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Desigualdades Regionais, Estado e Constituição Gilberto Bercovici

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DESIGUALDADES 
REGIONAIS, 
ESTADO E 
CONSTITUIÇÃO 
, .Max , Limonad 
GILBERTO BERCOVICI é Pro-
fessor Doutor da Faculdade de 
Direito da Universidade de 
São Paulo* É Doutor em Direi-
to do Estado pela mesma Uni-
versidade* Tem diversos arti-
gos publicados em perió-
dicos especializados e em li-
vros sobre federalismo, de-
senvolvimento, Teoria da 
Constituição e Teoria do Esta-
do no Brasil e no exterior» 
Gilberto Bercovici 
DESIGUALDADES REGIONAIS, 
ESTADO E CONSTITUIÇÃO 
Gilberto Bercovici 
DESIGUALDADES REGIONAIS, 
ESTADO E CONSTITUIÇÃO 
, . M d X . Limonad 
Copyright: 
Gilberto Bercovici 
Copyright da presente edição: 
Editora Max Limonad 
Moisés Limonad 
Capa: Luiza Macedo 
Editora Max Limonad 
São Paulo 
Fone: (0XX11) 3873-1615 
www.maxlimonad.com.br 
E-mail: maxlimonad@maxlimonad.com.br 
ISBN: 85-7549-019-2 
2003 
"A gente tem de sair do sertão! Mas só se 
sai do sertão é tomando conta dele a 
dentro..." 
João Guimarães Rosa 
Aos meus pais, Solly e Suely. 
Para Celso Furtado e Paulo Bonavides. 
SUMÁRIO 
A ENJEITADA Francisco cie Oliveira 13 
PREFÁCIO Paulo Bonavides 17 
ABREVIATURAS UTILIZADAS 23 
AGRADECIMENTOS 27 
INTRODUÇÃO 29 
PARTE I 
PREMISSAS DA QUESTÃO REGIONAL 
Capítulo 1 - Estado e Desenvolvimento 
1 .10 Desafio Furtadiano 35 
1.2 Qual Teoria do Estado? 44 
1.3 O Estado Social 50 
1.4 O Estado Desenvolvimentista 54 
1.5 Desenvolvimento, Desigualdades Regionais 
e a Importância do Estado 62 
Capítulo 2 - A Dificuldade na Conceituação de Região 
2.1 Jellinek e os "Fragmentos de Estado" 69 
2.2 As Definições de Perroux e Boudeville 71 
2.3 As Regões na Europa e no Brasil 73 
2.4 A Utilidade do Conceito de Região: 
Regionalismo ou Regionalização? 75 
Capítulo 3 - Fundamentos da Política Brasileira de Desenvolvimento 
Regional: O Relatório do GTDN 
3.1 Antecedentes da SUDENE 83 
3.1.1 Primeiras Experiências de Planejamento Regional 83 
3.1.2 O Nordeste e a Questão Regional 90 
3.2 Celso Furtado, a CEP AL e o Relatório do GTDN 95 
3.3 O Conselho Deliberativo e a Renovação do Federalismo Brasileiro ... 106 
10 GILBERTO BERC0V1CI 
3.4 A SUDENE e as Reformas de Base 110 
3.5 A Centralização e o Fim do Planejamento Regional 114 
3.6 A Impossibilidade Histórica de uma Industrialização 
Regional Autônoma 124 
3.7 Balanço da "Substituição de Importações Regional": 
Integração Produtiva e Permanência das Mazelas Sociais 130 
3.7.1 Características dos Incentivos Fiscais 130 
3.7.2 O "Sistema 34/18" e a Expansão dos Incentivos Fiscais 132 
3.7.3 A Integração Produtiva 138 
3.7.4 Permanência das Desigualdades Sociais e Regionais 140 
PARTE II 
A CONSTITUIÇÃO DE 1988 E A SUPERAÇÃO 
DAS DESIGUALDADES REGIONAIS 
Capítulo 4 - O Federalismo da Constituição de 1988 
4.1 "Modelos" Federais 145 
4.2 Coordenação, Cooperação e Competências Comuns 149 
4.3 Estado Social e Federalismo: A Homogeneização 
dos Entes Federados 156 
4.4 A Repartição de Rendas da Constituição de 1988 160 
4.5 Alternativas ao Federalismo Cooperativo: 
Federalismo Assimétrico e Federalismo Neodualista 168 
Capítulo 5 - A Prática do Federalismo no Brasil Pós-1988 
5.1 A Nova Centralização Fiscal e a Crise Financeira da Federação 173 
5.2 Descentralização de Políticas Sociais 178 
5.3 A Guerra Fiscal 183 
Capítulo 6 - Planejamento e Desenvolvimento Regional 
6.1 A Necessidade do Planejamento para o Desenvolvimento 191 
6.2 As Difíceis Relações entre Planejamento e Administração Pública: 
Tentativas de Planejamento Global no Brasil 194 
6.3 Planejamento e Orçamento 205 
6.4 Planejamento, Planejamento Regional e Federalismo Cooperativo: 
A Coordenação e Compatibilização do Desenvolvimento Nacional 209 
Capítulo 7 - A Constitucionalização Administrativa das Regiões 
7.1 Formas de Descentralização Política 217 
7.2 Estado Integral, Estado Regional e Estado Autonômico 219 
7.3 O Modelo das Autarquias Federais de Desenvolvimento Regional 225 
DESIGUALDADES REGIONAIS, ESTADO E CONSTITUIÇÃO 11 
7.4 A Inocuidade das "Agências" de Desenvolvimento Regional 228 
7.5 A Região Administrativa na Constituição: 
Inovação ou Retrocesso? 233 
PARTE III 
DESIGUALDADES REGIONAIS, 
ESTADO E CONSTITUIÇÃO 
Capítulo 8 - Novos Fundamentos para a Política 
Brasileira de Desenvolvimento Regional 
8.1 Federalismo Cooperativo, Princípio da Solidariedade 
e Igualação das Condições Sociais de Vida 239 
8.2 A Região como Ente Federado: Articulação e Cooperação 244 
8.3 A Heterogeneidade Intra-Regional: Necessidade de uma 
Nova Divisão Regional para o Brasil 251 
8.4 Por um Fórum Federativo Adequado: o Conselho Nacional 
de Desenvolvimento Regional 254 
8.5 A Questão Regional, a Crise do Estado e a 
"Fragmentação da Nação" 258 
8.6 Política Nacional de Desenvolvimento Regional 
e Projeto Nacional de Desenvolvimento 267 
Capítulo 9 - A Questão Regional e a Teoria 
da Constituição Constitucionalmente Adequada 
9.1 Teoria do Estado, Teoria da Constituição 
e Teoria da Constituição Constitucionalmente Adequada 271 
9.2 Qual Teoria da Constituição? 273 
9.2.1 As Teorias Processuais da Constituição 
e a Legitimação pelo Procedimento 273 
9.2.2 O Debate Norte-Americano: Ely e seus Críticos 275 
9.2.3 Procedimentalização da Constituição 278 
9.2.4 Constituição Material, Forças Reais de Poder e Decisão 281 
9.2.5 A Constituição Material para Smend e Heller 284 
9.2.6 Teoria Material da Constituição Constitucionalmente Adequada 287 
9.3 O Artigo 3o da Constituição de 1988 291 
9.3.1 Princípios Constitucionais Fundamentais 291 
9.3.2 Fins do Estado 295 
9.3.3 Parâmetro para a Interpretação Constitucional 298 
9.4 Dilemas do Controle Judicial de Políticas Públicas 302 
9.4.1 Instrumentos do Controle Judicial de Políticas Públicas 302 
12 GILBERTO BERC0V1CI 
9.4.2 Positivismo Jurisprudencial e Concretização 
Desconstitucionalizante 306 
9.5 A Constituição de 1988, a Questão Regional 
e a Transformação Social 312 
BIBLIOGRAFIA 317 
A ENJEITADA 
Francisco de Oliveira 
As desigualdades regionais no Brasil foram tema muito freqüentado 
pela economia política do desenvolvimento entre as décadas de quarenta a 
sessenta do século passado, com uma clara filiação à teoria do subdesenvol-
vimento, desenvolvido pela Cepal e, entre nós, sobretudo por Celso Furtado. 
Mas as ciências sociais não acompanharam a reflexão no mesmo diapasão e 
profundidade. A chamada "questão" regional ficou circunscrita ao Norte, 
Nordeste e seus pesquisadores e cientistas sociais. A rigor, era o tema da 
Federação que não freqüentava as preocupações no pólo dominante, vale 
dizer no Sudeste e, sobretudo, em São Paulo. Diferentemente dos primeiros 
quarenta anos do século passado, quando a questão da Federação dominava 
as proposições dos autoritários clássicos, como Oliveira Vianna, que a viam 
com desconfiança, apostando tudo em formas fortemente centralizadas, num 
Estado unitário, para resolver, para anular, as poderosas tendências centrífu-
gas "bárbaras" das províncias. 
A expansão capitalista do ciclo da industrialização da segunda 
revolução industrial , com epicentro em São Paulo, só fez esgarçar, ainda 
mais, o já debilitado tecido federativo. Ampliou as desigualdades regionais 
até o ponto em que a questão do Nordeste explodiu, no período 1950-1960, . 
na forma da emergência das Ligas Camponesas e no desafio posto ao domí-
nio oligárquico por governos de forte apelo e sustentação popular, de que o 
governo de Miguel Arraes em Pernambuco, entre 1963 e 1964, até o golpe 
de Estado de 1964, era o mais exemplar. O golpe foi, a seu modo, mais uma 
vez, a resolução "pelo alto" de uma crise do crescimento capitalista, tendo a 
questão regional atuado como espoleta dessa detonação. 
1. Professor Titular de Sociologia do Departamentode Sociologia da FFLCH-USP. 
Coordenador do Centro de Estudosdos Direitos da Cidadania-CENEDIC, da mesma 
faculdade e universidade. Aposentado. 
14 GILBERTO BERC0V1CI 
Um tanto paradoxalmente, uma política de desenvolvimento regio-
nal, como forma do medo das classes dominantes e correspondendo à 
homogeneização do espaço do capital, foi implementada ao ponto de expe-
rimentar-se, ineditamente, uma atenuação da desigualdade entre o pólo 
desenvolvido e a região menos desenvolvida, medida pelas taxas de 
crescimento econômico na década de 1970. Esse movimento foi detido a 
partir da década de 80, considerada "perdida" pela estagnação da própria 
economia nacional, e revertido a partir dos anos 90, quando as políticas 
neoliberais abriram o flanco para o processo da globalização do capital atuar 
não apenas pela sua própria dinâmica, mas poderosamente ajudados por um 
conjunto de políticas de desregulamentação. A política regional sofreu pesa-
das perdas, que culminaram, já em nossos dias, com a total desativação das 
agências regionais de desenvolvimento. 
A globalização, por sua vez, desarticula uma política de expansão 
que tenha caráter federativo. Entre a desregulamentação globalizante e a 
nova reivindicação do local, as desigualdades regionais têm tudo para voltar 
a crescerem. Perde-se até a noção de região, com o que é possível dizer que 
a noção de Federação vai para o espaço de uma vez. 
Tudo se passou, no âmbito das ciências sociais e mesmo das do 
direito, como se a questão da Federação e das desigualdades regionais 
tivesse sido resolvida, de uma vez para sempre. Era um não-problema. A 
desarticulação globalizante pode ter o condão de fazer renascer preocupa-
ções teóricas que tentem dar conta do que pode vir a ser uma nova Federa-
ção. E neste movimento que se insere o trabalho de Gilberto Bercovici, sua 
tese de doutorado, de cuja banca tive a honra de fazer parte, em boa hora 
publicada agora em livro. Revendo a teoria da Federação, em âmbito inter-
nacional, convocando as várias disciplinas das sociais e do direito para esse 
esforço, ele relança, com o auxílio da melhor bibliografia sobre um tema 
vasto e multifacetado, uma perspectiva crítica sobre a questão regional, 
Federação, Estado, planejamento econômico, que o predomínio do "pensa-
mento único" havia enxotado para os desvãos de uma ciência menor. A 
dramaticidade da globalização é esta: fica-se sem a Federação, com todas as 
suas imperfeições, que são muitas, e que Gilberto examina detidamente 
neste belo livro; e não se ganha estatuto de cidadãs e cidadãos internacio-
nais, mundiais. Pelo contrário, a perspectiva que se segue à perda da condi-
ção de cidadãos nacionais, é menos que a vassalagem: é a de bárbaros aos 
olhos do novo império. Por isso, a tentativa de reexaminar as novas possibi-
lidades e condições de um novo planejamento, democrático, de uma nova 
relação Estado-sociedade, de uma nova República e uma nova Federação, 
deve ser louvada e incentivada. Essa tentativa fica melhor ainda por se tratar 
de esforço que se faz a partir de São Paulo, cuja dívida para com a Federa-
ção é imensa. Fica melhor ainda por surgir da Faculdade de Direito de São 
14 
GILBERTO BERC0V1CI 
Um tanto paradoxalmente, uma política de desenvolvimento regio-
nal, como forma do medo das classes dominantes e correspondendo à 
homogeneização do espaço do capital, foi implementada ao ponto de expe-
rimentar-se, ineditamente, uma atenuação da desigualdade entre o pólo 
desenvolvido e a região menos desenvolvida, medida pelas taxas de 
crescimento econômico na década de 1970. Esse movimento foi detido a 
partir da década de 80, considerada "perdida" pela estagnação da própria 
economia nacional, e revertido a partir dos anos 90, quando as políticas 
neoliberais abriram o flanco para o processo da globalização do capital atuar 
não apenas pela sua própria dinâmica, mas poderosamente ajudados por um 
conjunto de políticas de desregulamentação. A política regional sofreu pesa-
das perdas, que culminaram, já em nossos dias, com a total desativação das 
agências regionais de desenvolvimento. 
A globalização, por sua vez, desarticula uma política de expansão 
que tenha caráter federativo. Entre a desregulamentação globalizante e a 
nova reivindicação do local, as desigualdades regionais têm tudo para voltar 
a crescerem. Perde-se até a noção de região, com o que é possível dizer que 
a noção de Federação vai para o espaço de uma vez. 
Tudo se passou, no âmbito das ciências sociais e mesmo das do 
direito, como se a questão da Federação e das desigualdades regionais 
tivesse sido resolvida, de uma vez para sempre. Era um não-problema. A 
desarticulação globalizante pode ter o condão de fazer renascer preocupa-
ções teóricas que tentem dar conta do que pode vir a ser uma nova Federa-
ção. E neste movimento que se insere o trabalho de Gilberto Bercovici, sua 
tese de doutorado, de cuja banca tive a honra de fazer parte, em boa hora 
publicada agora em livro. Revendo a teoria da Federação, em âmbito inter-
nacional, convocando as várias disciplinas das sociais e do direito para esse 
esforço, ele relança, com o auxílio da melhor bibliografia sobre um tema 
vasto e multifacetado, uma perspectiva crítica sobre a questão regional, 
Federação, Estado, planejamento econômico, que o predomínio do "pensa-
mento único" havia enxotado para os desvãos de uma ciência menor. A 
dramaticidade da globalização é esta: fica-se sem a Federação, com todas as 
suas imperfeições, que são muitas, e que Gilberto examina detidamente 
neste belo livro; e não se ganha estatuto de cidadãs e cidadãos internacio-
nais, mundiais. Pelo contrário, a perspectiva que se segue à perda da condi-
ção de cidadãos nacionais, é menos que a vassalagem: é a de bárbaros aos 
olhos do novo império. Por isso, a tentativa de reexaminar as novas possibi-
lidades e condições de um novo planejamento, democrático, de uma nova 
relação Estado-sociedade, de uma nova República e uma nova Federação, 
deve ser louvada e incentivada. Essa tentativa fica melhor ainda por se tratar 
de esforço que se faz a partir de São Paulo, cuja dívida para com a Federa-
ção é imensa. Fica melhor ainda por surgir da Faculdade de Direito de São 
DESIGUALDADES REGIONAIS, ESTADO E CONSTITUIÇÃO 
15 
Paulo, lendárias arcadas do Largo de São Francisco, sem dúvida um lugar de 
produção da hegemonia; se a indiferença do Largo de São Francisco para 
com as desigualdades regionais e para com o destino da enjeitada, da Fede-
ração, ceder lugar a um novo interesse, fica melhor para São Paulo, para os 
outros Estados e para o Brasil. Rima pobre: de enjeitada, quem sabe para 
amada. 
PREFÁCIO 
Paulo Bonavides 
A recente extinção da Sudene e da Sudam, por obra da corrupção 
que grassa nas mais altas esferas do Governo, representou um golpe mortal 
nos organismos regionais de desenvolvimento, criados há cerca de cinco 
décadas por uma malograda política do Governo Federal, volvida para a 
extinção dos desequilíbrios e disparidades que têm perpetuado o atraso, o 
subdesenvolvimento e a miséria em vastas regiões do País. 
O livro, objeto deste prefácio, é de autoria de Gilberto Bercovici, 
professor de Direito em São Paulo, e aparece em ocasião extremamente 
oportuna quando o debate acerca daqueles entes desperta o interesse da 
nação e mostra em cores sombrias a tragédia institucional da república 
federativa e presidencialista do Brasil encarada na sua dimensão regional. 
Com efeito, este ensaio sobre os desequilíbrios regionais que minam 
a estabilidade do sistema foi apresentado e defendido com brilho como tese 
de doutoramento na Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo. 
Gilberto Bercovici faz nele profunda análise jurídico-institucional aos pro-
blemas que afligem a comunhão federativa e para os quais o Estado brasi-
leiro ainda não encontrou solução. E isto tem acontecido em virtude de 
erros, omissões, incúria, despreparo,descontinuidade das medidas aplicadas, 
incertezas na execução dos programas propostos, falta de firmeza e fragili-
dade da política traçada; enfim, desorientação do Poder Central, que sempre 
se houve com uma visão estreita, ambígua e tecnocrática, jamais se capaci-
tando nem se conscientizando da profundeza, do alcance, da extensão e da 
gravidade das desigualdades regionais e sociais do País. Se não as corrigir-
mos, esta Nação não terá futuro, esta sociedade não se emancipará, este 
povo não fará valer o seu direito ao desenvolvimento. 
Ao redor de tão complicado nó problemático, revoluteiam pois as 
reflexões do autor da presente monografia, que ministra uma lição de per-
cuciência, saber, crítica construtiva, e levantamento dos aspectos mais 
destacados e relevantes da questão regional, indubitavelmente aquela que 
decidirá, em sede política e econômica, o destino da associação de entes 
autônomos corporificados na República Federativa do Brasil. 
18 GILBERTO BERC0V1CI 
Parte o Autor do trabalho em tela das premissas da questão regional 
numa investigação teórica e objetiva que põe em discussão os conceitos de 
Estado, desenvolvimento e região, até externar sua clara opção por um tra-
tamento político e institucional da matéria. E o faz depois de assinalar a 
importância do contributo científico de Celso Furtado, inexcedível na esfera 
econômica ao mensurar, compreender, interpretar e elucidar, com sua pro-
posta desenvolvimentista, radicada em organismos regionais, os problemas 
do País desigual, injusto e socialmente retardado que é o Brasil. 
O centro de gravidade do estudo de Bercovici passa em seguida para 
o exame da Constituição e para a face jurídica do problema da Federação na 
sua dimensão cooperativa e fiscal, cotejando, pelo aspecto cooperativo, os 
federalismos brasileiro e americano, e fazendo do mesmo passo um estudo 
que considera também as alternativas do federalismo assimétrico e do fede-
ralismo neodualista, bem como a exegese da relação do Estado social com a 
natureza federativa do sistema. 
Tocante ao federalismo fiscal, os temas versados abrangem a repar-
tição de rendas na Constituição de 1988, os fundos de participação, os 
incentivos fiscais, a crise financeira da Federação, as tendências neocentrali-
zadoras do fisco, e, finalmente, assuntos como a guerra fiscal entre os Esta-
dos, de máxima atualidade e que refletem a crise que percorre a presente 
época federativa. 
Na seqüência dessa excelente visão panorâmica dos problemas re-
gionais, Gilberto Bercovici entra a ocupar-se também de assuntos de plane-
jamento, desenvolvimento regional e constitucionalização administrativa das 
Regiões. Neste ponto o jovem publicista questiona se essa constitucionaliza-
ção significou inovação ou retrocesso. A nosso ver, inovou, porque trouxe as 
Regiões para uma esfera superior no quadro do ordenamento jurídico, ou 
seja, lhes deu dimensão constitucional. 
O recuo unitarista havido e anotado por Bercovici e que prima facie 
reforça o aparelho administrativo da União, é bastantemente compensado 
pela inserção mesma, cuja importância se infere quando se formula com 
base na Constituição o juízo interpretativo de que doravante nenhum obstá-
culo de ordem jurídica sobrerresta com que embargar amanhã o passo polí-
tico-legislativo fundamental de criação de nova instância federativa - a das 
autonomias regionais. 
A via constitucional de sua instauração não padece objeção idônea 
nem tropeça em obstáculos sérios nem tampouco ocasiona lesão aos conteú-
dos normativos do art. 60, que disciplinam o processo de Emenda e traçam 
limites materiais de alcance ao poder constituinte de segundo grau, designa-
damente em seu parágrafo 4o. 
A seguir, na parte terceira e derradeira de seu trabalho, Gilberto 
Bercovici analisa com acuidade os desequilíbrios regionais em face do 
Estado e da Constituição. Disserta sobre o tema em dois capítulos bastante 
DESIGUALDADES REGIONAIS, ESTADO E CONSTITUIÇÃO 19 
significativos: o primeiro, pertinente a novos fundamentos de uma política 
nacional de desenvolvimento das regiões, e o segundo, volvido para um 
extenso exame dos laços que prendem a solução da questão regional à teoria 
da Constituição. 
Há, sem dúvida, clara unidade de posições do Autor desta admirável 
e erudita dissertação. Quem a lê com olhos de ver logo percebe, ao cabo da 
leitura, que no pensamento do professor paulista se acha implícito um elo 
lógico de íntima conexidade dos conceitos de Constituição dirigente, Cons-
tituição aberta, teoria material da Constituição e Estado social; materiais de 
construção teórica que ele emprega com o intuito de firmar sobre sólidos 
alicerces o federalismo regional, fecho de suas reflexões críticas sobre o art. 
3o da Constituição onde ficou insculpida a suma dos objetivos fundamentais 
da República Federativa do Brasil. São aqueles do inciso III, dos quais um é 
a alma da Federação: o que se cifra em reduzir as desigualdades sociais e 
regionais, e erradicar a pobreza e a marginalização. 
A concretização desse objetivo fundamental nos conduz, de necessi-
dade, à Constituição dirigente de 1988, que unicamente fará vingar sua 
fórmula federativa se houver sacrifício, cooperação, solidariedade e frater-
nidade de cidadania, de uma parte, e doutra, adoção de um projeto reformu-
lador, o qual aliás já transparece nas locuções conclusivas do Autor desta 
monografia. Contempla esse projeto designadamente uma forma eventual de 
regeneração federativa pelos caminhos regionais. 
Ao tema da Constituição dirigente, que é a nossa, se prende outro, 
afim e complementar, a saber, o da Constituição aberta, que Bercovici 
adverte, com muita propriedade, não comportar abertura absoluta ou ilimi-
tada, "pois a Constituição, especialmente por meio dos seus princípios fun-
damentais, estabelece, de modo vinculante, o que não deve ficar aberto." 
Com efeito, Constituição aberta é Constituição confinada por prin-
cípios; estes servem de delimitar a esfera do procedimento normativo a jui-
zes e legisladores, quando, respectivamente , aplicam ou legislam a norma 
flexibilizada no interior do ordenamento regido pela Lei Fundamental. 
Nesta acepção de Constituição aberta não se corre o risco de dissol-
ver valores substanciais e superiores que compõem a essência axiológica e 
normativa da Constituição, visto que tais valores, invioláveis, determinam a 
normatividade mesma do sistema em termos principiológicos. Traçam pre-
cipuamente a fronteira e a base a toda uma criação positiva, até certo ponto 
independente e autônoma, porquanto, atada à materialidade, perdeu já gran-
demente, sem sacrifício da natureza hierárquica das Cartas Magnas, o seu 
teor obstaculizante de rigidez e formalismo excessivos. 
Cultivados pelas escolas do normativismo puro, a rigidez e o forma-
lismo desproporcionados são forçosamente incompatíveis em matéria cons-
titucional com o emprego da Nova Hermenêutica e a sua metodologia de 
20 GILBERTO BERC0V1CI 
princípio e ponderação de valores - indispensáveis ao estabelecimento, ob-
servância e conservação de uma ordem constitucional aberta. 
O degrau seguinte dessa caminhada expositiva dos problemas regio-
nais feita pelo publicista de São Paulo nos faz subir ao patamar das teorias 
materiais da Constituição, antecedidas de um breve estudo das doutrinas 
processuais da Lei Fundamental que, em rigor, são aliás a quinta essência da 
despolitização da legitimidade, alcançada pelas vias procedimentais. 
As teorias materiais vêm a significar, na substância, aquelas que 
efetivamente levantam com mais profundeza o problema, ainda por solver, 
da relação entre a Constituição e a realidade. 
Fora de uma teoria material, é de todo ininteligível, estéril e inapli-
cável o modelo da chamada Constituição dirigente, contido, entre outras 
cláusulas, naquelas que em nossa Constituição dispõem sobre asdesigual-
dades regionais, tema central deste ensaio. 
Resta porém saber que teoria da Constituição, pelo prisma da mate-
rialidade, dever-se-á sufragar. Gilberto Bercovici enfrenta esse problema 
teórico já posto por Lassalle na segunda metade do século XIX, mediante 
observações agudas, vazadas em linguagem cáustica e panfletária, tendo por 
continuador juristas do tomo de Carl Schmitt, Costantino Mortati, Rudolf 
Smend, de quem Konrad Hesse foi eminente discípulo e seguidor e 
Hermann Hei ler, este derradeiro, um dos melhores constitucionalistas da era 
de Weimar. 
Todos eles desfilam com suas idéias de Constituição material nos 
densos resumos e nítidos perfis do constitucionalista. Este se inclina, com 
toda razão, congruência e fidelidade, depois de fazer o balanço das concep-
ções antecedentes, por uma teoria material de Constituição que seja também, 
desde as raizes, teoria democrática do poder e teoria da legitimidade, politi-
zada sempre no interesse da Nação, do povo, da sociedade. 
E o que me foi dado inferir da leitura de páginas tão fluentes que 
educam para a liberdade, a cidadania e o Estado social; texto portanto que, 
sem perder seriedade, arrojo de pensamento e densidade científica, inculca 
valores de emancipação e justiça, fora dos quais jamais se resolverá a maté-
ria do art. 3o da Constituição. As cláusulas estatuídas nesse artigo atamos o 
futuro da nossa República Federativa, porquanto esta passa, de necessidade, 
e necessidade desesperadora, pela solução do problema do desenvolvimento 
regional, que é, do mesmo passo, político, institucional e econômico. Pro-
blema de teleologia de Governo e de Estado, de instituição, de reforma pro-
funda de hábitos políticos e sociais e que, se nesta República se cumprisse a 
Constituição, já estaria resolvido. 
Enfim, o livro de Gilberto Bercovici opulenta a bibliografia de 
investigação do fenômeno federativo. Tal fenômeno, ele o investiga pelo 
prisma das bases regionais. E o prisma que ocupa cada vez mais a atenção 
DESIGUALDADES REGIONAIS, ESTADO E CONSTITUIÇÃO 21 
do meio científico das Universidades brasileiras, onde o caminho foi des-
bravado nessa direção por Paulo Lopo Saraiva, em 1982, com o seu Federa-
lismo Regional, tese defendida na Pontifícia Universidade Católica de São 
Paulo. Bercovici e Lopo Saraiva são também arautos desse novo federa-
lismo. 
ABREVIATURAS UTILIZADAS 
ADA - Agência de Desenvolvimento da Amazônia 
ADENE - Agência de Desenvolvimento do Nordeste 
ANPOCS - Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Ciências Sociais 
ANPUR - Associação Nacional de Pós-Graduação em Planejamento Urbano e Regional 
BASA - Banco da Amazônia SA 
BCA - Banco de Crédito da Amazônia 
BCB - Banco de Crédito da Borracha 
BNB - Banco do Nordeste do Brasil 
BNDE - Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico 
BNDES - Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social 
CEBRAP - Centro Brasileiro de Análise e Planejamento 
CEDAM - Casa Editrice Dott. Amtonio Milani 
CDE - Conselho dc Desenvolvimento Econômico 
CEPAL - Comisión Econômica para América Latina 
Cf. - conforme 
CFCE - Conselho Federal de Comércio Exterior 
CHESF - Companhia Hidrelétrica do São Francisco 
Cia. Ed. Nacional - Companhia Editora Nacional 
CNPq - Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico 
CODECO - Comissão de Desenvolvimento do Centro-Oeste 
CODENO - Conselho de Desenvolvimento do Nordeste 
CODEVASF - Companhia de Desenvolvimento do Vale do São Francisco (desde janeiro de 
2000: Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba) 
CONDEL/FCO - Conselho Deliberativo do Fundo Constitucional de Financiamento do 
Centro-Oeste 
CONFAZ - Conselho Nacional de Política Fazendária 
coord. - coordenador 
C P M F - Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira 
CVSF - Comissão do Vale do São Francisco 
DASP - Departamento Administrativo do Serviço Público 
DNC - Departamento Nacional do Café 
DNOCS - Departamento Nacional de Obras Contra as Secas 
DRU - Desvinculação das Receitas da União 
ed. - edição 
Ed. FGV - Editora da Fundação Getúlio Vargas 
EDUC - Editora da Universidade Católica (São Paulo) 
EdUERJ - Editora da Universidade Estadual do Rio de Janeiro 
EdUFMG - Editora da Universidade Federal de Minas Gerais 
EdUFPR - Editora da Universidade Federal do Paraná 
EdUNESP - Editora da Universidade Estadual Paulista 
24 GILBERTO BERC0V1CI 
EdUNICAMP - Editora da Universidade Estadual de Campinas 
EDUSC - Editora da Universidade do Sagrado Coração (Bauru) 
EDUSP - Editora da Universidade de São Paulo 
ENAP - Fundação Escola Nacional de Administração Pública 
FAPESP - Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo 
FCO - Fundo Constitucional de Financiamento do Centro-Oeste 
FDUSP - Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo 
FEF - Fundo de Estabilização Fiscal 
FFLCH - USP - Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São 
Paulo 
FIDENE - Fundo de Investimentos para o Desenvolvimento Econômico e Social do Nordeste 
FINAM - Fundo de Investimentos da Amazônia 
FINOR - Fundo de Investimentos do Nordeste 
FNE - Fundo Constitucional de Financiamento do Nordeste 
FNO - Fundo Constitucional de Financiamento do Norte 
FPE - Fundo de Participação dos Estados e do Distrito Federal 
FPM - Fundo de Participação dos Municípios 
FSE - Fundo Social de Emergência 
FUNDAP - Fundação do Desenvolvimento Administrativo do Estado de São Paulo 
FUNDEF - Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de 
Valorização do Magistério 
FUNRES - Fundo de Recuperação Econômica do Estado do Espírito Santo 
GTDN - Grupo de Trabalho para o Desenvolvimento do Nordeste 
IAA - Instituto do Açúcar e do Álcool 
I B E S P - Instituto Brasileiro de Economia, Sociologia e Política 
IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística 
ICM - Imposto sobre Circulação de Mercadorias 
ICMS - Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços 
IE - Imposto sobre Exportação 
IFOCS - Inspetoria Federal de Obras contra as Secas 
ILDIS - Instituto Latinoamericano de Investigaciones Sociales 
IMESP - Imprensa Oficial do Estado de São Paulo 
INPES - Instituto de Pesquisas 
IOCS - Inspetoria de Obras Contra as Secas 
IPEA - Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada 
IPI - Imposto sobre Produtos Industrializados 
IPMF - Imposto Provisório sobre Movimentação Financeira 
IPSA - International Political Science Association 
IPVA - Imposto sobre Propriedade de Veículos Automotores 
IR - Imposto sobre a Renda e Proventos de Qualquer Natureza 
ISEB - Instituto Superior de Estudos Brasileiros 
ITR - Imposto sobre Propriedade Territorial Rural 
IUPERJ - Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro 
IVAP - Instituto Vasco de Administración Pública 
L.G.D.J - Librairie Générale de Droit et de Jurisprudence 
Mass. - Massachusetts (Estados Unidos) 
MEC - Ministério da Educação e Cultura 
MIT - Massachusetts Institute of Technology 
ONU - Organização das Nações Unidas 
Org. - organizador 
PIB - Produto Interno Bruto 
PIN - Programa de Integração Nacional 
PND - Plano Nacional de Desenvolvimento 
DESIGUALDADES REGIONAIS, ESTADO E CONSTITUIÇÃO 25 
POLAMAZÔNIA - Programa de Pólos Agropecuários e Agrominerais da Amazônia 
POLOCENTRO - Programa de Desenvolvimento dos Cerrados 
POLONORDESTE - Programa de Desenvolvimento de Áreas Integradas no Nordeste 
PRM - Partido Republicano Mineiro 
PROTERRA - Programa de Redistribuição de Terras e de Estímulo à Agroindústria do Norte 
e Nordeste 
PROVALE - Programa Especial para o Vale do São Francisco 
PRP - Partido Republicano Paulista 
PRR - Partido Republicano Riograndense 
PSD - Partido Social Democrático 
PSP - Partido Social Progressista 
PTB - Partido Trabalhista Brasileiro 
PUC/SP - Pontifícia Universidade Católica de São Paulo 
PUF - Presses Universitaires de France 
RBEP - Revista Brasileirade Estudos Políticos (Belo Horizonte) 
RDA - Revista de Direito Administrativo (Rio de Janeiro) 
RDCCP - Revista de Direito Constitucional e Ciência Política (Rio de Janeiro) 
RDP - Revista de Direito Público (São Paulo) 
reimpr. - reimpressão 
RIL - Revista de Informação Legislativa (Brasília) 
RPGE - Revista da Procuradoria-Geral do Estado (São Paulo) 
RT - Revista dos Tribunais (São Paulo) 
RT - CDCCP - Revista dos Tribunais - Cadernos de Direito Constitucional e Ciência Política 
(São Paulo) 
RTDP - Revista Trimestral de Direito Público (São Paulo) 
SEADE - Sistema Estadual de Análise de Dados 
SPVEA - Superintendência do Plano de Valorização Econômica da Amazônia 
SUDAM - Superintendência do Desenvolvimento da Amazônia 
SUDECO - Superintendência do Desenvolvimento da Região Centro-Oeste 
SUDENE - Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste 
SUDESUL - Superintendência do Desenvolvimento da Região Sul (até dezembro de 1967: 
Superintendência do Desenvolvimento da Fronteira Sudoeste) 
SUFRAM A - Superintendência da Zona Franca de Manaus 
SUPRA - Superintendência de Política Agrária 
SUS - Sistema Único de Saúde 
SUVALE - Superintendência do Vale do São Francisco 
TCU - Tribunal de Contas da União 
TVA - Tennessee Valley Authority 
UDN - União Democrática Nacional 
UNICAMP - IE - Instituto de Economia da Universidade Estadual de Campinas 
UFMG - Universidade Federal de Minas Gerais 
USP - Universidade de São Paulo 
Vol. - volume 
ZFM - Zona Franca de Manaus 
AGRADECIMENTOS 
A primeira versão do presente trabalho foi apresentada como tese de 
doutorado na Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo. Na sua 
elaboração, o apoio fundamental que recebi foi de meus pais, Solly e Suely 
Bercovici, e de minha irmã, Débora. 
Além de minha família, o meu orientador, Enrique Ricardo Lewan-
dowski, exerceu papel crucial para o andamento desta pesquisa, e aproveito 
para agradecê-lo pela confiança. Sou grato também ao Professor Antonio 
Junqueira de Azevedo, cuja lealdade permitiu que a tese que originou este 
livro fosse elaborada. 
Tenho o privilégio de poder contar com a amizade de Eros Roberto 
Grau. Sua influência neste trabalho, e em minhas reflexões, é muito maior 
do que ele mesmo imagina. Outro "co-responsável" é o Professor Dalmo de 
Abreu Dallari, em cujas aulas, no primeiro ano de Faculdade, comecei a me 
interessar pelo Estado como objeto de estudo. Também foram de grande 
importância o estímulo e as indicações bibliográficas do Professor Fábio 
Konder Comparato, sem me esquecer da confiança e da amizade de João 
Manuel Cardoso de Mello. 
Agradeço, ainda, aos amigos Marcelo Neves e Martonio 
Mont'Alverne Barreto Lima, que, em nossas conversas, ao vivo ou por e-
mail, contribuíram muito para este trabalho. Fundamentais, ainda, foram o 
entusiasmo e as sugestões de Paulo Lopo Saraiva e de Willis Santiago 
Guerra Filho, assim como o constante apoio da Professora Anna Maria 
Martins. 
José Reinaldo de Lima Lopes e Aírton Cerqueira Leite Seelaender, 
com quem tive a grata oportunidade de lecionar História do Direito, reitera-
ram a minha já arraigada convicção de privilegiar o enfoque histórico no 
desenvolvimento desta pesquisa. Quero mencionar também a contribuição 
de Plínio de Arruda Sampaio Jr, cujas críticas foram incorporadas parcial-
mente, e na medida do possível, a este livro, embora nossas discordâncias 
sobre inúmeros aspectos (como o conceito de região), continuem abertas, 
servindo de pretexto para novas discussões. 
Sou grato também à amiga Maria Paula Dallari Bucci, pelas críticas 
e sugestões (inclusive as divergências), bem como a André Ramos Tavares, 
28 GILBERTO BERC0V1CI 
Cláudio Pereira de Souza Neto, Renan Aguiar, Márcio Augusto Vasconcelos 
Diniz, Fábio Ricardo Kalvan, Mário Aquino Alves e José Maurício Conti. 
Aos amigos José Maria Arruda de Andrade, Samuel Rodrigues Bar-
bosa, Otávio Yazbek, Eduardo Modena Lacerda, Enéas de Oliveira Matos, 
Clarice Seixas Duarte, Mareio Soares Grandchamp, Mariana Mota Prado, 
Jean Paul Veiga Cabral da Rocha, José Paulo Marzagão, Nelcina Conceição 
de Oliveira Tropardi, Antonio Carlos Guidoni Filho, Beyla Esther Fellous, 
Candy Florencio Thome, Carlos Eduardo Batalha da Silva e Costa, Vera 
Lúcia Viegas, Yara Chaves Galdino Ramos, Carlos Abner de Oliveira Ro-
drigues Filho, Marcelo Duarte Iezzi, José Rodrigo Rodriguez, Marcos 
Roberto Shiratori, Renato Pereira Brandão, Vinícius Marques de Carvalho e 
Carolina Gabas Stuchi, sou grato pelas nossas intermináveis conversas, 
quando falamos sobre tudo, até desta tese. 
A Francisco de Oliveira, devo um agradecimento especial pela gene-
rosidade e disposição em discutir o tema das desigualdades regionais, bem 
como pela leitura e críticas a este trabalho. Finalmente, quero agradecer a 
Paulo Bonavides e a Celso Furtado, não apenas pela amizade e cordialidade 
com que me privilegiaram, mas, principalmente, pelo estímulo e exemplo na 
luta em favor do Brasil e dos brasileiros. A eles, e ao que representam, este 
livro também é dedicado. 
INTRODUÇÃO 
O objetivo deste trabalho é a análise da questão brasileira das desi-
gualdades regionais pelo enfoque da Teoria do Estado, como parte da refle-
xão sobre o Estado brasileiro, em busca da abertura do diálogo com outras 
""A disciplinas. Desta forma, esperamos nos distanciar de boa parte da doutrina 
juspublicística e constitucional, hoje dominante, que se limita a analisar as 
polêmicas e complexas questões do Estado e da Constituição através da 
mera exegese da legislação positiva ou de decisões jurisprudenciais. 
O desenvolvimento é entendido aqui como uma questão também 
pertinente à Teoria do Estado, tendo em vista ser, histórica e institucional-
mente, o Estado o principal promotor do desenvolvimento no Brasil. E, no 
entanto, apesar da sua importância, não existe uma análise sistemática sobre 
a questão institucional do Estado por parte dos estudiosos do desenvolvi-
mentismo nacional, conforme veremos no capítulo 1 deste livro. 
Após algumas considerações sobre o conceito de região (capítulo 2), 
passamos à análise dos fundamentos da política brasileira de desenvolvi-
mento regional (capítulo 3). No Brasil, questão regional tradicionalmente 
refere-se ao Nordeste. Após meio século de políticas fracassadas voltadas 
exclusivamente ao problema das secas, o economista Celso Furtado elabo-
rou, em 1959, um novo diagnóstico e uma nova política para a região, no 
documento conhecido como Relatório do GTDN (Grupo de Trabalho para o 
Desenvolvimento do Nordeste). Neste relatório, Furtado transferiu a teoria 
do desenvolvimento elaborada pela CEPAL (Comisión Econômica para 
América Latina), baseada nos conceitos de centro e periferia, vinculados à 
análise do comércio internacional, e na proposta de desenvolvimento através 
da industrialização substitutiva de importações, para a problemática nordes-
tina, com acentuado enfoque para as reformas sociais, consubstanciado na 
criação do organismo de desenvolvimento regional SUDENE (Superinten-
dência do Desenvolvimento do Nordeste). O Relatório do GTDN tornou-se 
o fundamento de praticamente todas as políticas de desenvolvimento regio-
nal levadas a cabo no Brasil desde então. 
Com o golpe militar de 1964, o planejamento regional foi, aos 
poucos, sendo abandonado e o enfoque reformista das políticas de desenvol-
vimento regional foi substituído pela ênfase exclusiva na industrialização 
30 GILBERTO BERC0V1CI 
das regiões periféricas através de incentivos fiscais. As regiões menos 
desenvolvidas efetivamente sofreram um processo de industrialização, 
acentuado na década de 1970. No entanto, apesar da industrialização, as 
mazelas sociais persistem e as desigualdades regionais se perpetuam. Este 
foi o quadro encontrado pela Constituição de 1988. 
A nova Constituição teve uma preocupação efetiva com a questão 
regional. Dentreseus pontos positivos podemos destacar a restauração do 
federalismo, nos moldes do federalismo cooperativo, a repartição de rendas 
e a inclusão da superação das desigualdades sociais e regionais entre os 
objetivos da República, positivados no seu artigo 3o. Em relação ao federa-
lismo cooperativo proposto no texto constitucional de 1988, inclusive, 
devemos ressaltar a possibilidade que foi aberta para a completa transforma-
ção das estruturas do federalismo brasileiro, originariamente um pacto de 
oligarquias, no sentido da cooperação e coordenação das várias esferas 
governamentais para a homogeneização social da população, com a iguala-
ção das condições sociais de vida e a igualdade perante os serviços públicos 
em todo o território nacional (capítulo 4). 
No entanto, podemos fazer também inúmeras críticas: o planeja-
mento continuou centralizado na esfera federal (capítulo 6) e criou-se a 
Região administrativa (artigo 43), que não inova a estrutura federativa bra-
sileira (capítulo 7). Isto, aliado à prática do federalismo no período posterior 
à promulgação da Constituição, com a tendência de centralização de receitas 
tributárias pela União e a guerra fiscal entre os Estados (capítulo 5), à falta 
de uma política de desenvolvimento regional e à falta de concretização de 
inúmeros dispositivos constitucionais, faz com que consideremos necessária 
a elaboração de novos fundamentos para a política brasileira de desenvolvi-
mento regional. 
Neste trabalho, propomos a superação do diagnóstico exposto pelo 
Relatório do GTDN (capítulo 8). Defendemos que a fundamentação da polí-
tica brasileira de desenvolvimento regional deve se dar através dos princí-
pios do federalismo cooperativo e da solidariedade, visando a homogeneiza-
ção das condições sociais de vida e a igualdade perante os serviços e políti-
cas públicas em todo o país. Mas, o fundamental desta revisão da política 
brasileira de desenvolvimento regional é a constatação da falência do 
modelo de autarquias federais criadas nos moldes da SUDENE. Este modelo 
deve ser substituído pelo federalismo regional. A Região seria um ente fede-
rado intermediário, entendida como um ente de articulação e cooperação 
entre União, Estados e Municípios. Além da adoção do federalismo regio-
nal, o Brasil, diante dos desafios e ameaças à própria integridade nacional 
trazidos pela globalização, tem que elaborar uma efetiva política nacional de 
desenvolvimento regional, inserida dentro de um projeto nacional de desen-
volvimento. 
DESIGUALDADES REGIONAIS, ESTADO E CONSTITUIÇÃO 31 
Concluímos este livro (capítulo 9), ao entender que as bases deste 
necessário projeto nacional de desenvolvimento já estão configuradas na 
Constituição de 1988. Para tanto, propomos a elaboração de uma teoria ma-
terial da Constituição constitucionalmente adequada à Constituição de 1988, 
ressaltando o seu papel instrumentalizador da transformação das estruturas 
sociais brasileiras, inclusive a superação das desigualdades regionais. 
PARTE I 
PREMISSAS DA QUESTÃO REGIONAL 
Capítulo 1 
ESTADO E DESENVOLVIMENTO 
1.1. O Desafio Furtadiano 
Em seu livro Brasil: A Construção Interrompida, Celso Furtado 
trouxe, ao debate público, um importante desafio: 
"Na lógica da ordem econômica internacional emergente parece ser 
relativamente modesta a taxa de crescimento que corresponde ao Brasil. 
Sendo assim, o processo de formação de um sistema econômico já não se 
inscreve naturalmente em nosso destino nacional. O desafio que se coloca à 
presente geração é, portanto duplo: o de reformar as estruturas anacrôni-
cas que pesam sobre a sociedade e comprometem sua estabilidade, e o de 
resistir às forças que operam no sentido de desarticulação do nosso sistema 
econômico, ameaçando a unidade nacional".2 
Não pretendemos, obviamente, responder de modo completo e defi-
nitivo a este desafio. Na realidade, a nossa pretensão é bem mais modesta: 
desejamos apenas analisar, sob o enfoque da Teoria do Estado, a problemá-
tica dos desequilíbrios regionais (a Questão Regional), tão cara ao pen-
samento furtadiano. E, acreditando que a Teoria do Estado efetivamente 
possa contribuir para superar o impasse colocado por Celso Furtado, inicia-
mos nosso estudo definindo o que entendemos por desenvolvimento e quais 
suas relações com o Estado, a política e o direito. O Estado tem, nesta tese, 
um papel fundamental, como não poderia deixar de ser. A referência cons-
tante será a obra de Celso Furtado, cuja importância se revela também pelo 
seu pensamento sobre o papel do Estado no Brasil, da qual todos somos 
devedores, como muito bem explicitou Francisco de Oliveira: 
"Furtado converte-se — é forte o termo - em demiurgo do Brasil. 
Ninguém, nestes anos, pensou o Brasil a não ser nos termos furtadiano s" .3 
2. Celso FURTADO, Brasil: A Construção Interrompida, 2a ed, Rio de Janeiro, Paz e Terra, 
1992, p. 13. 
3. Francisco de OLIVEIRA, "A Navegação Venturosa" in Francisco de OLIVEIRA (org.), 
Celso Furtado, coleção Os Grandes Cientistas Sociais, vol. 33, São Paulo, Ática, 1983, p. 13. 
Vide também Francisco de OLIVEIRA, "Viagem ao Olho do Furacão: Celso Furtado e o 
36 GILBERTO BERC0V1CI 
A reflexão sobre o desenvolvimento, na opinião de Celso Furtado, é 
um ponto de convergência das várias ciências sociais, sendo este caráter 
interdisciplinar o responsável pela fecundidade dos estudos deste tema. 
Deve-se dar ênfase, no entanto, à dimensão política do que costuma ser 
apresentado como um problema exclusivamente econômico, entendendo a 
superação do subdesenvolvimento como um projeto político. Afinal, em 
última análise, são as estruturas de poder e a política que explicam a direção, 
efetividade e intensidade do desenvolvimento. Além do mais, a idéia de 
bem-estar contida no conceito de desenvolvimento traz à tona os aspectos 
ideológicos das políticas desenvolvimentistas.4 Esta importância da dimen-
são política no estudo do desenvolvimento também foi enfatizada por Raúl 
Prebisch: 
"Los economistas se obstinan generalmente en eludir los problemas 
políticos porque escapan al âmbito de la teoria econômica. Y la misma 
asepsia doctrinaria les lleva a prescindir de otros elementos esenciales para 
comprender la dinâmica dei desarrollo. Empero, los fenômenos dei 
desarrollo no pueden explicarse solamente con una teoria econômica; hay 
que llegar a una teoria global que integre todos los elementos dei sistema 
mundial dei capitalismo. (...) Y mal podría entonces encerrarse el 
desarrollo en el estrecho cercado de una teoria econômica. Si razones 
metodológicas han llevado a los teóricos a examinar por separado los 
distintos elementos, animados a veces por un prurito explicable de 
especialización, se impone ahora abarcados en su intrincada complejidad y 
dilucidar sus mutuas relaciones. Y hay que hacerlo para aproximarse más a 
la realidad que se pretende transformar".5 
Desafio do Pensamento Autoritário Brasileiro", Novos Estudos, n. 48, São Paulo, CEBRAP, 
julho de 1997, pp. 3-4 e 15-19 e Francisco de OLIVEIRA, "Celebração da Derrota e Saudade 
do Futuro" in Marcos FORMIGA & Ignacy SACHS (coords.), Celso Furtado, a SUDENE e 
o Futuro do Nordeste - Seminário Internacional, Recife, SUDENE, 2000, p. 108. 
4. Celso FURTADO, Pequena Introdução ao Desenvolvimento: Enfoque Interdisciplinar, 2a 
ed, São Paulo, Cia Ed. Nacional, 1981, pp. 26-27 e 29-30; Osvaldo SUNKEL & Pedro PAZ, 
El SubdesarroUo Latinoamericano y la Teoria dei Desarrollo, 22a ed, México, Siglo 
Veintiuno, 1988, pp. 15 e 37-39 e Celso FURTADO, Brasil: A Construção Interrompida cit., 
pp. 28-31. 
5. Raúl PREBISCH, Capitalismo Periférico: Crisis y Transfortnación, reimpr., México, 
Fondo de Cultura Econômica, 1984, pp. 30-31. Sobre o caráter político do conceito de subde-
senvolvimento elaborado por Celso Furtado, vide Maria Eugênia GUIMARÃES, Celso 
Furtado: A Utopia daRazão - Um Estudo sobre o Conceito de Subdesenvolvimento (1945-
1964), mimeo, São Paulo, Tese de Doutoramento (Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências 
Humanas da USP), 1999, pp. 110-113. Devemos destacar, também, a crítica ao economi-
cismo dos estudos do processo de desenvolvimento do Brasil, formulada por Francisco de 
Oliveira: "O 'economicismo' das análises que isolam as condições econômicas das políticas 
é um vício metodológico que anda de par com a recusa em reconhecer-se como ideologia" in 
Francisco de OLIVEIRA, A Economia Brasileira: Crítica à Razão Dualista, 5a ed, Petrópo-
lis, Vozes, 1987, p. 9. 
DESIGUALDADES REGIONAIS, ESTADO E CONSTITUIÇÃO 37 
O desenvolvimento é um fenômeno com dimensão histórica: cada 
economia enfrenta problemas que lhe são específicos.6 Não existem fases de 
desenvolvimento pelas quais, necessariamente, passam todas as sociedades, 
seguindo os moldes da industrialização européia. O subdesenvolvimento é 
uma condição específica da periferia, não uma etapa necessária do processo 
de "evolução natural" da economia. O desenvolvimento e o subdesenvolvi-
mento são processos simultâneos, que se condicionam e interagem mutua-
mente, cuja expressão geográfica concreta se revela na dicotomia da CEP AL 
entre centro e periferia.7 Na concepção clássica de Celso Furtado: 
"O subdesenvolvimento é, portanto, um processo histórico autô-
nomo, e não uma etapa pela qual tenham, necessariamente, passado as 
economias que já alcançaram grau superior de desenvolvimento".* 
A economia subdesenvolvida não deve também ser considerada 
isoladamente do sistema de divisão internacional do trabalho em que está 
situada. A passagem do subdesenvolvimento para o desenvolvimento só 
pode ocorrer em processo de ruptura com o sistema, internamente e com o 
exterior, afinal, "em suas raízes, o subdesenvolvimento é um fenômeno de 
dominação, ou seja, de natureza cultural e política"!' Portanto, é necessária 
uma política deliberada de desenvolvimento, em que se garanta tanto o 
desenvolvimento econômico como o desenvolvimento social, dada a sua 
interdependência.1" Deste modo, o desenvolvimento só pode ocorrer com a 
transformação das estruturas sociais: 
"En síntesis, el concepto de desarrollo, concebido como proceso de 
cambio social, se refiere a un proceso deliberado que persigue como 
finalidad última la igualación de Ias oportunidades sociales, políticas y 
econômicas, tanto en el plano nacional como en relaciôn con sociedades 
que poseen patrones más elevados de bienestar material. Sin embargo, esto 
no significa que diclio proceso de cambio social tenga que seguir la misma 
trayectoria, ni deba conducir necesariamente a formas de organiz.aciôn 
6. Celso FURTADO, Teoria e Política do Desenvolvimento Econômico, 10a ed, Rio de 
Janeiro, Paz e Terra, 2000, p. 18 e Celso FURTADO, Brasil: A Construção Interrompida cit., 
p. 38. 
7. Celso FURTADO, Teoria e Política do Desenvolvimento Econômico cit., pp. 147-154 e 
203; Osvaldo SUNKEL & Pedro PAZ, El Subdesarrollo Latinoamericano y la Teoria dei 
Desarrollo cit., pp. 6, 32-34 e 37; Celso FURTADO, Brasil: A Construção Interrompida cit., 
pp. 40-41, 47-48 e 74-75 e Ricardo BIELSCHOWSKY, Pensamento Econômico Brasileiro: 
O Ciclo Ideológico do Desenvolvimentismo, 2a ed, Rio de Janeiro, Contraponto, 1995, 
pp. 137-140. 
8. Celso FURTADO, Teoria e Política do Desenvolvimento Econômico cit., p. 197. 
9. Celso FURTADO, Teoria e Política do Desenvolvimento Econômico cit., p. 207. Vide 
também idem, pp. 254 e 303 e Octavio IANNI, Estado e Capitalismo, 2a ed, São Paulo, 
Brasiliense, 1989, p. 204. 
10. Angelos ANGELOPOULOS, Planisme et Progrès Social, Paris, L.G.D.J., 1953, p. 181 e 
Raúl PREBISCH, Dinâmica do Desenvolvimento Latino-Americano, 2a ed, Rio de Janeiro, 
Fundo de Cultura, 1968, pp. 20-22 e 28-31. 
38 GILBERTO BERC0V1CI 
social y política similares a Ias que prevaleceu en los países actualmente 
industrializados o desarrollados de uno u otro tipo. La posición adoptada 
implica, en consecuencia, la necesidad de examinar y buscar en la propia 
realidad latinoamericana y en Ias influencias que ésta sufre, por el solo 
hecho de coexistir con sociedades desarrolladas, el proyecto de nación, Ias 
estratégias y políticas de desarrollo y Ias formas de organización que 
habrán de satisfacer Ias aspiraciones de los grupos en cuyo nombre se 
realiza la tarea de desarrollo"." 
Quando não ocorre nenhuma transformação, seja social, seja no sis-
tema produtivo, não se está diante de um processo de desenvolvimento, mas 
da simples modernização. Com a modernização, mantém-se o subdesenvol-
vimento, agravando a concentração de renda. Ocorre assimilação do pro-
gresso técnico das sociedades desenvolvidas, mas limitada ao estilo de vida 
e aos padrões de consumo de uma minoria privilegiada. Embora possa haver 
taxas elevadas de crescimento econômico e aumentos de produtividade, a 
modernização não contribui para melhorar as condições de vida da maioria 
da população.'2 
O crescimento sem desenvolvimento é aquele que ocorre com a mo-
dernização, sem qualquer transformação nas estruturas econômicas e sociais. 
Assim, o conceito de desenvolvimento compreende a idéia de crescimento, 
superando-a." As teorias do crescimento econômico dão ênfase à ação deli-
berada da política econômica do Estado para a manutenção de um ritmo 
expansivo que mantenha o pleno emprego. Contudo, suas preocupações são 
exclusivamente econômicas, não analisam as condições ou conseqüências 
políticas, institucionais, sociais ou culturais do crescimento econômico. 
Obstáculos institucionais não são analisados, afinal, são problemas políticos 
ou jurídicos, não econômicos. O objetivo propugnado pelas teorias do cres-
cimento econômico é fazer com que os países subdesenvolvidos, cujo 
problema se limita, para estas teorias, a uma maior ou menor capacidade de 
acumulação, alcancem o mesmo sistema econômico dos desenvolvidos. Na 
realidade, trata-se de uma aplicação de teorias elaboradas para os países 
desenvolvidos (neoclássicas ou keynesianas) na realidade sócio-econômica 
completamente distinta dos países subdesenvolvidos.14 
O grande desafio da superação do subdesenvolvimento é a transfor-
mação das estruturas sócio-econômicas e institucionais para satisfazer as 
11. Osvaldo SUNKEL & Pedro PAZ, El Subdesarrollo Latinoamericano y la Teoria dei 
Desarrollo cit., p. 39. 
12. Celso FURTADO, Brasil: A Construção Interrompida cit., pp. 41-45. 
13. Cf. Celso FURTADO, Teoria e Política do Desenvolvimento Econômico cit., pp. 101-
104. 
14. Albert O. HIRSCHMAN, La Estratégia dei Desarrollo Econômico, reimpr., México, 
Fondo de Cultura Econômica, 1973, pp. 39-43 e Osvaldo SUNKEL & Pedro PAZ, El 
Subdesarrollo Latinoamericano y la Teoria de! Desarrollo cit., pp. 24-25 e 29-32. 
DESIGUALDADES REGIONAIS, ESTADO E CONSTITUIÇÃO 39 
necessidades da sociedade nacional.15 Para a efetivação deste objetivo, 
segundo a proposta de Osvaldo Sunkel e Pedro Paz, é fundamental a partici-
pação social, política e cultural dos grupos tradicionalmente considerados 
como "objeto" do desenvolvimento, que devem tornar-se "sujeito" deste 
processo.16 Podemos afirmar, então, que a democracia também é essencial 
para o desenvolvimento.17 
Ao considerarmos a democracia como condição do desenvolvi-
mento, podemos também analisá-lo com enfoque nos direitos fundamentais. 
, 0 objeto do desenvolvimento, assim, é bem mais amplo do que o simples 
crescimento do PIB, pois também leva em conta fatores sociais e políticos. 
O desenvolvimento deixa de ser um fim em si mesmo, mas seus fins e meios 
adquirem crucial importância, tendo como principal meio e fim do desen-
volvimento a expansão da liberdade humana.1" Esta concepção, hoje, é con-
sagrada na elaboração, pela Organização das Nações Unidas (ONU), do 
direito ao desenvolvimento. 
A definição de direito ao desenvolvimentopassou por vários es-
tágios nas discussões da ONU.1'' Do enfoque economicista inicial, chegou-se 
15. Sobre os obstáculos existentes no capitalismo dependente para a satisfação das necessida-
des das sociedades nacionais, vide Plínio de Arruda SAMPAIO Jr, Entre a Nação e a Barbá-
rie: Os Dilemas do Capitalismo Dependente em Caio Prado, Florestem Fernandes e Celso 
Furtado, Petrópolis, Vozes, 1999, pp. 89-96 e 203-206. 
16. Cf. Osvaldo SUNKEL & Pedro PAZ, El Subdesarrollo Latinoamericano y Ia Teoria dei 
Desarrollo cit., pp. 37-38. 
17. Amartya SEN, Development as Freedom, New York, Alfred A. Knopf, 1999, pp. 146-
159. Para a importância da democracia na concepção de desenvolvimento desenvolvida por 
Celso Furtado, vide Maria Eugênia GUIMARÃES, Celso Furtado: A Utopia da Razão cit., 
pp. 160, 175-176, 182, 187, 199 e 219-222. A estratégia de desenvolvimento proposta pela 
CEPAL (Comisión Econômica para América Latina) também defendia a democracia como 
forma de coordenar as sociedades complexas da periferia. A integração econômica, física e 
social das sociedades nacionais era considerada como um requisito para o funcionamento da 
democracia plena. Ao mesmo tempo, uma organização política democrática era condição 
para a aplicação de estratégias orientadas para a eqüidade social. A democracia e a eqüidade, 
para a CEPAL, reforçavam-se mutuamente. Cf. Adolfo GURRIERI, "Vigência dei Estado 
Planificador en la Crisis Actual", Revista de la CEPAL n. 31, Santiago, CEPAL, abril de 
1987, pp. 214-216. 
18. Cf. Amartya SEN, Development as Freedom cit., pp. 3-5, 8-10, 14-15, 18-20, 33-41 e 51-
53. Vide também Kéba M'BAYE, "Le Droit au Développement comme un Droit de 
1'Homme", Revue des Droits de l'Homme/Human Riglits Journal, vol. V, n. 2-3, Paris, A. 
Pedone, 1972, pp. 514-530 e Cláudia PERRONE-MOISÉS, "Direitos Humanos e Desenvol-
vimento: A Contribuição das Nações Unidas" in Alberto do AMARAL Jr & Cláudia 
PERRONE-MOISÉS (orgs.), O Cinqüentenário da Declaração Universal dos Direitos do 
Homem, São Paulo, EDUSP, 1999, pp. 192-193. 
19. O primeiro a formular a idéia de direito ao desenvolvimento foi o senegalês Kéba 
M'Baye, na conferência "Le Droit au Développement comme un Droit de 1'Homme", publi-
cada na Revue des Droits de l'Homme/Human Riglits Journal, vol. V, n. 2-3, Paris, A. 
Pedone, 1972, pp. 505-534. Para a evolução das concepções de direito ao desenvolvimento na 
ONU, vide Fábio Konder COMPARATO, "O Reconhecimento de Direitos Coletivos na 
Esfera Internacional", RTDP n. 23, São Paulo, Malheiros, 1998, pp. 7-8 e Cláudia 
40 GILBERTO BERC0V1CI 
à concepção atual de direito ao desenvolvimento como um direito funda-
mental, integrante dos direitos de solidariedade, cujo titular não é o indiví-
duo, mas os povos.2" A proclamação do direito ao desenvolvimento foi efe-
tuada pela resolução 41/128 da Assembléia Geral das Nações Unidas, de 4 
de dezembro de 1986, e reafirmado no artigo 10 da Declaração da Confe-
rência Mundial de Direitos Humanos, realizada em Viena, de 12 de julho de 
1993: 
Artigo Io da Resolução 41/128 - "O direito ao desenvolvimento é 
um direito inalienável do homem em virtude do qual todo ser humano e 
todos os povos têm o direito de participar e contribuir para o desenvolvi-
mento econômico, social, cultural e político no qual todos os direitos do 
homem e todas as liberdades fundamentais possam ser plenamente realiza-
das, e beneficiar-se deste desenvolvimento". 
Artigo 10 da Declaração e Programa de Ação de Viena - "A Confe-
rência Mundial sobre Direitos humanos reafirma o direito ao desenvolvi-
mento, conforme estabelecido na Declaração sobre o Direito ao Desenvol-
vimento, como um direito universal e inalienável e parte dos direitos hu-
manos fundamentais. Como afirma a Declaração sobre o Direito ao 
Desenvolvimento, a pessoa humana é o sujeito central do desenvolvimento. 
Embora o desenvolvimento facilite a realização de todos os direitos huma-
nos, a falta de desenvolvimento não poderá ser invocada como justificativa 
para se limitarem direitos humanos internacionalmente reconhecidos. Os 
Estados devem cooperar uns com os outros para garantir o desenvolvi-
mento e eliminar os obstáculos ao mesmo. A comunidade internacional deve 
promover uma cooperação internacional eficaz visando à realização do 
direito ao desenvolvimento. O progresso duradouro necessário à realização 
do direito ao desenvolvimento exige políticas efi.caz.es de desenvolvimento 
em nível nacional, bem como relações econômicas eqiiitativas e um am-
biente econômico favorável em nível internacional".2' 
PERRONE-MOISÉS, "Direitos Humanos e Desenvolvimento: A Contribuição das Nações 
Unidas" cíí.,pp. 179-189. 
20. Paulo BONAVIDES, "Federalismo das Regiões, Desenvolvimento e Direitos Humanos" 
in A Constituição Aberta: Temas Políticos e Constitucionais da Atualidade, com ênfase no 
Federalismo das Regiões, 2a ed, São Paulo, Malheiros, 1996, pp. 346-350 e Fábio Konder 
COMPARATO, "O Reconhecimento de Direitos Coletivos na Esfera Internacional" cit., 
pp. 9-11. 
21. Apud Cláudia PERRONE-MOISÉS, "Direitos Humanos e Desenvolvimento: A Contri-
buição das Nações Unidas" cit., pp. 187 e nota 20, pp. 187-188. O direito ao desenvolvimento 
está incluído entre os direitos fundamentais previstos na Constituição de 1988 por força do 
seu artigo 5o, § 2o: "Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros 
decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em 
que a República Federativa do Brasil seja parte". Desta forma, o direito ao desenvolvimento 
está incorporado aos direitos fundamentais expressos no texto constitucional, tanto por ser 
decorrente do seu regime e princípios (como o artigo 3o, II, que institui o desenvolvimento 
nacional como objetivo fundamental da República), como pelo fato de estar previsto em 
DESIGUALDADES REGIONAIS, ESTADO E CONSTITUIÇÃO 4 1 
O desenvolvimento, portanto, também é um direito fundamental, 
que deve ser respeitado, garantido e promovido pelo Estado, que é o princi-
pal formulador das políticas de desenvolvimento. O Estado introduz a 
dimensão política no cálculo econômico, buscando a constituição de um 
sistema econômico nacional.22 O processo de formação de políticas públi-
cas,23 de acordo com Lourdes Sola, é o resultado de uma complexa e dinâ-
mica interação de fatores econômicos, políticos e ideológicos. O papel polí-
tico do Estado é central neste processo, contrariando a visão corrente da 
análise econômica que considera o Estado apenas uma categoria residual.24 
tratados internacionais firmados pelo Brasil. Há, ainda, autores que propõem a criação de um 
ramo autônomo do direito, intitulado "direito do desenvolvimento". Em nossa opinião, o 
desenvolvimento, além de um direito fundamental, é um objetivo, um fim para o qual está 
voltado o Estado, como prescreve o artigo 3o, II da Constituição de 1988, e todo o ordena-
mento por ele emanado. Não haveria, assim, necessidade de uma disciplina própria, autô-
noma. Para a proposta favorável ao "direito do desenvolvimento", vide especialmente Roger 
GRANGER, "Pour un Droit du Développement dans le Pays Sous-Développés" in Dix Ans 
de Conférences d'Agrégation - Etudes de Droit Commercial offertes à Joseph Hamel, Paris, 
Dalloz, 1961, pp. 47-69. Para a diferenciação entre direito ao desenvolvimento e direito do 
desenvolvimento, vide Washington Peluso Albino de SOUZA, Primeiras Linhas de Direito 
Econômico, 3a ed, São Paulo, LTr, 1994, pp. 317-318. 
22. Segundo Celso Furtado: "Um sistema econômico nacional não é outra coisa senão a 
prevalência de critérios políticos que permitem superar a rigidez da lógica econômica na 
busca do bem-estar coletivo" in Celso FURTADO, Brasil: A Construção Interrompida cit., 
p. 30. Vide também Plínio de Arruda SAMPAIO Jr, Entre a Nação e a Barbárie cit., pp. 64-
66, 86-87 e 203. 
23. Na definição de Maria PaulaDallari Bucci: "Políticas públicas são os programas de ação 
governamental visando coordenar os meios à disposição do Estado e as atividades privadas, 
para a realização de objetivos socialmente relevantes e politicamente determinados" in 
Maria Paula Dallari BUCCI, Direito Administrativo e Políticas Públicas, mimeo, São Paulo, 
Tese de Doutoramento (Faculdade de Direito da USP), 2000, p. 236. Vide também idem, 
pp. 245-248; Maria Paula Dallari BUCCI, "As Políticas Públicas e o Direito Administrativo", 
RTDP n. 13, São Paulo, Malheiros, 1996, pp. 135-136 e 140; Fábio Konder COMPARATO, 
"Um Quadro Institucional para o Desenvolvimento Democrático" in Hélio JAGUARIBE; 
Francisco IGLÉSIAS; Wanderley Guilherme dos SANTOS; Vamireh CHACON & Fábio 
COMPARATO, Brasil, Sociedade Democrática, 2a ed, Rio de Janeiro, José Olympio, 1986, 
p. 408; José Reinaldo de Lima LOPES, "Direito Subjetivo e Direitos Sociais: O Dilema do 
Judiciário no Estado Social de Direito" in José Eduardo FARIA (org.), Direitos Humanos, 
Direitos Sociais e Justiça, reimpr., São Paulo, Malheiros, 1998, pp. 131-134; Fábio Konder 
COMPARATO, "Ensaio sobre o Juízo de Constitucionalidade de Políticas Públicas", RIL 
n. 108, Brasília, Senado Federal, abril/junho de 1998, pp. 44-5 e Manuel GARCÍA-PELAYO, 
Las Transformaciones dei Estado Contemporâneo, 2a ed, Madrid, Alianza Editorial, 1985, 
pp. 22-24 e 39. Sobre a dificuldade na conceituação de política pública, vide Pierre 
MULLER, Les Politiques Publiques, 4a ed, Paris, PUF, 2000, pp. 23-27. 
24. Pierre Muller entende o estudo das políticas públicas como a "science de l'Etat en 
action". Cf. Pierre MULLER, Les Politiques Publiques cit., pp. 3-5. Vide também Celso 
FURTADO, Brasil: A Construção Interrompida cit., pp. 28-31; Lourdes SOLA, Idéias Eco-
nômicas, Decisões Políticas: Desenvolvimento, Estabilidade e Populismo, São Paulo, 
EDUSP/FAPESP, 1998, pp. 36-39 e 422-426 e Eros Roberto GRAU, .4 Ordem Econômica na 
Constituição de 1988 (Interpretação e Crítica), 4a ed, São Paulo, Malheiros, 1998, pp. 28 e 
266-268. Para Sônia Draibe, a atividade do Estado ocorre, concretamente, de modo finalís-
42 GILBERTO BERC0V1CI 
Para Lourdes Sola, um equívoco comum nas análises políticas é a 
incorporação do erro cometido pelos economistas, que atribuem o fracasso 
das políticas econômicas aos equívocos de teoria econômica em sua elabo-
ração. Falta, em sua opinião, a inclusão de outra causalidade: a política e 
institucional (e jurídica, incluiríamos). Os resultados das políticas econômi-
cas não dependem apenas de sua coerência econômica, mas também de sua 
viabilidade política e das opções institucionais. Isto ainda é mais facilmente 
perceptível no caso das políticas de desenvolvimento de longo prazo cujo 
objetivo seja a melhoria das condições sociais da população.2'1 E a análise do 
caso brasileiro revela que o processo de desenvolvimento funda-se em deci-
sões políticas.2'' 
O próprio fundamento das políticas públicas é a necessidade de con-
cretização de direitos por meio de prestações positivas do Estado, sendo o 
desenvolvimento nacional a principal política pública, conformando e har-
monizando todas as demais.27 O desenvolvimento econômico e social, com a 
tico. As políticas públicas são formadas pelos diferentes interesses sociais inseridos no apa-
relho estatal, que estão sujeitos à hierarquização pela direção política do Estado. Ao serem 
generalizados e abstraídos, transformam-se em "interesses nacionais" e fundamento das 
políticas públicas. As políticas públicas refletem as relações e contradições sociais básicas, ao 
mesmo tempo que exprimem o papel do Estado como definidor e dirigente de um projeto 
social e econômico para a sociedade. Cf. Sônia DRAIBE, Rumos e Metamorfoses: Um 
Estudo sobre a Constituição do Estado e as Alternativas da Industrialização no Brasil, 1930-
1960, Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1985, pp. 50-51, 61-62 e 83. Pierre Muller critica a redu-
ção da análise das políticas públicas às fases de elaboração e decisão (decision making) e de 
implementação. Em sua opinião, fundamental também é o estudo do referencial de uma 
política pública, ou seja, a construção de uma representação da realidade sobre a qual a polí-
tica pública irá atuar. O referencial da política pública dá sentido a um programa político, 
definindo seus critérios de escolha de meios e de objetivos. Cf. Pierre MULLER, Les 
Politiques Publiques cit., pp. 28-34 e 42-49. Sobre as dificuldades na conceituação de 
"interesse público", vide especialmente José Eduardo FARIA, Direito e Economia na Demo-
cratização Brasileira, São Paulo, Malheiros, 1993, pp. 63-82. 
25. Celso FURTADO, O Brasil Pós-"Milagre", T ed, Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1982, 
pp. 79-80 e Lourdes SOLA, Idéias Econômicas, Decisões Políticas cit., pp. 420-421. Vide 
também Nelson Mello e SOUZA, "O Planejamento Econômico no Brasil: Considerações 
Críticas", Revista de Administração Pública, vol. 18, n. 4, Rio de Janeiro, outubro/dezembro 
de 1984, pp. 68-69. 
26. Octavio 1ANN1, Estado e Capitalismo cit., p. 214. Vide também Sônia DRAIBE, Rumos 
e Metamorfoses cit., pp. 19-20. Devemos, no entanto, destacar a seguinte afirmação de Pierre 
Muller: "II n'y a ni déterminisme ni volontarisme absolu: une politique publique n'est jamais 
le produit direct d 'une situation socio-économique puisque cette situation n 'existe qu 'en tant 
qu'elle est formulée et recodée en fonction de la grille cognitive des acteurs de la décision. 
Inversement, une politique publique ne peut méconnaitre au-delà d'une certaine limite la 
configuration des rapports de force à un moment donné. La marge de jeu des politiques 
publiques se situe donc exactement à Vintersection entre l'état des rapports sociaux et les 
représentations que s'en font les acteurs" in Pierre MULLER, Les Politiques Publiques cit., 
p. 67. 
27. Fábio Konder COMPARATO, "A Organização Constitucional da Função Planejadora" in 
Ricardo Antônio Lucas CAMARGO (org.), Desenvolvimento Econômico e Intervenção do 
DESIGUALDADES REGIONAIS, ESTADO E CONSTITUIÇÃO 43 
eliminação das desigualdades, pode ser considerado como a síntese dos 
objetivos históricos nacionais.2* Podemos concluir com Francisco de Oli-
veira: a questão nacional é, essencialmente, a questão colocada pelo con-
ceito de subdesenvolvimento2'. 
Toda reflexão sobre a política de desenvolvimento exige que se 
refira ao Estado, inclusive para alterar as bases de sustentação deste Estado e 
modificar a orientação do desenvolvimento excludente, levado a cabo espe-
cialmente após 1964™. E este é um dos grandes problemas dos estudos sobre 
o desenvolvimento brasileiro: a falta de uma. reflexão mais aprofundada 
sobre o Estado". De acordo com Francisco de Oliveira, a temática dos gran-
des "pensadores do Brasil" da década de 1930, Gilberto Freyre, Sérgio 
Buarque de Holanda e Caio Prado Jr, é a formação da sociedade brasileira. 
O Estado é pouco estudado. O mesmo ocorre com os grupos políticos de 
direita e de esquerda das décadas de 1950 e 1960: ambos não tinham uma 
interpretação do Estado32. A preocupação com o Estado fez parte das obras 
dos autores autoritários da República Velha e década de 1930: Alberto Tor-
res e Oliveira Vianna. Devemos ressaltar, no entanto que, embora eles, 
como Celso Furtado, tenham se preocupado com a disfuncionalidade do 
Estado brasileiro, não há nenhum cabimento em buscar-se alguma filiação 
entre o pensamento de Furtado e o dos autoritários da República Velha". 
Apesar da sua importância para o desenvolvimento, não existe uma 
análise sistemática sobre a questão institucional do Estado por parte dos 
teóricos desenvolvimentistas. A ênfase no papel do Estado é derivada de 
uma concepção da ação política em que a racionalidade técnica tinha um 
papel decisivo: o Estado formulava e concretizava a racionalidade mediante 
Estado na Ordem Constitucional - Estudos Jurídicos em Homenagem ao ProfessorWashington Peluso Albino de Souza, Porto Alegre, Sérgio Antonio Fabris Ed., 1995, pp. 78 e 
82-83; Eros Roberto GRAU, A Ordem Econômica na Constituição de 1988 cit., pp. 238-242 
e Maria Paula Dallari BUCCI, "As Políticas Públicas e o Direito Administrativo" cit., p. 135. 
Vide também Pierre MULLER, Les Politiques Publiques cit., p. 25. 
28. Cf. Fábio Konder COMPARATO, "Um Quadro Institucional para o Desenvolvimento 
Democrático" cit., p. 410. 
29. Cf. Francisco de OLIVEIRA, "A Navegação Venturosa" cit., p. 27. Para uma análise da 
superação do subdesenvolvimento como o problema político essencial do Estado nacional no 
pensamento de Celso Furtado, vide Maria Eugênia GUIMARÃES, Celso Furtado: A Utopia 
da Razão cit., pp. 162-177. 
30. Celso FURTADO, O Brasil Pós-"Milagre" cit., pp. 42 e 75-79. 
31. Vide, especialmente, as críticas e sugestões para uma teoria latino-americana do Estado 
de José Luís FIORI, "Para uma Crítica da Teoria Latino-Americana do Estado" in Em Busca 
do Dissenso Perdido: Ensaios Críticos sobre a Festejada Crise do Estado, Rio de Janeiro, 
Insight, 1995, pp. 33-37. 
32. Francisco de OLIVEIRA, "Viagem ao Olho do Furacão: Celso Furtado e o Desafio do 
Pensamento Autoritário Brasileiro" cit., pp. 4-6. 
33. Francisco de OLIVEIRA, "Viagem ao Olho do Furacão: Celso Furtado e o Desafio do 
Pensamento Autoritário Brasileiro" cit., pp. 7-15. No mesmo sentido, vide Maria Eugênia 
GUIMARÃES, Celso Furtado: A Utopia da Razão cit., pp. 161-162 e 219-222. 
44 GILBERTO BERC0V1CI 
o planejamento e a política de desenvolvimento34. Para tentar superar esta 
lacuna, precisamos definir qual Teoria do Estado vai ser adotada neste 
estudo. 
1.2. Qual Teoria do Estado? 
O positivismo jurídico buscou, a partir do final do século XIX, a de-
puração metodológica dos elementos políticos, sociais, históricos e filosófi-
cos da Teoria do Estado35. Inspirados pela pandectística, os positivistas, 
como os alemães Carl Friedrich von Gerber e Paul Laband e o italiano 
Vittorio Emanuele Orlando, viam no Direito Privado o exemplo a ser 
seguido, buscando a adoção de uma metodologia "exclusivamente jurí-
dica""'. Fundamentando sua argumentação em construções meramente con-
ceituais, os teóricos positivistas retiraram a possibilidade de conhecimento 
do Estado concreto37. 
34. Cf. Adolfo GURRIERI, "Vigência dei Estado Planificador en la Crisis Actual" cit., 
pp. 201-202 e 205-206 e José Luís FIOR1, "Para uma Crítica da Teoria Latino-Americana do 
Estado" cit., pp. 1, 22 e 35. 
35. O italiano Vittorio Emanuele Orlando, em um texto de 1889, fez as seguintes considera-
ções, que consideramos emblemáticas da proposta positivista: "Se noi lamentiano clie i 
cultori dei diritto pubblico sono troppo filosofi, troppo politici, troppo storici, troppo 
sociologisti e troppo poco giureconsulti, mentre soprattutto giureconsulti dovrebbero essere, 
qual modo migliore, piu sicuro e piu semplice potrà tenersi, perchè la transformazione 
avvenga, che uno studio profondo dei metodi proprii a quelle scuole che di iurisprudentia 
sono modello?" in Vittorio Emanuele ORLANDO, "I Criteri Tecnici per la Ricostruzione 
Giuridica dei Diritto Pubblico" in Diritto Pubblico Generale - Scritti Varii (1881-1940) 
Coordinciti in Sistema, ristampa, Milano, Giuffrè, 1954, p. 6. Sobre as concepções de 
Orlando, vide Sebastião Botto de Barros TOJAL, Teoria Geral do Estado: Elementos de uma 
Nova Ciência Social, Rio de Janeiro, Forense, 1997, pp. 57-63. 
36. Sobre o Direito Privado como modelo a ser seguido pelo Direito Público: "Cosi, dunque, 
quella nozione giuridica che nel campo dei diritto privato appare sempre acompagnata da 
una certezza obiettiva, nel diritto pubblico è indivisibile da una discussione che Ia circonda 
di controversie e di dubbi. E una questione tutta técnica, è un abito intellettuale, ma che há 
avuto questa influenza disastrosa, che, mentre Io studioso di diritto privato há finito col 
considerare i principii giuridici come esistenze reali, a noi cultori di diritto pubblico 
appaiono come creazioni deli'arbítrio, e, per naturale conseguenza, quella chiarezza, quella 
precisione, quella sicurezza che contraddistinguono Io studio di un rapporto di diritto 
privato, si mutano, nel campo dei diritto pubblico, in incertezza, in oscurità, in confusione" 
in Vittorio Emanuele ORLANDO, "I Criteri Tecnici per la Ricostruzione Giuridica dei 
Diritto Pubblico" cit., p. 14. 
37. Heinrich TRIEPEL, Derecho Público y Política, 2a ed, Madrid, Editorial Civitas, 1986, 
pp. 37-41; Klaus STERN, Derecho dei Estado de la Republica Federal Atemana, Madrid, 
Centro de Estúdios Constitucionales, 1987, pp. 121-123; Pedro de Vega GARCÍA, "El 
Trânsito dei Positivismo Jurídico al Positivismo Jurisprudencial en la Doctrina 
Constitucional", Teoria y Realidad Constitucional n. 1, Madrid, Universidad Nacional de 
Educación a Distancia/Editorial Centro de Estúdios Ramón Areces, janeiro/junho de 1998, 
DESIGUALDADES REGIONAIS, ESTADO E CONSTITUIÇÃO 45 
O primeiro autor a dar um tratamento sistemático ao Direito Pú-
blico, sem se limitar a um comentário exegético ou a considerações filosófi-
cas, foi Georg Jellinek, abrindo caminho a uma doutrina jurídica do Estado. 
Jellinek pretendeu criar um sistema de validade universal, à margem da 
história e da realidade. A teoria jurídica do Estado de Jellinek, segundo 
Pedro de Vega, está ligada a três pressupostos: a positividade do direito, o 
monopólio estatal da produção jurídica e a personalidade jurídica do Estado. 
O principal conceito é o do Estado como pessoa jurídica, conceito ligado à 
auto-limitação do Estado. Afinal, ao criar o direito, o Estado obriga-se a si 
mesmo e, submetendo-se ao direito, torna-se também sujeito de direitos e 
deveres38. 
Apesar de sua intenção em estabelecer e fundamentar uma teoria 
jurídica do Estado, Jellinek admitia a possibilidade da existência de uma 
teoria sociológica do Estado. Para ele, a Teoria Geral do Estado deveria se 
ater a dois aspectos básicos: o Estado é uma construção social e uma insti-
tuição jurídica, havendo, portanto, a possibilidade de uma doutrina socioló-
gica e uma doutrina jurídica do Estado. A doutrina sociológica teria por 
objeto de estudo o "ser" do Estado, por meio dos fatos, da história, em 
suma, um exame "naturalista" do Estado. Já a doutrina jurídica estudaria as 
normas que "devem ser", normas estas diferenciadas das afirmações do 
"ser" do Estado enquanto fenômeno social. Não seria possível, todavia, 
introduzir métodos de investigação estranhos ao campo jurídico na Teoria 
Geral do Estado: embora se proponha a completar a concepção social de 
Estado, a concepção jurídica não pode ser confundida com ela. Deste modo, 
como salientou Sebastião Botto de Barros Tojal, Jellinek não considera as 
concepções jurídica e sociológica do Estado complementares, mas opostas, 
privilegiando a doutrina jurídica3'. 
O ponto culminante do positivismo jurídico foi representado por 
Hans Kelsen, com sua Teoria Geral do Estado (Algemeine Staatslehre), de 
1925, que pautou boa parte do debate juspublicista dos anos da República de 
Weimar (1918-1933). Este debate, travado entre figuras como Hans Kelsen, 
Carl Schmitt, Rudolf Smend e Hermann Heller, é, até os dias de hoje, de 
crucial importância para o estudo das concepções de Estado e Constituição. 
Ao normativismo positivista de Kelsen, opuseram-se várias doutrinas e con-
cepções, cujo ponto comum era o desejo de introduzir o político na análise 
pp. 69-70 e Sebastião Botto de Barros TOJAL, Teoria Geral do Estado cit., pp. 33-44 
e 55-57. 
38. Cf. Georg JELLINEK, Allgemeine Staatslehre, reimpr., 3a ed, Bad Homburg vor der 
Hohe, Hermann Gentner Verlag, 1959, pp. 169-173, 182-183, 370-375 e 386-387. Vide 
também Pedro de Vega GARCÍA, "El Trânsito dei Positivismo Jurídico al Positivismo 
Jurisprudencial en ia Doctrina Constitucional" cit., pp. 65-67 e 70-72. 
39. Georg

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