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LETRAS JURÍDICAS | V. 3| N.2 | 2O SEMESTRE DE 2015 | ISSN 2358-2685 CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA125 A (IN)IMPUTABILIDADE DOS PSICOPATAS Grazielle Gonçalves de Araújo1 Carlos Augusto Teixeira Magalhães2 RESUMO: Com tantos casos em nossa sociedade de crimes bárbaros cometidos por seres considerados cruéis, considerados psicopatas, é necessário um estudo a respeito dos crimes cometidos por eles e o tratamento dado a eles pelo nosso ordenamento jurídico. ABSTRACT: With so many cases in our society of barbaric crimes committed by beings considered cruel, considered psychopaths, a study is needed about the crimes committed by them and the treatment given to them by our legal system. PALAVRAS-CHAVE: psicopatas, código penal, lei, psicopatia, pesquisas, crimes, ordenamento jurídico. KEyWORdS: psychopaths, criminal law, law, psychopathy, research, crimes law. SUMÁRIO: 1 Introdução; 2 O conceito de crime no direito penal; 2.1 conceito material; 2.2 conceito formal; 2.3 conceito analítico; 3 A culpabi- lidade no direito brasileiro; 3.1 elementos que integram a culpabilidade; 3.1.1 imputabilidade; 3.1.2 potencial consciência da ilicitude; 3.1.3 exi- gibilidade de conduta diversa; 3.2 semi-imputabilidade; 4 Sanções penais; 4.1 pena; 4.2 medida de segurança; 5 O conceito e os aspectos da psicopatia; 5.1 dos perigos da caracterização da psicopatia; 6 Psicopatas no direito penal brasileiro; 7 A deficiência da punição dos psicopatas no sistema penal brasileiro; 8 Considerações finais; Referências 1 INTRODUÇÃO Quando nos deparamos com o termo psicopata, logo nosso pensamento nos remete a pessoas frias, cruéis. Porém, muito se en- gana quem assim pensa, como também se engana aquele que acha que um psicopata pode ser facilmente identificado. Ao contrário, pode se dizer que um psicopata é difícil de detectar, tendo em vista a capa- cidade deles se adaptarem a qualquer meio social para poder atrair suas vítimas. Essa capacidade de adaptação e atração de vítimas mostra que um psicopata não tem empatia para com suas vítimas, por essa razão são capazes de matar, ameaçar, roubar, enganar, dentre outras condutas. Para se responsabilizar um psicopata temos que levar em conta se durante a prática das condutas criminosas ele perde noção da realidade, não levando em conta somente o fato de não sentirem remorso, pois essa é uma característica própria deles. A partir do momento que se leva em conta que a pessoa é psi- copata e que ele é responsável pelos atos faz-se necessário entender qual o tratamento que o Estado dá ao psicopata analisando nosso ordenamento jurídico. Muitos dos pesquisadores nesse sentido ten- dem a entender que os psicopatas compreendem suas condutas cri- minosas, por isso devem ser submetidos a privação de liberdade. Por outro lado, há quem defenda que os psicopatas possuem transtornos mentais que os impossibilitam de entender as condutas criminosas as quais praticam, defendo que seja aplicada medida de segurança e dado o devido tratamento a eles. O presente trabalho vislumbra apresentar o psicopata como sen- do agente de conduta delituosa que compreende o que faz, que não demonstra arrependimento, mas que privá-lo de liberdade e colocá-lo com demais presos podem incentivá-los a prática de conduta crimino- sa bem como aplicar somente a medida de segurança não se torna eficaz, devendo os psicopatas serem submetidos a tratamento diferen- ciado e favorável para punição e ao mesmo tempo para recuperá-los. 2 O CONCEITO DE CRIME NO DIREITO PENAL A Lei de Introdução ao Código Penal, em seu artigo 1°, define crime como: Art 1º - Considera-se crime a infração penal que a lei comina pena de reclusão ou de detenção, quer isoladamente, quer alter- nativa ou cumulativamente com a pena de multa; contravenção, a infração penal a que a lei comina, isoladamente, pena de prisão simples ou de multa, ou ambas, alternativa ou cumulativamente. Para entender melhor a concepção de crime, embora seu con- ceito seja artificial, se faz necessária a explanação de três conceitos ou concepções de crime definidos pela doutrina. 2.1 Conceito Material O conceito material do crime, pode ser classificado como todo comportamento humano que lesa ou expõe a perigo de lesão bens jurídicos tutelados pelo direito Penal. Trata-se de conceito que busca traduzir a essência de crime. Pode se conceituar também como sendo a concepção da sociedade sobre o que pode e deve ser proibido, mediante a aplicação de sanção penal. 2.2 Conceito Formal Nesse conceito, o crime corresponde a violação da lei penal. Em outras palavras, corresponde a relação entre o fato e a norma penal incriminadora. É a concepção do direito acerca do delito, constituindo a conduta proibida por lei, sob ameaça de aplicação de pena, numa visão legislativa do fenômeno. 2.3 CONCEITO ANALíTICO É a concepção da ciência do direito, que não difere, na essência, do conceito formal. Na realidade, é o conceito formal fragmentado em elementos que melhor propiciam o entendimento da sua abrangência. Se for adotada a concepção bipartida defendida por damásio de Jesus, Julio Mirabete e Fernando Capez, crime é fato típico e an- tijurídico. Já se for adotada a concepção tripartida, defendida pela doutrina majoritária, crime é fato típico, antijurídico e culpável. 3 A CULPABILIDADE NO DIREITO BRASILEIRO A culpabilidade trata-se de pressuposto de aplicação da pena. Sendo assim, o agente não sendo culpável é absolutamente inviável a aplicação de pena. LETRAS JURÍDICAS | V. 3| N.2 | 2O SEMESTRE DE 2015 | ISSN 2358-2685 CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA126 Rogério Greco (2010, p.85) em sua obra “Curso de direito Pe- nal”3, entende que a culpabilidade diz respeito ao juízo de censura, ao juízo de reprovabilidade que se faz sobre a conduta típica e ilícita praticada pelo agente. Reprovável ou censurável é aquela conduta levada a efeito pelo agente, que nas condições em que se encontrava, podia agir de outro modo. 3.1 Elementos Que Integram a Culpabilidade Podemos citar como elementos da culpabilidade a imputabili- dade, a potencial consciência da ilicitude e a exigibilidade de conduta diversa. Os elementos são cumulativos, se um deles não estiver pre- sente não se poderá impor pena ao agente. 3.1.1 IMPUTABILIdAdE Entende-se por imputabilidade penal a capacidade que o agen- te possui de ser responsabilizado penalmente pelos seus atos. No campo do direito, há de saber se, no momento que ocorreu o crime o sujeito possuía condições de entender o caráter ilícito do fato para ser apontado como autor do crime e ser submetido a punição penal prevista em lei. Em sua obra, Manual de direito Penal, Guilherme de Souza Nuc- ci (2014, p.241) define a imputabilidade penal como sendo “conjunto das condições pessoais, envolvendo inteligência e vontade, que per- mite ao agente ter entendimento do caráter ilícito do fato, comportan- do-se de acordo com esse conhecimento”4. São causas de excludentes da imputabilidade: a inimputa- bilidade; a menoridade e a embriaguez completa, decorrente de caso fortuito ou força maior. A inimputabilidade encontra-se prevista no artigo 26 do Código Penal que dispõe: Art. 26 – É isento de pena o agente que, por doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado, era, ao tempo da ação ou da omissão, inteiramente capaz de en- tender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento. Vale ressaltar que não basta apenas que o agente possua doen- ça mental, é indispensável que, em razão dela, o agente no momento da ação ou omissão seja inteiramente incapaz de entender e querer o resultado do fato ilícito. A segunda causa excludente da imputabilidade é a menoridade, que tem previsão no artigo 27 do Código Penal, que assim se lê: Art. 27 – Os menores de 18 (dezoito) anos sãopenalmente inimputáveis, ficando sujeitos as normas estabelecidas na le- gislação especial. Sendo assim, o menor de 18 anos não pode ser penalmente punido. Ao redigir a lei, o legislador adotou o critério biológico, pois não há de se levar em consideração se o adolescente entendia ou não entendia o caráter ilícito do fato. Conforme destacado no artigo 27, os menores de 18 anos ficarão sujeitos a normas estabelecidas na legislação especial. Neste sentido, de acordo com o artigo 103 do Estatuto da Criança e do Adolescente, o adolescente que praticar crime ou contravenção penal terá cometido ato infracional a ser apurado pela Vara da Infância e da Juventude. A terceira causa de excludente da imputabilidade é a embria- guez completa, decorrente de caso fortuito ou força maior, menciona- da no artigo 28, parágrafo 1° do Código Penal, que traz em seu texto: Art. 28 – Não excluem a imputabilidade penal: (...) §1° - É isento de pena o agente que, por embriaguez com- pleta, proveniente de caso fortuito ou força maior, era, no tempo da ação ou omissão, inteiramente incapaz de enten- der o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento. Sendo assim, somente a embriaguez involuntária e completa retira a capacidade do agente de querer e entender, tornando-o inim- putável. Se a embriaguez for incompleta, o agente será penalmente responsabilizado, porém, como possibilidade de pena reduzida. Se o agente voluntariamente ingerir álcool, ainda que no mo- mento da infração não tenha capacidade de entendimento e deter- minação, será responsabilizado, pois, conforme dispõe o artigo 28 do CP, apenas se a embriaguez for involuntária e completa, o agente ficará isento de pena. 3.1.2 POTENCIAL CONSCIêNCIA dA ILICITUdE No direito Penal Brasileiro, a única causa excludente da poten- cial consciência da ilicitude é o erro de proibição, que possui previsão legal no artigo 21 do Código Penal que aponta: Art. 21 - O desconhecimento da lei é inescusável. O erro sobre a ilicitude do fato, se inevitável, isenta de pena; se evitável, poderá diminuí-la de um sexto a um terço. A depender das condições socioculturais do agente, poderá ele, de fato, desconhecer que sua conduta é errada, profana, contraria as regras usuais da sociedade. Nesse caso, se faltar potencial consciên- cia da ilicitude, o agente ficará isento de pena. 3.1.3 ExIGIBILIdAdE dE CONdUTA dIVERSA Podemos apontar duas situações em que é inexigível conduta diversa da praticada pelo agente, a saber: a coação moral irresistível e a obediência hierárquica a ordem não manifestamente ilegal. Ocorre a coação moral irresistível quando o agente (podendo ser um familiar ou alguém muito próximo) for vítima de coação moral irresistível não lhe sendo exigida conduta diversa da praticada. Já a obediência hierárquica a ordem não manifestamente ilegal, para ocorrer, é imprescindível a existência de uma relação de subor- dinação entre o superior hierárquico e o subordinado. Sendo assim, como espera deste certa obediência ao seu superior, se receber or- dem hierárquica e cumpri-la ficará isento de pena caso sua execução resulte na prática de um crime. 3.2 Semi-Imputabilidade A semi-imputabilidade ou responsabilidade diminuída é de- finida por Fernando Capez5 (2011, p.346) como: É a perda de parte da capacidade de entendimento e auto- determinação, em razão de doença mental ou de desenvolvi- mento incompleto ou retardado. Alcança os indivíduos em que as perturbações psíquicas tornam menor o poder de autode- terminação e mais fraca a resistência interior em relação à prá- tica do crime. Na verdade, o agente é imputável e responsável por ter alguma noção do que faz, mas sua responsabilidade é reduzida em virtude de ter agido com culpabilidade diminuída em consequência das suas condições pessoais. Em relação a consequência da semi-imputabilidade Capez ain- da dispõe: Não exclui a imputabilidade, de modo que o agente será conde- nado pelo fato típico e ilícito que cometeu. Constatada a redução na capacidade de compreensão ou vontade, o juiz terá duas op- ções: reduzir a pena de 1/3 a 2/3 ou impor medida de segurança (mesmo aí a sentença continuará sendo condenatória). LETRAS JURÍDICAS | V. 3| N.2 | 2O SEMESTRE DE 2015 | ISSN 2358-2685 CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA127 Portanto, a semi-imputabilidade não exclui a capacidade de en- tendimento, porém se for constatada redução na capacidade de com- preender a gravidade da conduta praticada ou na vontade do agente o juiz poderá reduzir a pena ou aplicar a medida de segurança. 4 SANÇÕES PENAIS Sanção é a consequência jurídica de uma conduta que viola o ordenamento jurídico, ou seja, é imposta quando há violação de uma norma penal incriminadora. O ordenamento jurídico brasileiro prevê somente duas formas de sanção penal: as penas e as medidas de segurança. 4.1 Pena Para Fernando Capez (2011, p.384) pena é conceituada como: sanção penal de caráter aflitivo, imposta pelo Estado, em exe- cução de uma sentença, ao culpado pela prática de uma in- fração penal, consistente na restrição ou privação de um bem jurídico, cuja finalidade é aplicar a retribuição punitiva ao de- linquente, promover a sua readaptação social e prevenir novas transgressões pela intimidação dirigida a coletividade. de acordo com o artigo 32 do Código Penal, as penas são di- vididas em penas privativas de liberdade, restritivas de direito e mul- ta. Sendo assim, as penas só serão aplicadas quando observados o juízo de reprovação, estando relacionada a culpabilidade. Quando não configurada a culpabilidade do agente, não haverá a aplicação da pena. 4.2 Medida de Segurança As medidas de segurança têm uma finalidade diversa da pena, pois se destinam ao tratamento ou cura do agente que praticou con- duta delituosa. O artigo 96 do Código penal assim dispõe sobre as medidas de segurança: Art. 96 As medidas de segurança são: I- internação em hospital de custodia e tratamento psiquiátrico ou, à falta, em outro estabelecimento adequado; II- sujeição a tratamento ambulatorial. Conforme disposto no artigo supracitado as normas de segu- rança podem iniciar-se em internação ou tratamento ambulatorial, por isso podem ser divididas em medidas de segurança detentivas (inter- nação) e restritivas (tratamento ambulatorial). Ainda neste sentido o artigo 97 do referido diploma legal aponta: Art. 97 Se o agente for inimputável, o juiz determinará sua internação (artigo 26). Se, todavia, o fato previsto como cri- me for punível com detenção, poderá o juiz submetê-lo a tratamento ambulatorial. Portanto, a medida de segurança a ser aplicada dependera do caso concreto, tendo finalidade exclusivamente preventiva, no sentido de evitar que o autor de uma infração penal que tenha demonstrado periculosidade volte a delinquir. 5 O CONCEITO E OS ASPECTOS DA PSICOPATIA A Associação Americana de Psiquiatria (American Psychiatric Association) atribuiu psicopatia como distúrbio da per- sonalidade sociopata ou reação antissocial, elencada e definida pelo Manual diagnóstico e Estatístico dos Transtornos Mentais (diagnostic and Statistical of Mental disorders – dSM), onde se lê: A expressão [personalidade antissocial] é reservada basi- camente para indivíduos que estão sem socializar, e cujos padrões de conduta lhes levam a contínuos conflitos com a sociedade. São incapazes de uma lealdade relevante com indivíduos, grupos e valores sociais. São extremamente egoís- tas, insensíveis, irresponsáveis, impulsivos e incapazes de se sentirem culpados e de aprender algo com a experiência do castigo. Seu nível de tolerância de frustrações é baixo. Incli- nam-se a culpar os outros ou a justificar de modo plausível sua própria conduta. Ainda neste sentido, segundo a Classificação Internacionalde doenças da Organização Mundial de Saúde, um diagnóstico clinico da psicopatia pode ser definido como sendo: Personalidade dissocial: transtorno de personalidade caracteri- zado por um desprezo das obrigações sociais, falta de empatia para com os outros. Há um desvio considerável entre o compor- tamento e as normas sociais estabelecidas. O comportamento não é facilmente modificado pelas experiências adversas, in- clusive pelas punições. Existe uma baixa tolerância à frustração e um baixo limiar de descarga da agressividade, inclusive da violência. Existe uma tendência a culpar os outros a fornecer racionalizações plausíveis para explicar um comportamento que leva o sujeito a entrar em conflito com a sociedade6 Há de se ressaltar que a psicopatia não se restringe apenas à esfera dos crimes contra integridade física de alguém, mas também se desenvolve no campo da criminalidade financeira, ou de ludibrio da fé pública para fins de um enriquecimento ilícito. Como dito anteriormente, muitas pessoas relacionam o indiví- duo psicopata como um criminoso de alta periculosidade, o qual você consegue identificar só pela aparência. Entretanto são indivíduos de difícil identificação, pois podem ser qualquer um que esteja em conví- vio social. Não se tratando apenas daquele autor de homicídios per- versos e cruéis aos olhos da sociedade. Podem ser classificados em níveis variados de gravidade: leve, moderado e grave. Os que se encaixam em leves, são aqueles que praticam pequenos golpes, enganando as pessoas, visando lucros financeiros. Já os moderados e graves, têm-se unida todas as carac- terísticas do leve acrescentando-se ainda métodos mais cruéis, estes, se necessário vão matar uma pessoa de forma brutal e perversa, bus- cando alcançar seus interesses. 5.1 Dos Perigos da Caracterização da Psicopatia Atualmente, há diversas discussões em torno do diagnóstico de um psicopata. Para caracterizar um psicopata, não se faz necessário apenas notar a presença de critérios expostos em escalas do tipo PCL-R (Hare Psychopathy Checklist Revisited) – como por exemplo, se o agente é esperto, sedutor, insensível, impulsivo ou se apresenta falta de empatia – uma vez que promoveria um julgamento morais que acabariam substituindo valorações de fatos por juízos de valo- res indemonstráveis, conforme narra Salo de Carvalho em sua obra “Mentes Perigosas na Academia: sobre plágios, responsabilidades, diagnósticos e estigmas”. Argumentos utilizados com base apenas em características lis- tadas como sendo próprias de um psicopata podem influenciar todo o processo, pois usar como prova da psicopatia apenas uma análise superficial do agente é querer tornar válida uma prova ilícita com pro- pósito de manipular todo o trâmite judicial, ofendendo os princípios da legalidade e da secularização do direito que constitui na separação entre direito e moral. Esse tipo de prova remete aos tempos do sistema penal inquisi- LETRAS JURÍDICAS | V. 3| N.2 | 2O SEMESTRE DE 2015 | ISSN 2358-2685 CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA128 tivo, onde para se comprovar um fato, utiliza-se de meios ardilosos e fraudulentos, nos fazendo regredir aos tempos dos primórdios, onde não existia contraditório e ampla defesa e sequer o princípio do devido processo legal. Nesse tipo de prova, esquece de levar em conta a história de vida do agente, substituindo a identidade deste pelo rótulo de “crimi- noso, perigoso”, assim o agente é anulado em sua essência e passa a ser encarado como sujeito do rótulo por ele recebido, não contribuin- do em nada para a sua devida recuperação. Não levar em conta as peculiaridades de cada um dos agentes infratores é uma negligencia que não deve ser aceitada, sendo ainda uma ofensa ao princípio norteador do direito Brasileiro que é a digni- dade da pessoa humana. Além disso, estudar as condições especiais do agente suspeito de ser psicopata é o mais importante ainda mais quando o objetivo de se aplicar a pena é a recuperação do infrator. 6 PSICOPATAS NO DIREITO PENAL BRASILEIRO No tocante a responsabilização do psicopata na esfera do di- reito Penal, há de mencionar que a capacidade de culpabilidade dos psicopatas ainda não é um tema pacificado. O Código Penal, não disciplina a matéria em específico, porém, deixa margens para sua interpretação e resolução. Atualmente, as Cortes estaduais têm condenado os agentes classificados como psicopatas, aplicando a estes o tratamento de se- mi-imputáveis, reduzindo a pena de acordo com o parágrafo único do artigo 26 do Código Penal, o que pode ser observado no seguinte jul- gado, onde o relator alega que sendo o agente semi-imputável devido a sua personalidade, não se aplica a medida de segurança. PENAL. PROCESSO PENAL. FURTO. MATERIALIDADE E AU- TORIA COMPROVADAS. SEMI-IMPUTABILIDADE. SENTENÇA CONDENATÓRIA. CONCURSO ENTRE AGRAVANTE DA REIN- CIDÊNCIA E ATENUANTE DA CONFISSÃO. PREPONDERÂN- CIA DA REINCIDÊNCIA. MEDIDA DE SEGURANÇA SUBSTI- TUTIVA COM PRAZO INDETERMINADO. IMPOSSIBILIDADE. SENTENÇA PARCIALMENTE REFORMADA. 1. A SEMI-IMPU- TABILIDADE É CAUSA DE DIMINUIÇÃO E NÃO DE ISENÇÃO DE PENA, PELO QUE DESCABE A SENTENÇA ABSOLUTÓRIA IMPRÓPRIA, RESTRITA TÃO SOMENTE AOS CASOS DE INIMPUTABILIDADE. 2. HAVENDO TRÊS CONDENAÇÕES PE- NAIS DEFINITIVAS ANTERIORES AO FATO EM JULGAMENTO, É VIÁVEL A EXASPERAÇÃO DA PENA-BASE EM RAZÃO DOS MAUS ANTECEDENTES E PERSONALIDADE DO AGENTE, E AINDA O AGRAVAMENTO NA SEGUNDA FASE PELA REINCI- DÊNCIA. 3. A AGRAVANTE DA REINCIDÊNCIA PREPONDERA SOBRE A ATENUANTE DA CONFISSÃO ESPONTÂNEA. 4. A MEDIDA DE SEGURANÇA SUBSTITUTIVA DE QUE CUIDA O ART. 98 DO CP TEM POR PRINCIPAL ESCOPO PROMOVER A SAÚDE DO CONDENADO POR MEIO DA ADOÇÃO DO TRA- TAMENTO DE SAÚDE ADEQUADO À CONDIÇÃO MENTAL DO RÉU, RAZÃO PELA QUAL A SUBSTITUIÇÃO NÃO SE LASTREIA EM JUÍZO DE PERICULOSIDADE DO AGENTE, NÃO PODEN- DO VIGORAR POR TEMPO INDETERMINADO. 5. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. (TJ-DF, Relator: JOÃO BATISTA TEIXEIRA, Data de Julgamento: 20/03/2014, 3ª Turma Criminal) No voto do relator ele expõe: “Sendo o agente inimputável (caput do art. 26 do CP), o juiz o absolve por intermédio de ato judicial denominado sentença ab- solutória imprópria, e determina sua internação ou submissão a tratamento ambulatorial. Contudo, o laudo de exame psiquiátri- co (fls. 252-254) concluiu ser o apelante semi-imputável, porque ele “tinha preservada sua capacidade de entendimento em re- lação ao caráter criminoso de sua conduta, mas reduzida capa- cidade de se autodeterminar em relação a esse entendimento” Portanto, os tribunais tendem a tratar os psicopatas como sendo semi- imputáveis, devido a capacidade de entendimento que possuem perante as práticas das condutas criminosas por eles praticadas. 7 A DEFICIÊNCIA DA PUNIÇÃO DOS PSICOPATAS NO SISTEMA PENAL BRASILEIRO Conforme já abordado, o artigo 26 em seu caput dispõe: Art. 26 – É isento de pena o agente que, por doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado, era, ao tem- po da ação ou da omissão, inteiramente capaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento. Sendo assim, somente pode ser considerado inimputável quem, por doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retarda- do não possuir, no momento da ação ou omissão, plena capacidade de entender o caráter ilícito de sua conduta ou determina-se de acor- do com esse entendimento. Para que fosse reconhecido a inimputabilidade, a psicopatia deveria ser tratada como doença mental ou de desenvolvimento men- tal incompleto ou retardado. E mesmo que verificado algum desses transtornos, ainda seria necessário analisar se no momento da ação ou omissão, esse transtorno que o agente possui seria suficiente para retirar deste a capacidade de entender e querer realizar a conduta. A partirentão, desta concepção legal de inimputabilidade, po- de-se construir um entendimento de que os psicopatas não se enqua- dram neste quesito, uma vez que a psicopatia não é considerada uma doença mental e sim como um distúrbio da personalidade sociopata ou reação antissocial ou ainda como detentores de déficits interpes- soais e afetivos que os impedem de interagir por longo prazo com outras pessoas conforme já explanado. Além do mais, pelo fato dos psicopatas serem incapazes de controlar os seus estímulos a pratica criminosa, não tendo a sua cul- pabilidade excluída, os doutrinadores acabam incluindo os psicopa- tas como sendo semi-imputáveis. Porém, colocar os psicopatas com outros presos, pode ser uma péssima ideia ao pensar na hipótese de que estes podem ser influen- ciados a praticar cada vez mais condutas delituosas, não se recupe- rando mais. Portanto, tratar o psicopata como imputável colocando junto com os demais sujeitos criminosos pode comprometer a paz e a ordem pública, já que estão sempre na iminência de influências e práticas delituosas. Neste sentido, os psicopatas deveriam ser tratados pelo estado de forma atenta e adequado, uma vez que é obrigação deste assistir e proteger a pessoa do psicopata, conforme julgado do Egrégio Tribu- nal de Justiça do distrito Federal, de número APC 20100110722117, que assim elucida: DIREITO CONSTITUCIONAL. INTERNAÇÃO COMPULSÓRIA DE PORTADOR DETRANSTORNO MENTAL DEVER DO ESTA- DO. I. O Decreto nº 24.559/1934, que dispõe sobre a assistên- cia e proteção à pessoa e aos bens dos psicopatas, toxicôma- nos etc,admite a internação desses enfermos por solicitação de seu cônjuge, genitor, filho ou parente até 4º, ou qualquer outro interessado. II. Os laudos médicos atestam que o réu é portador de doença mental e síndrome de dependência a LETRAS JURÍDICAS | V. 3| N.2 | 2O SEMESTRE DE 2015 | ISSN 2358-2685 CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA129 múltiplas drogas, sendo necessária a sua internação em clí- nica adequada ao seu quadro de saúde. III.Cabe ao Distrito Federal, por meio da rede pública de saúde, auxiliar todos aqueles que necessitam de tratamento, disponibilizando pro- fissionais, equipamentos, hospitais, materiais e remédios pres- critos, sendo dever do Estado colocar à disposição os meios necessários, mormente se para prolongar e qualificar a vida do paciente. IV. Deu-se provimento ao recurso. (TJ-DF - APC: 20100110722117 , Relator: JOSÉ DIVINO DE OLIVEIRA, Data de Julgamento: 22/07/2015, 6ª Turma Cível, Data de Publica- ção: Publicado no DJE : 04/08/2015 . Pág.: 296) Mesmo diante da obrigatoriedade de auxílio que o Estado deve prestar ao portador de psicopatia, ainda não se tem um tratamento adequado para eles, pois os métodos punitivos que temos atualmente vem se mostrando inócuos, pois deveriam levar em conta a situação particular de cada agente classificado como portador de psicopatia. Para solucionar o problema deveria haver a criação de prisões especificamente destinadas a psicopatas. Além do mais, essa prisão deveria receber uma atenção especial do governo, com auxílio médi- co e psicológico para um acompanhamento para que assim, possa realmente haver uma tentativa de ressocialização do agente. 8 CONSIDERAÇÕES FINAIS Por base do exposto no presente artigo, cumpre salientar que atu- almente não temos uma medida eficaz no tratamento aos psicopatas. Embora, sabemos que eles possuem plena capacidade de entendimen- to das condutas por eles praticadas, não pode alegar que por isso são passíveis de serem acolhidos em estabelecimento prisionais comuns. Os psicopatas precisam de atenção especial do governo, pois uma vez investidos em celas com demais presos pode ser considera- do um risco, uma vez com o poder de liderança que possuem, pode- riam certamente incitar a desordem e incentivar a pratica de condutas delituosas no estabelecimento prisional. Sabemos que entre suas características está a total ausência de aprendizado com a punição, razão pela qual a simples prisão não iria cumprir a sua finalidade de reeducação, ou seja, a prisão não vai recuperá-los e inseri-los novamente na sociedade de modo que estes não venham a cometer novos crimes, razão pela qual se faz necessário um tratamento diferenciado, com uma política criminal voltada aos psicopatas. REFERÊNCIAS CAPEZ, Fernando. Curso de Direito Penal, volume 1, parte geral. 15ª edição. São Paulo: Saraiva, 2011. GOMES, Luiz Flávio (Coord.). direito Penal: parte geral. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007. v. 2. GRECO, Rogério. Curso de Direito Penal. 12. ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2010. NUCCI, Gustavo Souza. Manual de Direito Penal. 10ed. Rio de Janeiro: Fo- rense, 2014 ZAFFARONI, Eugênio Raúl; PIERANGELI, José Henrique. Manual de direito pe- nal brasileiro: volume 1: parte geral 9. ed. rev. e atual. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011. Lei nº 2.848, de 07/12/1940. Código Penal brasileiro. Brasília, dF, Senado, 1940. disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto- lei/del2848com- pilado.htm> Acesso em 05/11/2015 Decreto-Lei nº 3.689, de 3 de outubro de 1941. Código de Processo Penal Brasileiro. Brasília, dF, Senado, 1941. disponível em:<http://www.planalto.gov. br/CCIVIL/decreto-Lei/del3689.htm>. Acesso em: 05/11/2015 AMBIEL, Rodolfo Augusto Matteo. 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