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Arlindo Ugulino Netto – NEUROANATOMIA – MEDICINA P3 – 2008.2 1 MED RESUMOS 2012 NETTO, Arlindo Ugulino. NEUROANATOMIA ANATOMIA MACROSCÓPICA DA MEDULA ESPINHAL E SEUS ENVOLTÓRIOS (Professor Stênio Abrantes Sarmento) Etimologicamente, o termo medula significa “miolo”, indicando “o que est dentro”. Da mesma forma, temos a medula ssea dentro dos ossos; medula suprarrenal, dentro da glndula do mesmo nome; e medula espinhal dentro do canal vertebral, canal formado entre o corpo e a lmina das v rtebras quando uma est posta sobre a outra. A medula espinhal, juntamente ao enc falo (conjunto do telenc falo, dienc falo, tronco enceflico e cerebelo), forma o sistema nervoso central ou neuroeixo. A medula espinhal uma massa cilndrica de tecido nervoso e que est situada dentro do canal vertebral sem, entretanto, ocup-lo completamente. No homem adulto, ela mede aproximadamente 45 centmetros, sendo um pouco menor na mulher. Cranialmente, a medula limita-se com o bulbo, aproximadamente em nvel do forame magno do osso occipital. O limite caudal da medula tem uma grande importncia clnica e, no adulto, situa-se ao geralmente ao nvel da 2 v rtebra lombar (L2). Nesse nvel, a medula termina afunilando- se para formar um cone, o cone medular, que continua com um delgado filamento menngeo, o filamento terminal. Depois desse cone medular, h apenas nervos espinhais de grande comprimento formando a cauda equina. OBS1: O limite superior da medula pode ser encontrado a partir do primeiro filamento radicular do primeiro nervo cervical (C1): acima desse filamento, tem-se o bulbo e abaixo, medula espinhal. Embriologicamente, a medula formada a partir da poro mais caudal do tubo neural, poro esta que no sofre as dilataes que formam as vesculas prosenceflicas, primrdios do enc falo. O tubo neural pode no se fechar completamente no desenvolvimento fetal (geralmente, por carncia de cido flico durante a gestao) e, uma vez que a ultima poro a se fechar a de baixo, gera o quadro conhecido comomielomeningocele, que discutiremos mais adiante. FORMA E ESTRUTURA GERAL DA MEDULA A medula apresenta forma aproximadamente cilndrica, sendo ligeiramente achatada no sentido ntero-posterior. Seu calibre no uniforme, pois apresenta duas dilataes denominadas intumescência cervical e intumescência lombar, situadas em nvel cervical e lombar, respectivamente. Essas intumescncias correspondem s reas em que as razes nervosas que formam os plexos braquial e lombossacral, destinadas a inervao dos membros superiores e inferiores, fazem conexo com a medula. A formao dessas intumescncias se deve maior quantidade de neurnios e, portanto, de fibras nervosas que entram ou saem destas reas e que so necessrias para a inervao dos membros superiores e inferiores. OBS2: Esta interpretao encontra apoio da anatomia comparada: o estudo dos canais vertebrais de dinossauros mostrou que estes animais, dotados de membros anteriores diminutos e membros posteriores gigantescos, praticamente no possuam intumescncia cervical, enquanto a intumescncia lombar competia com o tamanho do prprio enc falo. J um animal gigantesco como a baleia, mas com massas musculares igualmente distribudas ao longo do corpo, possui medula larga, mas sem dilataes locais. A superfcie da medula apresenta os seguintes sulcos longitudinais: sulco mediano posterior, fissura mediana anterior, sulco lateral anterior e sulco lateral posterior. Na medula cervical existe ainda o sulco intermédio posterior, localizado entre o sulco mediano posterior e o lateral posterior e que continua em um septo interm dio posterior no interior do funculo posterior (poro posterior da medula). Nos sulcos lateral anterior e lateral posterior fazem conexo, respectivamente, as razes ventrais e dorsais dos nervos espinhais. MORFOLOGIA MEDULAR EM SECÇÃO TRANSVERSAL Na medula, a substncia cinzenta localiza-se por dentro da branca e apresenta a forma de uma borboleta (mais semelhante com as da famlia Papilionidae) ou de um H. Nela, distinguimos de cada lado trs colunas que aparecem nos cortes como cornos e que so as colunas anterior, posterior e lateral (esta existente apenas na medula torcica e parte da alta da medula lombar, por estar relacionada com inervao visceral simptica). Arlindo Ugulino Netto – NEUROANATOMIA – MEDICINA P3 – 2008.2 2 A substância branca é formada por fibras, a maioria mielinizada, que sobem e descem na medula e que podem ser agrupadas de cada lado em três funículos ou cordões medulares: Funículo anterior: situado entre a fissura mediana anterior e o sulco lateral anterior. Funículo lateral: situado entre os sulcos lateral anterior e lateral posterior. Funículo posterior: situado entre o sulco lateral posterior e o sulco mediano posterior, este ultimo ligado à substância cinzenta pelo septo mediano posterior. Apenas na parte cervical da medula, o funículo posterior é dividido pelo sulco intermédio posterior em dois fascículos: o fascículo grácil e fascículo cuneiforme, regiões por onde passarão tratos de mesmo nome que carregam estímulos nervosos (relacionados à propriocepção consciente, tato discriminativo ou epicrítico, sensibilidade vibratória e estereognosia) a núcleos no bulbo (núcleos grácil e cuneiforme) e destes, ao tálamo, onde serão interpretados. CONEXES COM OS NERVOS ESPINHAIS (SEGMENTOS MEDULARES) Nos sulcos lateral anterior e lateral posterior, existem as conexões de pequenos filamentos radiculares, que se unem para formar, respectivamente, as raízes ventral e dorsal dos nervos espinhais. As duas, por sua vez, se unem para formar os nervos espinhais propriamente ditos. É a partir dessa conexão com os nervos espinhais que a medula é dividida em segmentos. Estes nervos são importantes, pois, por conectar o SNC à periferia do corpo. Os nervos espinhais são assim chamados por se relacionarem com a medula espinhal, estabelecendo uma ponte de conexão SNC-SNP. Existem 31 pares de nervos espinhais aos quais correspondem 31 segmentos medulares assim distribuídos: 8 cervicais (existem oito nervos cervicais, mas apenas sete vértebras, pois o primeiro par cervical se origina entre a 1ª vértebra cervical e o osso occipital), 12 torácicos, 5 lombares, 5 sacrais e 1 coccígeo. OBS3: Na realidade, são 33 pares de Nn. Espinhais se forem considerados os dois pares de nervos coccígeos vestigiais, justapostos ao filamento terminal da medula. A medula de um adulto tem aproximadamente 45 cm de comprimento. Sabe-se que pela topografia vertebromedular, a medula não ocupa toda a extensão do canal vertebral, sendo explicada pelo desenvolvimento embrionário das vértebras em relação á medula. Até o 4º mês de vida embrionária, o crescimento medular se faz concomitantemente com o crescimento vertebral. Porém, ao avançar dos meses, pode-se perceber que o crescimento das vértebras é mais avançado do que a medula, explicando o porquê que a medula não ocupa toda a extensão do canal vertebral. Anatomicamente, sabe-se que os nervos espinhais são formados entre os forames intervertebrais das vértebras. Como consequência deste crescimento desproporcional entre medula e vértebra, ocorre a formação da cauda equina, em que filamentos nervosos formados em segmentos mais caudais da medula descem para alcançar os seus respectivos forames intervertebrais e, assim, formar os nervos espinhais baixos. A formação da cauda equina se dá no momento em que as últimas grossas raízes dos nervos espinhais lombossacrais são arrastadas pelo rápido desenvolvimento longitudinal das vértebras e da coluna como um todo. Devido aos diferentes comprimentos do canal vertebral e da medula, os únicos segmentos medulares que são adjacentes aos respectivos corpos vertebrais são os da região cervical. Abaixo desse nível, as vértebras deixamda manter uma relação exata com seus respectivos segmentos medulares e suas raízes nervosas espinhais, que seguem cursos descendentes, progressivamente obliquo, até atingir seus respectivos forames intervertebrais. Este fato é mais acentuado na porção caudal da medula (onde há a formação da cauda equina). Exemplificando tal desproporção, uma fratura na vértebra T12 poderia levar a um comprometimento da medula lombar, e não de segmentos torácicos, como era de se imaginar. Arlindo Ugulino Netto – NEUROANATOMIA – MEDICINA P3 – 2008.2 3 Devido a esta discrepncia entre v rtebra e segmento medular, devemos tomar nota da seguinte regra: entre os nveis das v rtebras C2 e T10, adiciona-se 2 ao nmero do processo espinhoso da v rtebra e tem-se o segmento medular subjacente (assim, o processo espinhoso da v rtebra C2 est sobre o segmento medular C4 e o da v rtebra T10 est sobre T12). Os processos espinhosos de T11 e T12 correspondem aos cinco segmentos lombares, e o processo espinhoso de L1 corresponde aos cinco segmentos sacrais. Desta forma, em resumo, temos: Processo espinhoso de C2 a T10 – Segmentos C4 a T12 Processos espinhosos de T11 e T12 – Segmentos L1 a L5 Processo espinhoso de L1 – Segmentos S1 a S5 V rtebras L2 a L5 – Cauda equina. Cortes transversais de determinadas regies da medula apresentaro caractersticas diferentes. Ao nvel cervical, a substncia branca circundante da cinzenta mais escura, al m do fato de que o corno anterior e posterior da substncia cinzenta bem mais proeminente que em outras regies (exceto a lombar), devido ao fato da presena do plexo braquial. O mesmo vale para a regio lombar, em que os cornos anterior e posterior so mais robustos, mas a substncia branca aparece em menor quantidade do que em nveis mais altos. Na coluna torcica, al m do afinamento do corno posterior e corno anterior, h o aparecimento marcante do corno lateral (relacionado com o sistema nervoso autnomo simptico: inervao de vsceras torcicas e abdominais). Al m disso, nota-se um aumento gradativo da substncia branca medular com relao cinzenta na medida em que observamos cortes cada vez mais altos da medula. Isso acontece devido maior presena de fibras brancas na poro mais alta da medula. Considerando que, no primeiro segmento cervical, por exemplo, todas as fibras nervosas que vo para o enc falo ou que descem para seus rgos-alvo, justifica o fato de haver mais substncia branca do que cinzenta em tal corte. De modo contrrio, em cortes lombares mais baixos, observamos mais substncia cinzenta do que branca, uma vez que quase todas as fibras descendentes j tomaram seu rumo e as fibras ascendentes ainda nem entraram na medula. ENVOLTRIOS DA MEDULA Assim como todo o SNC, a medula envolvida por membranas fibrosas conhecidas como meninges. Sendo trs, os envoltrios da medula, de fora para dentro, so: dura-máter (que corresponde paquimeninge, sendo ela a mais espessa e a mais externa), aracnoide e pia-máter (essas duas ltimas denominadas, em conjunto, de leptomeninge). A dura-mter tem uma rigidez caracterstica devido espessura que lhe conferida pela abundancia de fibras colgenas encontradas quando realizada cortes histolgicos. Uma particularidade da paquimeninge que esta termina em nvel de S2, de modo que envolve a medula espinhal como se fosse um dedo na luva, o que leva formao do chamado saco dural. OBS4: Os prolongamentos laterais da prpria dura-mter formam o epineuro dos nervos espinhais. A aracnoide-mter se dispe entre a dura-mter e a pia-mter. Compreende um folheto justaposto dura-mter e um emaranhado de trab culas, as trabéculas aracnóideas, que une este folheto pia-mter. J a pia-mter a meninge mais delicada e mais interna. Ela adere intimamente ao tecido nervoso da superfcie da membrana e penetra na fissura mediana anterior. Quando a medula termina no cone medular, a pia-mter continua caudalmente, formando um filamento esbranquiado denominado filamento terminal, que perfura o fundo do saco dural e continua at o hiato sacral. Ao atravessar o saco dural, o filamento terminal recebe vrios prolongamentos da dura-mter e o conjunto passa a ser denominado filamento terminal da dura-máter espinhal. Este, ao inserir-se no peristeo da superfcie dorsal do cccix, constitui o ligamento coccígeo. Da pia-mter surgem processos triangulares que, em conjunto, formam duas pregas longitudinais denominadas ligamentos denticulados, que se dispem bilateralmente em um plano frontal ao longo de toda a medula. Desta forma, o ligamento coccgeo e os ligamentos denticulados constituem os meios de fixao da medula, que tm a finalidade de limitar o deslocamento dessa estrutura no seu repouso subaracnideo. Com relao s meninges que envolvem a medula, existem trs cavidades ou espaos: epidural (ou extradural, entre a dura- mter e o peristeo do canal vertebral), subdural (espao praticamente virtual entre a dura-mter e a aracnide, onde corre uma pequena quantidade de lquor) e subaracnódeo (espao maior entre a aracnide e a pia-mter, onde escorre uma quantidade razoavelmente grande de líquido cérebro-espinhal ou líquor). Este ltimo espao est comunicado com o 4 ventrculo (no tronco enceflico) por meio da abertura mediana e de duas aberturas laterais do 4 ventrculo. OBS5: A explorao clnica do espao subaracnideo em nvel da medula facilitada por certas particularidades anatmicas da dura- mter e da aracnide na regio lombar da coluna vertebral. Sabe-se que o saco dural e a aracnide que o acompanha termina em S2, Arlindo Ugulino Netto – NEUROANATOMIA – MEDICINA P3 – 2008.2 4 enquanto a medula termina mais acima, em L2. Entre estes dois níveis, o espaço subaracnóideo é maior, contém maior quantidade de líquor e nele se encontram apenas o filamento terminal e as raízes que formam a cauda equina. Não havendo perigo de lesão da medula, esta área é ideal para a introdução de uma agulha no espaço subaracnóideo, o que é feito nas seguintes finalidades: Retirada de líquor para fins terapêuticos ou diagnósticos de punções lombares (ou raquidianas) Medida da pressão do líquor Introdução de substâncias que aumentam o contraste das radiografias, como ar, hélio e sais de iodo Introdução de anestésicos nas chamadas anestesias raquidianas OBS6: A introdução de anestésicos no espaço meníngeo da medula de modo a bloquear as raízes nervosas que os atravessam constitui um procedimento de rotina na pratica medica, especialmente em cirurgias das extremidades inferiores, da cavidade pélvica e em algumas cirurgias abdominais. Anestesias raquidianas: o anestésico é introduzido no espaço subaracnóideo por meio de uma agulha que penetra no espaço entre as vértebras L2-L3, L3-L4 ou L4-L5. No seu trajeto, a agulha perfura sucessivamente a pele e a tela celular subcutânea, o ligamento interespinhal, o ligamento amarelo (primeira resistência), a dura-máter e a aracnóide (segunda resistência). Certifica-se de que a agulha realmente atingiu o espaço subaracnóideo pela presença de líquor que goteja de sua extremidade. É comum o paciente relatar dores de cabeça (cefaléia) no pós-operatório com raquianestesia. Esta é explicada pelo fato de que, ao perfurar a dura-máter, cria-se um canal de saída que leva a formação de um gradiente de pressão, que por sua vez leva à saída do líquor (mesmo que seja em mínima quantidade). Isto desencadeia a dor de cabeça no momento em que o líquor puxa junto de si estruturas superiores a favor da gravidade, no momento em que tende a sair pelo canal de acesso da anestesia. O paciente relata o desaparecimento da dor quando se deita, diminuindo o efeito da gravidade sobre as estruturas cranianas. Anestesias epidurais (ou peridurais): são feitas geralmente na região lombar, introduzindo-se o anestésico noespaço epidural, onde ele se difunde e atinge os forames intervertebrais, pelos quais passam as raízes dos nervos espinhais. Certifica-se de que a ponta da agulha atingiu o espaço epidural quando se observa uma súbita baixa de resistência, indicando que ela acabou de perfurar o ligamento amarelo. CORRELAES CLNICAS Mielomeningocele: é uma das lesões congênitas mais comuns da medula espinhal. É causada pelo fechamento incompleto do canal vertebral. Quando isso acontece, o tecido nervoso é induzido a sair por este orifício, formando uma protuberância mole, na qual a medula espinhal fica sem proteção (espinha bífida). Embora possa ocorrer em qualquer nível da coluna vertebral, é mais comum na região lombossacral. A exposição da medula espinhal causada pela espinha bífida resulta em deficiências neurológicas, com distúrbios sensitivos e ortopédicos (malformações ósseas), geralmente nos membros inferiores. A falta de controle das funções intestinal e urinária e a hidrocefalia estão presentes em 80% dos casos de mielomeningocele. A criança com mielomeningocele pode apresentar graus variáveis de paralisia e ausência de sensibilidade abaixo do nível da lesão medular, com preservação da parte superior do abdome, tórax e membros superiores. Torna-se importante a assistência precoce em reabilitação para prevenção das deformidades ortopédicas: pé torto, deslocamento do quadril, diminuição das amplitudes articulares, deformidades no tronco (cifoscoliose), etc. O tratamento da hidrocefalia é uma emergência neurocirúrgica e inclui a monitorização das cavidades cerebrais (ventrículos) através de ultrassom, tomografia ou ressonância magnética e a derivação ventricular. Uma das condutas iniciais para um recém-nascido com mielomeningocele é o fechamento cirúrgico da lesão com pele. A avaliação da hidrocefalia é uma emergência na assistência ao recém-nascido.
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