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Jurisdição: Atividade e Espécies

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Jurisdição - Continuação
SP, 24 agosto de 2013
Direito Processual Civil I
Prof. Dr. Nelson Nery Jr.
I. Atividade secundária ou primária:
 Posição habitual da doutrina: Aponta-se, usualmente, a jurisdição como atividade secundária. Por que? 
Atividade que se legitima somente quando uma pessoa, podendo satisfazer a pretensão de outra, não a satisfaz. 
Interesse de agir e princípio da não veiculação inútil da jurisdição.
Em geral, todavia, a jurisdição só é uma atividade secundária quando exercida em casos em que o demandado, podendo satisfazer o direito do demandante (pretensão), não o faz. 
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Liga-se, portanto, especialmente ao campo do direito das obrigações e direitos reais. Ex.: obrigação de fazer; obrigação de dar; obrigação de restituir; posse; direito de propriedade. 
Nestes casos o primeiro instrumento posto pela ordem jurídica à disposição das partes para a satisfação de seus direitos é o próprio sistema das obrigações, que já dispõe sobre as motivações para o obrigado cumprir sus obrigação (v.g. multa, agravadores do crédito, etc.). O segundo é o processo.
 Há, todavia, situações para as quais a ordem jurídica não prevê a possibilidade de satisfação voluntária de pretensões, para as quais a jurisdição atuará de forma primária. 
É o que ocorre nas relações que o Estado retira do particular o poder de deliberação sem as sua interferência. Assim, por exemplo, não se anula um casamento sem a atividade do Estado-juiz, assim como não se destitui o Poder Familiar ou se anula uma eleição sem a interferência imediata do Poder Judiciário.
Nestes casos, a jurisdição atua, pois, de forma primária.
Caráter substitutivo. Em qualquer caso – com atividade secundária ou primária – a jurisdição não perder sua característica primordial: substitutividade. 
II. Espécies de Jurisdição:
A jurisdição é una como expressão do poder estatal que também é uno. 
Assim, em regra, a jurisdição não seria suscetível de classificação em qualquer espécie. 
Todavia, em, por razões didáticas, classifica-se a jurisdição:
Segundo o modo como o juiz se comporta diante da demanda: em jurisdição contenciosa ou jurisdição voluntária;
Segundo a matéria: em jurisdição civil ou jurisdição penal;
Segundo a justiça competente: em jurisdição comum ou jurisdição especial;
Segundo a posição hierárquica do órgão julgador: em jurisdição inferior e jurisdição superior.
Segundo a soberania de cada país: jurisdição interna e jurisdição externa.
III. Jurisdição Contenciosa e Jurisdição Voluntária:
Proibição da autotutela ou tutela privada: Cominada as sanções aplicáveis por autorização do Estado e considerando que todos são iguais perante a lei e, portanto, destinatários destas sanções, em caso de transgressão de preceitos jurídicos, admite-se a legítima reação do ordenamento jurídico. Todavia, esta reação é, via de regra, tolhida do particular.
 O Estado eliminou a possibilidade do jurisdicionado desempenhar a tutela arbitrária de seus próprios direitos, assim como proíbe a vingança  Resultado de uma evolução milenar.
Lex Talionis. Lei de Talião: Código de Hamurabi em 1780 a.C. – “olho por olho, dente por dente”. 
  Estado clamou para si o Poder de prestar a jurisdição contenciosa;
 O que é jurisdição contenciosa?
Sempre que surja um CONFLITO DE INTERESSES cuja solução entre as partes não tenha sido possível de forma extrajudicial (imediata), é necessário que uma ou mais pessoas desinteressadas interfiram para que solucionem o impasse (Arruda Alvim. CPC comentado. São Paulo: RT, 1975, v. I, p. 52).
A jurisdição contenciosa, assim, é aquela prestada para resolver as situações litigiosas (lides), uma vez que o Estado clama para si esta função de forma exclusiva.
CARNELUTTI: É um dos principais autores que desenvolveu a ideia de LIDE para o processo civil. LIDE 
“conflicto (intersubjetivo) de intereses calificado por una pretensión resistida (subordinación de un interés ajeno el interés propio)” (Carnelutti. Instituiciones del processo civil. Tradução por Santiago Sentís Melendro. Buenos Aires: Librería El Foro S.A, 1997, vol. 01, p. 26).
CARNELUTTI: O processo contencioso é eminentemente repressivo, e revela-se como instrumento destinado a fazer cessar a contenda instaurada entre as partes. “el proceso contencioso es un proceso caracterizado por el fin, que no es otro que la composición de la litis”. (p. 43).
A jurisdição contenciosa qualifica-se, assim, em razão da postura que o juiz assume diante da demanda, ou seja, pela postura de resolver a lide que as partes lhe apresentam através da demanda. 
E a jurisdição voluntária?
Há situações em que não há lide. 
Nestas, o juiz é chamado não para resolver um conflito de interesses, mas para criar situações jurídicas novas capazes de proteger os interesses dos jurisdicionados.
Trata-se do que a doutrina convencionou em denominar de ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA DE INTERESSES PRIVADOS.
CPC, art. 1º “A jurisdição civil, contenciosa e voluntária, é exercida pelos juízes, em todo o território nacional, conforme as disposições que este Código estabelece.” 
O CPC além de distinguir a jurisdição em contenciosa e voluntária, exige com que esta seja exercida conforme as normas próprias do processo civil. Imposição de procedimentos legalmente regulados. 
Se não há lide, é próprio falar em jurisdição?
CHIOVENDA: “Qualificou-se com o nome romano iurisdictio vonuntaria o conjunto de atos que o juiz realizava em face de um único interessado em sob acordo de vários interessados, e o nome passou a designar também aqueles atos que vieram, com o tempo, a transferir-se da competência dos juízes ordinários para a dos notários”. (CHIOVENDA. Instituições de direito processual civil. Tradução da 2ª Ed. Italiana por J. Guimarães Menegale. Notas de Enrico Tullio Liebman. 2ª Ed. São Paulo: Saraiva, 1965, p. 16).
Prof. NNJ: ”Não se trata de jurisdição pura porque o juiz não diz o direito substituindo a vontade das partes, mas apenas pratica atividade integrativa de negócio jurídico privado”. 
A jurisdição voluntária não visa à atuação do direito, mas a criação de situações jurídicas novas.
 A jurisdição voluntária (ou graciosa) é jurisdição apenas na forma (NNJ).
Há determinados negócios jurídicos necessitam de integração pelo juiz para produzir seus efeitos, e é este o escopo da jurisdição voluntária. 
É facultativa? 
Não, pois sem a integração o negócio não atinge o seu próprio objetivo, razão pela qual não seria propriamente “voluntária”, mas, sim, forçada. 
CHIOVENDA: “A jurisdição voluntária é, por conseguinte, uma forma especial de atividade do Estado, exercitada em parte pelos órgãos judiciários, em parte pelos administrativos” (p.17).
Jurisdição voluntária, portanto, também é prestada pelo tabelião, pelo juiz de paz, pelos cartórios de registro em geral.
Ex.: emancipação; separação consensual; pedido de extinção de usufruto, etc. (CPC 1.113 e ss.)
Projeto do NCPC: propõe a modificação do nome para “procedimentos não contenciosos”. 
IV. Jurisdição Civil e Jurisdição Penal:
É tradicional a divisão doutrinária entre jurisdição civil e jurisdição penal.
O Direito é uno. A Jurisdição é una. Assim, tecnicamente, não há de se distinguir o Direito Penal e o Direito Civil, assim como não há como se distinguir a jurisdição entre civil e penal.
1ª Razão?
DIDÁTICA (leva em consideração a simetria entre processo civil – CPC – e processo penal – CPP); 
Jurisdição Civil: toda aquela que se volta para apreciar questões não penais. Determina-se a jurisdição civil por critério de exclusão. Tudo o que não for penal é civil. A jurisdição civil obedece critério residual. 
Expressão “civil” CPC, 1º. Lato sensu: direito civil, direito comercial, direito da infância e da juventude, direito previdenciário, direito do consumidor, direito constitucional, direito tributário e direito administrativo (NNJ).
Jurisdição Penal. Aquela exercida sobre conflitos de direito (material)
penal.
2ª Razão?
Contribuir para a setorização próprias das leis de organização judiciária. O critério é adotado para a organização do próprio Poder Judiciário e para elencar as competências de cada órgão a ele inerente. 
IV. Jurisdição Especial e Jurisdição Comum:
Critério: Esta classificação adota um critério aproximativo a natureza da normas jurídico-substanciais com base nas quais os conflitos serão julgados (direito material).
Tanto na jurisdição civil quanto na penal há esta distinção. 
Jurisdição especial: é aquela prestada pelo Estado para resolução de matérias especiais, ou seja, particulares em sua incidência. Tratam-se das questões de: 
Justiça Trabalhista (CF, 111-116);
Justiça Eleitoral (CF, 118-121); e
Justiça Militar (CF, 122-124 e 125, §§3º e 5º).
 Jurisdição comum: critério residual, pois abarca todas as demais matérias que não se enquadrem em alguma das hipóteses da jurisdição especial. 
V. Jurisdição Inferior e Jurisdição Superior:
Critério: A jurisdição é classificada dessa forma de acordo com os graus em que é exercida. 
Jurisdição Inferior: aquele exercida pelos juízes de primeiro grau, ou seja por aqueles que recebem, conhecem e processam as causas de forma originária, sem ter competência recursal alguma e estando suas decisões passíveis de revisão pelos tribunais.
Jurisdição Superior: aquela exercida pelos órgãos dotados de competência recursal. 
Função da distinção?
 A jurisdição inferior sofre controle da jurisdição superior. 
Princípio do duplo grau de jurisdição: dispõe sobre a necessidade do Estado prover mecanismos de controle das decisões jurisdicionais, especificamente no que se refere à possibilidade de se contrastar decisões perante os tribunais. 
A justiça superior garante a segurança da “revisibilidade” ampla. 
Quantas instâncias existem?
1ª Instância;
2ª Instância;
SOMENTE!!!
Instâncias Excepcionais  STF (CF 102) e STJ (CF 105). Desempenham uma função qualitativamente diversa dos órgãos da segunda instância. Estes órgãos têm por função precípua a proteção do direito constitucional e do direito federal e a uniformização das interpretações relativas a estas searas. 
. 
IMPORTANTE: Inexistência de correlação imediata entre as expressões “primeira instância” e “segunda instância” com “jurisdição inferior” e “jurisdição superior”.
Em regra, de fato, a primeira instância exerce função de jurisdição inferior e a segunda instância exerce função de jurisdição superior. Todavia, há hipóteses em que os Tribunais e até mesmo o STJ podem fazer as vezes de jurisdição inferior ou de primeiro grau. 
CF – “Art. 105. Compete ao Superior Tribunal de Justiça:
I - processar e julgar, originariamente:
a) nos crimes comuns, os Governadores dos Estados e do Distrito Federal, e, nestes e nos de responsabilidade, os desembargadores dos Tribunais de Justiça dos Estados e do Distrito Federal, os membros dos Tribunais de Contas dos Estados e do Distrito Federal, os dos Tribunais Regionais Federais, dos Tribunais Regionais Eleitorais e do Trabalho, os membros dos Conselhos ou Tribunais de Contas dos Municípios e os do Ministério Público da União que oficiem perante tribunais;
b) os mandados de segurança e os habeas data contra ato de Ministro de Estado, dos Comandantes da Marinha, do Exército e da Aeronáutica ou do próprio Tribunal; 
c) os habeas corpus, quando o coator ou paciente for qualquer das pessoas mencionadas na alínea "a", ou quando o coator for tribunal sujeito à sua jurisdição, Ministro de Estado ou Comandante da Marinha, do Exército ou da Aeronáutica, ressalvada a competência da Justiça Eleitoral”. 
E O STF? PODE EXERCER FUNÇÃO DE ÓRGÃO DE PRIMEIRO GRAU?
“Art. 102. Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição, cabendo-lhe:
I - processar e julgar, originariamente:
c) nas infrações penais comuns e nos crimes de responsabilidade, os Ministros de Estado e os Comandantes da Marinha, do Exército e da Aeronáutica, ressalvado o disposto no art. 52, I, os membros dos Tribunais Superiores, os do Tribunal de Contas da União e os chefes de missão diplomática de caráter permanente;”
VI. Jurisdição Interna e Jurisdição Externa:
Critério: Soberania de cada país. Divide- se em jurisdição interna (ou nacional) e jurisdição externa (ou internacional).
Jurisdição interna: aplica-se à pluralidade de órgãos que a exercem no Brasil;
Jurisdição externa: inerente a outros ordenamentos jurídicos. 
Jurisdição - Continuação
SP, 08 setembro de 2013
Direito Processual Civil I
Prof. Dr. Nelson Nery Jr.
Comentários sobre a Prova.
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II. Organização Judiciária.
Veiculação da jurisdição : necessita de estrutura;
Razão: O Poder Judiciário é organizado de forma sistemática para prestar a jurisdição. Esta sistemática é conhecida como organização judiciária;
Normas que tratam sobre a organização judiciária: ligam-se à dinâmica do processo e a própria jurisdição;
Exemplos:
Normas sobre composição dos juízos: define as atribuições do juiz em primeiro grau e do órgão colegiado em segundo grau;
Normas sobre a estrutura judiciária: estabelece o pano de fundo para a distribuição da jurisdição;
Fixação de épocas para o desenvolvimento dos trabalhos forenses: influencia os atos e prazos das partes;
Garantias dos juízes: garantem a imparcialidade;
Critérios de recrutamento: capacitação técnica;
Objeto: disciplina a relação entre as instituições judiciárias e entre o juiz e o Estado;
Não regem o processo como instrumento de prestação da jurisdição: não se trata da relação entre o Estado-juiz e os sujeitos litigantes, mas entre cada juiz (como órgão) e o Estado ou entre o Estado e o corpo orgânico que é a Magistratura;
Juiz é órgão: apresentam-se como agentes impessoais do Estado no exercício de atividades que somente podem ser exercidas através de pessoas físicas;
Tutela constitucional da organização judiciária: O regime proposto pela CF sobre o processo seria insuficiente se não houvesse normas para reger os órgãos responsáveis por ele;
Tutela constitucional da organização judiciária e tutela constitucional do processo: se unem para garantir a tutela constitucional às pessoas, i.e jurisdicionados (Dinamarco);
Significado sistemático: garantias aos “consumidores” do serviço público jurisdicional. Não há prerrogativas ou benesses, há garantias para que a jurisdição seja prestada da forma constitucionalmente devida – garantias processuais e garantias de organização judiciária;
Linhas mestras da organização judiciária: A CF dita uma série de disposições destinadas a prevalecer em relação a todo o Poder Judiciário. São:
Elenco fechado dos órgãos. O conjunto compõe a Justiça Brasileira;
Garantias. Institucionais ao Poder Judiciário e pessoais aos juízes, ao lado de impedimentos a estes;
Estrutura judiciária. Órgãos distribuídos entre as diversas Justiças e órgãos sobrepostos a estas;
Composição e competência;
Demais disposições de organização.
Competência legislativa. Em suma está assim dividida:
Primeiro Plano: Constituição Federal. Linhas Mestras. Dispõe i) sobre o exercício da Jurisdição; ii) sobre as competências para o exercício do Poder Estatal; e iii) sobre a competência para legislar em tela de organização judiciária;
 Estatuto da Magistratura (LC 45/79): Dispõe sobre as diretrizes a serem observadas na organização judiciária da União e dos Estados, observando os parâmetros impostos pela CF;
 Lei Federal: Compete dispor sobre as Justiças da União (CF 107, 113, 121 e 124);
Leis sobre cargos, vencimentos e divisão judiciária: De iniciativa do STF, Tribunais Superiores e TJs (CP 96, II);
Competência originária dos TJs: Constituição dos Estados (CF, 125, §1º, primeira parte);
 Organização das justiças estaduais: Leis ordinárias do Estado, por iniciativa do TJ (CF, 125, §1º, segunda parte);
Compete aos próprios Tribunais: dispor sobre os seus próprios serviços:
Regimentos Internos (CF 96, I , a);
Sobre a justiça de paz e juizados especiais: União e Estados (CF 98, I e II)
 III. A Organização na CF.
“Art. 92. São órgãos do Poder Judiciário:
I - o Supremo Tribunal Federal;
I-A o Conselho Nacional de Justiça; 
II - o Superior Tribunal de Justiça;
III - os Tribunais Regionais Federais e Juízes Federais;
IV - os Tribunais e Juízes do Trabalho;
V - os Tribunais e Juízes Eleitorais;
VI - os Tribunais e Juízes Militares;
VII - os Tribunais e Juízes dos Estados e do Distrito Federal e Territórios.
(...)”

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