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Mito das três raças

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Segundo Roberto Da Matta é notória a importância dos elementos étnicos, a dizer branco: negro 
e indígena na formação da sociedade brasileira. A amálgama formada a partir desses elementos, 
através de suas relações sociais e pessoais, proporcionou o reconhecimento da identidade 
nacional como deveras peculiar em relação a outros países com experiências semelhantes. O 
Brasil se tornou uma sociedade mestiça e homogênea, onde não existiria preconceito "racial" e 
todos os indivíduos seriam, em potencial, capazes de possuírem igualdade formal, material e 
moral entre si. 
Em termos gerais, este é o mito de origem da sociedade brasileira, conhecido como o "mito das 
três raças". Para Peter Fry, é possível notar sua presença em diversos âmbitos da sociedade, 
desde interpretações acadêmicas até em relações fortuitas do cotidiano. Apesar de não 
corresponder com precisão à realidade vivida, ele serve como uma orientação para se avaliar as 
relações sociais, positivas ou negativas, pois corresponde à realidade idealizada. 
Existem várias correntes que explicar a formação racial/cultural da sociedade brasileira. A 
primeira destas correntes previa a degenerescência e o pensador mais importante era o Conde de 
Gobineau, o qual via a mistura de raças como fator de decadência e degenerescência da 
sociedade brasileira, e influenciou a obra de expoentes do pensamento brasileiro como Sílvio 
Romero, Olveira Vianna e Nina Rodrigues. 
Já Gilberto Freyre se propõe a deslocar o debate superioridade/inferioridade para a observação 
de uma situação de contato e de troca que se atualiza dentro de uma estrutura social de 
desigualdade, uma vez que nesta troca uma das partes é o senhor e as outras duas encontram-se, 
com menor ou maior intensidade numa condição servil. Para este autor a miscigenação deixa de 
ser considerada um fenômeno meramente biológico ou ainda um processo gerador de aptidões e 
costumes, degenerescências dela derivadas e agravadas pela ação deprimente do clima. Ao 
contrario a mistura de diferentes grupos étnicos é vista com algo positivo e ate mesmo capaz de 
promover uma democratização a partir da posição ambivalente do mestiço. 
Outro estudo que abarcou as características da identidade nacional foi Raízes do Brasil, de Sérgio 
Buarque de Holanda. Para este autor, os males do país também não provêm da miscigenação. São 
oriundos da personalidade do português. Essa personalidade se apresenta tão dominante que a 
mistura com índios e negros não conseguiu superá-la. Pelo contrário, argumenta que a 
personalidade dos negros era semelhante à dos portugueses, ou seja, plástica e maleável. O que 
lhes fomentavam um caráter “anti-social” que preferia os entretenimentos ao trabalho. Nessa 
sociedade, as relações sociais afiguraram-se a partir da cordialidade e do personalismo. Relações 
que tomam formas distintas de acordo com o interlocutor, mas sempre de maneira afetiva. 
Característica que se tornou geral na sociedade brasileira. A cordialidade favoreceria, segundo o 
autor, a dinâmica social através da emoção, ao invés de regras sociais fixas. 
Outra importante contribuição ao entendimento da formação étnica e à diversidade cultural 
brasileira se dá por meio da obra de Darcy Ribeiro. Como leciona Adelia Miglievich Ribeiro , para 
este antropólogo o brasileiro nasce no processo de distinção de suas matrizes originais, 
hostilizado e, também, hostil. O mameluco rejeita a mãe índia que lhe deu a luz e opõe-se aos 
irmãos de sangue das Américas ao mesmo tempo em que é desconhecido por seu pai branco e 
banido entre os irmãos de ultramar. (...) Os brasileiros-brasilíndios-mamelucos expandem o 
domínio português na constituição do Brasil, castigando as gentes de sangue materno. 
Interrompe-se assim a linha evolutiva prévia das populações indígenas subjugadas como mão-de-
obra servil de uma nova sociedade integrada numa etapa mais elevada da evolução sociocultural. 
Tem-se não a assimilação étnica, mas sua integração. 
Não menos dolorosa é a transfiguração étnica que fez nascer o brasileiro-mulato. A submissão do 
escravo africano trazido para o Brasil apenas pode ser explicada pela força da opressão que exigiu 
a mais fervorosa vigilância e o uso constante dos castigos preventivos capazes de levar o ser 
 
 
 
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humano a se esquecer de si. Exalta a fuga como a mais forte motivação do cativo para se manter 
vivo. Destaca o principal dos conflitos havidos na história brasileira: o racial que não oculta, ao 
contrário, os elementos classistas. Antagonismos estes que alcançavam o caráter mais cruento no 
enfrentamento dos negros a seus senhores. Palmares é o caso exemplar do enfrentamento inter-
racial que, também, continha um projeto de sociedade na forma do igualitarismo e da economia 
solidária. A pronta ação repressora que sustenta o latifúndio e as lutas dos subalternos 
constróem, num só tempo, o Brasil. 
Segundo a autora, Darcy defende a noção de um povo novo nascido na maioria dos países da 
América Latina resultado dos processos de desindianização do índio, de desafricanização do negro 
e de deseuropereização do europeu. Um país de mestiços, os quais não são iguais aos seus 
ascendentes de uma ou outra etnia, portanto, uma nova etnia nacional, dos índios e dos africanos 
mortos, dos mamelucos, caboclos e mulatos que, sem identidade, plasmaram a identidade do 
brasileiro, dinamizada por uma cultura sincrética e singularizada pela redefinição de traços 
culturais delas oriundos?

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