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Teoria do Ordenamento Jurídico

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1 de 13 
 
 
 
 
 
 
 
Por Carlos Xavier 
para Direito sem Juridiquês 
Assista à playlist clicando aqui 
 
 
 
 
 
 
Introdução. Do estudo da norma jurídica ao estudo do ordenamento 
jurídico 
Já estudamos a teoria da norma jurídica. 
A construção de uma teoria do ordenamento jurídico decorre da constatação – que 
é, mesmo, meramente intuitiva – de que as normas jurídicas não existem de forma isolada. 
A aplicação de uma determinada norma jurídica depende da consideração de uma série de 
outras normas. Nenhuma norma jurídica pode ser aplicada de forma simplesmente isolada. 
Isso significa que as normas jurídicas compõem um sistema normativo. Exatamente 
esse sistema é que é chamado de “ordenamento jurídico” – ou, simplesmente, “ordem 
jurídica”. 
O estudo do ordenamento jurídico, assim, é o estudo desse sistema complexo 
composto pelas normas jurídicas. 
A teoria do ordenamento jurídico abrange, basicamente, o estudo de quatro 
grandes temas: as fontes do Direito; a construção escalonada do ordenamento jurídico; a 
coerência do ordenamento jurídico; e, por fim, a completude do ordenamento jurídico. 
 
 
 
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2. Fontes do Direito 
A ideia de fonte do Direito pode ser comparada à da fonte de um rio: trata-se de 
onde surge, de onde brota o Direito. 
 
2.1 Fontes materiais e fontes formais 
Neste assunto, contudo, é necessário distinguir entre fontes materiais do Direito e 
fontes formais do Direito. As primeiras (fontes materiais) do Direito equivalem à “matéria-
prima” do Direito (o substrato social que se torna objeto das normas jurídicas). As fontes 
materiais do Direito, assim, são as relações sociais. Nesse sentido, o costume de uma 
sociedade (mesmo na tradição de civil law) sempre será considerado fonte material do 
Direito – desde que, obviamente, este costume tenha sido incorporado pela lei. Uma vez 
transformada em lei em sentido formal, a conduta é observada de forma impositiva por 
constar da lei. No entanto, a origem desta lei impositiva (aquilo que fez com que o Estado 
editasse a lei) pode ser encontrada no costume do povo. 
As fontes formais do Direito, por sua vez, especialmente na perspectiva da tradição 
de civil law (influenciada pelo Positivismo Jurídico), são identificadas nos atos normativos 
editados pelo Estado. Em outras palavras, naquilo que chamamos de lei em sentido 
material. 
Há, na tradição de civil law, uma discussão histórica acerca da possibilidade de 
considerar-se a jurisprudência como fonte formal do Direito. Por trás dessa controvérsia 
estão as ideologias estática e dinâmica da interpretação. A ideologia estática compreende 
que o juiz não cria o Direito, apenas declara o sentido que já existia de forma subjacente ao 
texto legal. A ideologia dinâmica propõe que se faça diferença entre texto legislativo e 
norma jurídica, esta última resultado da atividade do intérprete (admitindo-se, assim, que 
os juízes contribuem com o legislador para a criação do Direito). Ultimamente, tem 
prevalecido a ideologia dinâmica, devendo, no mínimo, considerar-se um pensamento 
antiquado aquele que não consegue identificar as decisões judicias como fontes formais do 
Direito. 
Mais recentemente, inclusive, os próprios ordenamentos normativos da tradição de 
civil law têm, de alguma forma, acolhido a força obrigatória de determinadas decisões 
 
 
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judiciais (aproximando-se, assim, do stare decisis anglo-americano). No Brasil, é o caso dos 
recursos especiais repetitivos e do regime da repercussão geral no recurso extraordinário 
(que também dispõe de uma técnica de julgamento de casos repetitivos), situações 
disciplinadas pelos artigos 1.035 a 1.040 do Novo CPC. 
 
2.2 A lei enquanto fonte do Direito. Lei em sentido material e lei em 
sentido formal 
Nem tudo aquilo que chamamos de lei, no entanto, constitui fonte formal do Direito. 
Há, por outro lado, outros atos normativos que não chamamos de lei (porque editados 
pelo Poder Executivo), mas que consubstanciam, juntamente com a lei, fonte formal do 
Direito. 
As ideias apresentadas no parágrafo anterior pressupõem a distinção entre lei em 
sentido em sentido formal e lei em sentido material. Aqui, a utilização da mesma 
terminologia (formal e material) pode causar alguma confusão. Mas, atenção: apenas a lei 
em sentido material é considerada fonte formal do Direito. 
Devemos compreender, portanto, a diferença entre lei em sentido material e lei em 
sentido formal. 
Lei em sentido formal é o nome dado a diversas espécies de atos aprovados pelo 
Poder Legislativo. O critério para a identificação de uma lei em sentido formal, portanto, é 
subjetivo, dizendo respeito ao órgão que emite o ato. 
No entanto, lei em sentido material é, necessariamente, dotada dos atributos da 
generalidade e da abstração. Ou seja, são enunciados linguísticos abstratos (dizem respeito 
a uma tese) e genéricos (não são voltados a nenhuma situação concreta específica). Nessa 
perspectiva, há diversos atos aprovados pelo Poder Legislativo que levam o nome de “lei” 
mas que, por não serem dotados dos requisitos de generalidade e abstração não podem 
ser considerados lei em sentido material. O exemplo mais típico é a lei que estabelece ou 
modifica o nome de uma rua. Ela se volta a uma rua específica (e não a todas as ruas). Por 
isso, é chamada de lei de efeito concreto. A lei de efeito concreto, portanto, é apenas lei em 
sentido formal, mas não é lei em sentido material. 
Por outro lado, há diversos atos que, embora não editados pelo Poder Legislativo, 
são dotados dos atributos de generalidade e abstração. Trata-se dos chamados atos 
 
 
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administrativos normativos, editados pelo Poder Executivo, dentre os quais o mais 
conhecido é o decreto (há muitos outros, como resoluções, portarias, etc.; agrupemos, 
para o nosso estudo, todos esses sob o nome de regulamentos – o estudo detalhado de 
cada uma destas figuras é matéria da disciplina de Direito Administrativo). Quando o ato 
administrativo é dotado dos requisitos de generalidade e abstração, ele constitui, também, 
lei em sentido material. Há, evidentemente, muitos atos administrativos de caráter 
concreto (que não constituem lei em sentido material, portanto). Mas, sempre que um 
regulamento for editado pelo Poder Executivo com os atributos da generalidade e 
abstração, este será uma lei em sentido formal. 
Diz-se que os regulamentos devem ser editados (como o próprio nome, aliás, já 
indica) para regulamentar a lei (em sentido formal). O legislador estabelece normas mais 
gerais, que muitas vezes dependem de atividade do Poder Executivo para serem 
plenamente aplicadas. Quanto um regulamento extrapola os limites daquilo que lhe cabia 
disciplinar, diz-se deste regulamento que ele é dotado do vício (defeito) de ilegalidade 
(sendo, por isso, nulo). Por outro lado, se um regulamento é editado para disciplinar 
determinada situação que não tenha sido, previamente, objeto de lei, então o vício será, 
propriamente, de inconstitucionalidade (porque o regulamento está, indevidamente, 
fazendo as vezes de lei, e isso não fere uma determinada lei, mas fere a própria 
Constituição). 
Embora esta afirmação não seja encontrada na doutrina tradicional, é possível 
compreender que a jurisprudência em geral, e o precedente em especial, constituem “lei 
em sentido material”, a partir de uma compreensão do ordenamento jurídico informada 
pela ideologia dinâmica da interpretação. 
 
2.1 Princípio geral de legalidade (artigo 5º, II, da CRFB) e lei em 
sentido material 
Já vimos o chamado princípio geral de legalidade ao aludirmos que tudo aquilo que 
não éproibido é permitido. A Constituição, em seu artigo 5º, II, expressa isso em outros 
termos, afirmando que “ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer coisa alguma 
senão em virtude de lei”. 
 
 
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Entende-se que esse dispositivo faz alusão à lei em sentido material. Ou seja, não 
trata apenas de lei em sentido formal, mas compreende também os atos normativos que já 
nomeamos de regulamentos, expedidos pelo Poder Executivo. De forma mais ampla, como 
está propondo a presente apostila, poder-se-ia compreender na ideia de lei em sentido 
material de que trata o inciso II do artigo 5º da Constituição a jurisprudência e, 
especialmente, os precedentes, notadamente aqueles aos quais a legislação processual 
vem conferindo carga de eficácia vinculante (recursos especiais repetitivos e recursos 
extraordinários com repercussão geral). 
 
2.2 Princípio da legalidade estrita (ou de reserva de lei) e lei em 
sentido formal 
Já vimos que há um princípio geral de legalidade, que condiciona a inovação na 
ordem jurídica (criação, modificação ou extinção de direitos em geral) à lei em sentido 
material. 
Contudo, existem certas matérias a respeito das quais, por sua sensibilidade, 
apenas pode haver inovação na ordem jurídica por meio de lei em sentido formal. A isso se 
chama de princípio da legalidade estrita, ou, ainda, de princípio da reserva de lei. Reserva 
de lei porque apenas a lei em sentido formal é que, nessas matérias mais sensíveis, pode 
alterar a ordem jurídica. 
Exemplos de matérias que estão sob reserva de lei são o Direito Penal (artigo 5º, 
XXXIX, da CRFB) e, de maneira geral, o Direito Tributário (artigo 150, I, da CRFB). 
Há, ainda, o que se chama de reserva de lei complementar. A lei complementar é 
uma espécie normativa que tem quórum de aprovação qualificado, equivalente à maioria 
absoluta dos membros do Congresso Nacional (as leis ordinárias, ao contrário, são 
aprovadas por maioria simples). Exemplos de matérias que estão sob reserva de lei 
complementar são criação, incorporação, subdivisão e desmembramento de Estados 
(artigo 18, § 3º, da CRFB), criação de regiões metropolitanas nos Estados (artigo 25, § 1º, 
da CRFB), a perda de cargo de servidor público estável mediante procedimento de 
avaliação periódica (artigo 41, § 1º, III, da CRFB), o Estatuto da Magistratura (artigo 93, 
caput, da CRFB), entre outras. 
 
 
 
 6 de 13 
 
2.3 As chamadas “fontes subsidiárias do Direito”. Uma breve análise 
do artigo 4º do Decreto Lei 4.657/1942 (“Lei de Introdução às Normas 
do Direito Brasileiro”, ou a antiga “Lei de Introdução ao Código 
Civil” – LICC) 
Na concepção cultural histórica de civil law, a lei era compreendida como fonte 
primária e principal do Direito. Espera-se que já se tenha deixado claro que, a partir da 
evolução da sociedade e da incorporação da ideologia dinâmica da interpretação, é 
possível encontrar também na decisão judicial fonte do Direito. 
Sob aquela perspectiva de supremacia da lei, no entanto, havia a necessidade de 
considerarem-se as chamadas “fontes subsidiárias” do Direito. Quer dizer, era necessário 
saber onde seria encontrado o Direito, caso não houvesse uma lei que, expressamente, 
disciplinasse a situação concreta. 
No Brasil, a questão é tratada pelo artigo 4º da “Lei de Introdução ao Código Civil”, 
ou LICC (hoje denominada como “Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro”): 1 
 
Art. 4º Quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, 
os costumes e os princípios gerais de direito. 
 
Como a regra em questão é bastante antiga (datando de 1942), ela deve ser, hoje, 
compreendida em perspectiva crítica. 
Inicialmente, esclareça-se que “analogia” nunca foi, e nunca vai ser, fonte do 
Direito. É, apenas, uma técnica de interpretação, utilizada exatamente na ausência de lei 
específica que discipline o caso concreto sob apreciação. Na falta de lei específica, utiliza-se 
uma lei que trate de situação análoga (similar) para a apreciação do problema. Exemplo de 
utilização de analogia pode ser encontrado na questão do direito de greve dos servidores 
públicos. Uma vez que o Congresso Nacional, passadas já duas décadas e meia da 
aprovação da Constituição, ainda não editou lei para disciplina do direito de greve do 
servidor público, o Supremo Tribunal Federal entende que se deve aplicar à situação, no 
que couber, a lei geral de greve (Lei 7.783/1989). 
 
1
 Jesuitismo à parte, manter-se-á, nas linhas que seguem, a abreviação LICC, por ser a forma mais 
simples de fazer referência à hoje chamada “Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro”. 
 
 
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Os “princípios gerais do direito” na acepção que prevalecia na época da edição da 
LICC, eram tidos apenas como fontes subsidiárias do Direito. Contudo, já vimos o impacto 
que o Estado Constitucional causou sobre a consideração dos princípios. Estes hoje são 
compreendidos como verdadeiras normas jurídicas impositivas, de maneira que não faz 
mais sentido falar nos princípios como mera fonte subsidiária do Direito (até mesmo 
porque uma lei pode deixar de ser aplicada se contrariar um princípio). 
Resta-nos apenas analisar, portanto, o “costume.” Já vimos que o costume é fonte 
material do Direito (porque é das relações sociais de onde o Direito vai tirar a sua matéria 
prima). No entanto, no aspecto formal, o costume é considerado apenas como fonte 
subsidiária do Direito em nossa tradição. Isso quer dizer que ele somente vai ser aplicado 
quando não houver lei que discipline a questão. E, mais do que isso, que o costume não 
pode ser aplicado contra a lei (o que se chama de costume contra legem). 
Exemplo de costume contra legem é o chamado “cheque pré-datado” (embora ele 
seja, mais precisamente, pós-datado). Como a lei diz que o cheque é “ordem de 
pagamento à vista,” o comerciante não pode ser compelido a descontá-lo na data 
acertada, podendo, se quiser, descontá-lo imediatamente. Ou seja, não há proteção 
jurídica nenhuma à prática de comprar com cheque pré-datado; tudo se passa no âmbito 
de uma relação de confiança entre comprador e vendedor. 
 
3 Construção escalonada do ordenamento jurídico 
O estudo do que chamamos de “construção escalonada do ordenamento jurídico” 
vai nos indicar que o Direito é um sistema hierárquico de normas jurídicas. Isso significa 
que as normas inferiores retiram o seu fundamento de validade das normas superiores, 
iniciando-se na Constituição, passando pela legislação infraconstitucional e pelos 
regulamentos, até que se chegue à sentença judicial e ao contrato, estes dois últimos 
chamados, por Kelsen, de “normas individuais” (eram normas individuais, para Kelsen, não 
por terem caráter de generalidade e de abstração, mas por serem, para as partes do 
processo ou para os sujeitos da relação contratual, tão obrigatórias quanto a lei). 
A partir de uma consideração da ideologia dinâmica da interpretação e do 
reconhecimento de um sistema de precedentes obrigatórios como uma necessidade 
inerente à operação racional e igualitária do sistema de distribuição de justiça, poderíamos, 
 
 
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no entanto, compreender certas decisões judiciais não mais como apenas a regra do caso 
concreto, mas ocupando verdadeiro caráter de lei em sentido material dentro deste 
sistema hierárquico de normas. 
Demais disso, embora a construção escalonada do ordenamento jurídico seja um 
típico fruto do positivismo jurídico, a superveniência do Constitucionalismo, e mesmo do 
Neoconstitucionalismo, não é suficiente para que se abandone essa forma de compreender 
o Direito. 
Isso porque a existênciade direitos fundamentais que permitem o controle do 
conteúdo da lei é, exatamente, assentada sob uma noção de prevalência hierárquica. De 
maneira que a compreensão do Direito como um sistema hierárquico de normas 
(construção escalonada do ordenamento jurídico) serve muito bem à operação do Estado 
Constitucional. 
Já o Neoconstitucionalismo irá possibilitar a aplicação direta de determinadas 
normas constitucionais a situações concretas, o que também não é, necessariamente, 
incompatível com o tema ora estudado. 
 
3.1 A norma fundamental kelseniana 
O estudo deste tema indica, ainda, a consideração da norma fundamental, 
demonstrada por Kelsen. 
Se o Direito é um sistema hierárquico de normas, e se uma norma jurídica retira o 
seu fundamento de uma norma que lhe é superior, resta, então, a pergunta: qual norma dá 
fundamento de validade à própria Constituição? 
Segundo Kelsen, a Constituição retira o seu fundamento de validade da norma 
fundamental, que é pressuposta, e tem o seguinte conteúdo: “obedeça à Constituição”. 
Trata-se de uma construção necessária para conferir coerência científica à teoria da 
construção escalonada do ordenamento jurídico, embora ninguém jamais tenha visto a 
norma fundamental escrita em lugar nenhum (a não ser, é claro, nos livros do próprio 
Kelsen)... 
De todo modo, a demonstração da norma fundamental coloca em evidência as 
bases contratualistas sobre as quais o positivismo jurídico é constituído. 
 
 
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Vale o alerta (atenção!): a Constituição, para Kelsen, não é a norma fundamental. A 
norma fundamental é pressuposta, e o seu conteúdo é “obedeça à Constituição”. 
 
4 Coerência do ordenamento jurídico. Estudo dos critérios para 
supressão de antinomias 
O Direito não é apenas um sistema hierárquico de normas, mas é também (segundo 
afirma a teoria do ordenamento jurídico) um sistema coerente. Por isso, quando se supõe 
que duas normas estejam em conflito, diz-se que este é um “conflito aparente” (aparente 
porque ele, em verdade, não existe; há um critério já estabelecido para resolvê-lo). 
Essa situação de “conflito aparente de normas” é tecnicamente chamada, também, 
de antinomia. O estudo da coerência do ordenamento jurídico, assim, é o estudo dos 
critérios para supressão de antinomias. Há, registra-se desde já, três critérios básicos: o 
hierárquico, o temporal e o da especialidade. 
 
4.1 Critério hierárquico 
Segundo o critério hierárquico, a norma superior prevalece sobre a norma inferior. 
Este critério tem conexão direta com a ideia de construção escalonada do ordenamento 
jurídico, recentemente estudada. 
Diz-se, assim, que a Constituição prevalece sobre uma lei infraconstitucional que lhe 
seja contraria (reconhecendo-se a inconstitucionalidade da lei) e que um decreto é nulo 
por contrariar a lei que deveria regulamentar (o que se chama de ilegalidade do decreto) 
em razão do critério hierárquico de supressão de antinomias. 
 
4.2 Critério temporal 
O critério temporal de supressão de antinomias, em sua expressão mais simples, 
nos informa que lei posterior revoga lei anterior. 
Quando a revogação atinge a integralidade da lei anterior (revogação total), chama-
se ab-rogação. Quando, por outro lado, atinge apenas parte da lei anterior (revogação 
parcial), chama-se derrogação. 
 
 
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O enunciado mais simples do critério temporal (lei posterior revoga lei anterior) 
pode ser ainda desdobrado analiticamente. No Brasil, o artigo 2º, § 1º, da LICC apresenta 
esse desdobramento analítico: 
 
§ 1º A lei posterior revoga a anterior quando expressamente o declare, quando 
seja com ela incompatível ou quando regule inteiramente a matéria de que 
tratava a lei anterior. 
 
A primeira das situações percebidas ocorre quando a lei posterior expressamente 
revoga a lei anterior (isso se chama de revogação expressa). A lei nova contém um 
dispositivo que vai dizer: “revoga-se a lei tal” ou “fica revogada a lei tal”, ou, ainda, 
“revoga(m)-se o(s) artigo(s) X (Y, Z) da(s) lei(s) tal(is)”. Isso pode acontecer até mesmo se 
esta nova lei nada disser a respeito da matéria objeto da lei anterior ou mesmo de 
qualquer outra matéria, tendo, assim, o simples propósito de revoga-la. 
Há situações, no entanto, em que a lei nova não afirma expressamente que revogou 
a lei anterior. Nesses casos em que há incompatibilidade entre elas (lei posterior e lei 
anterior), prevalece, pelo critério temporal, a lei mais nova. A isso se chama de revogação 
implícita. A lei anterior é ab-rogada ou derrogada pela lei posterior, embora esta não 
afirme a revogação de forma expressa, mas porque há uma clara incompatibilidade. 
Obviamente que, se a lei posterior for de hierarquia inferior à lei anterior, esta não 
será revogada. A lei nova é que já nascerá inválida. Ou seja, o critério hierárquico prevalece 
sobre o critério temporal. 
 
4.3 Critério da especialidade 
Por fim, há o critério da especialidade. O critério da especialidade pressupõe que 
podem haver leis gerais, que tratam uma generalidade de casos, e leis especiais, que 
retiram certos casos de baixo da incidência da regra geral para fornecerem uma disciplina 
específica. 
Utilizemos um exemplo hipotético, para melhor compreender a afirmação do 
parágrafo anterior: imaginemos que a Lei A preveja um imposto que seja de 20% sobre o 
valor da venda. Esse imposto incide sobre todos os produtos que são vendidos. Sobrevém a 
Lei B, que estabelece isenção do mesmo imposto para os produtos da cesta básica. Como 
 
 
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fica a disciplina jurídica da questão? A lei geral (A) aplica-se para a generalidade das 
situações, indicando imposto de 20%, e a Lei B se aplica aos produtos da cesta básica, 
indicando imposto de 0% (isenção). A Lei B (lei especial), por ser dirigida a um grupo 
específico de produtos, não revoga a Lei A, que permanece tendo aplicação para a 
generalidade dos casos. Por isso, a Lei A é chamada de lei geral e a Lei B, lei especial. 
Em termos técnicos, o critério da especialidade é enunciado da seguinte forma: lei 
especial prevalece sobre lei geral, sem a revogar. 
E se houver a disciplina de uma situação específica (lei especial) em lei anterior, e 
sobrevier lei geral tratando de forma diferente a matéria? A lei geral nova vale para a 
generalidade dos casos, mas a lei especial continua tendo valor para os casos específicos 
que disciplina. Tecnicamente, isso significa dizer que o critério de especialidade afasta o 
critério temporal. 
Voltemos ao exemplo anterior. Imagine-se que lei posterior (Lei C) aumentasse o 
imposto sobre venda para 30%. E a cesta básica? Continuaria sendo isenta. Agora, uma lei 
ainda mais recente (Lei D) estabelece em 10% o imposto sobre a venda de produtos da 
cesta básica. Isso diminuiria o valor do imposto sobre a venda dos outros produtos? Não. 
Porque se trata de lei especial, aplica-se este último percentual (10%) apenas para a cesta 
básica. 
Esses desdobramentos específicos do critério da especialidade são encontrados, no 
Brasil, no artigo 2º, § 2º, da LICC: 
 
§ 2º A lei nova, que estabeleça disposições gerais ou especiais a par das já existentes, não 
revoga nem modifica a lei anterior. 
 
4.4 Conflito (ou tensão) entre princípios. O princípio da 
proporcionalidade 
Há, ainda, um critério a ser aplicado diante do conflito entre princípios (o conflito 
entre princípios é também chamado de tensão – o que dá a entender que um princípio está 
puxando para um lado e outro para o outro). 
Exemplos de tensão entre princípios são encontrados no dia-a-dia de nossa 
sociedade contemporânea. Podem-se mencionar, dentre outras hipóteses, a tensão entre12 de 13 
 
direito à intimidade e à liberdade de imprensa; tensão entre liberdade de culto e 
igualdade; tensão entre direito à saúde e igualdade; e assim por diante. Todos os exemplos 
dados, registra-se, pressupõem que não exista, em razão da complexidade de nossa vida 
atual, uma regra jurídica específica objeto de lei para a solução do problema. 
Ou seja, o conflito, a tensão entre princípios surge diante de casos concretos, e em 
razão da incidência direta dos princípios sobre o caso concreto. 
O método para solução do conflito entre princípios é dado pelo princípio da 
proporcionalidade. Este é subdividido em adequação, necessidade e proporcionalidade em 
sentido estrito. Não convém, aqui, minudenciar de forma analítica como a metodologia do 
princípio da proporcionalidade é aplicada diante dos casos concretos (tarefa que deverá ser 
realizada na disciplina de Direito Constitucional, especialmente no estudo dos direitos 
fundamentais). 
Devemos, apenas, considerar a consequência prática da aplicação do princípio da 
proporcionalidade. Diante da situação concreta específica, um princípio irá prevalecer 
sobre o outro. Mas, perceba-se, trata-se de solução específica para o caso concreto. 
Juridicamente, ambos os princípios continuam valendo, e nenhum dos dois é anulado. 
Apenas que as peculiaridades do caso concreto determinarão a aplicação de um princípio 
em detrimento do outro (valendo-nos da ideia de tensão, podemos compreender que o 
princípio aplicado foi aquele que teve mais força diante do caso concreto). 
 
5 Completude do ordenamento jurídico 
O último dos temas a ser estudado quando consideramos a teoria do ordenamento 
jurídico é a chamada “completude do ordenamento jurídico”. Embora uma questão muito 
relevante na perspectiva do Juspositivismo clássico, o problema da completude do 
ordenamento jurídico deixa de ter muita significação prática nos dias atuais. 
Assim, a completude do ordenamento jurídico indaga se há vazios normativos. 
Quer dizer, situações fáticas para as quais não existem normas jurídicas. 
Se o Direito fosse identificado apenas com a lei em sentido formal, seria possível 
identificar tais vazios normativos. Todavia, ainda assim não se teria ausência de solução 
jurídica. Lembre-se, a propósito, da regra do artigo 4º, da LICC, pensada, no contexto do 
Estado Legislativo, para a hipótese de “omissão da lei”. 
 
 
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No entanto, a partir de uma compreensão mais ampla da norma jurídica, informada 
pela já tão mencionada ideologia dinâmica da interpretação, é possível a conclusão de que 
não há vazio normativo. Para tanto, basta que se relembre que há diferença entre texto 
legislativo e norma jurídica, esta última fruto da atividade final do intérprete (e não do 
trabalho do Poder Legislativo), e que a norma jurídica a ser aplicada ao caso concreto pode 
ser obtida, pelo intérprete, a partir inclusive da própria Constituição (notadamente, dos 
direitos fundamentais). 
Na verdade, a menção a essa questão da completude do ordenamento jurídico é 
bastante interessante para colocar em perspectiva crítica a pretensão sobre-humana de 
codificação de todas as situações da vida, que impregnou a tradição jurídica na qual 
estamos inseridos, especialmente após a Revolução Francesa (no Direito, assim como em 
diversas outras áreas do conhecimento, o homem pensou que conseguiria brincar de Deus; 
muitos continuam tentando...).

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