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GERONTOLOGIA v. 10 – n. 2 São Paulo dez., 2007 GERONTOLOGIA v. 10 – n. 2 revista Kairós, São Paulo, 10(2), dez. 2007, pp. 1-267 ISSN 1516-2567 Ficha Catalográfica elaborada pela Biblioteca Reitora Nadir Gouvêa Kfouri/PUC-SP“ Revista Kairós : gerontologia / Núcleo de Estudo e Pesquisa do Envelhecimento. Programa de Estudos Pós-Graduados em Gerontologia – PUC-SP. Ano 1, n. 1 (1998) – São Paulo : EDUC, 1998- Anual até 2000 Semestral a partir de 2001 (v. 4, n. 1) Cadernos Temáticos: Estética e envelhecimento (2002); Psicogerontologia: contribuições da psicanálise ao envelhecimento (2002); Memória Viva-Cidadania Ativa (2005). ISSN 1516-2567 1. Gerontologia – Periódicos. I. Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Núcleo de Estudo e Pesquisa do Envelhecimento (NEPE). Programa de Estudos Pós-Graduados em Gerontologia. CDD 618.97005 Publicação do Programa de Estudos Pós-Graduados em Gerontologia – PUC-SP Indexada no Index Psi Periódicos (www.bvs-psi.org.br); na base de dados LILACS – Literatura Latino- Americana e do Caribe em Ciências da Saúde/BIREME e na base de dados em Ciências Sociais e Humani- dades CLASE (UNAM – México). Editoras Responsáveis Beltrina Côrte e Suzana A. Rocha Medeiros Editora Assistente Vera T. Brandão Secretária Maria Bernadete Maciel Correia Conselho Alexandre Kalache (Ageing and Life Course Noncommunicable Diseases Prevention and Health Promotion (NPH) World Health Organization, Geneva), Andre Chevance (Université de Picardie Jules Verne/Faculté de Philosophie Sciences Humaines et Sociales), Anita Liberalesso Neri (Unicamp), Diana Singer (Universi- dad Maimónides/Argentina), Ecléa Bosi (USP), Edvaldo Souza Couto (UFBA), Jack Messy (Université Paris 12/França), José Ferreira-Alves (Universidade do Minho/Portugal), Maria de Lurdes Quaresma (Gerontologia Social do ISSSL/Portugal), Marília Smith (Unifesp/EPM), Nara Costa Rodrigues (ANG), Sára Nigri Goldman (UFRJ), Sergio Antonio Carlos (UFRS), Teresinha da Silva (Harvard University), Vani Moreira Kenski (USP), Verónica Montes de Oca (Instituto de Investigaciones Sociales/México) Pareceristas Adriana Frohlich Mercadante (UF do Paraná), Amparo Caridade (Unicap/PE), Ana Maria Ramos Sanchez Varella (Unip/SP), Ângela Machado (USP/SP), Célia Pereira Caldas (UnATI/RJ), Delia Catullo Goldfarb (Cogeae/SP), Deusivania Vieira da Silva Falcão (USP/SP), Edvaldo Souza Couto (UFBA/BA), Elisabeth F. Mercadante (PUC/SP), Eucenir Fredini Rocha (USP/SP), Jacy Marcondes Duarte (UNISA/SP), Leila Marrach Basto de Albuquerque (Unesp/Rio Claro), Liliana Souza (UA/Portugal), Marcia Pontes Mendonça (UFSC/SP), Maria das Graças Leal (Sedes Sapientiae/SP), Maria Helena Villas Boas Concone (PUC/SP), Marisa Pereira Gonçalves (UnB/DF), Nadia Dumara Ruiz Silveira (PUC/SP), Otávio de Tolêdo Nóbrega (UCB/DF), Pedro Celso Campos (Unesp/Bauru), Ricardo Iacub (Universidade de Buenos Aires/Argentina), Rosa Helena Porto Gusmão (FEMB/PA), Rosa Maria da Exaltação Coutrim (UFOP/PE), Rosana Soares Lima (USP/SP), Roseli Vasconcelos (Uniban/SP), Ruth G. da Costa Lopes (PUC/SP), Sergio Antonio Carlos (UFRGS/RS), Silvana Tótora (PUC/SP), Suzana A. Rocha Medeiros (PUC/SP), Tomiko Born (SBGG), Ursula Karsch (PUC/SP), Vânia Gico (UFRN/RN), Vera Lúcia dos Santos Alves (Santa Casa/SP), Vicente Faleiros (UCB/DF), Virginia Viguera (FHCE-UNLP/Argentina), Vitória Kachar (IMES/ABC), Wania Regina Lima (UFP/Portugal), Wilson Madeira Filho (UFF/RJ) EDUC – Editora da PUC-SP Direção Miguel Chaia Coordenação Editorial Sonia Montone Revisão de Textos em Português Sonia Rangel Revisão de Textos em Inglês Carolina Siqueira M. Ventura Editoração Eletrônica Waldir Antonio Alves William Martins Capa Sara Rosa Secretário Ronaldo Decicino Rua Monte Alegre, 971 – sala 38CA 05014-001 – São Paulo – SP Tel./Fax: (11) 3670-8085 E-mail: educ@pucsp.br Site: www.pucsp.br/educ A revista Kairós, surgida em 1998, é o resultado da dedicação e do empenho de um grupo de pesquisadores ligados ao Núcleo de Estudo e Pesquisa do Envelhecimento (Nepe) e ao Programa de Estudos Pós-Graduados em Gerontologia, da PUC-SP, com o objetivo de publicar estudos relacionados ao tema envelhecimento. Ela funda-se na interdisciplinaridade, pretendendo romper com concepções estereotipadas e fragmentadas. Seu propósito primordial concentra-se na busca de uma visão de síntese, considerando a velhice como totalidade. Pretende ser um veículo de divulgação de um novo saber relativo ao processo de envelhecimento e da velhice e está aberta à participação de todos os estudiosos que, com suas reflexões, ajudem a superar a carga pejorativa que tem acompanhado essa etapa da vida humana. O nome dado à revista é uma homenagem ao professor Joel Martins, que demons- trou com sua vida que o ser humano pode sempre se desenvolver. Que não somos apenas Cronos, um tempo determinado, mas Kairós, energia acumulada pelas experiências vividas. Em 2001, a revista, que era anual, passa a ser semestral e, a partir de então, toda edição lançada em junho ganha uma apresentação editorial diferenciada, uma vez que sempre será a socialização dos resultados obtidos, sistematizados e impressos das Semanas de Gerontologia, eventos realizados anualmente pelo próprio Programa e que fazem parte de um novo método de trabalho acadêmico, a partir da troca de idéias e a permanência da crítica intelectual ante os desafios que nos impõe a longevidade. Portanto, um dos números, sempre o ímpar (n. 1), da revista, que tem a intenção de resgatar e atualizar o papel da teoria a partir de debates, mesas-redondas, depoi- mentos, histórias de vida, etc., em uma perspectiva interdisciplinar, terá um formato editorial diferente, não diferindo, contudo, no plano da preocupação teórico-intelectual das revistas científicas em Ciências Humanas, que incluem artigos, pesquisas, resenhas, como se enquadra a edição número par da Revista Kairós. Revista Kairós Caderno Kairós O Caderno Temático da revista Kairós é mais uma modalidade de apresentação dos trabalhos desenvolvidos no Programa de Estudos Pós-Graduados em Gerontologia, da PUC-SP. Ele nasce com a intenção de ser um veículo de fácil circulação, ágil e de leituras temáticas, buscando refletir sobre as múltiplas dimensões do envelhecimento e da velhice vivida. Longe de representar qualquer solução de continuidade ante o perfil já consagrado da revista, o lançamento de edições centradas na análise e reflexão de temas específicos é uma resposta, do Programa, às demandas explicitadas, em várias ocasiões, por alunos, professores e por muitos dos que participam das atividades promovidas pelo Nepe. Dentre os objetivos dos números temáticos, ocupa lugar central a socialização dos exercícios interdisciplinares realizados por diversas atividades do Programa, alicerçados em três dimensões da existência humana – Família, Comunidade e Estado. Espaços especialmente ricos, criativos e estimulantes que buscam a edificação de um novo saber sobre a velhice e o processo de envelhecimento. Exercícios que vêm perseguindo, ao longo do tempo, a difícil tarefa de promover a superação das tradicionais fronteiras que separam e isolam os saberes específicos. Por isso, os artigos reunidos em cada número do Caderno Temático da revista Kairós devem ser pensados como parte de um movimento que, estreitamente afinado às diretrizes que norteiam o Programa de Estudos Pós-Graduados em Gerontologia, orienta-se na e pela construção de um pensamento complexo. De um pensamento que, em nome da recomposição do todo, sabe, como bem salientou Edgar Morin, que não é nem onisciente, nem completo, nem certo; que é sempre local, situado que está em um tempo e um lugar. As opiniões emitidas não expressam necessariamente a posição da revista/caderno. Reprodução permitida desde que citada a fonte. Política editorialA revista Kairós tem se consolidado como um veículo de divulgação de um novo saber relativo ao processo de envelhecimento, promovendo uma outra percepção da velhice, a qual procura entender o sentido dessa etapa da vida humana muito além das fronteiras da biologia, da genética e da fisiologia. A proposta editorial da revista/caderno temático Kairós funda-se, portanto, na interdisciplinaridade a partir da troca de idéias e do exercício da crítica intelectual ante os desafios que nos impõe a velhice como totalidade e a longevidade, concentrando-se na busca de uma visão de síntese, uma vez que se orienta na e pela construção de um pensamento complexo. A publicação periódica de artigos que trazem o universo novo de co- nhecimento gestado pela Gerontologia e que fazem uma reflexão sobre essas etapas da existência humana tem resgatado e atualizado o papel da teoria a partir de debates, mesas-redondas, depoimentos, histórias de vida, relatos, além de artigos, pesquisas e resenhas. Editorial 9 revista Kairós, São Paulo, 10(2), dez. 2007, pp. 1-267 Sumário Editorial ......................................................................................13 Artigos (Articles) Medo de envelhecer ou de parecer? ...............................................19 (Fear of growing old or of looking old?) Maria Helena Villas Bôas Concone Um breve ensaio sobre a aceitação da beleza na efemeridade dos corpos ...........................................................45 (A brief essay on the acceptance of beauty in the ephemeralness of the bodies) Marilda Silveira Lopes, Rodrigo Caetano Arantes e Ruth Gelehrter da Costa Lopes Verdejar-envelhecer: que combinação é essa? ................................63 (Turning green – aging: what combination is this?) Adriana Barin de Azevedo e Ricardo Niquetti Imagens cinematográficas da velhice: um enfoque gerontológico ...........................................................75 (Movie images of old age: a gerontological approach) Denise Mendonça de Melo, Fabiana Regina Chinaglia de Freitas Di Nucci e Paula Casalini Domingues 10 Editorial revista Kairós, São Paulo, 10(2), dez. 2007, pp. 1-267 A velhice não contemplada: invisibilidade das demandas sociais da pessoa idosa em Fernando de Noronha – Nordeste do Brasil .......................................................................91 (The invisibility of the social demands of the elderly in Fernando de Noronha – Northeast of Brazil) Sálvea de Oliveira Campelo e Paiva, Eduardo Maia Freese de Carvalho e Carlos Feitosa Luna Conselhos de Representação: espaços para os idosos se organizarem na defesa de seus direitos ....................................107 (Representation Councils: spaces for the social organization of the elderly in the defense of their rights) Márcia Aparecida Fraga Bernardes Educação permanente na atenção à saúde de idosos ....................123 (Permanent education in the care of aged patients) Maria Cristina Pedro Biz e José Antonio Maia Formador de formador: características educacionais e profissionais de acadêmicos que ensinam na formação continuada stricto sensu em Gerontologia no Brasil ......................135 (Teacher of educators: The educational and professional characteristics of academics teaching post-graduate courses on gerontology in Brazil) Tereza Lins O impacto da informática na vida do idoso ................................153 (The impact of information technology on the life of the elderly) Rosana Alfinito Kreis, Vicente Paulo Alves, Carmen Jansen Cárdenas e Margô Gomes de Oliveira Karnikowski Lazer e tempo livre na “terceira idade”: potencialidades e limites no trabalho social com idosos .......................................169 (Leisure and free time in “third age”: potentialities and limits in the social work with aged people) Solange Maria Teixeira Editorial 11 revista Kairós, São Paulo, 10(2), dez. 2007, pp. 1-267 Implicações psicossociais do envelhecimento: o caso da cirurgia de revascularização do miocárdio em mulheres idosas .................189 (Psychosocial Implications of Aging: the case of myocardial revascularization surgery on aged women) Patrícia Fonseca Caetano da Silva e Célia Pereira Caldas Perfil clínico-demográfico dos pacientes inseridos em um programa de assistência domiciliária no município de São Paulo ....205 (Clinical and demographic profile of patients assisted by a homecare program in the city of São Paulo) Carina Corrêa Bastos, Naira Dutra Lemos e Andréia Nóbrega Mello Qualidade de vida em um grupo de idosos de Veranópolis ..........225 (Quality of life in a group of elderly people from Veranópolis) Waleska P. Farenzena, Irani de L. Argimon, Emílio Moriguchi e Mirna W. Portuguez A importância do bom funcionamento do sistema mastigatório para o processo digestivo dos idosos ...........................................245 (The importance of the good functioning of the masticatory system for the digestive process of the elderly) Fernando Luiz Brunetti Montenegro, Leonardo Marchini, Ruy Fonseca Brunetti e Carlos Eduardo Manetta Resenha (Review) A roda da vida ...........................................................................259 (The wheel of life) Lenina Lopes Soares Silva Normas para publicação ............................................................265 Editorial 13 revista Kairós, São Paulo, 10(2), dez. 2007, pp. 13-17 Editorial Organizar uma edição é sempre tarefa árdua. Primeiro, poucos são os editores científicos (raríssimos) remunerados para executar tal trabalho. Segundo, separar um tempo (e que tempo) para isso, entre orientações, aulas, casa e filhos (especialmente as mulheres), não é fácil. Fins de semana, feriados e muitas noites devoram esse fazer. Tudo por amor à ciência. No caso, à Gerontologia, que tem no Brasil raríssimas publicações. E que devoção! Organizar uma revista científica conta pou- co ou quase nada para a produção individual do pesquisador/editor. Assumido o trabalho (quase sempre solitário) de edição, o editor fica às voltas com vários artigos. Muitos não entram por problemas de espaço e de prioridade, outros, por questão de qualidade. Todos querem publicar, pois hoje essa produção é muito valorizada no meio acadêmi- co. Apesar das dificuldades esta é uma etapa enriquecedora, quando e-mails vão e voltam entre pareceristas, editores e autores, na tentativa de sempre melhorar o texto, de torná-lo mais compreensível, completo e agradável. Uma vez selecionados os artigos, passa-se à outra fase, organizando-os em uma ordem de leitura. Qual deles colocar em primei- ro lugar? Como traçar um caminho a ser percorrido pelos leitores? Essa é uma empreitada difícil, uma vez que, ao se falar em envelhecimento e velhice, tudo parece ser prioritário. Mas não dá para pensar muito, pois os prazos de gráfica e editora pressionam. Como fazer? Nesta edição, os artigos foram organizados por temas afins. 14 Editorial revista Kairós, São Paulo, 10(2), dez. 2007, pp. 13-17 É assim que abrem a revista as reflexões de uma antropóloga que envelhece e rejeita cada vez mais as secas reflexões que parecem colocar o ser humano sob um microscópio, como se não fizéssemos parte daquilo que analisamos. Trata-se do artigo intitulado “Medo de envelhecer ou de parecer?” Nele a autora tece considerações sobre o medo do envelhecer apoiadas em experiências, conversas e crônicas, embora não exclusivamente, para depois buscar uma abordagem mais acadêmica, mas que complete, uma vez que mergulho e descolamento são complementares. Reflexão que, em “Verdejar-envelhecer: que combinação é essa?”, discorre sobre o envelhecimento como acontecimento em cujo contexto a velhiceé traçada a partir de uma noção de envelhecer associada à de verdejar, a qual propicia meios de criar saúde na produção de diferentes modos de vida. Como é o caso de “Um breve ensaio sobre a aceitação da beleza na efemeridade dos corpos”, texto que identifica a relação entre a beleza corporal e a longevidade por meio dos paradigmas que ligam o culto do corpo e a estética da beleza nas relações sociais. Nessa perspectiva, a opinião dos idosos é essencial para uma compreensão do significado da beleza nesse momento de suas vidas. Não só. O significado da velhice pode ser dado também pela conjugação do conhecimento gerontológico com as influências cultu- rais da produção cinematográfica, articulando as diversas facetas do envelhecimento humano na complexidade de seus aspectos biológicos, psicológicos e sociais. É o que trata o artigo “Imagens cinematográficas da velhice: um enfoque gerontológico”, tendo como referencial as teorias life-span e life-course, com a exposição imagética da velhice, no início do século XXI, por meio do filme Lições para toda vida. Não devemos falar em velhice, mas em velhices. E é delas que trata o texto “A velhice não contemplada: invisibilidade das deman- das sociais da pessoa idosa em Fernando de Noronha – Nordeste do Brasil”. O artigo apresenta informações epidemiológicas e reflexões sobre os padrões e as desigualdades no processo de envelhecimento com base em uma pesquisa e uma leitura crítica, analisando o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), a prevalência de déficit cogni- Editorial 15 revista Kairós, São Paulo, 10(2), dez. 2007, pp. 13-17 tivo, as taxas de envelhecimento e condições de vida encontradas na ilha. Tópicos que reforçam o tom de invisibilidade e negligência das demandas sociais do segmento mais velho da população no conteúdo das políticas públicas do país. Bases fundamentais para o surgimento de organizações sociais que fortalecerão o segmento, destacando o grande valor dos Conselhos de Representação como espaços de participação e mobilização do idoso na defesa de seus direitos. Por isso, o artigo “Conselhos de Representa- ção: espaços para os idosos se organizarem na defesa de seus direitos” observa as normas jurídicas no Estado Democrático de Direito, que têm, entre outros objetivos, regular o convívio social, estabelecer obrigações e direitos no relacionamento interpessoal e na relação das pessoas com o Estado. Independentemente do seu conteúdo, a aplicação efetiva das normas jurídicas é que vai determinar seu alcance, sua relevância. Já o artigo “Educação permanente na atenção à saúde de ido- sos” discute a formação de profissionais na atenção à saúde do idoso. Com base na escuta de gestores da saúde e na análise dos dados con- frontados com a literatura, evidenciaram-se dois eixos norteadores: qualidade de vida e competência profissional. A inter-relação dos dois eixos pode constituir uma estratégia operacional de capacitação profissional permanente. É o que, em certa medida, o artigo “Formador de formador: características educacionais e profissionais de acadêmicos que ensinam na formação continuada stricto sensu em Gerontologia no Brasil” procura analisar. Esse estudo apresenta resultados de pesquisa realizada sobre o perfil do formador de formadores da formação continuada em Geronto- logia no Brasil, com base em dados de acervo documental. Os resultados mostram que os formadores de formadores apresentam muitas caracte- rísticas em comum e que, no Brasil, há indícios de um “perfil-tipo” do formador de profissionais educadores de adultos maiores, que ensinam nos cursos de Gerontologia stricto sensu. Cursos que têm como propó- sito final atingir as pessoas idosas, grupo emergente obrigado a lidar diariamente com a proliferação das tecnologias comunicacionais. Daí o interesse em saber qual é “O impacto da informática na vida do idoso”. 16 Editorial revista Kairós, São Paulo, 10(2), dez. 2007, pp. 13-17 Esse texto aborda as transformações das tecnologias de comunicação e de informação, uma vez que elas têm despertado um grande interesse entre os idosos quanto ao aprendizado, especialmente da informática, considerando os benefícios que pode oferecer às suas vidas. Muitas vezes, esse aprendizado se dá na ocupação do tempo livre ou como simples lazer, como abordado no artigo “Lazer e tempo livre na ‘terceira idade’: potencialidades e limites no trabalho social com idosos”, apresenta uma crítica aos programas dirigidos à terceira idade que visam a ocupação do tempo livre com atividades de lazer e recreação com base nas crítica aos fundamentos teóricos e ideológicos que os orientam e de onde emanam as potencialidades no trabalho social com idosos. A compreensão dos significados e impactos da intervenção cirúr- gica também faz parte desta edição, que procura também identificar as “Implicações psicossociais do envelhecimento: o caso da cirurgia de revascularização do miocárdio em mulheres idosas”. Com base em uma revisão da literatura científica, esse texto contribui para um co- nhecimento que objetiva a promoção de condições para o tratamento de idosas que necessitam realizar essa complexa cirurgia. Procura-se também identificar as características clínicas e demo- gráficas de pacientes inseridos no Programa de Assistência Domiciliar ao Idoso (PADI), discutido no artigo “Perfil clínico-demográfico dos pacientes inseridos em um programa de assistência domiciliária no município de São Paulo”, por meio de um estudo transversal descriti- vo feito mediante um questionário baseado no material de avaliação multiprofissional inicial do programa. São estudos que procuram verificar também o bem-estar do segmento idoso, como é o caso do artigo “Qualidade de vida em um grupo de idosos de Veranópolis”, o qual, por meio do WHOQOL-Bref, avaliou um grupo e seus resultados apontaram ter ele boa qualidade de vida por realizar atividades de lazer, não utilizar medicação diária e estar livre de sintomas depressivos. E, por último, esta edição assi- nala “A importância do bom funcionamento do sistema mastigatório para o processo digestivo dos idosos”, fazendo uma correlação entre a importância da boa função dentária e sua capacidade na ingestão de Editorial 17 revista Kairós, São Paulo, 10(2), dez. 2007, pp. 13-17 nutrientes-chave, de vital necessidade para o estado de saúde geral que permitirá ao idoso enfrentar as prováveis vicissitudes da terceira idade. Encerramos este número com a resenha “A roda da vida”, pois pensar a vida como uma roda é, com certeza, refletir sobre a circularidade dos movimentos das pessoas vivas, em especial daquelas que ficaram vivificadas em nossa memória e, de certa forma, compreender a vida como uma travessia entre o nascimento e a morte, sem que esta última signifique um fim. É nesse sentido que a médica psiquiatra Elisabeth Kübler-Ross (1926- 2004), suíça radicada nos Estados Unidos traduz sua vida na autobiografia intitulada A roda da vida: memórias do viver e do morrer. Memórias que, certamente, percorremos cotidianamente e traça- mos no nosso processo de envelhecer. Como cada um de nós a trilhará é outra história, que contaremos no próximo número. Não deixe de ler! Beltrina Côrte Suzana A. Rocha Medeiros Vera Brandão revista Kairós, São Paulo, 10(2), dez. 2007, pp. 19-44 Medo de envelhecer ou de parecer? Maria Helena Villas Bôas Concone1 RESUMO: com base em reflexões de uma antropóloga que envelhece e rejeita cada vez mais as secas reflexões que parecem nos colocar sob um microscópio, como se não fizéssemos parte daquilo que analisamos, este artigo tece considera- ções sobre o medo do envelhecer apoiadas em experiências, conversas e crônicas, embora não exclusivamente, para depois buscar uma abordagem complementar, mais acadêmica. Momento de mergulho/deslocamento.Palavras-chave: medo; envelhecer; parecer. ABSTRACT: Based on reflections of an anthropologist who is growing old and rejects the arid reflections that seem to put us under a microscope, as if we were not part of what we analyze, this article discusses the fear of growing old based on experiences, conversations and narratives. Then, it searches for an academic approach that can complete the author’s ideas on the subject, as immersing and distancing oneself are complementary actions. Keywords: fear; to grow old; to look old. Dividi este artigo em três tópicos. Começo com algumas consi- derações menos comprometidas com referências bibliográficas e mais apoiadas em experiências, conversas e crônicas, embora não exclusiva- mente. No segundo e no terceiro tópicos buscarei uma abordagem mais acadêmica. Mas são partes que se completam, mergulho e descolamento são complementares. Rejeito cada vez mais as reflexões secas que pa- recem nos colocar sob um microscópio, como se não fizéssemos parte 1 Agradeço aos alunos da minha classe do Pós em Gerontologia, de 2007, pelas contribuições ao texto. 20 Maria Helena Villas Bôas Concone revista Kairós, São Paulo, 10(2), dez. 2007, pp. 19-44 daquilo que analisamos. Vejo a antropologia, que enriqueceu minha vida intelectual e pessoal, como ciência, busca de interpretação, disciplina e forma de pensar, instrumento que ajuda a refletir e viver. Se as nossas opções intelectuais ou acadêmicas se mantiverem apenas nesse nível, isoladas do cotidiano, serão opções de superfície, estéreis. Desse modo, quero justificar a forma deste texto e avisar que não se trata, ou não se trata exclusivamente, de uma reflexão antropológica sobre o envelhecimento, mas sim de reflexões de uma antropóloga que envelhece. Medo de envelhecer Um pequeno evento recente pode servir de ponto de partida para algumas ponderações. Na nossa Universidade, como em muitas outras, há os famosos cursos para a terceira idade. Dois dias na semana, os elevadores lotam de senhoras (sobretudo elas) de várias idades e formas, bem arrumadas, cabelos azuis, unhas feitas. Entram e lotam, adonando-se, visivelmente alegres, dos espaços universitários, para irritação mal contida, quando não sarcástica, dos usuários habituais. Em um desses dias, num horário tranqüilo, estava eu no elevador, quando entraram duas mulheres: uma jovem, evidentemente aluna, e outra nem tanto, professora da área de pós-graduação. Esta última entrou comentando com desaprovação a questão dos elevadores lotados pela “turma da terceira idade”. Disse então (talvez numa meia desculpa): “Resolvi ser solidária e ceder lugar, porque afinal mais um pouco eu também estarei lá”. Sem dúvida, seu pertencimento não parecia nada distante. Essa postura, evidentemente, não é privilégio das universidades. Ouvi de uma mulher, empregada doméstica, que declarava orgulhosa seus insuspeitados 54 anos, reclamação equivalente: “Por que essa ter- ceira idade não toma ônibus em outro horário? Por que ‘os velhinhos’ vão no horário de ônibus cheio, quando a gente tá cansada?” O que esses episódios cotidianos podem revelar? Medo de envelhecer ou de parecer? 21 revista Kairós, São Paulo, 10(2), dez. 2007, pp. 19-44 Primeiro, que “velho” ou “da terceira idade” é o outro; nos casos acima, é aquele outro “fora do lugar”, que ocupa “os nossos espaços”, que incomoda. Ora, é inegável que os idosos estão na universidade porque esta – por numerosas razões – abriu a eles seus espaços. Por princípio, têm tanto direito de estar lá quanto qualquer outro aluno. Por que então nos incomodam tanto? É inegável também o direito de qualquer pessoa tomar o ônibus no horário que for necessário; é pouco provável que “os velhinhos” escolhessem propositalmente o horário do rush para tomar o ônibus. Mas, e se fosse esse o caso? Poderíamos estranhar a preferência, mas nunca negar o direito de ir e vir (no caso, provavelmente, com desconforto semelhante ao dos demais). Por que seriam “os velhinhos” mais responsáveis que outros passageiros pelo ônibus lotado? O que nos incomoda? Seguramente, não é a eventualidade de ter que ceder lugar; isso praticamente não acontece. Comentando esses fatos com uma gerontóloga, ela devolveu retoricamente a pergunta – “o que nos incomoda tanto?” – e respondeu ela mesma: “Creio que é medo da morte”. Em outras palavras, a presença de idosos “nos nossos espaços” nos confrontaria com a passagem do tempo para nós próprios, nos obrigaria a encarar nossa fragilidade e nossa finitude. A morte atemoriza-nos e a passagem dos anos aproxima-nos dela. Parafraseando Marx, estamos habituados a pensar (ou teorizar) sobre a “morte em si”, dificilmente sobre a morte “para si”. Negar o idoso de carne e osso seria negar a finitude. De carne e osso porque o “idoso idealizado” é objeto de respeito, “pela sabedoria acumulada”, pela “experiência”, pela “memória”. A idealização do idoso é a contrapartida e o reforço da negação de fato. Nessa linha de idealização respeitosa jamais entraria em consideração que um idoso no ônibus na hora do rush pudesse ser, por exemplo, um “velho batedor de carteiras”... Por quê? Porque parece um contra-senso. Afinal é um idoso, por definição indefeso e “bom”. No idoso de carne e osso, entretanto, a sabedoria é relativa, a experiência ultrapassada, a memória repetitiva e a bondade cansativa ou inexistente. 22 Maria Helena Villas Bôas Concone revista Kairós, São Paulo, 10(2), dez. 2007, pp. 19-44 Creio que, realmente, o medo da morte deva ser um aspecto de especial preocupação do gerontólogo (para me limitar a esse pro- fissional). De fato, a não ser em casos especiais (grupos com pacientes terminais), a morte não é assunto de discussão. Familiares, por exemplo, não costumam falar da morte ou raramente sentem-se aptos a tocar no assunto. Afinal, “não se fala em corda em casa de enforcado”... É preciso disfarçar, animar, “pôr para cima”. Há, entretanto, outras razões para o temor do envelhecimento. Outras razões socioculturais. É dessas que quero falar mais à frente. Por agora, uma última excursão pela conhecida verdade de que “velho é o outro”. Uma deliciosa crônica de Fernando Veríssimo no “Estadão” (10 de setembro de 2006), começa assim: “O primeiro sinal foi quando uma senhora se levantou para me dar o lugar num ônibus”. Continua com o estranhamento do autor, que diz, mais adiante: “A partir daí, passei a notar que as pessoas me tratavam de um modo diferente.(...). Cheguei a desenvolver algumas teorias. (...) Finalmente, na semana passada, tudo se esclareceu”. Conta então que, no Rio, tendo tomado um táxi para ir do aeroporto ao hotel, o carro teve um problema e “parou na ensolarada Lagoa”; o motorista, pelo rádio, pediu ajuda a outro táxi e enfatizou a urgência da situação: “Estou aqui com um idoso debaixo do sol”: “Olhei em volta. Idoso? Onde estava o idoso? E então tive a revelação. O idoso era eu!” Essa crônica lembra história semelhante, contada com humor por uma professora amiga. Também nesse caso a revelação do “estado de idoso” veio dos outros. Todos nós, que chegamos no limiar da ve- lhice (velhice, aliás, tem limiar?) já vivemos, num momento ou outro, “revelações” semelhantes: um braço não solicitado que nos apóia na escada, um lugar oferecido no ônibus (raro, mas pode acontecer) ou, finalmente, o indiscutível direito de usar “a fila dos idosos” (no banco, no supermercado ou onde quer que seja) indicada solicitamente por algum funcionário. Quantos de nós já não resistimos antes de se valer do indesejado “privilégio”? Medo de envelhecer ou de parecer? 23 revista Kairós, São Paulo, 10(2), dez. 2007, pp. 19-44 Depois de algumas considerações sobre a palavra idoso (“Curiosa palavra. O que acumulou idade... Se é que não significa alguém que está indo, alguém em processode ida. Em contraste com os que ficam, os ficosos”), Veríssimo termina a crônica dizendo: “Preciso começar a agir como um idoso. Dizem que entre eles idoso não fala em quem chega à velhice como alguém à beira do túmulo. Dizem que está na zona de rebaixamento. Vou ter que aprender o jargão da categoria”. Velho é o outro, sem dúvida, pois o autor fala “deles”, não usa nós; ou, no mínimo, está negaceando, protelando, o que parece inevi- tável: “mudar de categoria”. Morte aqui também está presente, seja na interpretação (“idoso” como contrário de “ficoso”), seja na brincadeira (jocosamente tratada como “zona de rebaixamento”). A jocosidade é também uma forma de exorcismo... A passagem do tempo, apontada pelos outros, colhe-nos de surpresa; parece abrupta e não processual. Há alguns anos, numa outra crônica, igualmente memorável, Mario Prata reclamava a necessidade de reconhecer um período de passagem: assim como reconhecemos o período de adolescência, como difícil ajuste entre a infância e a juventude, deveríamos reconhecer um período de “envelhescência” equivalente – a passagem da idade adulta para a senescência... Nessas revelações há um desajuste, ou melhor, um descompasso entre Cronos e Kairós. Cronos como passagem do tempo marcada pelo acúmulo dos aniversários é detectada primeiro pelos outros (“Como en- velheceu fulano! Como está acabada beltrana!”); nós mesmos envelhece- mos conosco, nos acompanhamos, vivemos Kairós, enquanto deslizamos pelo tempo cronológico sem grandes rupturas; nos reconhecemos, a partir de dentro, sem saltos, de modo contínuo. O susto vem de fora. Hoje, cada vez mais, pode vir desse alter ego que é o espelho... que me compara comigo mesma. Reverso do retrato de Dorian Gray: não me reconheço no reflexo. Não sou eu. Não sou mais eu mesma. Talvez me reconheça de modo mais cabal nas fotos mais antigas... O sentimento kairós é forte, entretanto, e abre a possibilidade de uma avaliação atualizada, melhor, sempre renovada de si mesmo. Há pouco tempo, uma amiga na casa dos setenta me disse: “Não penso 24 Maria Helena Villas Bôas Concone revista Kairós, São Paulo, 10(2), dez. 2007, pp. 19-44 em mim como velha, penso em mim como eu mesma; eu sou Fulana, em outra fase da vida e mais realizada hoje”. Ela é, aliás, uma mulher que completou o ensino médio depois dos 40, fez Universidade aos 50 e no final dos seus 60 anos defendeu um mestrado. Depois disso, ao contrário da propalada queda inexorável marcada pelo envelhecimen- to (o envelhecimento seria, então, literalmente caduco), essa mulher verdadeiramente desabrochou, pesquisando e escrevendo. Exemplos semelhantes não são raros. Embora convivendo com a diversidade individual (e, evidentemente, sociocultural, da qual tra- taremos mais além) do envelhecimento, há um generalizante modelo social de velho, altamente medicalizado, construído em oposição ao de jovem. É o que mostra Elisabeth Mercadante (para nos apoiarmos no seu competente estudo) quando discute a velhice como identidade estigmatizada: O conhecimento da existência de um modelo social amplo e geral de velho, presente no imaginário social, que se constrói pela contraposição à identidade de jovem, levou-nos a pensar sobre questões relativas à construção da identidade do idoso e de como essa mesma identidade é sentida e vivida por aqueles indivíduos classificados como velhos. (2003, p. 56) Ora, os indivíduos assim classificados, eles mesmos, buscam reconstruir as classificações gerais, nuançando-as e tecendo novas classificações capazes de conter diferenças e, eventualmente, livrá-los do estigma. Alguns depoimentos colhidos por aquela pesquisadora (pp. 58-59) e que tomo agora de empréstimo, ilustram esse processo. Para esses entrevistados (entre os 60 e os 80 e mais anos), ser velho significa: “Ter perdido a energia física, mas ter ganho em experiência” (homem, 70 anos) “Ficar sendo cuidado por outras pessoas” (mulher, 69) “Ser fraco de corpo e forte de espírito” (homem, 68) Medo de envelhecer ou de parecer? 25 revista Kairós, São Paulo, 10(2), dez. 2007, pp. 19-44 “Ser velho é não ter mais saúde, é ser um esclerosado” (homem, 84) “Ser velho é não ter mais lucidez” (mulher, 76) “Ser velho é ficar doente e solitário” (homem, 63) “Ficar cheio de rugas e depender dos outros é igual a velhice” (mulher, 69) “Ser velho é perder a beleza, a de fora e a de dentro” (mulher, 70 anos) Como se pode notar nessas falas, colhidas ao acaso entre os de- poimentos trazidos no trabalho acima citado, todos os entrevistados usam um claro marcador para a velhice. Se há falas que reconhecem algum ganho na passagem da idade (experiência, fortaleza de espírito), a maioria sinaliza as perdas (vividas direta ou indiretamente e, sobretudo, temidas). Paradoxalmente, são essas mesmas perdas, genericamente identificadas, que podem separar o sujeito enunciante dos “verdadeiros velhos” (não ter saúde e ser esclerosado, perder a autonomia, perder a beleza, perder a saúde, perder a memória, perder o senso). É como se essas falas dissessem que “ser velho é ser gagá, o que não é o meu caso”, “é ser dependente, o que também não é meu caso”, e assim por diante. As falas reconstroem as diferenças, repõem a individualidade. Como foram sublinhadas por Mercadante, elas indicam, enfim, que “velho é o outro”. Há um esforço no sentido de escapar das generalizações e do estigma da velhice, esforço que aparece no discurso, nas ações (“man- ter o corpo ativo e a mente alerta”), nos cuidados e, quando houver a possibilidade, na interferência direta sobre as marcas corporais (o crescimento da “cosmetologia” e das plásticas corretivas e estéticas é um indicador importante).2 2 Falar de cirurgias plásticas, recursos cosméticos e outros constitui ponto sensível. É evidente que não se pode “condenar” tais recursos ou quem a eles recorre. Trata- se de recursos importantes para manter ou recuperar a auto-estima (para falar só desta). Não podemos esquecer que beleza sempre foi valorizada em toda e qualquer realidade sociocultural e, embora haja variações culturais dos padrões valorizados, alguns estudiosos apontam para certos traços universalmente considerados como 26 Maria Helena Villas Bôas Concone revista Kairós, São Paulo, 10(2), dez. 2007, pp. 19-44 As considerações dos depoentes, na sua maioria, assinalam de fato características presentes no corpo como demarcadoras de idade (perda de beleza, rugas, doenças, dificuldade de movimentos, etc.). Nessas marcas, a perda da beleza (“do frescor” e “do viço”) aparece como elemento primordial. É de se notar, também, que o padrão de beleza implícito é o da juventude – beleza “perde-se”, não se admite a possibilidade de outros padrões ou de padrões alternativos; não há, para esse tópico, uma fala correspondente àquela que diz: “perde-se energia, mas ganha-se experiência”. O trabalho de Mercadante mostra, ainda, que os entrevistados relacionam imediatamente corpo doente e velhice. Tal fato não seria de admirar, dado que nosso modelo social de velho é fortemente bio- médico. No que se refere a essa relação, entretanto, há ambigüidades quando tomada a ótica do próprio idoso – se a doença genericamente aponta para a velhice, esse não é o caso dos entrevistados, que vêm “suas” doenças, “somente como doenças” e não como algo relacionado à idade ou indicativas da sua própria condição de velhos. sinais de beleza (rosto de proporções equilibradas, por exemplo, ou estatura masculina elevada) e que estariam relacionados à necessidades da reprodução da espécie (levando os indivíduos a acentuarem os indicadores do dimorfismo sexual, a buscarem sinais considerados como indicadores de virilidade ou de feminilidade, de saúde ou, ainda, de capacidade reprodutiva – quadris largos em mulheres, por exemplo). Esse é um campo complexo,que não pode ser abordado apenas da perspectiva biológica e do comportamento da espécie; exige uma abordagem que não perca tal complexidade (basta um olhar para os padrões conflitantes em uma mesma sociedade, na qual figuras andróginas convivem com a busca de acentuar o dimorfismo – implantes de silicone nos seios, por exemplo – ou a figura feminina longilínea, “tubo”, que se afasta do padrão “violão”). Esse será tema de outras reflexões. No momento, gostaría- mos de reforçar a idéia de que, no que tange à velhice, o padrão de beleza continua sendo o de juventude e nesse sentido podemos assistir a algumas distorções: busca incessante de “retocar a juventude” (muitas vezes com riscos para a própria saúde, causados pelo número de cirurgias ou outros processos mais ou menos invasivos), produzindo máscaras constrangedoras; a depressão diante da perda do “viço juvenil”; a desvalorização de si; a desistência de buscar significados mais duradouros para a própria vida e assim por diante. Medo de envelhecer ou de parecer? 27 revista Kairós, São Paulo, 10(2), dez. 2007, pp. 19-44 “Tenho uma artrite que me incomoda muito, mas ela já está co- migo há muitos e muitos anos. Minha mãe sofria dessa mesma doença. Eu acho que herdei dela” (homem, 70 anos) “Eu não tenho qualquer problema de doença. Não tenho coleste- rol, nada na urina e nada também no fígado. Talvez só um pouquinho de reumatismo que não relaciono com a minha idade” (homem, 65) “Eu sou uma pessoa muito saudável, não tenho qualquer doença grave e as coisas que sinto e tenho de vez em quando, acho que acontecem por problemas que vivo no dia-a-dia” (mulher, 68). (Ibid., p. 59) Há, pois, um reconhecimento implícito de que saúde e doença são “coisas próprias da vida”, independentes da idade: algumas doen- ças ou afecções são percebidas como idiossincráticas (“está comigo há muitos anos”) ou familiares (“herdei da minha mãe”), são antes marcas individualizadoras e não classificatórias.3 Outro ponto que aparece bastante nos depoimentos citados (e que pode ser ouvido também em conversas informais) indica um horizonte temido: a perda da autonomia, a dependência dos outros. Há também aqui uma certa ambigüidade, pois, embora haja uma concepção mais ou menos implícita de que a dependência é um fato inescapável – “já que é própria ou ‘natural’ da velhice” – os sujeitos enunciantes procuram afastá-la de seu destino pessoal. De novo, a biografia familiar serve de anteparo: “meu pai morreu com mais de 80, lúcido e ativo”. Assim, a questão da “inescapabilidade” dessa condição (geralmente associada mais à “natureza biológica intrínseca à humanidade” e menos a uma construção sociocultural da velhice) pode, entretanto, admitir exceções das quais “eu e minha família somos um exemplo”. Relacionado a esse temor da dependência, o medo da solidão ex- pressa-se também como decorrente de “um fato natural” e não social e 3 Claro que falar em “traços familiares” como heranças genéticas já faz parte das concepções correntes, entrou para a linguagem comum; a mídia ajuda no sentido de uma certa vulgarização da perspectiva científica e biogenética. A discussão desses fatores exige reflexão específica. Por agora, quero apenas mostrar como padrões classificatórios podem ser travestidos em sinais individualizadores na fala de pessoas que ultrapassaram, ou quase, a marca dos 70 anos. 28 Maria Helena Villas Bôas Concone revista Kairós, São Paulo, 10(2), dez. 2007, pp. 19-44 cultural, como realmente é: ser velho é estar à margem, não ser querido por perto (o que seria “natural”). Como dizem alguns entrevistados da pesquisa citada, “ser velho é ficar doente e solitário”, “velho não é uma pessoa alegre, velho é recalcado”. Discutindo o processo de medicalização do envelhecimento, que leva a uma concepção da velhice como “uma doença em si mesma”,4 o psicanalista argentino Ricardo Iacub, depois de várias considerações rela- tivas às mudanças nas concepções de velhice na história do pensamento no mundo Ocidental, mostra o surgimento, a partir do século XIX, de mais uma limitação atribuída ao velho: a velhice é des-sexuada; nas suas palavras, a “mudança na percepção da velhice produziu o aparecimento de novos significados em sua erótica” (2007, p. 70). O autor aponta, no correr do período do século retrasado até nossos dias, noções que se modificam, mas se interligam: “As noções de vida e sexualidade começaram a ser ligadas de um modo determinante (sendo) a abstinência da sexualidade (vista como) um meio para evitar o envelhecimento”. Numa segunda articulação, percebe-se a “velhice como um retorno ao inorgânico”; haveria “um aumento da pulsão de morte devido às mudanças biológicas associadas à sexualidade (assim) concebeu-se o velho como um indivíduo carente de energia, que ao ir se retirando gradualmente deste mundo, favorecia o desenvolvimento da espécie humana”. Finalmente, um “conjunto de quadros patológicos definiram o desejo sexual referido à velhice e foi construída uma peculiar forma de perversão denominada ‘gerontofilia’” (ibid., p. 70). Gerontofilia define, então, o interesse sexual pelo(a) velho(a) como patológico. No nosso meio social, sem fazer concessão a patologias, atribui-se imediatamente “segundas intenções” ou “interesses escusos” 4 Não é possível, quando se aborda o tema da medicalização, deixar de fazer referência a um autor e a um livro seu poucas vezes lembrados. Trata-se de Ivan Illich, em A expropriação da saúde. Nêmesis da Medicina (Nova Fronteira, Rio de Janeiro, 1977). No preâmbulo do livro, o autor avisa: “Neste ensaio eu encaro a empresa médica como paradigma para ilustrar a instituição industrial”. Em que pesem as posições extremamente polêmicas (e sem dúvida datadas) e às vezes radicais, o uso alargado do conceito de iatrogênese e a análise da construção de uma “sociedade mórbida” graças ao processo crescente de medicalização merecem ser visitados ou revisitados. Medo de envelhecer ou de parecer? 29 revista Kairós, São Paulo, 10(2), dez. 2007, pp. 19-44 àqueles que mantêm relações com pessoas “idosas” (ou que apresen- tem diferenças etárias superiores ao esperado). Normalmente, julga-se haver por trás da relação um interesse financeiro. Até pouco tempo, aceitava-se com maior facilidade que homens mais velhos se casassem com mulheres jovens; era quase “natural”, embora a relação ficasse sempre sob suspeita, por parte de familiares e da sociedade em geral (mostra-se maior complacência quando a relação envolve homens mais velhos, porém considerados bonitos e famosos). Esse quadro demorou mais para ser aceito quando a parceria era entre homens mais jovens e mulheres “maduras”. Algumas situações contemporâneas envolvendo mulheres com amplo trânsito midiático parecem reverter em parte essa situação de desigualdade entre os gêneros (embora os casos de grande visibilidade sejam de mulheres famosas). Patologia ou segundas intenções rondam aqueles que se apro- ximam romanticamente de pessoas “velhas”. E os próprios velhos? Como são percebidos? “Tarado” ou “safado” são algumas das acusações possíveis; há também a acusação de trouxa e “velho babão”. Mulheres acima dos 70 causam ainda maior estranheza. Claramente, parece que, em qualquer caso, mas sobretudo para as mulheres, está-se diante de “herotismo fora do lugar”. A relação entre dois idosos (um novo casamento, por exemplo), quase sempre é tratada com complacência – a mesma que se mostraria para com duas crianças pequenas que se querem (Que gracinha! Que bonitinhos!). Creio que pudemos perceber que há um temor ligado ao envelhe- cimento, um medo de ser velho. Medo mais que justificado, dado que o envelhecimento é visto quase que exclusivamente como uma fase de perdas: perdas físicas, perdas sociais, perdas psíquicas, perdas afetivas. Não deixa de ser um horizontetenebroso que é necessário afastar. Nesse sentido, a perspectiva antropológica pode nos ajudar a “desnaturalizar a velhice”, mostrá-la como uma construção sociocul- tural e histórica. Cultural e socialmente variável no tempo e no espaço. Velhice e envelhecimento não foram e de fato não são vistos sempre da mesma maneira. 30 Maria Helena Villas Bôas Concone revista Kairós, São Paulo, 10(2), dez. 2007, pp. 19-44 Velhice e envelhecimento como construtos A velhice como construto sociocultural e histórico constitui, assim, um ponto de importância na presente reflexão. Vou procurar colocar rapidamente os pontos-chave da visão antropológica, antes do terceiro e último item, mesmo correndo risco nos dois extremos – descomplicar e perder a complexidade do fenômeno ou resumir per- dendo clareza... A cultura é sempre uma ação de construção do mundo, do mundo dos homens, do mundo da cultura... Nomear é uma ação criadora por excelência. Assim, toda cultura – qualquer cultura – dá nomes, classifica, cria categorias, empresta sen- tidos. Toda e qualquer cultura sofre mudanças, modifica-se no correr do tempo; novos arranjos societários, novos modos de trabalho, de técnicas e conhecimentos dialogam entre si, reforçam-se, anulam-se ou enfraquecem; há, enfim, um jogo contínuo que tece os processos socioculturais. Claro está que toda realidade sociocultural vive períodos de maior ou de menor estabilidade, de mudanças mais lentas ou mais aceleradas. É inegável que as culturas humanas, nos últimos dois sé- culos, mas especialmente de meados do século XX ao início do atual, têm vivido um processo de intenso movimento, de intensas mudanças. Tais mudanças aceleradas ocorrem de modo mais visível nas socieda- des ditas modernas, sendo nelas especialmente notável o peso que se atribui às mesmas mudanças. Como aponta Georges Balandier, dois movimentos incidem sobre tais sociedades: o das mudanças reais e o dos significados a elas atribuídos. Em outras palavras, as sociedades modernas dão um peso positivo, valorizam as mudanças, as inovações, o novo, enquanto as sociedades tradicionais dão um peso positivo à permanência, à reprodução do mesmo, à tradição. Não significa que nas primeiras não haja permanências e nem que as segundas não vivam mudanças. Não se pode perder de vista, entretanto, que a valorização Medo de envelhecer ou de parecer? 31 revista Kairós, São Paulo, 10(2), dez. 2007, pp. 19-44 positiva do “novo”, da “mudança”, da “inovação”, da “modernização” torna-se, ela mesma, uma força de mudança, um importante fator a um tempo cultural e ideológico. Voltemos ao envelhecimento e à velhice. Não se pode ignorar que a velhice é também uma construção sociocultural, isto é, sendo um dado da realidade de qualquer sociedade humana, está sujeita às ações nominadoras da cultura (atribuição de nome, classificação, significação, etc.); a noção de velhice depende, basicamente, do estabelecimento de demarcações socioculturais. Além disso, encontramos no envelheci- mento aspectos universais (biológicos), conquanto seus ritmos variem por numerosas razões (biológicas e outras). De fato, pode-se dizer que o envelhecimento é a um tempo biológico e sociocultural. Assim, tal como a noção de corpo (que, como se viu, é referência importante na nossa percepção de velho), a noção de envelhecimento também goza de uma dupla natureza: biológica e sociocultural. Essas duas dimensões se imbricam, dialogam e digladiam. Além disso, as realidades da velhice e do envelhecimento, embora submetidas às suas próprias lógicas, são de fato interdependentes. As construções de que falei são universais (porque presentes em toda e qualquer cultura) e ao mesmo tempo variáveis (porque construí- das com base em lógicas culturais e histórias sociais diversas). Alguns exemplos podem clarear melhor esses pontos. Comecemos com culturas bantos tradicionais. Falando delas, o religioso e antropólogo Asúa Altuña (1974) aponta que [...] (as) primeiras associações banto brotam das divisões de sexo e idade. Como estruturas sociais primárias estratificam a vida social e colaboram na sua conformação, porque o acesso a elas se vai realizando dentro de cada classe ou irmandade etária. (...) Os indivíduos do mesmo sexo, geração e parentela, formam as irmandades. (Estas) estruturam uma estratificação paralela ao parentesco (e seus) fins são educativos, religiosos, sociais políticos e, antigamente, guerreiros. 32 Maria Helena Villas Bôas Concone revista Kairós, São Paulo, 10(2), dez. 2007, pp. 19-44 Segundo esse estudioso, tais irmandades ou classes de idade, na sua forma mais generalizada compreendem quatro divisões, das quais a “primeira abrange as crianças dos 3 aos 9 anos; podendo ir até os 12.5 A segunda (abrange) todos os iniciados nos ritos da puberdade, ainda solteiros; os homens casados e pais de família formam a terceira; a quarta, a mais respeitada e poderosa é a dos velhos”. A passagem de uma categoria a outra implica um ritual de passagem específico, que, no caso dos membros do sexo masculino, é sempre obrigatório. Tais ritos são vistos como momentos públicos de instrução e também tecem e fortificam os vínculos entre os membros de cada classe etária (“o que não impede que no seu interior se estabe- leçam alianças particulares”). Nas classes etárias masculinas, as crianças não iniciadas são consideradas “pré-homens, social, moral e religiosamente”; isso, evi- dentemente, não significa que não sejam protegidas e mimadas pelos adultos. É um período de aprendizagem, pois o não iniciado é perce- bido como “algo inacabado”. Depois da iniciação, a criança passa para a classe seguinte, sendo, a partir de então, um membro de direito e de fato da sociedade. A grande liberdade sexual dos jovens é uma forma de realização do ideal do grupo, pois “a possibilidade de procriar” é que lhes dá a “plenitude vital e viril que os realiza individual e socialmente”. A fase da juventude é também de aprendizagem dos trabalhos da vida adulta e de cooperação nas atividades do grupo. São os homens casados que “dão consistência ao grupo”, assegu- rando sua subsistência e sua sobrevivência como grupo. Finalmente, os velhos (“classe de mais respeito e prestígio”), são os conhecedores de toda a tradição, dominam o direito e formam a assembléia política dirigente; são temidos por sua força vital e pelo manejo competente da magia, são os “sacerdotes familiares” detentores dos ritos comunitários. “Vivem com plenitude vital.” 5 Note-se que a classe das crianças inclui os membros entre os 3 e os 9 ou 12 anos, isto significa que antes dos 3 não estão contidos em nenhuma classe; são preciosas promessas para o futuro se podemos dizer assim. Medo de envelhecer ou de parecer? 33 revista Kairós, São Paulo, 10(2), dez. 2007, pp. 19-44 Nessas sociedades, as mulheres passam pelas mesmas classes etárias e, segundo Altuña, “embora não desempenhem um papel social decisivo” (em termos de parentesco ou em termos políticos – se bem que é a matrilinhagem que define as pertenças), a “matrona é presti- giada e influente”. Segundo o mesmo autor, a solidariedade banto é uma “exigência natural e sobretudo estrutural da sua filosofia e religião”; fundamenta- se na unidade de vida, na relação recíproca entre descendentes de um mesmo antepassado. “A solidão, o individualismo, além de repugnarem e serem incompreensíveis, acarretar-lhes-iam o desespero e o aniqui- lamento.” Nessas sociedades, “o homem só não existe” (Asúa Altuña, 1985, p. 159 e ss). Antes de Altuña, Tempels (1965), também falando sobre a filo- sofia banto, mostra que esses povos concebem o universo como feito de energia (matéria é energia), e a energia ou força vital que está presente em todas as coisas percorre os grupos familiares apresentando-se nos vivos e nos mortos.As passagens de uma classe etária a outra implicam crescimento de energia vital e, nesse sentido, os maiores depositários dessa energia são os velhos (já cumpriram quase todas as fases) e os ancestrais mortos (passaram pelo último rito: a morte). Sabedoria é fator de energia vital e a sabedoria cresce no correr da vida, acrescen- ta-se a cada rito de passagem. O que diferencia vivos e mortos não é, pois, a quantidade de energia vital – que é maior nos últimos –, mas a possibilidade de agir no sentido de captar a energia existente. Só os homens vivos podem fazê-lo e os velhos, como “sacerdotes familiares”, garantem, graças ao seu conhecimento dos ritos, que a energia vital dos ancestrais mortos fortaleça os vivos, permitindo, ao mesmo tempo, que os ancestrais continuem a existir (a falta de descendência e, por conseguinte, a ausência de ritos a eles voltados, acarretaria a verdadeira morte dos ancestrais). Ora, como se pode perceber, em sociedades que constroem seu mundo a partir desses parâmetros, o significado de ser velho não é o mesmo significado nosso. Aquelas idéias de perda e de degradação física e social não têm, aqui, qualquer lugar. 34 Maria Helena Villas Bôas Concone revista Kairós, São Paulo, 10(2), dez. 2007, pp. 19-44 No contexto da sociedade brasileira, que, majoritariamente, se pauta pelos padrões das sociedades ocidentais modernas, vamos re- encontrar nas religiões afro-brasileiras o reconhecimento do papel da ancestralidade e o peso positivo da senioridade. Nos núcleos religiosos em que a iniciação é um fator fundamental para o crescimento pessoal e a construção de saber, a idade é fator de respeito social e religioso. De fato, embora não haja, necessariamente, nos dias que correm, uma superposição absoluta entre idade cronológica e fase de iniciação, nos grupos mais tradicionais, graças ao tempo que medeia entre uma fase iniciática e outra, a idade cronologicamente maior tem maiores chances de coincidir com os estágios mais altos de iniciação. Nesse sentido, nesses grupos, além do respeito merecido pelo velho enquanto tal (independen- temente da sua posição religiosa e seu conhecimento), há o respeito pelo saber acumulado daqueles que viveram sucessivos processos iniciáticos e que acumularam não apenas idade, mas especialmente saber. Há, por assim dizer, uma potencialização do respeito. Em religiões não iniciáticas, mas igualmente hierarquizadas, os cargos mais altos na hierarquia religiosa correspondem também, de modo geral, aos mais velhos. A Igreja católica é um bom exemplo da correspondência, mesmo que não absoluta, entre idade e posição na hierarquia. Chegar a bispo ainda jovem é muito mais uma situação festejada por sua excepcionalidade do que uma regra. Isso sem falar em outras posições... Exemplos de diversidade numa perspectiva temporal, histórica, no mundo ocidental europeu, no que concerne ao significado das dife- rentes idades, podem ser encontrados nos ricos trabalhos do historiador francês Philippe Ariès. Em sua História social da criança e da família, ele discute a história da educação nos aspectos que “revelam o progresso do sentimento da infância na mentalidade comum”. Se, na Idade Média, a demarcação das idades não importava, no caminho da modernidade assiste-se ao aumento da disciplina, do valor a ela atribuído e do papel que devia representar na formação das pessoas, e, pouco a pouco, vão Medo de envelhecer ou de parecer? 35 revista Kairós, São Paulo, 10(2), dez. 2007, pp. 19-44 se institucionalizando classes etárias; nesse processo, o papel desem- penhado pela escola foi fundamental. Nas palavras de Ariès, na Idade Média, as escolas e os colégios que [...] eram reservadas a um pequeno grupo de clérigos e mistu- ravam as diferentes idades dentro de um espírito de liberdade de costumes, tornaram-se no início dos tempos modernos um meio de isolar cada vez mais as crianças durante um período de formação tanto moral como intelectual, de adestrá-las graças a uma disciplina mais autoritária e desse modo, separá-las dos adultos. (1981, p. 165) Mais adiante, o autor indica que, no século XII, podiam-se encontrar numa escola todas as idades da vida (pueros, adolescentes, juvenes, senes), “pois não havia uma palavra para designar o adulto e as pessoas passavam sem transição de juvenes a senes”. O mesmo autor aponta que essa mesma situação podia ser encontrada no século XV e que “essa mistura de idades continuava fora da escola” (p. 167). O sociólogo alemão Martin Kohll (1989), que toma Ariès como referência, apresentando um texto de discussão sobre “Ciclo de Vida”, entendido por ele como uma instituição social (um construto), mostra que o modelo de “institucionalização do curso da vida” por ele anali- sado constituiu um fato da sociedade moderna, paralelo à construção da noção de individualização e acompanhando as transformações do sistema de trabalho. No que concerne ao nosso tema, Kohll destaca “a construção legal e administrativa da demarcação das idades”, sendo o código napoleô- nico “o primeiro a introduzir precisas demarcações etárias” (1989). Se a infância e a juventude como idades de vida separadas da vida adulta são normatizadas a partir do sistema escolar e de demarcações legais (responsabilidade civil, penal, política), a velhice é definida pelo sistema de aposentadoria. Assim, a velhice “como idade distinta do ponto de vista estrutural e cronológico é um produto bastante moderno”, diz o sociólogo. A criação dos sistemas públicos de seguridade social (processo que teve a Alemanha como precursora: primeira caixa de aposentadoria 36 Maria Helena Villas Bôas Concone revista Kairós, São Paulo, 10(2), dez. 2007, pp. 19-44 pública e obrigatória) ajudou a constituir um curso de vida “marcado pela segurança e pela continuidade”, mas também aparece como “um novo tipo de controle político e social”. O mesmo sociólogo aponta, ainda, que depois dos anos 60 do século XX há uma mudança significativa nas sociedades européias (que toma como referência). Assiste-se, nessas sociedades, a um processo de “desinstitucionalização” do curso de vida, uma nítida desinstitucionali- zação do ciclo familiar: variação nas idades de casamento e nas idades consideradas adequadas para ter filhos, proporção crescente de pessoas não casadas, queda de natalidade, entre outras variações motivadas por escolhas pessoais. Há, ainda, flexibilização relativa da trajetória profissional e mudanças no “código biográfico” graças a um crescente processo de individualização. Ora, embora o campo de reflexão de Kohll fosse a Europa dos anos 80, não é preciso lembrar que tais mudanças são praticamente universais. Também no Brasil, não obstante as nossas profundas dife- renças internas (sociais e regionais), vivemos um processo de mudança social e populacional de largo alcance. Do ponto de vista no qual nos colocamos (o que é ser velho no Brasil, quando se é considerado velho no Brasil), pode-se ver que a questão da aposentadoria não desempenha mais o mesmo papel que já desempenhou, de demarcador importante no ciclo de vida, no arranjo biográfico; isto é, do estabelecimento de “um antes” e “um depois”. Seja pela mudança de composição etária da nossa população, seja pelos baixos patamares das remunerações da aposentadoria, seja pelas mudanças no sistema de empregos e de em- pregabilidade, seja pelo aumento da informalidade, o fato é que o ciclo de vida institucionalizado está sofrendo mudanças. A demarcação das idades não é a mesma de cinqüenta anos atrás. Houve um aumento do período de dependência dos filhos, um atraso da idade adulta, maiores exigências de escolaridade – freqüentemente incompatíveis com as po- sições de trabalho em oferta no mercado –, mudança nas expectativas de constituir família, entre outros pontos a serem considerados. Numpanorama de retraimento do mercado formal de trabalho, cresceu o número de aposentados, especialmente de mulheres aposentadas que Medo de envelhecer ou de parecer? 37 revista Kairós, São Paulo, 10(2), dez. 2007, pp. 19-44 sustentam, com os magros recursos da aposentadoria, suas famílias compostas de seus filhos, netos e outros dependentes; aumentou o número de aposentados que continuam trabalhando para compensar os baixos salários da aposentadoria e, finalmente, assiste-se também no Brasil ao retraimento do Estado ante as obrigações sociais das políticas de seguridade e de aposentadoria. Ora, é inegável que essas mudanças vão repercutir nas definições do que é ser velho nas sociedades modernas. O aumento significativo da porcentagem de pessoas acima dos 60 anos na população mundial, e também na brasileira, sem dúvida, é outro fator de mudança. Já encontramos novas formas de perceber o “envelhescente” e o idoso, formas que se insinuam insufladas pelas mudanças, pelas diferenças de poder aquisitivo anteriores e posteriores à aposentadoria, e também por uma certa “consciência de categoria” que de maneira mais ou menos tímida vai se instalando. Malgrado as diferenças de poder aquisitivo e as diferenças de valores das aposentadorias pública e privada, surge entre nós um mercado (diferenciado segundo a clientela visada) voltado para a “terceira idade” (viagens, oferta de produtos que vão de vestuário a saúde e beleza); também os clubes, associações e grupos da “terceira idade” (às vezes chamados “da melhor idade”) engrossam o movimento na direção da “consciência de categoria”, consciência de pertencimento, construção de uma nova perspectiva do envelhecimento. Em um artigo onde discute envelhecimento e sentimento do corpo, Alda Britto da Motta afirma que [...] a modernidade capitalista construiu uma visão segmentar das idades: periodiza as gerações, constrói e desconstrói idades, quase a cada século inventa mais uma; (...) recentemente – década de 60 – inventa uma “terceira idade”, inserção de um novo período entre a maturidade e a velhice, ao mesmo tempo negação desta. (2004, p. 38) Pode-se dizer, então, que estamos em um período de mudanças. Apesar disso, entretanto, não seria exagero afirmar que, no Brasil, convivemos com dois tipos polarizados de representação sobre o ser 38 Maria Helena Villas Bôas Concone revista Kairós, São Paulo, 10(2), dez. 2007, pp. 19-44 idoso, como dissemos no início – de um lado há as representações que o valorizam (respeito, sabedoria, etc.) e de outro, as que o desvalori- zam (decadência, passadismo, etc.). As primeiras expressam uma visão tradicional e extremamente formalizada, quase caricatural, e apontam para um ideal de respeito (ou talvez de respeito ideal). As segundas, não menos caricatas, de sabor mais contemporâneo, apontam para novas concepções que trazem embutida uma ideologia positiva do novo e da modernidade. Não por acaso essas representações “modernas” têm igualmente um caráter biologizante. Alda Britto da Motta afirma que “provavelmente a maior parte dos estudos sobre o envelhecimento e a velhice, pelo menos no Brasil, refere-se ao campo da saúde e áreas correlatas”. Reclamando da falta de uma verdadeira conexão com “envelhescentes”, a socióloga assinala: “A sensação é de encontrar neles corpos classificatoriamente naturais, ao mesmo tempo simbolicamente descorporificados e mudos”. No texto anteriormente citado, Mercadante discute o pro- cesso de construção cultural da identidade do idoso mostrando que as qualidades que lhe são atribuídas, embora amplas, são de modo geral negativas, definindo-o como sujeito em declínio físico e social. A autora problematiza assim a questão: Tendo em vista esse modelo social ideológico, que atribui quali- dades negativas aos velhos – degradação física e social – (e) que ao fazer isso lhes nega um futuro, avaliamos como é possível então para o idoso pensar novas formas de vida futura, novas alternativas para a velhice. (2003, p. 56) A construção de uma identidade social contrastiva, em que o novo é o valor e a medida, é sem dúvida responsável pela dificuldade de encontrar tais formas alternativas. Algumas considerações sobre esse último tópico encerram estas reflexões. Medo de envelhecer ou de parecer? 39 revista Kairós, São Paulo, 10(2), dez. 2007, pp. 19-44 Medo de parecer Se a velhice atemoriza e o único modelo apreciado socialmente é (majoritariamente) de juventude, a questão que mobiliza grande parte dos brasileiros “envelhescentes” é a de “retardar o envelhecimento” ou apagá-lo. Britto da Motta, citada acima, afirma que [...] a ainda majoritária terceira idade começa a ser muito lu- crativa para uma série de organizadores/gestores de atividades, produtos e serviços para esta faixa etária (...) no cotidiano, en- tretanto, as idades ainda são percebidas principalmente como parte do passar do tempo, mimetizando como duração e ritmo os ciclos da natureza e as estações, o que é expresso no corpo das pessoas. Diz-se “completar 15 primaveras”, “estar na flor da idade”, “ainda viçosa aos 50 anos”, “bem conservado/a”, “no inverno da vida”, etc. Complementa a autora dizendo que o tempo da “natureza” é expresso no universo da cultura, busca em seguida na literatura “ima- gens cruéis da velhice especialmente a das mulheres”. Borges Pereira (2000), falando da linguagem do corpo na so- ciedade brasileira, afirma que o “progressivo desnudamento do corpo, em especial do corpo feminino, está associado ao que a mídia chama freqüentemente de ‘culto ao corpo’ o que nada mais é do que a exaltação da beleza física em si, independentemente de atributos morais”. Claro está que o corpo e os cuidados com o corpo sempre foram objeto de preocupação dos homens e mulheres em todas as sociedades, entretanto, as reflexões sobre o corpo ganham visibilidade ao longo do último século. Ligia Amparo da Silva Santos, em preciosa tese de doutorado, toma a si a tarefa de “pontuar as especificidades (das questões referentes ao corpo) no mundo contemporâneo”. Entre tais especificidades nos modos de pensar, representar e agir sobre o corpo, Silva Santos destaca o papel da mídia e da tecnociência, a exposição e a exploração da intimidade do corpo, as manipulações do corpo graças à 40 Maria Helena Villas Bôas Concone revista Kairós, São Paulo, 10(2), dez. 2007, pp. 19-44 biotecnologia (cirurgias plásticas, implantes, transplantes, mudança de sexo), a engenharia genética, a reprodução artificial. Todo um campo de saber e uma enorme área voltada à comunicação empenhadas, cada uma a seu modo, em “libertar o corpo” de suas amarras anatômicas. Estamos, diz a autora, diante de uma antropomorfia, reconstrução completa da corporalidade em que há exibição contínua da transformação. Além disso, se “prolongar a vida, preservar o corpo e a saúde sempre foram preocupações da humanidade (...), no mundo atual tais práticas contam com um aparato científico que produz incessantemente novos recursos (...)”. O conceito de saúde se reatualiza, sendo entendido não como um dado, mas como uma tarefa; saúde não é definida por um estado e sim por um conjunto de comportamentos. Culto ao corpo como autocuidado define a perspectiva contemporânea. Lembra Ligia que, coerentemente com a centralidade do corpo no mundo contemporâneo, “o corpo também é o marketing de si mesmo”: “É na sua aparência, tonicidade, juventude e magreza que revelamos quem somos, a chave do sucesso, mas também do fracasso”. É difícil atingir metas tão exigentes e, sobretudo, é difícil manter “tonicidade, juventude e magreza” independentemente do tempo e das modificações corporais... Em artigo que discute modernidade e velhice, Vera Almeida (2003) afirma que encontrar na juventude modelode ser e de agir é uma tendência relacionada ao individualismo moderno e antecede os anos 80. De fato, podemos dizer que vem de muito mais longe, o que temos é um acirramento do modelo. Citando Lash, Almeida levanta a questão de que os [...] conteúdos individualistas da sociedade atual e o conseqüente culto do eu seriam mais responsáveis que o “culto da juventude” pelo horror à velhice. A personalidade narcísica dominante só teria a perder com o declínio dos atributos mais valorizados como beleza, encanto, poder, celebridade, atributos que segundo Lash “geralmente declinam com o tempo”. Medo de envelhecer ou de parecer? 41 revista Kairós, São Paulo, 10(2), dez. 2007, pp. 19-44 Claro está que “culto à juventude”, narcisismo e individualismo são faces da mesma moeda (que seria a identidade de idoso), a qual, por sua vez, é uma das faces da identidade sociocultural contemporânea. Não há porque afirmar, por exemplo, o declínio do poder (com o en- velhecimento) fora de um modelo específico de sociedade e de cultura. Os “nossos bantos” acrescentavam poder à medida que envelheciam. Qualquer que seja a ordem desses fatores, entretanto, há nas sociedades modernas – e o Brasil alia-se a essa tendência – um esfor- ço constante de “retardar o envelhecimento”, aderindo a comporta- mentos mais descontraídos, roupas menos convencionais, buscando saúde através de comportamentos “responsáveis” (controle alimentar, exercícios, abandono de hábitos “pouco saudáveis”, etc.), recorrendo à cosmetologia ou à cirurgia plástica, e assim por diante. O indivíduo é representado como autônomo e responsável por suas opções; saúde e doença, beleza e feiúra são de sua responsabilidade, dependem das suas escolhas, das suas ações. Como “velhice e doença” formam um par nas nossas represen- tações, a busca do envelhecimento saudável fica entre a obrigação e a contradição – a meta inalcançável. Temos que reconhecer que, enquanto não construirmos um forte modelo alternativo de velhice, os caminhos continuarão restritos. Continuaremos a reproduzir modelos “exógenos” e estigmatizadores. Não por convicção, mas por adesão. Como fugir desse círculo? Como já dissemos antes, as mudanças na composição etária da população mundial e nacional serão o fator mais significativo para mudanças de concepção e busca de novas perspectivas individuais e sociais. Derrubar mitos arraigados (feiúra, doença, taras, demência, perdas, falta de memória, ausência de perspectivas, sala de espera da morte) não é tarefa rápida ou fácil. Mas já está em andamento. A geração idosa de hoje já é diferente daquela que a precedeu. Como também já é diferente a geração jovem. Há pouco, o jornal Folha de S. Paulo dedicou um caderno inteiro à discussão das questões relacionadas à beleza. Numa entrevista rápida com uma jovem apresentadora de TV e ex-miss Brasil, o entrevistador 42 Maria Helena Villas Bôas Concone revista Kairós, São Paulo, 10(2), dez. 2007, pp. 19-44 perguntou: “Você tem medo de envelhecer?”. A resposta foi incisiva: “Sim”. Depois ela completou: “Acredito que até lá vou mudar minhas prioridades”. Creio que esse é o melhor recado que uma jovem poderia dar às gerações mais velhas e também às novas: mudar prioridades, encontrar novos interesses, investir em outras capacidades. Note-se que esse é um recado otimista: ela não fala em fim (como dizem alguns, “encerrar o expediente”, “pendurar as chuteiras”) nem em “recomeço”, mas em continuidade. Pode-se aprender de muitas maneiras. Para encerrar, vou voltar ao início, isto é, falar da relação kairós e cronos. Através de outra cultura. Num pequeno livro de comentários de um chefe de uma ilha do arquipélago de Samoa, lemos o seguinte: Todo Papalagui (o “branco” europeu) é possuído pelo medo de perder o seu tempo. Por isso, todos sabem exatamente (e não só os homens, mas as mulheres e as criancinhas) quantas vezes a lua e o sol saíram desde que, pela primeira vez, viram a grande luz. De fato, isto é tão sério que a certos intervalos de tempo se fazem festas com flores e comes e bebes. (...) Ter tantos anos significa ter vivido um número preciso de luas. É perigosa essa maneira de indagar e contar o número das luas porque assim se chega a saber quantas luas dura a vida da maior parte dos homens. Todos prestam muita atenção nisso e, passando um número muito grande de luas, dizem: “Agora, não vou demorar a morrer”. E então essas pessoas perdem a alegria e morrem mesmo dentro de pouco tempo. (...) Acho que o tempo lhe escapa tal qual cobra na mão molhada justamente porque o segura com força demais. O Papalagui não espera que o tempo venha até ele, mas sai ao seu encalço, sempre, sempre, com as mãos estendidas (...) Mas o tempo é quieto, pacato, gosta de descansar, de deitar-se à vontade na esteira. (...) Nunca o tempo nos falta, nunca nos enfastia (...) Não precisamos de mais tempo do que temos e, no entanto, temos tempo que chega. Sabemos que no devido tempo o Grande Medo de envelhecer ou de parecer? 43 revista Kairós, São Paulo, 10(2), dez. 2007, pp. 19-44 Espírito nos chamará quando for da sua vontade, mesmo que não saibamos quantas luas nossas passaram. Devemos livrar o pobre Papalagui, tão confuso, da sua loucura. Devemos devolver-lhe o verdadeiro sentido do tempo que perdeu: “o homem tem muito mais tempo do que é capaz de usar” (Scheurmann, s.d., pp. 51-52). Referências ALMEIDA, V. V. (2003). Modernidade e velhice. Serviço Social e Sociedade, ano XXIV, n. 75. ÁRIES, P. (1981). História social da criança e da família. 2 ed. Rio de Janeiro, Zahar. ASÚA ALTUÑA, R. R. (1974). 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Kairós- Gerontologia, v.1, n.1. 44 Maria Helena Villas Bôas Concone revista Kairós, São Paulo, 10(2), dez. 2007, pp. 19-44 MERCADANTE, E. F. (2003). Velhice: a identidade estigmatizada. Serviço Social e Sociedade, ano XXIV, n. 75. SCHEURMANN, Erich (s.d.). O Papalagui. Comentários de Tuiávii, chefe da tribo Tiavéa, nos mares do sul. Rio de Janeiro, Marco Zero. SILVA SANTOS, L. A. (2006). O corpo o comer e a comida. Tese de doutorado. PEPGCS, São Paulo, PUC. TEMPELS, P. (1965). La philosophie Bantou. Presence africaine. Paris. Data de recebimento: 14/6/2007; Data de aceite: 20/7/2007. Maria Helena Villas Bôas Concone – Antropóloga. Professora doutora titular do Departamento de Antropologia da PUC-SP. Docente do Programa de Estudos Pós-Graduados em Gerontologia e do Programa de Estudos Pós-Graduados em Ciências Sociais, ambos da PUC-SP. E-mail: trcconcone@yahoo.com.br revista Kairós, São Paulo, 10(2), dez. 2007, pp. 45-61 Um breve ensaio sobre a aceitação da beleza na efemeridade dos corpos� Marilda Silveira Lopes Rodrigo Caetano Arantes Ruth Gelehrter da Costa Lopes RESUMO: o trabalho pretende identificar a relação entre a beleza corporal e a longevidade através dos
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