ou fruto do acaso e do momento, e nunca a obra de um prudente observador da natureza humana, que tenha sabido orientar todas as ações a sociedade com essa finalidade única: todo o bem-estar possível para a maioria. BECCARIA, Cesare. Dos delitos e das penas. Trad. Torrieri Guimarães. São Paulo: Martin Claret, 2014. p. 13-14. “Se a arbitrária interpretação das leis constitui um mal, a sua obscuridade o é igualmente, pois precisam ser interpretadas. Tal inconveniente ainda é maior quando as leis não são escritas em língua comum.” (p. 22) Algumas ideias de Beccaria 1. princípio da individuação das penas. Deuteronômio: “Não morrerão os pais pelos filhos nem os filhos pelos pais”. 2. Só o legislador pode legislar, e previamente. 3. finalidade das penas é prevenir e reeducar e não penalizar. Era contra a pena de morte, por ser ilógica. Como alguém pode dizer ao outro não matar, se ele próprio condena à morte? 4. Quanto mais juízes na comunidade, melhor. 5. É contraa tortura – a verdade não nasce pelo tormento. 6. É dele o “in dubio pro reu” (na dúvida, a favor do réu, princípio jurídico da presunção da inocência) X “in dubio pro societate” (se resolve em favor da sociedade as eventuais incertezas propiciadas pela prova). 7. Defende a igualdade de tratamento legal e é avesso à vingança. Crise do sistema colonial Prancha número 5 do tomo 2 da obra de Debret “Voyage Pittoresque et Historique au Brésil”, Ed. Firmine Didot et Frères, Paris, 1834-1839 Crise do sistema: fatores externos Críticas ao regime de monopólios e ao pacto colonial: Adam Smith (filósofo e economista escocês): um dos teóricos do liberalismo, criticava a política mercantilista, o controle dos monopólios e o trabalho servil. Jean Baptiste Say (economista francês): denunciava o caráter espoliativo do sistema colonial, acusando as colônias de se tornarem ônus para as metrópoles. Fatores responsáveis pelo esgotamento do sistema: expansão dos mercados, desenvolvimento crescente do capital industrial e a crise do Estado absolutista. Monopólios e privilégios: obstáculos aos grupos interessados numa produção em larga escala comercial. Mercados fechados e restrições do pacto colonial: entrave ao aumento da produção em função da mecanização. Absolutismo monárquico: críticas ao Antigo Regime, crença nos direitos naturais dos homens, ideias sobre a soberania da nação e supremacia das leis, defesa dos princípios de igualdade e liberdade. Crise do sistema: fatores internos Aumento da população, incremento da produção, ampliação do mercado interno. Atritos entre as nações europeias em torno dos monopólios: Invasões dos franceses e holandeses. Ataque de piratas e corsários. Contrabando de produtos nativos. Críticas internas e expressões do descontentamento com a política de monopólios: - conflitos entre produtores e comerciantes (1710/1711 - Guerra dos Mascates - PE, tensão entre senhores de engenho e comerciantes portugueses), - conflitos entre comerciantes e burocratas (1684 - Revolta de Beckman – MA, reação de proprietários rurais aos abusos cometidos pela Companhia de Comércio do Maranhão, instalada na região dois anos antes, em 1682, por ordem do governo português ), levantes nas regiões de Minas Gerais. - Revolta dos Alfaiates (Conjuração Baiana ou Inconfidência Baiana), em 1798, que tinha como objetivo o rompimento dos laços coloniais com Portugal. Liderada pelos alfaiates João de Deus e Manuel Faustino dos Santos e pelos soldados Lucas Dantas e Luiz Gonzaga. Efeitos do iluminismo no Brasil Impactos da Revolução Americana e da Revolução Francesa: caminhos para a emancipação. Influência dos escritos da Ilustração: D’Alembert, Montesquieu, Raynal, Rousseau, Turgot. Florescimento do anticolonialismo. Luta pela emancipação dos laços coloniais. Explosão de diversos movimentos conspiratórios: Inconfidência Mineira e Conjuração Baiana. A abertura dos portos em 1808 e a entrada de estrangeiros facilitou a divulgação de ideias revolucionárias. As maçonarias tiveram papel importante no debate em torno dessas teorias. Limites do liberalismo no Brasil: pobreza ideológica dos movimentos e falta de envolvimento popular. O comportamento dos revolucionários, com exceção de poucos, era elitista, racista e escravocrata. A escravidão foi o limite do liberalismo. Período pombalino e leis extravagantes Várias leis extravagantes foram promulgadas, das quais podemos destacar: Leis sobre Câmbio Marítimo (1609); Leis sobre Letras de Câmbio (1672); Lei sobre seguros (1684). Em 1750, o rei de Portugal, D. José I, escolheu Sebastião José de Carvalho e Melo – conde de Oeiras e futuro marquês de Pombal – para ocupar o cargo de primeiro-ministro. Decorridos 27 anos, Pombal talvez tenha sido o principal ministro e homem forte do governo. Em sua obra reformista, combinou elementos contraditórios, como mercantilismo e iluminismo, buscando fortalecer o Estado. As reformas pombalinas constituíram uma violenta reação antijesuítica. Após viver séculos sob a ideologia jesuítica, Portugal percebeu seu distanciamento tanto econômico como ideológico das novas ideias que se disseminavam pela Europa. A reforma dos Estatutos da Universidade de Coimbra em 1772 e a constituição de uma Junta do Novo Código prenunciavam, para Portugal, o fim da tradição jurídica do Antigo Regime e o advento da “era das codificações” sob a égide da nacionalização e da “razão natural” moderna. Lei da Boa Razão (1769), uma norma de hermenêutica, ou seja, uma lex legum (norma sobre norma) que estabelecia regras para interpretação das leis e mandava aplicar, no caso de lacuna, o Direito Romano, desde que compatível com a boa razão! Convenção Secreta de Londres No início do século XIX, a Europa estava agitada pelas guerras. Inglaterra e França disputavam a liderança no continente europeu. Em 1806, Napoleão Bonaparte, imperador da França, decretou o Bloqueio Continental, proibindo que qualquer país aliado ou ocupado pelas forças francesas comercializassem com a Inglaterra, com o objetivo de arruinar a economia inglesa. Quem não obedecesse seria invadido pelo exército francês. O príncipe D. João não podia aderir ao Bloqueio porque mantinha intensa relação comercial com a Inglaterra, mas também temia o exército francês. A solução, negociada com a Inglaterra, foi firmada na Convenção Secreta de Londres, em 1807: a família real portuguesa ‘fugiria’ para o Brasil. Dessa forma, com a vinda da família real, tem fim o Pacto Colonial. Houve apoio dos ingleses no transporte da família real, do tesouro real, dos arquivos, do aparelho burocrático e de toda a corte portuguesa. Algumas leis importantes 1808 – Carta Régia: abertura dos portos às nações amigas (gerando o fim do pacto colonial). 1808 – Alvará: liberação da indústria manufatureira. Alvará de 05 de abril de 1808, que criou a Intendência Geral da Polícia com o objetivo organizar a segurança e controlar as obras públicas, a fim de conceder as condições necessárias para a permanência da Corte na colônia. 1810 – Tratado de Aliança e Amizade entre Portugal e Inglaterra (D. João se comprometia a não permitir a instalação da Inquisição em seus domínios da América do Sul) e Convenção de Comércio e Navegação (estabelecia tarifas alfandegárias preferenciais de 15% para produtos britânicos - produtos portugueses pagavam 16% e os de outras nações, 24%). 1815 – Carta de Lei: elevou o Brasil a Reino Unido de Portugal e Algarves. Brasil reino A elevação do Brasil à condição de Reino Unido ao de Portugal e Algarves, ocorrida em 16 de dezembro de 1815, deu legitimidade a uma situação que já existia de fato, por força da transferência da família real ocorrida em 1808: o Brasil havia se tornado o centro decisório do Império Português, configurando-se como a parte do Império dotada de maior importância política, econômica e estratégica. Tal ato foi sugerido pelo representante francês (Talleyrand) nas negociações do Congresso de Viena, com o objetivo de fortalecer a posição de Portugal na Europa pós- napoleônica. A elevação do Brasil à categoria de Reino Unido garantiu, todavia, a permanência da Corte no Rio de Janeiro. Se, para o Senado da Câmara do Rio de Janeiro, o ato de 16/12/1815 constituiu-se em “ilustrada política”, pois levava em consideração a “preeminência” que o Brasil fazia por merecer em função de “sua vastidão, fertilidade e riqueza”, para os portugueses (apoiados pelos ingleses) fazia-se imprescindível o retorno da família real à Europa. A elevação do Brasil à condição de reino, a recusa de D. João a voltar a Portugal e sua coroação como rei (com o título de D. João VI) em 06/02/1818 (em virtude da mortede D. Maria I em 1816 e da Insurreição Pernambucana de 1817) reafirmava o crescente peso político do Brasil sobre o Império e a ascendência do Rio de Janeiro sobre as demais partes do país. Mudanças na estrutura jurídica em 1808 A Relação do Rio de Janeiro foi transformada em Casa da Suplicação para todo o Reino, com 23 desembargadores, criando-se as Relações do Maranhão, em 1812, e as de Pernambuco, em 1821. Como órgãos superiores das jurisdições especializadas, foram instituídos: o Conselho Supremo Militar e a Mesa do Desembargo do Paço e da Consciência e Ordens. Criação dos cargos: Juiz Conservador da Nação Britânica, como garantia de foro privilegiado para os súditos ingleses, sendo exercido por um juiz brasileiro eleito pelos ingleses residentes no Brasil e aprovado pelo embaixador britânico (cargo só extinto em 1831). Intendente Geral de Polícia, com jurisdição sobre os juízes criminais, que recorriam para ele, podendo prender e soltar presos para investigação. Portugal descontente A aclamação de D. João VI em terras americanas atingiu duramente os sentimentos dos portugueses na Europa – o jornal O PORTUGUÊS chamava a Corte no Brasil de “governo tupinambá”. Algumas medidas paliativas foram tomadas, visando atenuar o descontentamento dos súditos portugueses europeus – para tanto, o Alvará de 25/04/1818 concedia taxas mais favoráveis para o vinho e a aguardente trazidos de Portugal, enquanto que o Aviso de 30/05/1820 isentava dos direitos de entrada nos portos brasileiros, o peixe e alguns tecidos portugueses (como o linho). O descontentamento, em Portugal, com as condições em que se encontrava a parte europeia do Império, levou à chamada Revolução do Porto (24/08/1820) – tal movimento tinha como objetivos o fim do Antigo Regime, a convocação das Cortes (na verdade, uma Assembleia Constituinte) para a elaboração de uma Constituição para o Império e o restabelecimento do lugar que os portugueses entendiam como merecido no contexto do Império Luso-Brasileiro. Aplicação: articulação teoria e prática Frequentemente o apoio à pena de morte é destaque na mídia brasileira. Recentemente, mais especificamente o mês de janeiro de 2018, pesquisa realizada pelo Instituto Datafolha apontou que 57% da população brasileira são favoráveis à pena de morte. Na verdade tal número representou um aumento de 10 pontos percentuais em relação à última pesquisa, realizada no ano de 2008, quando a quantidade de pessoas que apoiavam este tipo de punição era de 47%. Ao menos em relação ao tema pena de morte, parece que a visão da população brasileira parece estar indo de encontro com as ideias preconizadas por Cesare Beccaria, um grande iluminista italiano, contemporâneo de Tiradentes. Agora que você leu o texto acima, faça uma pesquisa e responda as seguintes perguntas: a) Com base em que legislação Tiradentes foi, no Século XVIII, condenado à pena de morte? b) A condenação e a pena aplicadas a Tiradentes foram influenciadas pelas ideias de Cesare Beccaria? Justifique. PARA A PRÓXIMA AULA Antes da próxima aula, você deve: Acessar o ambiente virtual da disciplina no SAVA (no SIA, entrar em Sala de Aulas Virtuais e Minhas disciplinas presenciais), assistir à videoaula 4 e observar outras indicações de materiais para aprofundamento deste conteúdo. Ler o livro texto - Livro didático de História do Direito Brasileiro, da Estácio, até a página 68.
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