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Apostilas Solução - Professor Educação Básica – PEB II 90 Bibliografia para Língua Portuguesa MOISES, Massaud. A LITERATURA PORTUGUESA. São Paulo: Cultrix, 2008. I - Introdução Segundo Massuad Moisés, pela sua posição geográfica no mapa europeu, Portugal como se estivesse empurrado contra o mar, toda a sua histó- ria, literária e não, atesta o sentimento de busca dum caminho que só ele representa e pode repre- sentar. Recebe influências exclusivas e marcantes tanto étnicas como culturais (árabes, germânicas, francesas, inglesas, etc.), e por essa razão gerou uma literatura com características próprias e per- manentes, além da "fatalidade" de ser a Língua Portuguesa seu meio de comunicação, o que ajuda a completar e explicar o quadro. A Literatura Portuguesa reflete essa angústia geográfica: “o escritor português opta pela fuga ou pelo apego a terra, matriz de todas as inquietudes e confidente de todas as dores, centro de inspiração e nutridora de sonhos e esperanças. A fuga dá-se para o mar, o desconhecido, fonte de riqueza algu- mas vezes, de males incríveis e de emoção quase sempre; ou, transcendendo a estreiteza do solo físico, para o plano metafísico, à procura de visuali- zar numa dimensão universal e perene a inquieta- ção particular e egocêntrica”. Para o autor, é uma literatura rica em poetas - Camões, Bocage, Antero, Fernando Pessoa, entre outros - “(...) A poesia é o melhor que oferece a Literatura Portuguesa, dividida entre o apelo metafí- sico, que significa a vivência e a expressão de pro- blemas fundamentais e perenes (a existência ou não de Deus, o ser e o não-ser, a condição humana, os valores do espírito, etc.), e a atração amorosa da terra (representada por temas populares, folclóri- cos), ou um sentimento superficial, feito da confis- são de estados de alma provocados pelos embates amorosos (...)”. A riqueza da poesia contrasta com a pobreza do teatro que somente algumas poucas vezes saiu “do nível medíocre ou meramente razoável” através de Gil Vicente, Garrett e António José da Silva. O romance decai após a morte de Eça de Quei- rós, em 1900. Voltando a viver uma época de es- plendor após 1940, pela quantidade e qualidade de seus autores configura-se no ponto forte da literatu- ra lusa. A crítica literária, como o teatro, pobre, so- mente nos últimos anos começa a despontar com rigor científico. A Literatura Portuguesa nasceu quase simulta- neamente com a nação. Em 1094, Afonso VI, Rei de Leão, um dos reinos em que a Península Ibérica era dividida (os outros: Castela, Aragão e Navarra), casa suas filhas, Urraca com o Conde Raimundo de Borgonha, e Teresa com D. Henrique. Ao primeiro genro, doa uma extensa região de terra correspon- dente à Galiza; ao segundo, o território compreendi- do entre o rio Minho e o Tejo, com o nome de "Con- dado Portucalense". Após a morte de D. Henrique, D. Teresa assume o governo e se aproxima da Galiza. Seu filho, o Infante, Afonso Henriques, rebela-se contra a mãe e inicia uma revolução que culmina com a vitória dos revoltosos, na batalha de S. Mamede, nos arredores de Guimarães e o Infante é declarado seu sobera- no. Porém, somente em 1143, na Conferência de Samora, D. Afonso VII reconhece Afonso Henriques como rei. Portugal está politicamente autônomo. A data utilizada como marco do início da Literatura Portuguesa é 1198 (ou 1189), quando o trovador Paio Soares de Taveirós compõe uma cantiga, Can- tiga de Garvaia, palavra que designava um luxuoso manto de Corte, dedicada a Maria Pais Ribeiro, também chamada A Ribeirinha, favorita de D. San- cho I. Tudo indica que já havia uma atividade literá- ria anterior, porém desaparecida. II - TROVADORISMO (1198-1418) O Trovadorismo Português foi o movimento lite- rário caracterizado por seu caráter popular, sem relação com a cultura da Antiguidade Clássica gre- co-latina. Era uma arte literária simples, voltada para o entretenimento, e devido a essa simplicidade e natureza popular tem a preferência pelo idioma galaico-português em vez de latim, que era a língua da literatura erudita da época. Recebe considerável influência da cultura provençal, através dos artistas nômades oriundos daquela região que chegaram à Península Ibérica naquela época. A lírica trovado- resca teve grande força na França naquela época, e sua influência acabou se espalhando por vários países da Europa. Massaud Moisés destaca quatro teses para a origem da poesia trovadoresca: 1) A tese arábica. Relaciona a poesia trovadoresca à cultura árabe em virtude das invasões mouras à Península Ibérica. 2) A tese popular ou folclórica. Segundo essa linha de estudo a poesia trovadoresca foi uma manifesta- ção literária de “espontânea”, surgido naturalmente a partir das manifestações e cultura do povo da época. 3) A tese médio-latinista. A poesia trovadoresca teria se originado a partir da literatura latina produ- zida na Idade Média. Essa literatura teria chegado à Península Ibérica e influenciado a produção literária local. 4) A tese litúrgica. A poesia trovadoresca surgiu a partir da literatura cristã/sacra da época. Entretanto, parece que nenhuma das teses cita- das acima é suficiente para determinar com certeza a origem da lírica trovadoresca, dando-nos a possi- bilidade de aceitar todas elas de modo conjun- to.Todavia a influência da Provença na poesia tro- vadoresca portuguesa é incontestável e se deu principalmente pelo fato de que muitos dos trovado- res portugueses tiveram certa relação com a Fran- ça. (D. Afonso Henriques e D. Sancho I foram casa- dos com princesas criadas em cortes ligadas à Pro- vença). Além disso, muitos artistas nômades oriun- dos daquela região passaram pela península, e, ainda, as relações comerciais e os movimentos militares (cruzadas) são fatores de influência. Apostilas Solução - Professor Educação Básica – PEB II Bibliografia para Língua Portuguesa 91 O Trovadorismo Português inicia-se em 1189 (ou 1198) com a “Cantiga da Guarvaia” ou “Cantiga da Ribeirinha”, de Paio Soares de Taveirós e se esten- de até 1418, quando Fernão Lopes é nomeado Guarda-mor da Torre do Tombo por D. Duarte. A POESIA TROVADORESCA Na Provença, o poeta era chamado de trouba- dour, cuja forma correspondente em Português é trovador, da qual deriva trovadorismo (que serve de rótulo geral dessa primeira época medieval), trova- doresco, trovadorescamente. O poeta deveria ser capaz de compor, achar os versos e a melodia para sua cantiga. Eram poemas cantados e acompanha- dos por instrumentos musicais e às vezes danças. A poesia trovadoresca classifica-se em: lírico- amorosa e satírica. A primeira divide-se em cantiga de amor e cantiga de amigo; a segunda, em cantiga de escárnio e cantiga de maldizer. O idioma empre- gado era o galego-português, em virtude da então unidade lingüística entre Portugal e a Galiza. CANTIGAS DE AMOR Poesia lírica onde o trovador, de acordo com a “arte de trovar” confessa seu amor por uma dama inacessível aos seus apelos, entre outras razões por ser de classe social mais elevada, geralmente no- bre, enquanto ele era, quando muito, um fidalgo decaído. O poema é um lamento suplicante, os ape- los do trovador “colocam-se alto, num plano de espi- ritualidade, de idealidade ou contemplação platôni- ca”. Trata-se de um fingimento poético, de acordo com as regras de conveniência social e da moda literária vinda da Provença. Retratam um sofrimento interior (coita de amor). Geralmente é o próprio trovador quem confessa seus sentimentos, dirigindo-se em vassalagem e subserviênciaà dama (mia senhor ou minha senho- ra), e rendendo-lhe o culto que o "serviço amoroso" lhe impunha: as regras do "amor cortês", recebidas da Provença: o trovador teria de mencionar comedi- damente o seu sentimento (mesura), a fim de não incorrer no desagrado (sanha) da bem-amada; teria de ocultar o nome dela ou recorrer a um pseudôni- mo, e prestar-lhe uma vassalagem que apresentava quatro fases: a primeira correspondia à condição de fenhedor, de quem se consome em suspiros; a se- gunda é a de precador, de quem ousa declarar-se e pedir; entendedor é o namorado; drut, o amante. Segundo Moisés, “(...) O trovador, portanto, su- bordina todo o seu sentimento às leis da Corte amo- rosa, e ao fazê-lo, conhece das dificuldades inter- postas pelas convenções e pela dama no rumo que o levaria à consecução dum bem impossível. Mais ainda: dum' bem (e "fazer bem" significa correspon- der aos requestos do trovador) que ele nem sempre deseja alcançar, pois seria por fim ao seu tormento masoquista, ou início dum outro Maior. Em qualquer hipótese, só lhe resta sofrer, indefinidamente, a coita amorosa”. O sofrimento segue uma ordem crescente, atra- vés das estrofes (cobra ou talho) sendo reforçado no estribilho ou refrão, onde o trovador pode rema- tar cada estrofe, reforçando a angustiante idéia fixa para a qual ele não encontra consolo. Em síntese, nas Cantigas de Amor, o trovador destaca todas as qualidades da mulher amada, colocando-se numa posição inferior (de vassala- gem) a ela. A mulher é colocada num patamar ele- vado, idealizada, em geral por se encontrar em uma posição social superior. As cantigas de amor não possuem variedade temática, sendo a temática mais comum o amor não correspondido. Além disso, re- produzem o sistema hierárquico do feudalismo, pois o trovador passa a ser o vassalo da amada (susera- na) e espera receber um benefício em troca de seus “serviços” (as trovas, o amor dedicado, o sofrimento pelo amor não correspondido). CANTIGAS DE AMIGO As cantigas de amigo focalizam o outro lado da relação amorosa entre ele e uma dama: o fulcro do poema é agora representado pelo sofrimento amo- roso da mulher, em geral pertencente às camadas populares (pastoras, camponesas, etc.). O drama é o da mulher, mas quem ainda compõe a cantiga é o trovador. Massuad Moisés diz que o “(...) trovador vive uma dualidade amorosa, de onde extrai as duas formas de lirismo amoroso próprias da época: em espírito, dirige-se à dama aristocrática; com os sen- tidos, à camponesa ou à pastora. Por isso, pode expressar autenticamente os dois tipos de experiência passional, enquanto ele pró- prio, e enquanto a mulher que por ele desgraçada- mente se apaixona. É digno de nota que essa ambi- güidade, extremamente curiosa ainda como psico- logia literária ou das relações humanas, não existia antes do trovadorismo nem jamais se repetiu de- pois”. O “eu-lírico” (quem fala) é a própria mulher, diri- gindo-se em confissão à mãe, às amigas, aos pás- saros, aos arvoredos, às fontes, aos riachos. O teor da confissão é sempre uma paixão não correspon- dida, mas a que ela se entrega de corpo e alma. Traduz um sentimento espontâneo, natural e primitivo por parte da mulher, e um sentimento don- juanesco e egoísta por parte do homem, que geral- mente está “(...) no fossado ou no bafordo, isto é, no serviço militar ou no exercício de armas. Por isso, a palavra amigo pode significar namorado e amante”. Trata-se de uma poesia de caráter narrativo e descritivo e se classifica de acordo com o lugar geográfica e as circunstâncias em que decorrem os acontecimentos (serranilha, pastorela, barcarola, bailada, romaria, alva ou alvorada - surpreende os amantes no despertar dum novo dia, depois de uma noite de amor). CANTIGAS DE ESCARNIO E DE MALDIZER A Cantiga de Escárnio revela uma sátira que se constrói indiretamente, por meio da ironia e do sar- casmo, usando palavras ambíguas, de duplo senti- do. Na Cantiga de Maldizer, a sátira é feita direta- mente, com agressividade, com palavras chulas e muitas vezes obscenas. Apostilas Solução - Professor Educação Básica – PEB II 92 Bibliografia para Língua Portuguesa Em geral escritas “(...) pelos mesmos trovadores que compunham poesia lírico-amorosa, expressa- vam, como é fácil depreender, o modo de sentir e de viver próprio de ambientes dissolutos, e acaba- ram por ser canções de vida boêmia (...) poesia "forte", descambando para a pornografia ou o mau gosto, possui escasso valor estético, mas em con- trapartida documenta os meios populares do tempo, na sua linguagem e nos seus costumes, com uma flagrância de reportagem viva”. Em geral, cultivadas por jograis de “má vida”, eram acompanhadas pelas soldadeiras (= mulheres a soldo), cantadeiras e bailadeiras, de vida dissoluta que faziam coro com as “chulices” presentes nas letras das canções. CANCIONEIROS Cancioneiros são coletâneas de canções, compi- ladas por ordem e graça de algum mecena ou so- berano. Dos vários cancioneiros que existiram, três merecem destaque: 1) Cancioneiro da Ajuda, composto no reinado de Afonso III (fins do século XIII), o que exclui a contri- buição de D. Dinis (reinou entre 1268 e 1325 e foi chamado Rei Trovador); contém 310 cantigas, qua- se todas de amor; 2) Cancioneiro da Biblioteca Nacional (também chamado Colocci-Brancuti, homenagem a seus dois possuidores italianos, dos quais Brancuti foi o últi- mo), é, uma cópia italiana do século XVI, possivel- mente de original do século anterior; contém 1 647 cantigas, de todos os tipos, e engloba trovadores dos reinados de Afonso III e de D. Dinis; 3) Cancioneiro da Vaticana (o nome lhe vem de ter sido descoberto na Biblioteca do Vaticano, em Roma), também cópia italiana do século XVI, de original do século anterior, inclui 1205 cantigas de escárnio e de maldizer, de amor e de amigo. PRINCIPAIS TROVADORES Moisés destaca como principais trovadores: - João Soares de Paiva, considerado o mais anti- go, nascido em 1141. - Paio Soares de Taveirós, autor da cantiga mais antiga de que se tem registro. - D. Dinis, autor de aproximadamente 140 canti- gas, entre líricas e satíricas. - João Garcia de Guilhade escreveu 54 composi- ções líricas e satíricas. Considerado um dos mais originais trovadores do século XIII. - Martim Codax, trovador da época de Afonso III, escreveu 7 cantigas de amigo, as quais tem o méri- to de constituir as únicas peças da lírica trovadores- ca cuja pauta musical permaneceu até hoje. - Outros trovadores: Afonso Sanches, Aires Cor- pancho, Nuno Fernandes Torneol, Bernardo Bona- val, Aires Nunes, João Zorro, etc. TERMINOLOGIA POÉTICA A poesia medieval utilizava requintados recursos formais, apesar da aparência primitiva, espontânea, e de ser composta para ser cantada, com regras e estruturas peculiares. Cantigas de atafinda ou de maestria, cantigas nas quais ocorre o que chamamos hoje de encadea- mento, ou “enjambement”, que consiste na continu- ação da idéia de um verso no verso seguinte, esta- belecendo uma ligação de sentido entre os versos. Esse esquema de organização das cantigas é con- siderado mais difícil e intelectualizado, por nele não ocorrer o recurso do refrão. Acontece mais comu- mente nas cantigas de amor. Cantigas paralelísticas, cantigas nas quais ocorre o paralelismo, recurso que consiste na repetição de vocábulos, na forma de sinônimos, no decorrer da cantiga. Cantigas de refrão, estrutura típica da poesia po- pular, na qual ocorre a presença do refrão, verso ou par de versos que se repete após cada estrofe (que era chamada de cobra, cobla ou talho, de acordocom a Poética Fragmentária). O recurso do parale- lismo e do refrão ocorre mais freqüentemente nas cantigas de amigo e às vezes de amor. Tenções, também chamadas cantigas dialogadas, por apresentarem diálogos, ou seja, alternância entre as vozes de interlocutores na cantiga. Ocorre principalmente nas cantigas de amigo. Além dos trovadores, havia outros tipos de artis- tas envolvidos nas manifestações artístico-literárias da época, como os segréis, os jograis e os menes- tréis. Simplificando, o trovador era o artista completo: compunha, cantava e podia instrumentar as canti- gas; as mais das vezes, era fidalgo decaído. Jogral era uma designação menos precisa: podia referir o saltimbanco, o truão, o ator mímico, o músico e até mesmo aquele que compunha suas melodias; de classe social inferior, por seus méritos podia subir socialmente e ser classificado como trovador. Se- grel designava um artista de controvertida condição: colocado entre o jogral e o trovador, era o trovador profissional, que ia de Corte a Corte interpretando cantigas próprias ou não, a troco de soldo. Menes- trel era como se chamava o músico e cantor da Corte. NOVELAS DE CAVALARIA O Trovadorismo ainda se caracteriza pelo apare- cimento e cultivo das novelas de cavalaria. Originárias da Inglaterra ou/e da França surgiram a partir das canções de gesta, antigos poemas de temas guerreiros, que em Portugal foram traduzi- dos, com algumas modificações que buscavam adaptar as novelas à realidade de Portugal. Circulava entre a nobreza e, traduzidas do Fran- cês, era natural que na tradução e cópia sofressem voluntárias e involuntárias alterações com o objetivo de adaptá-las à realidade histórico-cultural de Por- tugal. Apostilas Solução - Professor Educação Básica – PEB II Bibliografia para Língua Portuguesa 93 Convencionou-se agrupar as novelas de cavala- ria em três ciclos: 1) ciclo bretão ou arturiano, tendo o Rei Artur e seus cavaleiros como protagonistas; 2) ciclo carolíngio, em torno de Carlos Magno e os doze pares de França; 3) ciclo clássico, referente a novelas de temas gre- co-latinos. As novelas de cavalaria têm uma forte conotação religiosa e eram permeadas por ensinamentos cris- tãos implícitos no enredo das histórias, refletiam o culto à vida espiritual, a busca pela perfeição moral, e a valorização de qualidades como a honra, a bra- vura, a castidade, a lealdade, a generosidade, a justiça entre outras. Chegaram aos nossos dias as seguintes novelas: Amadis de Gaula, História de Merlim, José de Arimatéia e A Demanda do Santo Graal. Amadis de Gaula marca com relevância a ficção da época, através do enredo amoroso e guerreiro, bem ao gosto do gênero, do cavaleiro perfeito, des- truidor de monstros, tímido e heróico, apaixonado e fiel a sua amada Oriana, seguindo o modelo dos cantares de amor. A novela surpreende, sobretudo, pela atmosfera de sensualidade que une o par amo- roso, em especial pelo fato da amada ter-se ofereci- do, gentilmente, antes do casamento. A Demanda do Santo Graal é uma novela místi- ca, tem começo numa visão celestial de José de Arimatéia e no recebimento dum pequeno livro (A Demanda do Santo Graal). José parte para Jerusa- lém; convive com Cristo, acompanha-lhe o martírio da Cruz, e recolhe-lhe o sangue no Santo Vaso. Deus ordena-lhe que o esconda. Tendo-o feito, mor- re em Sarras. O relato termina com a morte de Lan- celote: seu filho, Galaaz, irá em busca do Santo Graal. Conforme Moisés “(...) A Demanda do Santo Graal contém o seguinte: em torno da "távola re- donda", em Camelot, reino do Rei Artur, reúnem-se dezenas de cavaleiros. É véspera de Pentecostes. Chega uma donzela à Corte e procura por Lancelote do Lago. Saem ambos e vão a uma igreja, onde Lancelote arma Galaaz cavaleiro e regressa com Boorz a Camelot. Um escudeiro anuncia o encontro de maravilhosa espada fincada numa pedra de mármore boiando n'água. Lancelote e os outros tentam arrancá-la debalde. Nisto, Galaaz chega sem se fazer anunciar e ocupa a seeda perigosa (= cadeira perigosa) que estava reservada para o ca- valeiro "escolhido": das 150 cadeiras, apenas falta- va preencher uma, destinada a Tristão. Galaaz vai ao rio e arranca a espada do pedrão. A seguir, en- tregam-se ao torneio. Surge Tristão para ocupar o último assento vazio. Em meio ao repasto, os cavaleiros são alvoro- çados e extasiados com a aérea aparição do Graal (= cálice), cuja luminosidade sobrenatural os transfi- gura e alimenta, posto que dure só um breve mo- mento. Galvão sugere que todos saiam à demanda (= à procura) do Santo Graal. No dia seguinte, após ouvirem missa, partem todos, cada qual por seu lado. Daí para frente, a narração se entrelaça, se ema- ranha, a fim de acompanhar as desencontradas aventuras dos cavaleiros do Rei Artur, até que, ao cabo, por perecimento ou exaustão, ficam reduzidos a um peque no número. E Galaaz, em Sarras, na plenitude do ofício religioso, tem o privilégio exclusi- vo de receber a presença do Santo Vaso, símbolo da Eucaristia, e, portanto, da consagração de uma vida inteira dedicada ao culto das virtudes morais, espirituais e tísicas. A novela ainda continua por algumas páginas, com a narrativa do adulterino caso amoroso de Lan- celote, pai de Galaaz, e de D. Ginebra, esposa do Rei Artur. Tudo termina com a morte deste último”. CRONICÕES E LIVROS DE LINHAGEM Além da poesia e das novelas de cavalaria no trovadorismo, ainda foram cultivados outras mani- festações literárias: os cronicões, as hagiografias e os nobiliários ou livros de linhagem. Os cronicões, de pouco valor literário, deram origem à historiografia portuguesa e serviram de material de suporte para Herculano compor sua Portugaliae Monumenta Historica. Crônicas Breves do Mosteiro de Santa Cruz de Coimbra, Crónica Geral de Espanha (1344), provavelmente elaborada por D. Pedro, Conde de Barcelos, filho bastardo de D. Dinis. As hagiografias (= vidas de santos), escritas em Latim, possuem ainda menos significado literário. Os livros de linhagens eram relações de nomes, especialmente de nobres, com o objetivo de estabe- lecer graus de parentesco que serviam para dirimir dúvidas em caso de herança, filiação ou de casa- mento em pecado (= casamento entre parentes até o sétimo). Ao lado de informações tipicamente genealógi- cas revelam veleidades literárias: nas referências às ligações genealógicas se intercalam, com realismo, colorido e naturalidade, narrativas breves, mas de especial interesse, como a da Batalha do Salado. III – HUMANISMO (1418-1527) Em Portugal, o Humanismo inicia-se quando Fernão Lopes, guarda-mor da torre do Tombo des- de 1418, é encarregado por D. Duarte (filho de D. João I) de “por em crônica as histórias de seus an- tepassados. e ou da sua promoção a Cronista-Mor do Reino, em 1434, e encerra-se em 1527, quando Sá de Miranda regressa da Itália trazendo a medida nova (ou o decassílabo). Pela primeira vez, é demonstrada uma preocu- pação com a História documentada, envolvendo a descrição dos fatos sociais fora dos parâmetros da Corte. OS CRONISTAS: FERNÃO LOPES Autodidata, de origem humilde, foi um dos legítimos representantes do saber popular, embora já no seu tempo um novo tipo de saber começava a surgir: de cunho erudito-acadêmico e humanista. Apostilas Solução - Professor Educação Básica – PEB II 94 Bibliografia para Língua Portuguesa Das várias crônicas que teria escrito sobre os reis portugueses da primeira dinastia (Dinastia de Avis) e do começo da segunda, váriasse perderam, só restando três de autoria indiscutível: Crônica d'El- Rei D. Pedro, Crônica d'El-Rei D. Fernando e Crôni- ca d'El-Rei D. João I. Outras, ainda lhe são atribuí- das, como a Crônica do Condestável (publicada em 1526). Decididamente vocacionado para a historiografia, Fernão Lopes tem sido considerado o "pai da Histó- ria" em Portugal. Sua visão abrangente e lúcida de Fernão Lopes torna possível o “nascimento” da His- tória documentada de Portugal compilando fatos como a Dinastia de Avis, a expansão marítima por- tuguesa. Seu valor como historiador reside acima de tudo no fato de procurar ser "moderno", desprezando o relato oral em favor dos acontecimentos documen- tados. Do ponto de vista da forma, o seu estilo repre- senta uma literatura de expressão oral e de raiz popular. Ele próprio diz que nas suas páginas não se encontra a formosura das palavras, mas a nudez da verdade. “(...) nosso desejo foi em esta obra escrever verdade, sem outra mistura, deixando nos bons aquecimentos todo fingido louvor, e nuamente mostrar ao povo, quaisquer contrárias cousas, da guisa que avieram." Fernão Lopes enquadra-se nitidamente nas es- truturas culturais da Idade Média. Todavia, alguns pormenores fazem dele um homem avançado para o seu tempo. Dotado dum estilo maleável, coloquial, primitivo, saborosamente palpitante e vivo, não escondia o seu gosto acentuado pelo arcaísmo, talvez em de- corrência de sua origem plebéia e seu amor ao po- vo, à "arraia-miúda". Fernão Lopes possui incomum sentido plástico da realidade, procurando oferecer ao leitor um ins- tantâneo "vivo", "atual", dos acontecimentos. Incor- porou em sua obra alguns recursos da novela, como por exemplo, nos retratos psicológicos das perso- nagens, a cerrada cronologia, o emprego dos diálo- gos, constituem soluções estruturais que trouxe da novela e caldeou com seu próprio pendor literário. Sua carreira como historiador é provavelmente a mais longa, sendo sucedido por Gomes Eanes de Zurara após a aposentadoria. GOMES EANES DE ZURARA Gomes Eanes de Azurara (ou Zurara) sucedeu a Fernão Lopes e continuou o propósito de escrever a crônica de todos os reis portugueses até àquela data. Escreveu a 3.ª parte à Crônica de D. João I (co- nhecida como Crônica da Tomada de Ceuta, sua obra mais importante), Crônica do Infante D. Henri- que ou Livro dos Feitos do Infante, Crônica de D. Pedro de Meneses, Crônica de D. Duarte de Mene- ses, Crônica dos Feitos de Guiné, Crônica de D. Fernando, Conde de Vila-Real (desaparecida). Iniciador da historiografia da expansão ultramari- na, Azurara não tinha o mesmo talento de Fernão Lopes, escreve numa linha ufanista (que culminará n’ Os Lusíadas). Ao contrário de Fernão Lopes, preocupa-se com pessoas, individualidades, e não com grupos sociais, onde a ação isolada do cavalei- ro predomina sobre à da massa popular e já encon- tramos em sua obra certa influência da cultura clás- sica. Foi sucedido por Vasco Fernandes de Lucena, que nada escreveu apesar de ocupar o cargo mais ou menos 30 anos. RUI DE PINA Quarto cronista-mor, Rui de Pina escreveu nove crônicas a propósito de monarcas da 1.ª e 2.ª dinas- tias: Sancho I, Afonso II, Sancho II, Afonso III, D. Dinis, Afonso IV, D. Duarte, Afonso V, e D. João II. Contesta-se a autoria integral dessas crônicas: “as seis primeiras seriam a refundição duma obra con- temporânea cujos originais só muito recentemente foram descobertos (na Biblioteca Pública do Porto e na casa do Cadaval), ou, ainda, calcadas nas crôni- cas perdidas de Fernão Lopes”. Suas crônicas pos- suem valor historiográfico, em especial pelos novos e diferentes dados sobre a sociedade portuguesa de seu tempo e pela sobriedade da linguagem, de in- fluência clássica. A PROSA DOUTRINÁRIA A prosa de caráter religioso girou em torno de traduções de episódios bíblicos, muitas vezes am- pliadas com comentários ou derivações ficcionadas, e de obras de caráter hagiográfico (vidas de san- tos). Escrita pelos monarcas portugueses, a Prosa Doutrinária era direcionada à educação da nobreza objetivando orientá-la no convívio social e no ades- tramento físico para a guerra. Conforme Moisés “O culto do desporto, especialmente o da caça, ocupa o primeiro lugar nessa pedagogia pragmática. As virtudes morais também se lembram e se enalte- cem, mas sempre visando a alcançar o perfeito equilíbrio entre a saúde do corpo e a do espírito”. Destaca: Livro da Montaria, de D. João I, em que se ensina a caça ao porco montes, considerado o desporto ideal para a fidalguia; Leal Conselheiro e Livro da Ensinança de Bem Cavalgar Toda Sela, de D. Duarte: na primeira, recopila e adapta com independência e novidade reflexões filosóficas e psicológicas de várias e con- traditórias fontes, desde Cícero até S. Tomás de Aquino; na outra, faz a apologia da vida ao ar livre, mas não esquece de exaltar as virtudes do espírito, especialmente a vontade; O Livro da Virtuosa Benfeitoria, do Infante D. Pedro, o Regente (nascido em 1392 e morto em 1449, na batalha de Alfarrobeira, era filho bastardo de D. João I), contém a tradução e adaptação da obra De Beneficiis, de Séneca, realizada com a ajuda de Frei João Verba, e que trata das numero- sas modalidades e virtudes do "benefício", sobretu- do na educação dos nobres; Apostilas Solução - Professor Educação Básica – PEB II Bibliografia para Língua Portuguesa 95 Livro de Falcoaria, de Pero Menino, em que se ensina a tratar das doenças dos falcões. Outras obras de destacam, como o Boosco De- leitoso, obra com forte influência de Petrarca nos primeiros capítulos, em que se narra a peregrinação da alma em busca da salvação, etc. A POESIA DO CANCIONEIRO GERAL A poesia portuguesa quatrocentista, do reinado de D. João II e D. Manuel, foi compilada por Garcia de Resende no seu Cancioneiro Geral (1516). São composições escritas em português e castelhano. Contém aproximadamente mil composições, de 286 poetas, cerca de 150 são escritas em Espanhol. A poesia do período se caracteriza pelo divórcio entre a "letra" e a música. O ritmo é alcançado com os próprios recursos da palavra disposta em versos, estrofes, etc., e não com a pauta musical. O Cancioneiro Geral introduziu o emprego do verso redondilha (redondilha menor, com 5 sílabas, e redondilha Maior, com 7 sílabas) e trouxe novida- des temáticas: a influência clássica (Ovídio), o influ- xo italiano (Dante e Petrarca: o lirismo centrado no conhecimento do amor e suas contradições. inter- nas) e o espanhol (Marques de Santilhana, Juan de Mena, Gómez Manrique, Jorge Manrique). Há, ainda, registros de poesia épica, religiosa e satírica. Entretanto, o ponto alto do Cancioneiro Geral é representado pela poesia lírica. Poetas que se destacam no Cancioneiro Geral: João Ruiz de Castelo-Branco representa-se com a "Cantiga sua partindo-se", Garcia de Resende, com as Trovas à Morte de Dona Inês de Castro, graças ao forte sentimento de adesão ao "caso" da amante de D. Pedro, a ponto de possivelmente o poema haver estado presente no espírito de Camões quan- do este desenhou igual episódio em Os Lusíadas, além de Bernardim Ribeiro e Sá de Miranda. O TEATRO POPULAR DE GIL VICENTE Anteriormente a Gil Vicente, o teatro em Portugal consistia na representação de breves quadros reli- giosos alusivos a cenas bíblicas e encenados em datas festivas, como o Natal e a Páscoa. Geralmen- te falados em Latim, eram encenados nas igrejas. Posteriormente, surge o teatro profano, de caráter não religioso. A biografia de Gil Vicente é muito enigmática. Seria ele o ourives autor nafamosa cruz de Belém? Nobre arruinado? O enigma continua a possibilitar teses a favor e contra, na busca de esclarecer as incertezas biográficas do grande teatrólogo portu- guês. O concreto é que Gil Vicente mantinha proximi- dade aos integrantes da corte, em especial à rainha D. Maria, cuja homenagem ao nascimento do filho da monarca, mais tarde D. João III, Rei de Portugal, escreveu e interpretou o Auto da Visitação (também conhecido como Monólogo do Vaqueiro), no ano de 1502. Com relação às incertezas da vida do mestre, Saraiva deixa a questão de lado, achando muito mais pertinente destacar o gênio vicentino e sua autenticidade como criador: “Se ele está vivo no meio das múmias que assinalam a história do teatro português, isso se deve certamente ao fato de que ele era Gil Vicente, o grande teatrólogo e não qual- quer outra pessoa”. Com relação a Gil VICENTE não ter estudado formalmente, não ter bebido das fontes clássicas (...) “Seu auto-didatismo possibilitou-lhe as condi- ções de originalidade de sua estrutura artística, dando-lhe uma expressão singular, predispondo-o a representar de maneira objetiva, os valores culturais de seu momento histórico”. Recebeu influências do teatro medieval e tam- bém de Juan Del Encina, dramaturgo castelhano, seu contemporâneo, e pode ser constatada na pin- tura dos quadros sociais ou através de citações direta ao mestre espanhol. Durante trinta e quatro anos de produção drama- túrgica, pontilhados de algumas trovas, sermões e epístolas, ele nos legou 44 peças, sendo a primeira em 1502, com o Monólogo do Vaqueiro e a última Floresta de Enganos, no ano de 1536. No teatro de Gil Vicente, conviveram elementos característicos do medievo e do humanismo. “Em seu teatro desfilava uma verdadeira fauna humana, conforme Saraiva, sendo suas personagens muito mais tipos que se comportam segundo automatis- mos inveterados”. Dentre os ‘tipos’ sociais que desfilam nas peças vicentinas, podemos mencionar como mais recor- rentes: a alcoviteira, o escudeiro pobre, o clérigo corrupto, a viloa casadoira, o almocreve, o sapatei- ro, os pajens etc. Todos são descritos com morda- cidade pelo dramaturgo. Gil Vicente foi autor e ator e suas representa- ções, cheias de improvisos já previstos, são ricas, densas e variadas. Sua galeria de tipos humanos é imensa: o padre corrupto, o cardeal ganancioso, o sapateiro que explora o povo, a beata, o médico incompetente, os aristocratas decadentes, etc. Seus personagens não têm nome - são sempre designados pela profissão, assim registrando os tipos sociais que faziam parte da sociedade da épo- ca. O teatro era sua arma de combate e de denúncia contra a imoralidade. Sua linguagem, bastante sim- ples, espontânea e fluente. Assim como os cenários e as montagens. A relevância das quarenta e quatro peças de Gil Vicente não se exauriu até os nossos dias, fossem elas autos ou farsas, tratassem de temas cotidianos, fantásticos ou religiosos. A genialidade e habilidade de Gil Vicente fizeram dele o maior dramaturgo português de todos os tempos. Trata-se do princípio intemporal que, se- gundo SARAIVA, caracteriza a arte de forma geral. Apostilas Solução - Professor Educação Básica – PEB II 96 Bibliografia para Língua Portuguesa Didaticamente, pode-se dividir em fases o teatro vicentino: a) 1.ª fase, de 1502 a 1514, em que a influência de Juan del Encina é dominante, sobretudo nos primei- ros anos, atenuando-se depois de 1510; b) 2.ª fase, de 1515 a 1527, começando com Quem tem farelos? e terminando com o Auto das Fadas: corresponde ao ápice da carreira dramática de Gil Vicente, com a encenação de suas melhores peças, dentre as quais a Trilogia das Barcas (1517-1518), o Auto da Alma (1518), a Farsa de Inês Pereira (1523), o juiz da Beira (1525); c) 3.ª fase, de 1528, com o Auto da Feira, até 1536, com a Floresta de Enganos, fase em que o dramaturgo intelectualiza seu teatro sob influência do classicismo renascentista. Os temas do teatro vicentino também variam: Teatro tradicional, predominantemente medie- val: são as peças de caráter religioso (Auto da Fé, o Auto da Alma), peças de assunto bucólico (Auto Pastoril Castelhano, o Auto Pastoril Português), as peças de assunto relacionado com as novelas de cavalaria (D.Duardos, Auto de Amadis de Gaula). Teatro atual: caracteriza-se por conter o retrato satírico da sociedade do tempo, em seus vários estratos, a fidalguia, a burguesia, o clero e a plebe (Farsa de Inês Pereira e em Quem tem farelos? (ou Farsa do Escudeiro), ou pelo teatro alegórico-crítico, como a Trilogia das Barcas. Sua obra, compilada por seu filho, Luís Vicente segue a seguinte divisão: 1) Obras de devoção (Monólogo do Vaqueiro, Auto Pastoril Castelhano, Auto da Alma, Auto da Feira, Trilogia das Barcas, etc.); 2) Comédias (Comédia do Viúvo, Comédia de Ru- bena, Divisão da Cidade de Lisboa, Floresta de Enganos); 3) Tragicomédias (Exortação da Guerra, Cortes de Júpiter, Frágoa de Amor; 4) Farsas (Quem tem farelos?, Auto da índia, O Velho da Horta, Inês Pereira, Juiz da Beira, Farsa dos Almocreves, etc.). Segundo o autor, “o teatro de Gil Vicente carac- teriza-se, antes de tudo, por ser rudimentar, primiti- vo e popular, muito embora tenha surgido e se te- nha desenvolvido no ambiente da Corte, para servir de entretenimento aos animados serões oferecidos pelo Rei”. IV – CLASSICISMO (1527-1580) PRELIMINARES O marco inicial do Classicismo português é em 1527, quando se dá o retorno do escritor Sá de Mi- randa de uma viagem feita à Itália, de onde trouxe as idéias de renovação literária e as novas formas de composição poética, como o soneto. O período se encerra em 1580, ano da morte de Luís Vaz de Camões e do domínio espanhol sobre Portugal. Para Massaud Moisés, o Renascimento foi deci- sivo para a Literatura Portuguesa. O Humanismo antecedeu ao Classicismo e preparou o movimento cultural, em especial “pela descoberta dos monu- mentos culturais do mundo greco-latino, de modo particular as obras escritas, em todos os recantos do saber humano, e por uma concepção de vida centrada no conhecimento do homem, não de Deus”. A descoberta do caminho marítimo para as Ín- dias, em 1498 por Vasco da Gama, e dois anos depois o "achamento" do Brasil, permitiram a Portu- gal gozar de um prestígio cultural e econômico, mesmo que momentâneo, no reinado de D. Manuel. Este otimismo ufanista chega ao fim com a bata- lha em Alcácer-Quibir, no ano de 1578, quando morre D. Sebastião e Portugal passa ao domínio espanhol. Sob Felipe II, Camões reflete essa atmos- fera de exaltação épica e desafogo financeiro que cruza as primeiras décadas do século XVI, mas não deixa de refletir também o desalento dos lúcidos perante a efêmera superioridade portuguesa através da fala do Velho do Restelo e do epílogo d’ Os Lu- síadas. Do Classicismo ao teocentrismo medieval, vai opor-se uma concepção antropocêntrica do mundo, em que o "homem é a medida de todas as coisas". Enfatiza-se a imitação dos autores clássicos gregos e romanos da antiguidade: Homero, Virgílio, Ovídio, etc.; uso da mitologia: Os deuses e as musas, inspi- radoras dos clássicos gregos e latinos aparecem também nos clássicos renascentistas (Em Os Lusí- adas: (Vênus) = a deusa do amor e (Marte) o deus da guerra, protegem os portugueses em suas con- quistas marítimas; predomínio da razão sobre os sentimentos: a linguagem clássica não é subjetiva nem impregnada de sentimentalismos e de figuras, porque procura coar, através da razão, todos os dados fornecidos pela natureza e, desta formaex- pressou verdades universais; linguagem sóbria, simples, sem excesso de figuras literárias; idealis- mo: o classicismo aborda os homens ideais, libertos de suas necessidades diárias, comuns. Os personagens centrais das epopéias (grandes poemas sobre grandes feitos e atos heróicos) nos são apresentados como seres superiores, verdadei- ros semideuses, sem defeitos. amor Platônico: Os poetas clássicos revivem a idéia de Platão de que o amor deve ser sublime, elevado, espiritual, puro, não-físico; busca da universalidade e impessoalida- de. A obra clássica torna-se a expressão de verda- des universais, eternas e despreza o particular, o individual, aquilo que é relativo. O saber concreto, "científico" e objetivo, tende a valorizar-se em detri- mento do abstrato; notável avanço opera-se no campo das ciências experimentais; a mitologia gre- co-latina, esvaziada de significado, passa a funcio- nar apenas como símbolo ou ornamento; em suma: o humano prevalece ao divino. Em 1527, depois de ausente seis anos, Sá de Miranda regressa da Itália, impregnado das novas idéias. Apostilas Solução - Professor Educação Básica – PEB II Bibliografia para Língua Portuguesa 97 Introduziu, ou colaborou para introduzir o verso decassílabo, o terceto, o soneto, a epístola, a elegi- a, a canção, a ode, a oitava, a écloga, a comédia clássica (escreveu Os Estrangeiros em 1526). Tor- nou-se o principal divulgador do Classicismo, mas o papel de teórico do movimento coube a Antonio Ferreira. A ESTÉTICA CLÁSSICA Para Moisés, o classicismo consistia, antes de tudo, numa concepção de arte baseada na imitação dos clássicos gregos e latinos, considerados mode- los de suma perfeição estética. Imitar não significava copiar, mas criar obras de arte segundo as fórmulas, as medidas, empregadas pelos antigos. Estabelece-se, ou deseja-se, um equilíbrio entre Razão e imaginação, no afã de criar uma arte uni- versal e impessoal. Todavia, a universalidade e a impessoalidade implicavam uma concepção absolu- tista de arte onde provém que os clássicos renas- centistas procurem a Beleza, o Bem e a Verdade, com maiúsculas iniciais, em virtude dessa concep- ção absolutista e idealista de arte. Percebe-se por isso que os clássicos atribuíam à arte objetivos éti- cos, identificados com o Bem e a Verdade. O Classicismo português se inicia e termina com um poeta: Sá de Miranda e Camões. Numa visão de conjunto, este último é o grande poeta, enquanto os demais se colocam em plano inferior, naturalmente ofuscados pelo seu brilho. LUIZ VAZ DE CAMÕES Pouco se conhece da vida de Luís Vaz de Ca- mões. Escritor de dados biográficos muito obscuros, Camões é o maior autor do período. Teria nascido em 1524 ou 1525, talvez em Lisboa, Alenquer, Co- imbra ou Santarém. Pelo seu talento e cultura, teria provocado paixões entre damas da Corte, dentre as quais a lnfanta D. Maria, filha de D. Manuel e irmã de D. João III, e D. Catarina de Ataíde. Por causa desses amores proibidos, é "desterrado" algum tempo para longe da Corte, até que resolve "exilar- se" em Ceuta (1549), como soldado raso. Perde um olho, e regressa a Lisboa. Em 1552, na procissão de Corpus Christi, fere Gonçalo Borges, é preso e solto, em seguida, sob a condição de engajar-se no serviço militar ultramarino. Com efeito, em fim 1553, chega à Índia. Em 1556, dá baixa, e é nomeado "provedor mor dos bens de defuntos e ausentes", em Macau. Ali, teria escrito parte d'Os Lusíadas. Acusado de prevaricação, vai à Goa defender-se, mas naufraga na foz do rio Mecon: salva-se a nado, levando Os Lusíadas mas perdendo sua compa- nheira, Dinamene. Em 1572, Camões publica Os Lusíadas, poema épico que celebrava os recentes feitos marítimos e guerreiros de Portugal. A obra fez tanto sucesso que o escritor recebeu do rei D. Se- bastião uma pensão anual – que mesmo assim não o livrou da extrema pobreza que vivia. Camões mor- re pobre e abandonado, em 10 de Junho de 1580. Escreveu teatro ao modo vicentino (Auto de Filode- mo e El-Rei Seleuco) e ao clássico (Anfitriões), mas sem alcançar maior nível, relativamente à sua poe- sia e aos comediógrafos do tempo. Sua correspon- dência contém valor biográfico ou histórico-literário. A LÍRICA CAMONIANA Camões é grande, dentro e fora dos quadros literários portugueses, por sua poesia. Escreveu versos tanto na medida velha quanto na medida nova. Seus poemas heptassílabos, geral- mente são compostos por um mote e uma ou mais estrofes que constituíam glosas (ou voltas a ele). Os sonetos são a parte mais conhecida da lírica camoniana. As composições líricas de Camões oscilam entre dois pólos: o lirismo confessional, em que o autor dá vazão à sua experiência íntima, e a poesia pura arte, em que pretende transpor os sentimentos e os temas a um plano formal, lúdico. Em outras pala- vras, Camões demonstra, em seus sonetos, uma luta constante entre o amor material, manifestação da sensualidade e do desejo, e o amor idealizado, puro, espiritualizado, capaz de conduzir o homem à realização plena. Isso faz que o poeta abstraia a mulher, ou as mulheres, em favor da Mulher. Camões pinta com o auxílio da Razão o retrato da Mulher, formado da reunião de todas e de nenhuma em particular, por- que subordinado a um ideal de beleza perene e universal. . Nessa perspectiva, o poeta concilia o amor como idéia e o amor como forma, tendo a mulher como exemplo de perfeição, ansiando pelo amor em sua integridade e universalidade. O poeta procura conhecer, conceituar o Amor, o que só consegue realizar lançando mão de antíte- ses e paradoxo. A longa e dramática meditação acerca dos misté- rios do Amor, Camões acrescenta idêntica reflexão a propósito da condição humana. A vida, tema muito mais vasto que o da mulher e o amor, é que agora lhe interessa. Para tanto, porém, o poeta somente conta com o recurso da auto-sondagem, pois em si encontra a súmula da tragédia humana espalhada pelos quatro cantos do mundo. E à proporção que aprofunda a análise, vai reparando que uma espécie de fatalismo, o "fado", o impede mesmo de recorrer ao desespero. A mente se debate num mar de pa- radoxos e pensamentos desencontrados, e não pode interromper o processo nem com a ajuda da desesperação: é o desconserto do mundo. Em síntese, o núcleo da poesia reflexiva de Ca- mões: “a vida não tem razão de ser, e descobri-lo e pensá-lo incessantemente é inútil, além de perigoso, pois apenas acentua quão irremediavelmente mise- rável é a condição humana”. A POESIA ÉPICA DE CAMÕES Os Lusíadas representam a faceta épica da poe- sia camoniana. Considerada o "Poema da Raça", "Bíblia da Nacionalidade", etc., a epopéia constrói a visão do mundo e dos homens quinhentistas portu- gueses, retratando o exato momento em que Portu- gal atingia o ápice de sua evolução histórica. Recorre a todo material produzido por escritores portugueses anteriormente: Fernão Lopes, Gomes Eanes de Zurara, Garcia de Resende e Antonio Ferreira. Apostilas Solução - Professor Educação Básica – PEB II 98 Bibliografia para Língua Portuguesa O cerne da ação desenvolve-se em torno da viagem de Vasco da Gama às Índias. A palavra “lusíada” é um neologismo inventado por André de Resende para designar os portugueses como des- cendentes de Luso (filho ou companheiro do deus Baco). Contém 10 cantos, 1102 estrofes ou estâncias e, portanto, 8816 versos; as estâncias estão organiza- das em oitava-rima, Divide-se em três partes: 1ª parte: Introdução Estende-se pelas 18 estrofes do Canto I e subdivi- de-se em: Proposição:é a apresentação do poema, com a identificação do tema e do herói (constituem as três primeiras estrofes do canto I): o poeta se propõe cantar as façanhas das "armas e os barões assina- lados", isto é, os feitos bélicos de homens ilustres; Invocação: o poeta invoca as Tágides, musas do rio Tejo, pedindo a elas inspiração para fazer o poema. Dedicatória: o poema é dedicado a D. Sebastião, rei de Portugal, que custeou a publicação e uma pen- são vitalícia para seu autor. 2ª parte: Narração - (da estrofe 19 do Canto I até a estrofe 144 do Canto X), o poeta relata a viagem propriamente dita dos portugueses ao Oriente. 3ª parte: Epílogo. É a conclusão do poema (estrofes 145 a 156 do Canto X), onde o poeta pede às mu- sas que o inspiraram para calarem a voz de sua lira, pois está desiludido com uma pátria que já não me- rece as glórias do seu canto. Síntese do poema: quando a ação do poema co- meça (estância 19), as naus estão navegando pelo meio da viagem, em pleno Oceano Indico. No Olim- po, os deuses se reúnem em concílio, para decidir a sorte dos navegantes. Júpiter, Vênus e Marte são favoráveis à sorte dos portugueses e Baco é o opo- sitor ferrenho que fará o que puder para atrapalhar o feito daqueles que ofuscariam suas façanhas. As agressões são poderosas, porém Vênus está atenta para protegê-los sutilmente. Durante a viagem, onde aportam, Vasco da Gama vai narrando a história dos portugueses, a partir da fundação da pátria, prosseguindo com uma série de episódios históri- cos: o de Egas Moniz, Inês de Castro, a batalha de Ourique, a batalha do Salado, a batalha de Aljubar- rota, a tomada de Ceuta, o sonho profético de D. Manuel, os aprestos da viagem, a fala do Velho do Restelo e a largada; a seguir, o Gama conta a pri- meira parte da viagem, cujas peripécias mais impor- tantes são: o fogo de Santelmo, a tromba marinha, a aventura de Veloso, o Gigante Adamastor, chegada a Melinde. Com a chegada a Calecut, Gama desembarca e é recepcionado pelo Samorim. Enquanto isso, Paulo da Gama recebe a bordo da nau capitania o Catual, a quem comunica o significado das figuras dese- nhadas nas bandeiras; uma última tentativa de Baco é desfeita e os navegantes devem regressar à Pá- tria. Na Ilha dos Amores, os navegantes são favore- cidos pelas ninfas em recompensa do heróico feito praticado. Após grande banquete, Tethys conduz Vasco da Gama ao ponto mais alto da ilha e desvenda-lhe a "máquina do mundo" e o futuro glorioso dos portu- gueses. Partida. Chegada a Portugal. Os Lusíadas representam o espírito novo trazido pela Renascença. A começar do herói, como o título indica, o herói desta epopéia é coletivo, os Lusíadas, ou seja, os filhos de Luso, os portugueses. PAPEL E SIGNIFICADO DA MITOLOGIA EM “OS LUSÍADAS” Camões utiliza a mitologia pagã pelas seguintes razões: - Obedece às regras da epopéia clássica: conter um plano mitológico com os deuses da sua civilização, e tal ato apenas revela o enorme conhecimento e a profunda admiração que Camões nutria pela Anti- guidade Clássica; - Assegura a ação interna do poema épico ao opor deuses e humanos, possibilitando a demonstração de emoções sem por isso enfraquecer o seu poder; - Embeleza a intriga, tornando a obra mais do que um especial relato de viagem, e criando outro ponto de interesse sem, porém, tirar a importância ao pla- no da narração; "enfeita", dando mais emoção à história, tornando-a mais uma espécie de “novela” do que apenas um “relatório”; - Mostra que até mesmo os deuses conseguem exprimir sentimentos como o amor, ódio, inveja e sensualidade; -Glorifica o povo português ao colocá-lo em cená- rios adversos criados pelos deuses, mas que ainda assim conseguem ser superados, criando uma comparação entre a força de ambos; - Evidencia a grandeza dos feitos portugueses co- mo: vencer o mar (Netuno), ultrapassar o gigante Adamastor e vencer as guerras (Marte); - Demonstra que os portugueses enquanto heróis são deuses, pois se tornam "imortais" pelos feitos praticados. Na verdade, o poeta se viu obrigado a colocar maior ênfase naquilo que era marginal ao eixo cen- tral da epopéia, como se pode observar na fisiono- mia de alguns episódios fundamentais: a Ilha dos Amores, os Doze de Inglaterra, Inês de Castro, o Gigante Adamastor, a fala do Velho do Restelo. Essas inovações ressaltam a criatividade de Ca- mões e a edificação duma epopéia renascentista, moderna. SÁ DE MIRANDA Escritor português, natural de Coimbra. De famí- lia fidalga, surge no Cancioneiro Geral de Garcia de Resende (1516), onde colaborou com poesias em português e em castelhano (como era habitual nos escritores da época). Em 1521, fez uma viagem à Itália, lá permanecendo até 1516 onde foi introduzi- do ao Renascimento italiano. Apostilas Solução - Professor Educação Básica – PEB II Bibliografia para Língua Portuguesa 99 Sá de Miranda foi o introdutor, na Literatura Por- tuguesa, do soneto, do terceto, da oitava, de subgê- neros poéticos como a canção, a carta, a écloga e a elegia, do verso decassílabo e da comédia clássica. Sá de Miranda concebeu as primeiras comédias clássicas portuguesas (Estrangeiros e Vilhalpan- dos), embora não tenha sido bem recebido pelo público, habituado aos autos à moda de Gil Vicente. Sá de Miranda deixou uma importante obra episto- lográfica e uma série de éclogas, entre outros tex- tos. A sua obra foi publicada postumamente, em 1595. Influenciou decisivamente escritores, seus contemporâneos e posteriores, como António Fer- reira, Diogo Bernardes, Pero Andrade de Caminha, Luís de Camões, D. Francisco Manuel de Melo ou ainda, mais recentemente, Jorge de Sena, Gastão Cruz e Ruy Belo, entre outros. A HISTORIOGRAFIA DE JOAO DE BARROS João de Barros é geralmente considerado o pri- meiro grande historiador português. Sua carreira literária iniciou-se muito jovem, com pouco mais de vinte anos, ao escrever um romance de cavalaria, a Crónica do Emperador Clarimundo, donde os Reys de Portugal descendem, dedicado ao soberano e ao príncipe herdeiro Dom João. Como A Demanda do Santo Graal, a novela é dominada por um tom mes- siânico: O advento do império português. Por sugestão de por Dom Manuel I, iniciou a escrita de uma história que narrava os feitos dos portugueses na Índia - as Décadas da Ásia (Ásia de Ioam de Barros, dos feitos que os Portuguezes fize- ram na conquista e descobrimento dos mares e terras do Oriente). Enquanto historiador e lingüista, João de Barros merece a fama que começou a correr logo após a sua morte. As "Décadas" são não só um precioso manancial de informações sobre a história dos por- tugueses na Ásia, mas, principalmente o início da historiografia moderna em Portugal e no Mundo. Obras de João de Barros: Crónica do Imperador Clarimundo, Rhopica pneuma ou Mercadoria Espiri- tual , Grammatica da Língua Portuguesa com os Mandamentos da Santa Madre Igreja, Diálogo da Viciosa Vergonha, Diálogo sobre Preceitos Morais, Diálogo Evangélico sobre os Artigos da Fé, Panegí- ricos: de D. João III e da Infanta D. Maria , Décadas da Ásia. Volumes I a IV entre outros. A LITERATURA DE VIAGENS Quanto à literatura de viagens é importante res- saltar o objetivo maior: transmitir a beleza deslum- brante das descobertas de novas esferas e paisa- gens. Dessa forma, nascem os relatos de viagens, roteiros, diários ou equivale, "reportagens" do mun- do que se alargava incrivelmente. Exemplos do gênero: História Trágico-Marítima, coletânea de relatos e naufrágios ocorridos nos séculos XV, XVI e XVII, organizada por Bernardo Gomes de Brito. As crônicas de viajantes como Francisco Álva-res, autor da Verdadeira Informação das Terras do Preste João (Abissínia); Fernão Cardim, autor dos Tratados da Terra e Gente do Brasil. Fernão Mendes Pinto é o maior representante do gênero e autor de uma das obras mais significativas do século XVI e de toda a literatura de viagens de qualquer tempo: Peregrinação (tudo começa em águas Portuguesas continentais, quando a caravela em que vai o narrador de Lisboa a Setúbal é aprisi- onada por piratas Franceses. Daí para frente, se- gue um rol de complicadas e pitorescas aventuras pelo Oriente). Fernão Mendes Pinto deixou um relato vivo e saboroso duma quase mítica experiência humana por terras e gentes da África e Ásia. O CONTO Segundo Massaud Moisés, “(...) o conto, de re- mota e vaga origem, cujas primeiras manifestações se localizam nas Mil e Uma Noites, foi pouco apre- ciado em Portugal antes do Romantismo’. O primei- ro nome que merece ser lembrado historicamente é o de Gonçalo Fernandes Trancoso, que escreveu breves narrativas de fundo moral, logo publicadas sob o título de Contos e Histórias de Proveito e E- xemplo. O êxito que de imediato conheceu não se alterou durante o século XVII, inclusive no Brasil, especialmente no Nordeste, onde passaram a cha- mar-se de "estórias de Trancoso" as narrativas po- pulares de imaginação e exemplo moral. Numa prosa desataviada, coloquial, ingênua, Trancoso mistura o sobrenatural com o real sem medo à inverosimilhança, aproveitando-se da tradi- ção oral e dos ensinamentos de contistas espa- nhóis, como D. Juan Manuel, e italianos, como Boccaccio, autor do conhecido Decamerone, do inglês Geoffrey Chaucer, autor de The Canterbury Tales, entre outros. A NOVELISTICA A novelística segue o espírito da cavalaria, que ainda teimava em subsistir em Portugal. A matéria cavaleiresca, que tinha sido cultivada na Idade Mé- dia, agora se nacionaliza e se aportuguesa, uma vez que surgem novelas de autores portugueses e de espírito português. Caracteriza-se por tentar manter vivo um ideal de vida próprio da Cavalaria medieval, mas adaptada ao Renascimento. O individualismo bélico cede lugar à guerra coletiva, aos torneios, em flagrante concessão ao aprimoramento operado na confecção de armas e às novidades em matéria de tática mili- tar. Já não se considerando como valoroso e digno de admiração o cavaleiro que luta mas o que ama. Embora de larga circulação na Espanha e Itália, em Portugal a novela bucólica e sentimental é re- presentada por Menina e Moça (ou Saudades, 1554), de Bernardim Ribeiro. Ao mistério que envol- ve a vida do escritor, é preciso acrescentar a dúvida que ainda paira sobre a identidade da novela. A narrativa divide-se em duas partes, a primeira com trinta e um capítulos, a segunda com cinqüenta e oito. Seu caráter bucólico e sentimental se revela pelo tom melancólico e pessimista que varre toda a novela. Duas são as interlocutoras, a Menina e Moça, que funciona como narradora, e a Senhora idosa. Apostilas Solução - Professor Educação Básica – PEB II 100 Bibliografia para Língua Portuguesa Ao contrário das novelas de cavalaria em que o protagonista é sempre o cavaleiro, a narrativa de Bernardim tem como centro de interesse a mulher e sua psicologia amorosa: evidente prenúncio da psi- cose romântica. O TEATRO CLÁSSICO O teatro clássico, quando comparado com o vigor, o brilho e a espontaneidade do teatro vicenti- no é secundário. De inspiração clássica (Plauto, Terêncio e Sêneca) teve como expoentes: Sá de Miranda (Os Estrangeiros, Os Vilhalpandos), Antonio Ferreira (A Castro, Bristo e Cioso), Jorge Ferreira de Vasconcelos (Aulegrafia, Eufrosina, Ulissipo). Merece destaque A Castro (Tragédia de D. Inês de Castro - publicada em 1587), de Antonio Ferrei- ra, que é a primeira tragédia clássica em português e uma verdadeira obra-prima no gênero. V – BARROCO (1580-1756) Em 1578, quando Dom Sebastião desaparece na batalha de Alcacer-Quibir é chegado o ocaso me- lancólico da pátria portuguesa. O barroco em Portu- gal desenvolve-se entre 1580 quando Portugal perde sua autonomia política, passando a integrar o reino da Espanha e vai até 1756 com a fundação da Arcádia Lusitana – uma academia poética -, e tem início um novo estilo: o Arcadismo. Moisés afirma que o movimento barroco, iniciado na Espanha e introduzido em Portugal durante o reinado filipino, corresponde a uma profunda trans- formação cultural, cujas raízes constituem ainda objeto de discussão e divergência. Para ele, o Barroco procurou conciliar o espírito medieval, considerado de base teocêntrica, e o es- pírito clássico, renascentista, de essência pagã, terrena e antropocêntrica. Entendendo que conhe- cer é identificar-se com, assimilar o objeto ao sujei- to, parece evidente que a dicotomia barroca (corpo e alma, luz e sombra, etc.) corresponde a dois mo- dos de conhecimento. cultismo e conceptismo: 1. Cultismo ou gongorismo - valorização de for- ma e imagem, jogo de palavras, uso de metáforas, hipérboles, analogias e comparações. Manifesta-se uma expressão da angústia de não ter fé. 2. Conceptismo ou quevedismo - valorização do conteúdo/conceito, jogo de idéias através do racio- cínio lógico. Há o uso da parábola com finalidade mística e religiosa. PADRE ANTONIO VIEIRA Nasceu em Lisboa e viveu no Brasil. Adquiriu prestígio junto à Corte por ser o confessor real. Per- seguido pela Inquisição por defender os judeus, volta ao Brasil onde passa a combater a escravidão dos indígenas e, com outros jesuítas, é expulso do Maranhão. Preso pela Inquisição, é proibido de pregar e condenado à prisão domiciliar. Sua atuação política, intimamente associada à sua obra, centralizou-se na defesa dos judeus, negros e índios. A obra do padre Vieira compreende: a) Cartas, sermões e obras de profecia (de inte- resse documental), Vieira trata de diversos assuntos relacionados à sua atuação e à questões políticas do momento em que vivia no Brasil). b) Sermões. O sermão consistia em interpretar o texto sagrado citado à cabeça do sermão. Segundo a exegética tradicional, o texto tinha quatro sentidos: o sentido literal ou histórico, o alegórico (maneira velada de manifestar uma verdade da fé), o moral (ensinamento sobre como se comportar na vida), o anagógico, relativo à outra vida. Os sermões vieirianos seguem a estrutura clás- sica tripartida: Intróito (ou exórdio), em que o orador declara o plano a utilizar na análise do tema em pauta: desenvolvimento (ou argumento), em que se apresentam os prós e os contras da proposição e os exemplos que os abonam; peroração, em que o orador finaliza a prédica conclamando os ouvintes à prática das virtudes que nela se enaltecem. Dono de uma linguagem dramática, ainda hoje a leitura dos sermões demonstram o autor e ator cheio de vigor e que surpreende a cada passo pelas respostas paradoxais que dá às perguntas que ele próprio faz ao texto pregado e a si mesmo. Uma das virtudes da eloqüência de Vieira é a chamada “propriedade”, ou a arte de encontrar as palavras mais próprias para o que se quer significar. A mais famosa criação da sua imaginação é a teoria do quinto império do mundo, sob a égide do rei de Portugal, que seria inaugurado com a segunda vin- da de Cristo a Terra e com a chegada do messias dos judeus: “seria D. João IV, quem estava destina- do a derrotar definitivamente os turcos e reconduzir os judeus dispersos no mundo à sua terra de ori- gem, a Palestina.” O quinto império tem a ver com a crença na missão providencial dos Portugueses (equivalente à dos Hebreus no seu tempo). A dou- trina do quinto império, tal como é tratadapor Vieira, especialmente na sua obra incompleta História do Futuro, tem um lado prático: obter o regresso a Por- tugal dos judeus fugidos e seus capitais. Sua imaginação verbal, e o estilo de pensar, com os seus paradoxos, aproximam o Padre Antonio Vieira de Fernando Pessoa, que o considerava seu mestre e “imperador da língua portuguesa”. D. FRANCISCO MANUEL DE MELO Deixou uma obra vastíssima em português e em castelhano, repartida por todos ou quase todos os gêneros cultivados na época, até agora só parcial- mente publicados. Suas poesias são em parte cas- telhanas, em parte portuguesas, ao gosto gongóri- co. Escreveu, ainda, nas duas línguas tratados mo- rais, o mais célebres dos quais é a Carta de Guia de Casados, muito apreciada em Portugal, porque é a expressão mais completa de um certo modelo por- tuguês de vida conjugal. Deu a sua contribuição ao teatro com O Fidalgo Aprendiz, ao gosto vicentino, mas com personagens suas contemporâneas. So- bre o Brasil escreve: “paraíso de mulatos, purgató- rio de brancos e inferno de negros”. Apostilas Solução - Professor Educação Básica – PEB II Bibliografia para Língua Portuguesa 101 PADRE MANUEL BERNARDES Nasceu em Lisboa e compôs sua obra no silên- cio claustral. Sua existência e sua obra opõem-se às do Padre António Vieira. Era um contemplativo e místico por natureza, e as obras que escreveu, re- fletem essa condição e sua fé inquebrantável: “es- creveu suas obras com os olhos voltados para o plano transcendente, embora não se esquecesse de os dirigir igualmente para os seus semelhantes, dentro e fora dos mosteiros”. Deixou Nova Floresta (5 vols), Pão Partido em Pequeninos, Luz e Calor, Exercícios Espirituais, Últimos Fins do Homem, Armas da Castidade, Ser- mões e Práticas (2 vols, 1711), Estímulo prático para seguir o bem e fugir o mal. Segundo Moisés, o Padre Manuel Bernardes tornou-se um autêntico modelo da prosa literária seiscentista através da linguagem, conceptista, ele- gante, espontânea e precisa. A HISTORIOGRAFIA. A HISTORIOGRAFIA ALCOBACENSE Observa-se nítida regressão na historiografia seiscentista. É o que se nota claramente no caso da "historiografia alcobacense", assim chamada por ser escrita por algumas gerações de sacerdotes do Mosteiro de Alcobaça. Na obra coletiva, intitula-se Monarquia Lusitana, está presente uma concepção medieval e imaginosa da História, pois “seus autores não temeram incluir tudo quanto era fábula e mitologia relacionada com a história de Portugal, a começar de Adão e Eva, ao mesmo tempo que davam por verdadeiros docu- mentos apócrifos, ou inventavam-nos quando ne- cessários ao panorama que pretendiam oferecer”. FREI LUIS DE SOUSA Antes de entrar para a vida religiosa, chamava- se Manuel de Sousa Coutinho. Nasceu em Santa- rém, por volta de 1555, e faleceu em 1632. Depois de prestar serviços a Filipe II em Espanha, regressa a Portugal e casa-se com D. Madalena de Vilhena, viúva de D. João de Portugal, desaparecido em Alcácer-Quibir com D. Sebastião. Anos mais tarde, quer a lenda que um peregrino vem ter a Lisboa para dizer a D. Manuel que o primeiro marido de D. Madalena ainda é vivo em Jerusalém. A morte da filha do casal apressa a execução dum propósito anterior, e ambos tomam hábito, ele no Convento de S. Domingos de Benfica, onde assume o nome por que é conhecido, e ela, no do Sacramento. Essa história inspirou Garrett na composição de sua tra- gédia Frei Luís de Sousa, obra-prima no teatro ro- mântico. Escreveu: Vida de D. Frei Bartolomeu dos Mártires, História de São Domingos Particular do Reino, Conquistas de Portugal e Anais de D. João III. Contrariamente aos processos empregados em Alcobaça, Frei Luís de Sousa compõe sua obra com rigor e severidade na interpretação dos fatos e do- cumentos. Linguagem castiça, fluente, plástica, evitou os excessos barrocos, procurou a sobriedade na variedade, e acabou sendo um modelo da me- lhor prosa do século XVII. A EPISTOLOGRAFIA Durante o século XVII, a epistolografia ganhou fisionomia literária autônoma, como exercício literá- rio, onde o epistológrafo imaginava um destinatário qualquer ou dirigia-se a uma audiência fictícia. SÓROR MARIANA ALCOFORADO Nasceu em Beja e ingressa no Convento de Nossa Senhora da Conceição em sua cidade natal. Conhece e enamora-se por Chamilly, oficial Fran- cês servindo em Portugal durante as guerras da Restauração e quando ele volta para a França tro- caram correspondência e suas cartas são publica- das como “Lettres Portugaises”, sem declarar o nome do destinatário e o tradutor. No texto das cartas vinha o nome da remetente: Mariana. As cartas retratam segundo Moisés, “a sincera, franca e escaldante confissão duma mulher que se desnuda interiormente para o amante cínico, ingrato e ausente, com fúria de fêmea abandonada, sem qualquer rebuço ou pudor. (...) As Cinco Cartas de Amor, escritas por uma mulher, que alcança dizer com rara precisão os seus transes íntimos (via de regra mantidos ocultos ou disfarçados pelo comum das mulheres), ganham maior relevo ainda como documento "humano" e literário precisamente por- que não visavam à publicação nem a ser encaradas como peça literária (...)”. A POESIA BARROCA A poesia barroca corresponde mais ao culto da forma, do verso, que da essência, do conteúdo, do sentimento, da emoção lírica, ao contrário da litera- tura doutrinária e moralista. A poesia barroca em Portugal apresenta-se em poetas isolados e em antologias organizadas com idêntico espírito ao que presidiu à compilação dos cancioneiros medievais. A "Fenix Renascida" e o "Postilhão De Apolo" são as duas antologias mais importantes da poesia seiscentista em Portugal. O TEATRO DO SÉCULO XVIII Após Gil Vicente, o teatro português decai, ape- sar das obras e do empenho de alguns escritores como o Fidalgo Aprendiz, de D. Francisco Manuel de Melo, voltando a brilhar com o surgimento de Antônio José da Silva, alcunhado "o judeu". Nascido no Rio de Janeiro em 1705, criou um novo tipo de teatro. Sua primeira peça, A Vida do Grande D. Quixote de la Mancha e do Gordo San- cho Pança. Em “Guerras do Alecrim e Manjerona”, ele critica e satiriza “os fidalgos pretensiosos que galanteiam as primas aperaltadas no rebuscado estilo gongóri- co enquanto de caminho apalpam os braços roliços das criadas”. Antonio José satiriza o costume e, através dele, a sociedade lisboeta nos começos do século XVIII. Apostilas Solução - Professor Educação Básica – PEB II 102 Bibliografia para Língua Portuguesa Escreveu ainda: Esopaida ou Vida de Esopo, Encantos de Medéia, Anfitrião ou Júpiter e Alcmena, Labirinto de Creta, Precipício de Faetonte, além de outras peças que lhe tem sido atribuídas, como a Ninfa Siringa, e a novela O Diabinho da Mão Fura- da. Suas peças recebem o nome de óperas, pois eram acompanhadas de música e de canto. ARCADISMO (1756-1825) As primeiras manifestações anti-barrocas vem de longe: já na Fénix Renascida começaram a apare- cer notas satíricas contra alguns exageros barrocos e em 1756 é fundada a Arcádia Lusitana (símile da Arcádia Romana, fundada em Roma, em 1690), por iniciativa de Antonio Dinis da Cruz e Silva, Manuel Nicolau Esteves Negrão e Teotónio Gomes de Car- valho. A Arcádia Lusitana vigora até 1774. Seu lema - inutilia truncat - desejam testemunhar seu repúdio às "coisas inúteis" que adornavam pe- sadamente a poesia barroca, o objetivo é restaurar a autêntica poesia clássica. Assim, empreendem uma espécie deviagem no tempo, em busca das fontes originárias do Classicismo, aceitam o pasto- ralismo e a poesia camoniana, por coincidirem com o ideal que eles, os árcades, pretendem realizar. Vão em busca da Antiguidade greco-latina, na ideal e mitológica Arcádia, região grega de pastores e poetas vivendo em meio a uma natureza sempre idílica, localizam seus sonhos de plenitude poética. Trata-se de um exílio voluntário, uma vida em "torre- de-marfim". Segundo Moisés “é com base no mito da Arcádia que erguem suas doutrinas (...) procuram realizar obra semelhante à dos clássicos antigos (...) imita- rão dos modelos greco-latinos (...) elogio da vida simples, sobretudo em face da natureza, no culto permanente das virtudes do espírito; fuga da cidade para o campo (fugere urbem), pois a primeira é con- siderada foco de mal-estar e corrupção; desprezo do luxo, das riquezas e de todas as ambições que enfraquecem o homem; elogio da vida serena, plá- cida, pela superação estóica de todos os apetites menores; elogio da velhice como exemplo desse ideal tranqüilo da existência, da aurea mediocritas; elogio da espontaneidade primitiva, pré-civilizada; por outro lado, o gozo pleno da vida, minuto a minu- to, na contemplação da beleza e da natureza, pres- supõe certo epicurismo, que equilibra as tendências estóicas do movimento; por fim, a incidental presen- ça da Virgem Maria se explica por sua condição de neoclássicos católicos. Seguem os modelos antigos (defendem a sepa- ração de gêneros, a abolição da rima, o emprego de metros simples, o despojamento do poema, a impor- tância da mitologia), ao mesmo tempo em que pro- curam aproveitar-se da orientação racionalista de teóricos do tempo. Para que o "fingimento" poético seja completo, imaginam-se vivendo num mundo habitado por deu- ses e ninfas, numa natureza e num tempo absolu- tamente fictícios e adotam pseudônimos pastoris. POETAS DA ARCÁDIA LUSITANA Os poetas da Arcádia Lusitana são figuras meno- res em comparação com os poetas de outras esco- las portuguesas. António Dinis da Cruz e Silva, cujo pseudônimo arcádico era Elpino Nonacriense, foi juiz durante o inquérito em torno da Inconfidência Mineira, escre- veu Poesias (6 vols.), Metamorfoses (doze) em que o poeta mitifica a natureza brasileira, misturando realidade observada com imaginação e lenda. His- sope, poema herói-cômico em que faz a sátira do espírito feudal, escolástico e clerical. Pedro Antonio Correia Garção, ou Córidon Eri- manteu, mesclando a influência clássica com a qui- nhentista, nos legou: Obras Poéticas, Discursos Acadêmicos (proferidos nas reuniões da Arcádia Lusitana onde espelha suas principais idéias acerca das doutrinas arcádicas). O principal de sua obra é o teatro, para o qual escreveu a comédia Teatro Novo, e a comédia de costumes intitulada Assem- bléia ou Partida. A NOVA ARCADIA Fundada em 1790 por Domingos Caldas Barbo- sa tem como companheiros Belchior M. Curvo Se- medo, J. S. Ferraz de Campos e Francisco J. Bin- gre, Bocage, José Agostinho de Macedo, Luís Cor- reia França e Amaral, Tomás Antonio dos Santos e Silva, e outros. Predominou na Nova Arcádia a ora- tória e a poesia, desaparecendo divergências inter- nas, sobretudo entre Macedo e Bocage, em 1794. OS DISSIDENTES Outras arcádias existiram como a Arcádia Portu- ense, a Arcádia Conimbricense e os Árcades de Guimarães, além Arcádia Ultramarina, organizada em Minas Gerais, por Cláudio Manuel da Costa. Paralelamente, alguns poetas renegaram a Ar- cádia (como Bocage), ou fundaram outras agremia- ções para combatê-la (como Filinto Elísio, líder do Grupo da Ribeira das Naus), enquanto outros cria- ram obra autônoma, de onde o nome "dissidentes" ou "independentes", que por suas características podem ser classificados como pré-românticos, es- pecialmente a José Anastácio da Cunha, a Marque- sa de Alorna e Bocage. Filinto Elísio, pseudônimo arcádico do Pe. Fran- cisco Manuel do Nascimento é considerado o último legítimo árcade. Freqüentou a roda literária da mar- quesa de Alorna. Foi um dos autores da “guerra dos poetas”, ao lado do chamado “grupo da Ribeira das Naus”. Preceptor da futura Marquesa de Alorna e de sua irmã, cai na desgraça da Inquisição e evade-se para Paris, onde vive até o fim da vida e publica sua obra poética: Versos de Filinto Elísio. Pré-romântico pelo tom confessional de alguns poemas exerceu notável influência em vida e depois da morte, inclusive em Garrett. Em posição semelhante se coloca a Marquesa de Alorna (Leonor de Almeida de Portugal Lorena e Lencastre), adotou o pseudônimo de Alcipe. Apostilas Solução - Professor Educação Básica – PEB II Bibliografia para Língua Portuguesa 103 Importante pela vida que levou e pela atividade sócio-literária que exerceu, inclusive por influência à obra de Alexandre Herculano. Sua poesia, publi- cada em 1844, Obras Poéticas, oscila entre o culto dos clássicos e o dos românticos. BOCAGE O maior poeta do século XVIII português foi Ma- nuel Maria de Barbosa du Bocage, concorrente de Camões na vida e na obra. Foi membro da Nova Arcádia, teve uma vida aventurosa e inquieta, que ele próprio comparou com a de Camões, de quem admirava o lado “romântico” (avant la lettre) da sua vida e obra. Bocage foi talvez o autor dos melhores sonetos da língua portuguesa depois do seu mode- lo, foi também grande repentista e improvisador em assembléias e tornou-se efetivamente o autor mais popular e mais lembrado em Portugal até hoje, tal- vez por certa facilidade de verso e por certa vulgari- dade de situações em que se apresenta. Os român- ticos consideraram-no seu precursor e Herculano resumiu, provavelmente, um juízo coletivo quando escreveu que Bocage trouxe a poesia dos salões para a praça pública. Morre na miséria e arrependi- do pela vida desregrada que levou. Seu pseudôni- mo arcádico era Elmano Sadino, formado com as letras do seu prenome e do rio Sado, que banha Setúbal, sua terra natal. Em sua vida, Bocage publi- cou Idílios Marítimos recitados na Academia das Belas-Artes de Lisboa e as Rimas. Postumamente, Obras Poéticas e Verdadeiras Inéditas Obras Poéti- cas. Segundo Moisés “existem dois Bocages: o que o vulgo fixou através de anedotas, verdadeiras al- gumas e falsas outras, mas todas raiando na obs- cenidade grosseira, e o que a tradição literária nos legou. Este é que importa, pois o primeiro segue trajetória secundária e infensa a qualquer configura- ção, visto o povo atribuir-lhe todos os ditos picantes que, não tendo paternidade conhecida, devem for- çosamente pertencer a alguém. (...) O segundo Bocage escreveu uma vasta obra poética fracionada em dois sectores fundamentais: o satírico e o lírico. Quanto ao primeiro, Bocage alcançou ser estrela de primeira grandeza, ao lado dum Gregório de Matos, graças ao temperamento agressivo, impulsivo, cor- tante, amparado no dom da improvisação feliz e certeira. Contudo, a sátira ocupa lugar menos rele- vante em sua obra, seja porque de cunho pessoal e bilioso, seja porque dura tanto quanto o aconteci- mento que lhe dá causa e sentido”. VII – ROMANTISMO (1825-1865) O Romantismo é a expressão literária e plástica da consciência burguesa. Acredita no progresso, porque o progresso foi a mola econômica da bur- guesia; entoa o canto da liberdade, porque para o burguês parece evidente que a liberdade não é se- não o exercício do poder por ele próprio; exalta o sentimento contra a barreira das convenções, por- que o sentimento é ele e as convenções são as sobrevivências das barreiras sociais que ainda se opõem à sua caminhada triunfal; inventa a alma do povo, ou o espírito nacional, porque se considera
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