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Arlindo Ugulino Netto – ANESTESIOLOGIA – MEDICINA P5 – 2009.2 1 MED RESUMOS 2011 NETTO, Arlindo Ugulino. ANESTESIOLOGIA ANESTESIA VENOSA Como se sabe, os objetivos clssicos da anestesia geral so: promover o bloqueio ou insensibilidade dor (analgesia); promover a inconscincia; bloquear e evitar reflexos autonmicos (neurovegetativos) indesejveis; promover amn sia antergrada, isto , fazer com que tudo que acontece aps a anestesia seja esquecido pelo paciente; promover o relaxamento muscular. Antigamente, estes efeitos eram obtidos pela administrao de uma nica substncia inalatria, como, por exemplo, o ter. Hoje, para obteno de analgesia, administram-se analg sicos; para obteno de hipnose, administram- se hipnticos; e para obteno de relaxamento muscular, utilizam-se bloqueadores neuromusculares. Todos estes agentes so administrados no de forma isolada, mas em conjunto, com finalidades bem-especficas, por meio dos anest sicos venosos. Os agentes mais utilizados em anestesia venosa so: Sedativos hipnticos: propofol (Diprivan, hipntico de eleio para as grandes anestesias), midazolam (Dormonid, muito utilizado para anestesia peditrica), etomidato (Hipnomidato, derivado imidazlico que apresenta melhor controle hemodinmico durante a induo), metoexital e tiopental (Tiopental Sdico Northia, derivado barbitrico que serve de prottipo para os frmacos de sua classe). Frmacos com atividade dissociativa: cetamina. A anestesia dissociativa um tipo de anestesia que favorece a ativao dos sistemas psicolgicos e, com isso, o paciente pode apresentar algumas alteraes comportamentais, fazendo com que o paciente, muito frequentemente, passe por experincias como iluses ou pesadelos. Agonistas α2: dexmedetomidina e clonidina Opiides (derivados sintticos da morfina): devem ser includos como componentes da t cnica da anestesia venosa, merecendo destaque os de uso corrente como fentanil (muito potente, com cerca de 100 vezes da potncia da morfina), sufentanil (mais potente dos opiides, com cerca de 10 vezes da potencia do fentanil), alfentanil (opiide de pequena potencia, com cerca de 1/15 da potncia da morfina) e, mais recentemente, o remifentanil (tamb m tem baixa potencia). Essas drogas oferecem uma boa estabilidade hemodinmica durante a anestesia. Classicamente, durante a induo e manuteno da anestesia, os anest sicos venosos tm sido administrados tanto em doses nicas elevadas quanto em doses pequenas e intermitentes. A partir da d cada de 80, com a introduo do propofol e a possibilidade de sua associao com opiides (como alfentanil, sufentanil e, atualmente, remifentanil), abriu-se a possibilidade da utilizao de t cnicas anest sicas por infuso venosa contnua, j que estes anest sicos apresentam um perfil farmacocin tico favorvel a essa forma de administrao. Por m, o uso de infuses contnuas, com velocidades e concentraes no plasma e no stio efetor controladas, possui uma s rie de vantagens em relao sua administrao intermitente, tais como: Possibilidade de ajustes independentes das concentraes de cada um dos componentes da anestesia (hipnose/analgesia), adaptando-os s modificaes dos estmulos cirrgicos; Manuteno de concentraes plasmticas dos anest sicos venosos estveis ao longo do tempo; Possibilidades de alteraes rpidas e reais da concentrao no plasma e no stio efetor dos anest sicos; Despertar mais rpido; Estimativa do tempo do despertar aps o t rmino da infuso; Menor incidncia de alteraes hemodinmicas dependentes do estmulo cirrgico; Reduo da necessidade de suplementao com outros anest sicos ou frmacos vasoativos; Diminuio das necessidades da utilizao de suporte ventilatrio no ps-operatrio; Baixa incidncia de paraefeitos; Ausncia de poluio ambiental; Menor dose total administrada, com consequente economia. FARMACOLOGIA BSICA Devemos considerar o organismo humano como sendo constitudo de vrios pequenos compartimentos cheios de lquido, os quais so normalmente estudados em nmero de trs. Desta forma, foram idealizados os modelos matemáticos farmacocinéticos multicompartimentais: O compartimento central (plasmtico) composto pelos rgos que recebem uma maior frao do d bito cardaco – corao, rins, fgado, glndulas endcrinas, c rebro, bao e pulmes. Neste compartimento, esto os locais de ao dos anest sicos venosos, denominados stios efetores. O compartimento 2 compreendido pelos msculos. O compartimento 3 constitudo pelo tecido adiposo (onde se agregam os frmacos lipoflicos, que apresentam, portanto, metabolismo mais lento), sendo este menos vascularizado, mas representando o setor com a maior Arlindo Ugulino Netto – ANESTESIOLOGIA – MEDICINA P5 – 2009.2 2 massa de tecido corporal, ou seja, o maior compartimento do organismo. Por ser pouco vascularizado, o tecido gorduroso faz com que a droga seja eliminada mais vagarosamente, aumentado o efeito residual do frmaco, podendo causar, inclusive, efeito de 2 fase ( por esta razo que se tem utilizado muito mais frmacos hidroflicos, participando menos deste 3 compartimento). Os frmacos administrados no compartimento central devero se ligar s protenas plasmticas em certa quantidade e, como sabemos, apenas a poro no ligada serve como poro ativa do frmaco, que deve passar por processos farmacocin ticos que j conhecemos – isto : absoro, distribuio, redistribuio e, por ltimo, a eliminao (biotransformao) – ao longo dos compartimentos. Esses compartimentos compartilham as substncias que so administradas no compartimento central, geralmente por meio da diferena dos gradientes de concentrao entre cada um deles, de tal forma que, quando a concentrao de um compartimento aumenta, o frmaco distribudo aos demais. Embora o trnsito seja livre de um para o outro, existem constantes de velocidade e de tempo de distribuio entre eles. As referidas constantes so denominadas de k e ke0 com suas constantes de tempo t1/2k e t1/2ke0, como ser visto mais adiante. Quando se administra um frmaco venoso, isto feito dentro do compartimento central. Uma vez em circulao plasmtica, o frmaco diludo pelo contedo desse compartimento, gerando uma concentrao da substncia. Quanto maior o volume do compartimento, menor a concentrao obtida, uma vez que a diluio ser mais intensa e vice-versa. A farmacocin tica engloba todos os fatores envolvidos na relao temporal entre a administrao do frmaco e sua concentrao no stio de sua ao (biofase). A farmacodinmica quantifica a relao entre a concentrao do frmaco no stio de ao (biofase – stio efetor) e o seu efeito especfico. Portanto, ela quem determina e quantifica a atividade farmacolgica resultante da administrao de uma substncia, como por exemplo, a intensidade da depresso sensorial aps a administrao de um hipntico, a repercusso hemodinmica aps a administrao de um opiide, etc. importante ressaltar que os dois parmetros, farmacocin ticos e farmacodinmicos, estabelecem relaes temporais de ao, ou seja, so ambos dependentes de tempo. Embora os conceitos tradicionais de cin tica e dinmica sejam filosoficamente atraentes, representam uma situao ideal, que no pode ser aplicada no estudo farmacolgico de frmacos venosos quando administrados esp cie humana. Isso se deve a dois fatores: 1. O stio primrio ou os stios de ao hipntica/sedativa, analg sica e amn sica dos anest sicos venosos esto localizados no interior do sistema nervoso central, embora no tenha sido possvel medir as concentraes do frmaco no seu stio efetor. Entretanto, est amplamente estabelecido que a concentrao do frmaco no stio efetor est em equilbrio constante com a sua prpria concentraono plasma, sendo que esta ltima pode ser quantificada, servindo como uma projeo de sua concentrao no referido stio efetor. 2. Est estabelecido cientificamente que somente as mol culas dos frmacos no ligadas s protenas plasmticas ou a outros stios podem atingir os stios efetores. Como consequncia disto, a maior parte do conhecimento atual sobre a farmacocin tica desse grupo de frmacos tem sido derivada da caracterizao da relao temporal entre administrao venosa do frmaco e sua concentrao plasmtica total (ligada e livre). importante salientar que, no caso dos anest sicos venosos, as conceituaes rec m-descritas tm-se mostrado adequadas para a orientao de sua administrao em anestesia clnica. Embora a proposta desta sesso seja discutir a farmacologia dos anest sicos venosos de maneira individualizada, importante introduzir alguns conceitos farmacolgicos que facilitem o entendimento do anestesiologista clnico no que se refere sua infuso contnua. O tempo de equilíbrio (ke0), como um dos conceitos necessrios, o tempo decorrido entre a administrao do frmaco por via venosa e seu efeito mximo teraputico no stio efetor. O ke0 deve ser o mais rpido possvel para uma boa induo anest sica, fazendo com que os efeitos da dose inicial apaream logo aps a administrao do frmaco, evitando a possibilidade da administrao de doses subsequentes por interpretao errada de que a primeira dose foi insuficiente, o que pode resultar em superdose, com os seus indesejveis paraefeitos. Alguns anest sicos venosos, com exceo do fentanil, sufentanil, etomidato, midazolam e da cetamina, possuem um rpido ke0, que gira em torno de 1 minuto. Esse tempo pode ser influenciado pela velocidade de injeo. O equilbrio entre a concentrao sangunea arterial da substncia e no seu stio efetor (biofase) caracterizado pelo parmetro farmacocin tico/farmacodinmico t1/2ke0, como foi visto antes, sendo essa relao aferida por meio do estudo concomitante da concentrao plasmtica e da repercusso eletroencefalogrfica. OBS1: O remifentanil, o alfentanil e o propofol so frmacos que esto indicados para procedimentos de curta durao (intubao traqueal, endoscopias, reduo de fraturas), com recuperao rpida, bem como para abordar com rapidez os distrbios hemodinmicos secundrios superficializao inesperada da anestesia ou por elevao da intensidade dos estmulos cirrgicos nociceptivos ou reflexgenos. Arlindo Ugulino Netto – ANESTESIOLOGIA – MEDICINA P5 – 2009.2 3 t1/2ke0 e tempo do pico máximo de efeito (após dose em bolus) Fármaco Pico máximo de efeito (min) t1/2ke0 Fentanil 3,6 4,7 Alfentanil 1,4 0,9 Sufentanil 5,6 3 Remifentanil 1,5 1 Propofol 2,2 2,4 Tiopental 1,7 1,5 Midazolam 2,8 4 Etomidato 2 1,5 OBS2: Indução anestésica com a técnica de sequência rápida. A induo da anestesia por meio da t cnica de sequncia rpida utilizada, principalmente, para proteger as vias a reas, quando h risco de aspirao do contedo gstrico. Esta t cnica tem sido utilizada amplamente em procedimentos de emergncia (todo paciente em emergncia deve ser considerado como “estmago cheio”, at que se prove o contrrio) e na anestesia obst trica quando a anestesia geral est indicada. Tamb m tem sido empregada em situaes em que, embora no haja emergncia, existe o risco de aspirao do contedo gstrico, como nos casos de obesidade, refluxo gastroesofgico ou diabete melito. Assim, o intervalo entre a perda da conscincia e a intubao traqueal constitui o perodo de maior risco para a aspirao do contedo gstrico. A t cnica envolve oxigenao pr via, hipnose (com anest sicos de t1/2ke0 curto, como o tiopental e etomidato), analgesia, relaxamento muscular rpido (com succinilcolina) e aplicao de presso na cartilagem cricide. A t cnica deve ser realizada por duas pessoas: o anestesiologista e um assistente. Anlise ectoscpica rpida e efetiva da via a rea superior do paciente, atribuindo a ele um grau de dificuldade de intubao segundo Mallampatti. Pr -oxigenao (durante 5 minutos) e desnitrogenao do paciente (no sexto minuto). Posio de pr-clive, com elevao cranial em 15 a 30 no leito. Analgesia com opiides de t1/2ke0 curto, como o alfentanil e o remifentanil. O fentanil no serve para induo anest sica em sequncia rpida. Sedao com frmacos sedativos hipnticos com t1/2ke0mais curto possvel (preconiza-se aqueles com t1/2ke0 menores que 2 minutos), como o tiopental e etomidato. Relaxamento muscular com um bloqueador neuromuscular de ao rpida, como a succinilcolina, com um tempo de ao em cerca de 1 minuto. Para evitar as fasciculaes, deve-se fazer, previamente, a priming dose (uso pr vio de 1/10 da dose de bloqueador neuromuscular adespolarizante para que os receptores muscarnicos da placa neuro-muscular seja previamente ativada em menos de 25% de seu total). Uma vez identificada a dificuldade de intubao (pela escala de Mallampatti), a conduta preconizada a passagem do tubo oro ou nasotraqueal com o paciente acordado, precedida da devida preparao (sedao consciente, antissialagogo, anestesia tpica ou bloqueio do nervo larngeo superior e do ramo lingual do nervo glossofarngeo). Quando a dificuldade das vias a reas s percebida aps induo da anestesia geral e a ventilao sob mscara facial no possvel, deve-se prontamente colocar mscara larngea ou Combitube, iniciar ventilao a jato transtraqueal ou realizar cricotireoidostomia de emergncia. A presso bidigital da cartilagem cricide (manobra de Sellick) por permitir a compresso do esfago contra a coluna vertebral, tornou-se prtica universal durante a induo da anestesia em pacientes potencialmente com estmago cheio. Esta manobra, quando realizada corretamente, previne a insuflao gstrica em crianas e em adultos, al m de aumentar o tnus do esfncter esofgico superior. Este efeito diminui a probabilidade de aspirao do contedo gstrico em caso de refluxo. Al m disso, esta manobra, auxiliada pela compresso do dedo indicador contra a proeminncia larngea, conduzindo-a em sentido ceflico e para trs da fora aplicada sobre a cartilagem, possibilita uma retificao melhor dos eixos ceflicos, melhorando a visualizao das estruturas atrav s da laringoscopia. Somente depois de realizada a entubao e confirmada a sua correta instalao, o assistente poder encerrar a manobra de Sellick. O segundo conceito o de meia-vida contexto-dependente (context-sensitive half-time). O conceito de meia- vida de eliminao (t1/2β) de um frmaco caracterizado como uma propriedade intrnseca dos modelos farmacocin ticos monocompartimentais. A meia-vida muito til para prever a concentrao plasmtica de um frmaco quando sua farmacocin tica pode ser descrita em um modelo monocompartimental. Contudo, o organismo dos pacientes que recebem os anest sicos venosos considerado um sistema multicompartimental e, portanto, o modelo no se encaixa de maneira matemtica. FARMACOLOGIA DOS ANESTSICOS VENOSOS SEDATIVOS HIPNÓTICOS 1. Propofol O propofol utilizado em anestesiologia clnica por muitas razes, entre elas o seu incio rpido de ao, paraefeitos mnimos, estabilidade hemodinmica e, em algumas situaes, uma potencial atividade anti-em tica. O propofol o anest sico venoso que tem o perfil farmacolgico mais adaptado administrao de infuso contnua. Arlindo Ugulino Netto – ANESTESIOLOGIA – MEDICINA P5 – 2009.2 4 1.1. Características físico-químicas O propofol (2,3-diisopropilfenol) um alcalifenol com propriedades hipnticas. Esse grupo farmacolgico composto de substncias insolveis em soluo aquosa, por m altamente lipossolveis em temperatura ambiente. O propofol preparado em soluo a 1% em emulso leitosa branca, que constituda de 10% de leode soja, 2,25% de glicerol e 1,2% de fosfato purificado de ovos. O propofol est disponvel em ampolas e frasco-ampolas. A diferena entre ambas apresentaes est na presena ou no do conservante: apenas o frasco-ampolas apresentam o conservante. Este responsvel por preservar o propofol de contaminao bacteriana. Por esta razo, o propofol em ampola, por no conter substncias bactericidas nem bacteriostticas em sua composio, deve ser usada apenas individualmente (em no mximo 1 hora depois de aberto). O glicerol o agente responsvel pela irritao venosa quando o propofol administrado por via venosa. Os pacientes al rgicos a ovos no so necessariamente al rgicos ao propofol, porque esse tipo de reao est geralmente relacionado com a frao albumina do ovo. 1.2. Mecanismo de ação Trabalhos recentes propem que a inibio da neurotransmisso de atividade excitatria e uma ativao da neurotransmisso inibitria so possveis mecanismos de ao desse grupo de anest sicos. Estudos realizados em modelos experimentais mostram que o tipopental e o propofol produzem inibio da liberao de glutamato dependente de potssio pela ativao de receptores de cido γ-aminobutrico (GABA). Esse dado sugere que o estado de anestesia resulta de uma interao entre a transmisso glutamin rgica e liberao de cido γ-aminobutrico. 1.3. Características farmacológicas pH 7,0 (discretamente viscosa) Estvel a luz solar e a temperatura ambiente Pode ser diludo em soluo glicosada a 5% ou salina a 0,9%. A ampola no cont m substncia bactericida e nem bacteriosttica Uso individual Algumas apresentaes (conservante edetato dissdico). 1.4. Farmacocinética O propofol pode ser comparado ao tiopental quanto aos seus aspectos farmacocin ticos. Comparação entre os parâmetros farmacocinéticos Variável Propofol Tiopental Meia-vida de eliminao (h) 6,3 12,7 Volume de distribuio (L) 530 190 clearence metablico (L/min) 1,7 0,2 clearence compartimental Compartimento rpido Compartimento lento 1,7 2,1 2,6 0,6 clearence total (metablico+compartimental) 5,5 3,4 A t1/2ke0 do propofol de 2,6 minutos, o que faz com que o seu equilbrio entre a contrao plasmtica e dentro do stio efetor ocorra de forma relativamente lenta. Conforme definio farmacolgica, uma substncia alcana o seu equilbrio entre esses dois compartimentos quando completa 4,32 vezes a sua t1/2ke0. Assim, no caso do propofol, este tempo est situado entre 8 e 10 minutos sempre que o m todo de infuso tiver como alvo uma dada concentrao plasmtica. A dose de induo de 2 a 2,5 mg/kg, sendo este valor diminudo para 1,5 mg/kg em pacientes idosos, uma vez que a dose depende das condies clnicas dos pacientes e,como veremos, os efeitos cardiorrespiratrios so dose- dependentes. Quando o propofol comparado ao tiopental, nota-se que este ltimo apresenta uma t1/2ke0 de 1,17 minutos sendo, portanto, mais rpido que o propofol para igualar as suas concentraes no plasma e no stio efetor. O clearence metablico sistmico do propofol 10 vezes maior que o do tiopental. O cleance compartimental do propofol e do tiopental gira em torno de 3 a 4L/min/70kg, um valor aproximado de 60 a 80% do d bito cardaco. O propofol tem um volume de distribuio maior que o do tiopental. A elevada lipossolubilidade dos dois frmacos implica grande deposio deles nos msculos e gorduras por um mecanismos de redistribuio rpida. Em resumo, pelo fato de o propofol ter um clearance muito mais otimizado que o do tiopental, temos um tempo de eliminao do propofol muito mais rpido, resultando em diminuio dos efeitos residuais deste frmaco. A meia-vida de eliminao (t1/2β) de um anest sico venoso diretamente proporcional ao seu volume de distribuio e inversamente proporcional ao seu cleance. Arlindo Ugulino Netto – ANESTESIOLOGIA – MEDICINA P5 – 2009.2 5 Estudos com cateterização da veia hepática, com o objetivo de avaliar o clearence hepático do propofol, mostram que somente metade do clearance total foi realizada por essa via, sendo que a outra metade é realizada de maneira extra-hepática. As doenças hepáticas parecem implicar um tempo maior para atingir uma situação de equilíbrio concentração do fármaco no compartimento central por causa do maior volume desse compartimento nos hepatopatas. Nessa situação clínica, o cleance do propofol não é alterado e a meia-vida de eliminação é discretamente elevada. As doenças renais não alteram a farmacocinética do propofol. 1.5. Farmacodinâmica 1.5.1. Sistema Nervoso Central Uma dose de 1 mg/kg, seguida de uma infusão contínua em dose menor do que 100 µg/kg (dose sedativa) do propofol, altera o traçado de EEG de um paciente hígido. Os principais efeitos do propofol em nível de SNC são: Diminui o fluxo sanguíneo cerebral e o consumo cerebral de oxigênio de forma paralela e de maneira dose-dependente, diminuindo o metabolismo cerebral. Diminui a pressão do líquor e eleva a resistência vascular cerebral em pacientes submetidos a craniotomia, com ou sem hipertensão intracraniana prévia. O tiopental, por causar menor diminuição na pressão arterial sistêmica do que o propofol, mantendo mais estável a pressão de perfusão cerebral, é preferido por muitos neuroanestesistas para procedimentos cirúrgicos intracranianos. Apresenta uma recuperação rápida após a administração de uma dose em bolus ou por infusão contínua de doses hipnóticas. Reduz a pressão intra-ocular e previne sua elevação pela administração de uma segunda dose imediatamente antes da realização das manobras de intubação traqueal e da administração de succinilcolina. 1.5.2. Sistema respiratório O propofol é um depressor respiratório de ação central que deprime a frequência e a profundidade da respiração. Frequentemente, ocorrem períodos de apnéia após a administração de doses de indução de propofol, sendo mais comuns em pacientes com oxigênio a 100% ou hiperventilados. Doses de 6mg/kg/h em infusão contínua durante ventilação espontânea resultam em depressão de 30% do volume corrente, com consequente elevação da frequência respiratória no mesmo percentual. Os fármacos depressores respiratórios (opióides) associados ao propofol aumentam o poder depressor respiratório. Em doses sedativas, o propofol causa depressão do volume corrente e do volume-minuto respiratório, bem como depressão da curva de resposta ventilatória à hipoxemia. Esse fármaco não causa alteração do tônus da musculatura lisa brônquica, como faz o tiopental (contra- indicado para pacientes asmáticos). 1.5.3. Sistema cardiovascular De uma forma geral, todas as drogas anestésicas são depressoras dose-dependentes do sistema cardiovascular. O propofol é o mais potente depressor cardiovascular de todos os anestésicos venosos aqui estudados, sendo esta a principal desvantagem para sua utilização clínica. Devem ser especialmente acompanhados os pacientes com baixa reserva vascular miocárdica que serão submetidos a esta anestesia. Para eles, deve-se diminuir e fracionar a dose. Uma dose de indução de 2 a 2,5 mg/kg produz uma redução de 25 a 40% na pressão arterial sistólica (PAS), independentemente da presença de doença cardíaca. Reduções em níveis similares acontecem na pressão arterial média (PAM) e diastólica (PAD). As referidas reduções são acompanhadas de decréscimo na relação débito cardíaco- índice cardíaco (15%), no volume sistólico de ejeção (20%) e na resistência vascular sistêmica (15 a 20%). O trabalho ventricular diminui em 30%. Diminui o débito cardíaco (em 15%), a resistência vascular sistêmica (em 15 a 20%), a pressão arterial sistêmica (sistólica e diastólica) e o volume sistólico de ejeção. Deprime a contratilidade miocárdica de maneira dose-dependente. Diminui a pré e a pós-carga cardíacas por ação direta namusculatura lisa vascular (arterial e venosa) e por diminuição do tônus simpático. Diminuição da PAS, PAD e PAM: pode provocar hipotensão arterial dose-dependente por causa da depressão miocárdica, da vasodilatação periférica, da inibição simpática e da discreta depressão do reflexo barorreceptor. O propofol eleva a vagotonicidade, podendo ser a causa de intensa bradicardia, principalmente quando combinado com fármacos vagotônicos, como os opióides e a succinilcolina. Não tem atividade arritmogênica. Diminui a demanda de oxigênio pelo miocárdio e o fluxo sanguíneo neste músculo. Arlindo Ugulino Netto – ANESTESIOLOGIA – MEDICINA P5 – 2009.2 6 1.6. Efeito antiemético A incidncia de nuseas e vmitos mais baixa aps a utilizao de propofol do que a utilizao de qualquer outro anest sico venoso. Essa caracterstica favorece seu uso em procedimentos que por si s aumentem a incidncia desses sintomas no perodo ps-operatrio, como, por exemplo, cirurgia de estrabismo em crianas ou cirurgia ambulatorial (principalmente cirurgias laparoscpicas ginecolgicas em mulheres jovens). Estudos recentes avaliando a potencial atividade anti-em tica do propofol indicam que a concentrao plasmtica mnima efetiva para esse tipo de ao de 350ng/mL. Dessa forma, essa atividade perdida quando ele utilizado apenas como agente indutor anest sico em procedimentos de m dia e longa durao. Para tornar mais efetiva a atividade anti-em tica do propofol, faz-se uma dose de induo e uma dose complementar administrada imediatamente antes da fase de recuperao anest sica. 1.7. Fase de recuperação A utilizao de propofol para induo anest sica em procedimentos cirrgicos curtos resulta em rpida recuperao e retorno precoce das funes psicomotores, quando comparado ao tiopental e ao metoexital. O propofol, devido s suas caractersticas farmacocin ticas, promove uma recuperao rpida, superior recuperao ps- anestesia barbitrica, embora semelhante ao tempo de recuperao aps a utilizao isolada de enflurano e isoflurano (a recuperao mais rpida com estes frmacos do que a conferida pelo propofol). 1.8. Outros efeitos O propofol ainda apresenta as seguintes caractersticas: Rpida recuperao e retorno precoce s funes psicomotores No potencializa efeitos bloqueadores neuromusculares adespolarizantes ou despolarizantes Favorece condies para uma “excelente” laringoscopia e entubao traqueal No desencadeia crise hipertermia maligna No interfere na liberao do hormnio adrenocorticotrfico e corticides no organismo No altera funo heptica, hematolgica, fibrinoltica Baixo poder alergnico. 1.9. Contra-indicaçoes e paraefeitos Dor durante a injeo (mais intensa do que a causada pelo tiopental). A dor pode ser reduzida pela utilizao de veias de grosso calibre e pela associao de lidocana soluo. Contraes tnico-clnicas so mais frequentes com o propofol do que com o tiopental Apn ia aps utilizao de propofol em dose de induo anest sica Hipotenso arterial (bastante frequente) Tromboflebites (mais rara) 1.10. Uso clínico O propofol pode ser usado tanto em induo e manuteno da anestesia, como em sedao durante cirurgia e na unidade de terapia intensiva. Seus usos e doses so listados a seguir: Indução de anestesia geral: 1 – 2,5 mg/kg intra-venoso, reduzindo a partir de 50 anos. Manutenção de anestesia: 80 – 150 g/kg/min IV com xido nitroso ou opiides. Sedação: 10 – 50 g/kg/min IV. 2. Midazolam (Dormonid®) O midazolam o primeiro benzodiazepnico hidrossolvel, preparado em soluo aquosa sob a forma de sal (cloridrato). estvel nessa soluo, podendo ser misturado com soluo salina ou Ringer lactato. Estruturalmente, difere do diazepam pela incorporao de um on fluoreto no anel benznico e de um grupamento imidazlico no lugar da mol cula de oxignio ligada ao carbono 2 do anel benzodiazepnico. A principal caracterstica que distingue o midazolam dos outros benzodiazepnicos sua hidrossolubilidade dependente do pH a que est submetido, isto , em pH menor que 4, um frmaco hidrossolvel que dispensa a utilizao de propilenoglicol para sua solubilizao. Em pH fisiolgico, o midazolam torna-se extremamente lipossolvel, dessa forma transpondo barreiras lipdicas com grande facilidade, o que lhe confere um rpido incio de ao e um grande volume de distribuio. Diferentemente do propofol em frasco-ampola, o midazolam no apresenta conservante e, quando injetado na veia, no causa irritao. 2.1. Farmacocinética Os trs benzodiazepnicos utilizados em anestesia podem ser classificados, de acordo com o seu metabolismo e clearance, em frmacos de durao de efeito curta (midazolam), intermediria (lorazepam) e longa (diazepam). Arlindo Ugulino Netto – ANESTESIOLOGIA – MEDICINA P5 – 2009.2 7 2.1.1. Metabolismo O midazolam eliminado do plasma quase exclusivamente pelo metabolismo; menos de 1% apenas eliminado na forma in natura pelo plasma. Os metablitos hidroxilados so conjugados e, depois, eliminados pela urina. O metablito 1-hidroximidazolam detectado no plasma em concentraes de 40 a 80% em relao concentrao do frmaco-me, sendo farmacologicamente ativo no nvel do receptor benzodiazepnico. O 1-hidroximidazolam acima de 60 ng/mL em circulao pode ter uma atividade muito significativa no complexo receptor-canal inico GABA-benzodiazepnico. Devido ao seu elevado clearance sistmico, os nveis plasmticos diminuiro de maneira muito mais rpida do que os dos outros benzodiazepnicos. Pode ser utilizado, portanto, nos procedimentos de curta e m dia durao. As seguintes situaes clnicas podem alterar a farmacocin tica do midozalam: Concentração de proteínas plasmáticas: o midozalam, assim como o diazepam, um frmaco muito ligado s protenas plasmticas, em especial albumina. Processos patolgicos que diminuem a albumina plasmtica podem ocasionar um aumento dos nveis s ricos do midazolam e, portanto, aumento de seu efeito. Gestação: o volume de distribuio do midazolam normalmente maior nas mulheres e fica aumentado durante a gestao. Obesidade: a meia-vida de eliminao (t1/2β) desse frmaco est elevada na obesidade (2,7 para 8,4 horas) devido a um decr scimo no clearance e a um aumento no volume de distribuio. Insuficiência rena (IR): a IR aguda eleva o volume de distribuio do midazolam, fazendo com que sua ligao s protenas s ricas alcance um percentual de 95%. A frao no-ionizada desse frmaco eleva-se no paciente renal crnico, sem aumento do clearance do midazolam s rico livre. necessrio, neste caso, um pequeno ajuste da dose. Insuficiência hepática: no caso de cirrose, o clearance heptico est diminudo. Cimetidina: o uso de cimetidina reduz o clearance do midazolam pela inibio enzimtica causada por este frmaco. Tabagismo: o tabagismo aumenta o clearance do midazolam por induo enzimtica. Uso em pacientes cirúrgicos: o procedimento cirrgico em si tem pouca atividade sobre a distribuio, embora possa levar a um aumento na meia-vida de eliminao. 2.2. Farmacodinâmica 2.2.1. Mecanismo de ação Os benzodiazepnicos tm propriedades hipntica-sensitivas, ansiolticas, amn sicas, anticonvulsivantes,, relaxantes musculares (ao central), etc. Essas atividades farmacodinmicas so estabelecidas pela ligao com receptores especficos relacionados espacial e funcionalmente ao receptor GABAA. Foram identificados at o momento dois subtipos de receptores benzodiazepnicos, tipo I e tipo II (tamb m chamados de BZ1 e BZ2), de acordo com a sensibilidade de ligao com diferentes substncias. Os receptores benzodiazepnicos esto localizados em grande densidade no bulbo olfatrio, crtex cerebral, cerebelo, hipocampo, substncia negra,colculo inferior e, em menor densidade, no ncleo estriado, na regio subcortical e na medula. 2.2.2. Início de ação O diazepam (mais lipossolvel) apresenta um tempo de incio de ao 3 vezes mais rpido do que o midazolam (mais hidrossolvel), embora os dois agentes venosos apresente um pico mximo de efeito dentro dos primeiros minutos aps sua administrao venosa. O anel diazepina do midazolam abre em soluo cidas com pH menor que 4, elevando muito a sua hidrossolubilidade. Em pH fisiolgico de 7,4 e uma temperatura de 37C, o anel diazepina se fecha, resultando em uma elevada lipossolubilidade da estrutura molecular do midazolam, o que facilita sua rpida difuso trav s da barreira hematoenceflica. Entretanto, o fechamento do anel diazepina lento, ficando em torno de 10 minutos, o que talvez possa explicar a diferena de tempo de incio entre o midazolam e o diazepam. 2.2.3. Duração de ação O diazepam tem um tempo de ao longo, o lorazepam, intermedirio e o midazolam, curto. O diazepam tem uma fase de distribuio rpida, com meia vida de eliminao de 20 horas. J o midazolam apresenta meia vida de 5h (4 vezes menor que a do diazepam). Sendo assim, o midazolam tem uma boa indicao para anestesia ambulatorial. 2.2.4. Sistema nervoso central Sedação-hipnose: um efeito dose-dependente: a injeo rpida de 10 mg de midazolam em voluntrios hgidos induz inconscincia em 30 a 97 segundos, a qual tem durao de 3 a 6 minutos. O midazolam administrado na dose de 2 mg por via venosa antes da infuso de doses sedativas de propofol eleva a ansilise, a sonolncia e amn sia, comparado com a utilizao de uma infuso de propofol isolado. Amnésia: os benzodiazepnicos podem no produzir amn sia retrgrada, mas podem produzir amn ia antergrada (maior predominncia). O lorazepam produz uma amn sia mais intensa e duradoura (6 horas). A amn sia conferida pelo diazepam de curta durao e no significativa, a no ser em doses eevadas (a partir Arlindo Ugulino Netto – ANESTESIOLOGIA – MEDICINA P5 – 2009.2 8 de 20 mg via venosa). O midazolam pode produzir amn sia antergrada com doses sub-hipnticas, de 0,15 mg/kg por um perodo de aproximadamente 40 minutos. Efeito ansiolítico: a dose para obteno desse tipo de efeito situa-se entre a que propicia amn sia e a que induz sedao. Efeito antoconvulsivante: os benzodiazepnicos so efetivos como anticonvulsivantes, principalmente em intercorrncias agudas: o diazepam e o midazolam so os eleitos para o tratamento a curto prazo (em infuso contnua), enquanto que o lorazepam escolhido em caso de tratamento a longo prazo. Efeito sobre o metabolismo cerebral: os benzodiazepnicos exercem um potente efeito sobre o metabolismo cerebral. Doses elevadas (supra-anest sicas) de diazepam e de midazolam diminuem o fluxo sanguneo cerebral, diminuem o metabolismo cerebral e o consumo de oxignio pelo tecido nervoso. 2.2.5. Sistema cardiovascular O midazolam confere uma boa estabilidade hemodinmica, apresentando efeitos cardiovasculares muito semelhantes ao etomidato (que de todas as drogas hipntico-sedativas, a que melhor apresenta estabilidade cardiocirculatria durante a induo da anestesia). Discreto aumento da frequncia cardaca (10%). Maior decr scimo na presso arterial m dia (15 a 25%) Diminuio no significativa na resistncia vascular sistmica Diminuio moderada na presso da art ria pulmonar Diminuio no volume sistlico de ejeo e no d bito cardaco direito e esquerdo. 2.2.6. Sistema respiratório A depresso do sistema respiratrio tamb m dose-dependente: aps a administrao de midazolam nas doses de 50 a 150 g/kg/min, o volume corrente diminui e a frequncia respiratria se eleva na mesma proporo, o que resulta em um aumento de apenas 10% na presso parcial expirada de CO2. Deste modo, ocorre uma pequena alterao do volume minuto. Contudo, ao ser administrado juntamente a opiides, o midazolam bloqueia a compensao da frequncia respiratria, diminuindo tanto o volume corrente quanto a prpria frequncia, diminuindo de forma considervel o volume minuto. A associao de midazolam com fentanil eleva a incidncia de fenmenos hipxicos em 50%. A depresso respiratria causada pela administrao de midazolam muito intensificada pela presena de doena broncopulmonar obstrutiva crnica, o que resulta em uma significativa depresso na curva de resposta inalao do CO2. 2.2.7. Tônus muscular Os benzodiazepnicos tm a propriedade de provocar relaxamento muscular de origem central, a qual tem sido postulada como uma atividade no nvel de receptores de glicina no sistema nervoso central e na medula. O midazolam no tem nenhuma interao com os bloqueadores neuromusculares, despolarizantes nem adespolarizantes. OBS3: Flumazenil. A liberao para uso clnico do antagonista especfico e competitivo dos receptores GABAA, o flumazenil, possibilitou a reverso de todos os efeitos resultantes da administrao de medazolam e de diazepam em infuso contnua ou em bolus. Existe a possibilidade da reverso dos seguintes efeitos: sedao-hipnose, amn sia, vida de eliminao de 1 hora, comparada com a meia-vida de eliminao acima de 3 horas dos benzodiazepnicos, pode causar problemas na reverso dos efeitos depressivos destes em longo prazo. Contudo, apenas uma infuso de flumazenil (que hidroflico) pode no ser o suficiente para reverter os efeitos do diazepam lipoflico, uma vez que estes podem apresentar uma meia-vida longa (20h, quatro vezes maior que a do midazolam), podendo causar efeito de 2 fase. 3. Etomidato O etomidato um derivado imidazlico carboxilado hidrossolvel, constitudo por dois ismeros, sendo apenas o ismero + ativo e com funo hipntica. Apresenta uma certa instabilidade em solues neutras. Atualmente, fornecido em soluo, na concentrao de 2mg/mL com propilenoglicol (conservante) com um pH de 6,9. Contudo, tem sido proposta sua diluio em um novo solvente, o 2-hidroxipropil-β-ciclodextrina, que resulta em menor intensidade de dor infuso e menor incidncia de tromboflebites, sem causar hemlise, quando comparado ao propilenoglicol. 3.1. Farmacocinética 3.1.1. Volume de distribuição e clearance O etomidato possui volume de distribuio discretamente maior e clearance de eliminao mais elevado, quando comparado com os barbitricos. Arlindo Ugulino Netto – ANESTESIOLOGIA – MEDICINA P5 – 2009.2 9 3.1.2. Metabolismo O metabolismo do etomidato heptico, por hidrlise do ster. Seu tempo de meia vida de 2,7 minutos (rpido), tempo de distribuio de 29 minutos e tempo de eliminao (t1/2β), 2,9 a 5,3 horas. A t1/2β relativamente curta e o clearance rpido fazem do etomidato um frmaco com perfil farmacocin tico favorvel para administrao atrav s de infuso contnua. 3.2. Farmacodinâmica 3.2.1. Mecanismo de ação A ao primria do etomidato em nvel central a hipnose bastante efetiva. O etomidato potencializa o efeito inibitrio do cido γ-aminobutrico (GABA) sobre o receptor GABAA, hiperpolarizando as membranas ps-sinpticas pelo aumento de condutncia do cloro. 3.2.2. Início e duração de ação de ação O incio de ao aps uma dose convencional de induo de etomidato (0,3 mg/kg) muito rpido, isto , um tempo de circulao brao-c rebro equivalente ao do tiopental. A durao da anestesia aps uma dose nica de etomidato linearmente correlacionada com a dose empregada: cada 0,1 mg/kg administrados promovem 100 segundos de sono. Em situaes onde t1/2β de 5,5h, os pacientes se recuperam da sedao com etomidato em 40 minutos. 3.2.3. Sistema nervoso central O etomidado, em doses de 0,3 mg/kg, induz a hipnose por ao central, e no possui atividade analg sica. Nesta dose, o etomidato causa uma reduo do fluxo sanguneo cerebral e do consumocerebral de oxignio, diminuindo, com isso, o metabolismo cerebral, mas sem alterao da presso arterial m dia. 3.2.4. Sistema cardiovascular De todas as drogas, o etomidato apresenta a melhor estabilidade hemodinmica, com mnima repercusso cardiovascular quando utilizada em doses clnicas convencionais. Causa apenas alteraes insignificantes na elevao do d bito cardaco e uma discreta diminuio na frequncia cardaca, com baixa intervenincia na resistncia vascular sistmica. O etomidato no sensibiliza o miocrdio s catecolaminas. O etomidato , portanto, a droga de escolha para pacientes coronariopatas ou com distrbios hemodinmicos. 3.2.5. Sistema respiratório Em doses equivalentes, utilizadas durante a induo anest sica, o etomidato causa menor depresso respiratria do que o propofol e o tiopental. Seus efeitos de depressor respiratrio so dose-dependentes, da velocidade de injeo e da pr -medicao utilizada (os opiides causam maior depresso respiratria). O etomidato pode causar breves perodos de soluo ou tosse, embora no cause liberao de histamina ou aumento da resistncia em vias a reas, podendo ser administrado com segurana em pacientes asmticos. Ocasionalmente, a induo anest sica com etomidato pode ser acompanhada de um breve perodo de hiperventilao seguido de apn ia (esta mais prolongada quando h efeito do propofol). 3.2.6. Sistema endocrinológico A sedao prolongada com etomidato (por 5 dias, por exemplo) pode causar insuficincia da supra-renal. A atividade endcrina especfica do etomidato que resulta em insuficincia supra-renal uma inibio, dose-dependente e reversvel (com corticoideterapia), da enzima 11-β-hidroxilase, a qual converte o 11-deoxicortisol em cortisol e, em menor intensidade, uma atividade inibitria sobre a 17-α-hidroxilase. Essa inibio resulta na diminuio da ressntese de cido ascrbico, o qual necessrio para a sntese de esterides humanos. 3.3. Contraindicações e paraefeitos Aumento na incidncia de nusea e vmitos (30 – 40%). Essa incidncia aumenta ainda mais quando h associao com opiides ou em casos de cirurgias que, por si s, aumentem a incidncia de nuseas e vmitos (correo do estrabismo ou procedimento ambulatorial) Pode aumentar a incidncia flebites e tromboflebites, principalmente em veias de fino calibre. Dor durante a injeo devido ao seu conservante. A dor pode diminuir com o uso de pr vio de lidocana associado a uma dose mais diluda do etomidato. Contraes musculares tnico-clnicas e soluo (0 – 70%) so sintomas que pode acompanhar a administrao clnica do etomidato. 4. Cetamina A cetamina, responsvel por promover uma anestesia dissociativa, tem peso molecular de 238, sendo parcialmente hidrossolvel e apresenta sob a forma de soluo lmpida cristalina, com pKa de 7,5. Sua lipossolubilidade 5 a 10 vezes maior do que a do tiopental. preparada em uma soluo discretamente cida (pH 3,5 a 5,5). Tem um efeito antilgico que falta ao tiopental. Arlindo Ugulino Netto – ANESTESIOLOGIA – MEDICINA P5 – 2009.2 10 4.1. Farmacocinética A administrao venosa de cetamina apresenta uma curva tpica de relao concentrao plasmtica versus tempo. A queda de concentrao desse frmaco no plasma tem caracterstica bifsicas: (1) com uma fase de distribuio rpida e com durao de 45 minutos e (2) outra, de eliminao longa, com durao de horas. A cetamina no se liga intensamente s protenas plasmticas: sua ligao com elas oscila entre 27 – 47%. As protenas de ligao com a cetamina so albumina e 1-cido glicoprotena. A cetamina metabolizada no nvel de um sistema enzimtico microssomal heptico. A via metablica mais importante a que envolve a N-desmetilao, a qual forma a norcetamina (metablito I), posteriormente hidroxilada para originar a hidroxinorcetamina. Esses produtos so conjugados aos glicurondeos hidrossolveis e excretados na urina. 4.2. Farmacodinâmica 4.2.1. Mecanismo de ação A cetamina produz inconscincia e analgesia (o nico sedativo hipntico com ao analg sica) de maneira dose- dependente. A anestesia gerada por sua administrao denominada de anestesia dissociativa. O principal stio molecular de ao de cetamina o receptor N-metil-D-aspartato, no qual atua como um antagonista no-competitivo. Al m desse tipo de atividade, tamb m reduz a liberao pr -sinpatica de glutamato. Tem sido sugerido ainda que a ao sobre os receptores nicotnicos pode ser a responsvel pelos efeitos comportamentais secundrios utilizao dessa substncia. 4.2.2. Sistema nervoso central A cetamina produz inconscincia e analgesia (cetamina S+ agindo sobre os receptores MI) de maneira dose- dependente. O estado de anestesia conferido pela administrao desse frmaco denominado de anestesia dissociativa, assemelhando-se a um estado de catalepsia, diferentemente dos outros tipos de anestesia venosa, que simulam uma situao de sono normal. A cetamina produz uma situao clnica de intensa analgesia, por m muitas vezes mantendo os pacientes com os olhos abertos e com alguns reflexos (corneanos, tosse e de deglutio, frequentemente). A cetamina, al m de atravessar a barreira hemato-enceflica rapidamente, apresenta ainda um efeito excitatrio sobre os sistemas extra- piramidais e do sistema lmbico (este efeito pode ser bloqueado pelos benzodiazepnicos, como o midazolam). Embora a cetamina possa elevar a presso intracraniana, estudos recentes consideram-na como uma boa opo para anestesia de pacientes com leso cerebral ou para cirurgia intracraniana. Estudos mostram uma elevao na presso arterial m dia por apresentar efeitos simpatomim ticos indiretos. Trabalhos mostram tamb m que a cetamina prejudica a drenagem do humor aquoso pelo canal de Schlemm, sendo contra-indicada para pacientes com glaucoma. 4.2.3. Sistema cardiovascular A cetamina o nico anest sico venoso que apresenta caractersticas farmacodinmicas de estimulao cardiovascular, tais como: aumento da frequncia cardaca, do d bito cardaco, da presso sistlica-ventricular, aumento do tnus adren rgico indireto (liberao de catecolaminas), trabalho cardaco e consumo de O2 miocrdico. Por esta razo, pacientes que apresentam doenas cardiovasculares no devem fazer uso desta droga. A elevao desses parmetros hemodinmicos est associada elevao do trabalho e do consumo de oxignio pelo miocrdio. In vitro, entretanto, a cetamina evidencia um efeito inotrpico negativo, que parece ser mediado por sua atuao na corrente inica atrav s das membranas das c lulas musculares e neuronais cardacas. Este efeito depressor da musculatura cardaca importante por contrabalencear os efeitos estimulatrios pr -citados. Existe, portanto, um efeito de compensao, tendendo a manter a homeostase. Portanto, a cetamina depressora direta do sistema cardiovascular e excitatria indireta deste sistema. Ela , enfim, a nica droga cardiodepressora mas simpaticoestimulante. 4.2.4. Sistema respiratório A cetamina utilizada em doses clnicas produz uma mnima depresso respiratria ( a droga que menos causa depresso respiratria dose-dependente). No entanto, em pacientes respirando espontaneamente ar ambiente, a cetamina na dose de 2mg/kg IV, administrada de maneira rpida em bolus (ou associada com opiides), resulta em uma diminuio significativa na PaO2. A administrao de cetamina na dose de 1 mg/kg causa mnimo efeito respiratrio e, durante partos vaginais, no alterou significativamente os gases arteriais maternos ou fetais. A anestesia dissociativa com cetamina produz depresso respiratria somente quando administrada em altas doses ou muito rapidamente. Doses farmacolgicas causam alteraes mnimas na capacidade residual funcional (CRF), no volume minuto, frequncia respiratriae volume corrente (VC). A administrao de cetamina em pacientes com broncoespasmo aumenta a complacncia pulmonar e diminui a resistncia das vias a reas. A droga no provoca broncoconstrico e, portanto, pode ser usada pelo asmtico. Arlindo Ugulino Netto – ANESTESIOLOGIA – MEDICINA P5 – 2009.2 11 4.3. Efeitos adversos Aumento das secreções salivares (sialorréia) e brônquicas mucosas com a administração de cetamina, tornando necessário o uso de profilático de atropina. A cetamina produz uma elevação de tônus muscular, com ocasionais espasmos. A cetamina produz discreta elevação na glicemia, mas não altera os níveis de renina. 4.4. Contra-indicações Hipertensão intracraniana Lesões expansivas intracranianas Doença isquêmica coronariana grave Por cursar com aneurisma cerebral Pacientes portadores de doenças psiquiátricas compensadas ou descompensadas
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