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OSBORNE, D.; GAEBLER, T. Reinventando o Governo

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ip
272 REINVENTANDO O GOVERNO
Não consigo ver como é possível termos uma revolução
tecnológica, uma revolução social, uma revolução na infor¬mação, revoluções, além disso, moral, sexuale epistemológica,
e não igualmente uma verdadeira revolução política ... Em
palavras simples, a tecnologia política da era industrial não
é mais apropriada para a nova civilização que se forma ànossa volta. Nossa política é obsoleta.
9-
Governo descentralizado:
da hierarquia à participação
e ao trabalho de equipe
1
Nada pode substituir o conhecimento de um trabalhador acerca de seu local
de trabalho. Não importa quão inteligente seja o chefe, nem tampouco sua
capacidade de liderança. Só conseguirá liberar o potencial máximo dos seus
empregados trabalhando com eles, em vez de contra eles.— Ronald Contino, ex-diretor do Departamento de Saneamentoda Cidade de New York
Há 50 anos, as instituições centralizadas eram indispensáveis.
As tecnologias de informação eram primitivas, a comunicação entre
localidades diferentes difícil, e a mão-de-obra disponível relativa¬
mente pouco instruída. Não havia outra alternativa, senão a de
juntar todos os profissionais de saúde em um mesmo hospital, todos
os funcionários públicos em uma mesma organização ou todos os
bancários em uma ou duas grandes instituições, de modo a que a
informação pudesse ser concentrada e as ordens cumpridas com
maior eficiência.
Havia tempo de sobra para que a informação subisse lentamente
toda a cadeia hierárquica e, depois, descesse, pelo mesmo percurso,
sob a forma de decisões.
Hoje em dia, entretanto, a informação é praticamente sem limi¬
tes. A comunicação entre as mais recônditas localidades é instan¬
tânea. Muitos funcionários públicos têm boa formação acadêmica,
e as condições mudam à velocidade da luz. Não se pode desper¬
diçar tempo com o lento fluxo de informações hierarquia acima,
í*
'
IjFI
274 Governo descentralizadoREINVENTANDO O GOVERNO 275
de ordens hierarquia abaixo. Tomemos, por exemplo, o caso dodiretor de uma determinada escola que descobre que alguns deestudantes carregam um bip para se comunicar com traficantes dedroga. Em um sistema centralizado, o diretor solicitaria ao con¬selho educacional que promulgasse um dispositivo qualquer regu¬lamentando o uso dos bips. Quando a decisão finalmente fossetomada, seis meses mais tarde, os estudantes já estariam usandotelefones celulares, ou, quem sabe, até armas.
No mundo de hoje, as coisas simplesmentefuncionam melhor seos funcionários públicos — nas escolas, nas secretarias de habi¬tação, nos parques e nos programas de treinamento profissionali-
zante — tiverem autonomia para tomar algumas decisões pota própria.
Alvin Toffler, em seu livro Anticipatory Democracy, diz que,era da informação, “a pressão por um sistema mais ágil de tomadade decisões fica seriamente restrita pela complexidade e a poucafamiliaridade das circunstâncias sobre as quais deve se decidir.”O resultado é “uma sobrecarga esmagadora sobre as tomadas dedecisões - em essência, um choque político do futuro.” Tofflerapresenta duas respostas possíveis:
dade crescente do mercado; e o nosso super-herói contra as drogas
assiste, impotente, ao espetáculo das guerras e dos tiroteios que
varrem as ruas de cidade em cidade.
Os líderes empresariais procuram, instintivamente, a abordagem
descentralizadora. Deslocam grande parte das decisões para a peri¬
feria, pelas muitas formas que já descrevemos aqui, delegando-as
clientes, às comunidades e às organizações não-governamen¬
tais. As decisões restantes são empurradas para os escalões infe¬
riores, horizontalizandoa hierarquia e dando maior autonomia a cada
membro.
As instituições descentralizadas apresentam uma série de van-
ou
seus
aos
tagens:
Primeiro: instituições descentralizadas são muito mais flexí¬
veis que as instituições centralizadas e podem responder
muito mais rapidez a mudanças nas circunstâncias ou
sidades dos clientes. Doug Ross, ex-diretor do Departamento de
Comércio de Michigan, reforça a tese com um exemplo bastante
ilustrativo: “O único meio de servirmos a nosso propósito e nos
adaptarmos às rápidas mudanças no mercado foi a descentralização
da autoridade”, contou-nos. “Não me era possível conhecer tão bem
cada um dos programas que mantínhamos como as pessoas que
estavam em campo, vivenciando as experiências dia a dia. Se as
decisões tivessem de subir por toda a cadeia de comando até chegar
a mim, eu precisaria me inteirar de uma série de detalhes de modo a
ser capaz de tomá-las. E, até que elas fizessem o caminho de volta,
já não poderiam corresponder, com a devida agilidade, às necessi¬
dades de nossos clientes.”
Segundo: instituições descentralizadas são muito mais efici¬
entes que as centralizadas. Os trabalhadores na linha de frente são
mais contato têm com os problemas e as oportunidades
r con-
comna nas neces-
Uma das maneiras é tentar fortalecer, ainda mais,
governamental, concentrando mais e mais políticos, buro¬cratas, especialistas e computadores, no afã, desesperado, desuplantar o crescente aumento da complexidade; a outra écomeçar a reduzir a carga de decisões, compartilhando-acom
o centro
outras pessoas, permitindo que a decisão seja tomada
na periferia, livrando da tarefa ojá esgotado e ineficiente centro de decisões.
por escalões inferiores, ouíI
os que
existentes: sabem o que, de fato, acontece, a cada hora, a cada dia.
Freqiientemente, são capazes de engendrar as melhores soluções, se
tiverem o apoio daqueles que dirigem a organização. Isto dá às
administrações participativas uma tremenda vantagem. Ronald
Contino usou o princípio da administração participativa
pleta reformulação do Centro de Equipamento Motorizado (BME) do
Departamento de Saneamento da Cidade de New York e faz uma
colocação bem coerente: “À luz de nossa própria experiência, posso
trabalhador do BME como o nosso mais valioso
As lideranças tradicionais procuram, instintivamente, a primeirasolução. Diante de uma crise fiscal, tratam de consolidar as agên¬cias e centralizar o controle. Quando as instituições de poupançaquebram, criam uma superagência em Washington. Se o tráfico dedrogas se alastra por toda a parte, elegem um super-herói nacionalpara solucionar o problema. Este instinto, porém, geralmente levaao desastre. A centralização do controle e a consolidação de agên¬cias geram mais desperdício, quando deviam combatê-lo. Nossasinstituições tornam-se cada vez mais obsoletas diante da complexi-
na com-
considerar o
276 111Governo descentralizadoREINVENTANDO O GOVERNO
sobre os informados é diferente: só leva aos resultados esperados
seja exercida por meio da persuasão, envolvendo ou consultan¬
do aqueles com alguma participação no processo decisório.” Em
outras palavras, a autoridade é delegada para cima. “Estruturas
colegiadas, não de comando, deverão compor a base mais natural
para a organização. Em lugar de comando e controle, discussões e
reuniões passam a constituir o padrão obrigatório para se levar a
bom termo as realizações." Cleveland chamou isso de "crepúsculo
da hierarquia."
Enquanto o resto da sociedade luta para fugir, como pode, dos
padrões hierarquizados, seja sob a forma dos movimentos estudan¬
tis dos anos 60, do movimento feminista da década de 70, ou, ainda,
dos movimentos empresariais da década de 80 — os governos, em
maioria, continuam segurando as rédeas. Continuam passando
empregados a mesma mensagem: cumpram as ordens; não
a cabeça; não pensem por si mesmos; não tomem atitudes indepen¬
dentes. Se alguma coisa sair errado, a responsabilidade jamais será
de vocês. Ignorem o fato.Se,mesmo assim, vocês se virem impelidos
a tomar uma decisão, decidam-se por sua segurança. Nunca, jamais
se exponham a um risco.
Esta mensagem é altamente destrutiva. Por décadas e décadas,
atemorizado os funcionários públicos, amansando-os, tornan¬
do-os passivos e amargurados. Em organizaçõeshierarquizadas,
tradicionais, podem até reclamar, mas não conseguem conceber a
idéia de tomar o controle em suas próprias mãos.
A inércia resultante tem um preço altíssimo. “Ao verificar o
desperdício, algumas pessoas clamam por um sistema mais centra¬
lizado de controle”, diz Gifford Pinchot III. “Mas o desperdício
não está sendo gerado por mecanismos ineficientes
Decorre exatamente de se tirar o controle real das únicas pessoas
suficientemente próximas do problema, para fazer alguma coisa.”
Para trazer o controle de volta às mãos daqueles que se encon¬
tram na ponta mais baixa da hierarquia, onde as coisas, de fato,
acontecem, os líderes empreendedores empregam um variado nú¬
mero de estratégias. Usam uma administração participativa, vi¬
sando a descentralizar o processo de tomada de decisões;
jam o trabalho em equipe, buscando superar as rígidas barreiras que,
hierarquizadas, afastam as pessoas; criam, ainda,
verdadeiras campanhas institucionais, de modo a proteger aqueles
património. São mais capazes de incorporar melhorias nas organiza¬ções e de resolver seus problemas do que um monte de especialistasadministrativos e todas as suas idéias sobre o que precisa ser feitonos locais de trabalho. Munidos dos programas de participaçãofuncional por nós implantados, os trabalhadores têmvantagem: trata-se de seu próprio local de trabalho."Terceiro: instituições descentralizadas são muito mais inova¬doras do que as centralizadas. Foi o que concluíram os estrategis-tas da Faculdade Kennedy de Estudos Governamentais, de Harvard,em seu trabalho junto com o Programa de Fomento à Inovação, daFundação Ford. Sua maior surpresa, segundo seus próprios relatos,foi verificar que a inovação não surge, fundamentalmente, de umagrande idéia de alguém lá no topo, que, de repente, elabora um plinfalível. Ao contrário, as boas idéias costumam brotar dos
caso
uma enorme
ano
suaempre¬gados que estão em contato direto com o público, a quem, de fato,incumbe o trabalho.
usemaos
Quarto: instituições descentralizadas têm moral elevado, sãomais comprometidas e produtivas. Quando os administradoresdepositam sua confiança nos empregados, delegando-lhes decisõesimportantes, emitem um sinal de respeito por seus funcionários.Este é um aspecto particularmente importante em organizaçõescujas atividades envolvem trabalho intelectual. Se precisamos dacompetência e do conhecimento de nossos professores, estrategis-tas de desenvolvimento e ambientalistas, não podemos tratá-loscomo operários industriais em uma linha de montagem. Os emprega¬dores aprendem logo uma lição: para beneficiar-se, efetivamente, dacapacidade intelectual e do conhecimento de trabalhadorespensantes, precisamos dar-lhes autonomia para que tomem deci¬sões. Na administração, modismos surgem e se vão a todo tempo—e disso já sabem todos os funcionários públicos. Mas participaçãonão é moda. Está em toda a parte, em praticamente todas as indús¬trias.
tem
!
íí de controle.f
Harlan Cleveland, antigo decano do Instituto Humphrey da Uni¬versidade de Minnesota, escreveu um livro fascinante a respeito deadministrar em uma economia de conhecimento: The KnowledgeExecutive. “Antigamente, quando apenas um pequeno número depessoas tinha instrução e estava por dentro, a liderança sobre osdesinformados só podia ser exercida segundo padrões verticalmenteestruturados de comando e controle”, diz Cleveland. “A liderança
encora-
nas estruturas
k
!
279278 REINVENTANDO O GOVERNO Governo descentralizado
que usam de sua autoridade para inovar; e, além disso, investem
empregados, para garantir que tenham sempre as habilidadese o moral que possam permitir-lhes fazer o melhor uso possível desua autoridade. Esses líderes descentralizam, também, a autoridadeas organizações governamentais, empurrando as decisões deWashington para os estados e, dos estados, para os municípios.Estas cinco estratégias serão discutidas mais tarde, aindacapítulo.
Os governos que querem passar credibilidade a seus cidadãosnão podem simplesmente dar total liberdade a seus funcionários,obviamente. Os eleitores exigem alguma responsabilidade. Assim,as organizações que promovem esta descentralização de autoridadetambém têm dificuldade em articular suas missões, criar culturasinternas acerca de seus valores fundamentais e, tambémresultados. A responsabilidade pelos recursos gera uma responsa¬bilidade sobre os resultados, e as culturas autoritárias dão lugauma responsabilidade mais solta, como a expressa na obraEm Buscade Excelência, de Peters e Waterman, em que a divisão dos valorese princípios substitui as regras e os regulamentos, tomando-se aargamassa que irá manter unidos os trabalhadores.
mentava, aindamais, oclamor pela centralização. Por fim, o presiden¬
te Johnson assumiu, pessoalmente, o controle da guerra. Da Casa
Branca, comandou bombardeios e grandes ofensivas da infantaria
nos campos de batalha. Seu pessoal, no Pentágono, se debruçava
sobre as fotografias aéreas, elegendo, a 16 mil quilómetros de dis¬
tância, os alvos do bombardeio. Os generais, nos quartéis instala¬
dos no Vietnã, davam comandos, por intermédio do rádio, a suas
tropas da linha de frente. E as forças armadas americanas pagavam
emseus
entre
neste
o pato.
Felizmente, nossos líderes aprenderam com a derrota. Quando
expulsaram o Iraque do Kuwait, em
bem diferente. O presidente Bush, que enfaticamente garantia que
do Vietnã, deu ao general
1991, usaram uma abordagem
não repetiria os mesmos erros
Schwarzkopf apenas duas missões: expulsar o Iraque do Kuwait e
demolir todo o poder de fogo da Guarda Republicana Iraquiana.
Disse aos militares o que queria que fizessem, mas deixou que eles
achassem a melhor maneira de fazê-lo.O general Schwarzkopf tomou
a mesma atitude em relação a seus comandados no campo de batalha.
Um dos responsáveis por este redirecionamento da filosofia
forças armadas foi o general W. L. (Bill) Creech — um homem quelenda viva da Força Aérea dos Estados
mensurar os
r a
nas
permanece como uma
Unidos, mesmo depois de reformado. Em 1978, Creech assumiu o
Comando Tático Aéreo (TAC), uma operação de US$ 40 bilhões,
envolvendo 115 mil pessoas e 3.800 aeronaves.
Quase todos os dias, cerca da metade de seus aviões ficava em
solo devido a problemas mecânicos. O número de vôos de treina¬
mento caíra à razão de 7,8% ao ano, por mais de uma década.
Pilotos que precisariam de um mínimo de 25 horas de vôo para
estarem realmente aptos para o combate, estavam voando 15 horas
Para cada 100 mil horas voadas, sete aviões se
O MUNDO SEGUNDO CREECH
Talvez o mais puro exemplo de descentralização de quenotícia tenha acontecido na maior e mais centralizada burocracia dosEstados Unidos: o Departamento de Defesa. De acordo com o his¬toriador militar Martin van Creveld, os exércitos mais bem-sucedidos são aqueles em que se verifica a descentralização daautoridade. Entretanto, durante os anos 60, as forças armadasamericanas perderam de vista esta lição. O secretário de defesaRobert McNamara, que chegou ao Pentágono vindo de um dosmarcos da era industrial, a Ford Motor Company, era um devoto dossistemas centralizados. Fascinado pela idéia de otimizar a eficiênciamediante um controle centralizado e planejamento cuidadoso desistemas, fazia seus especialistas produzirem análises de custo-be¬nefício e novas regulamentações a uma velocidade tal, que os co¬mandantes não eram capazes de segui-las. A autoridade desafiavaa lei da gravidade, e os homens no campo de batalha viam desapa¬recer toda a sua capacidade de decisão.
À medida que os Estados Unidos se atolavam
se tem
ou menos.
acidentavam — muitos deles por manutenção ineficiente. Pilotos,mecânicos e técnicos estavam abandonando o TAC em grandes
blocos. “As forças armadas americanas estavam se desmantelando,”
confidenciou mais tarde Creech. “A situação era bem pior do que se
imaginava.”
Creech trabalhara no gabinete do secretário de defesa em meados
da década de 60,e conhecia a paixão de McNamara pela centrali¬
zação e a padronização. Concluiu, então, que tal paixão era o prin¬
cipal problema doTAC. A Força Aérea usava uma abordagem tama-no Vietnã, au-
ff"'
281280 Governo descentralizadoREINVENTANDO O GOVERNO
lações atinge o orgulho das pessoas na organização e afeta sua
performance. Ou se tem um clima de profissionalismo ou, então, de
deterioração e decadência.”
Ele também publicava resultados, patrocinava a competição econcentrassem em suas mis-
nho único, dissera ele, em umdiscurso proferidoem83. “Um sistemaúnico de manutenção foi criado, com a função de se adequar aorganizações diametralmente distintas — do Comando Aéreo Mili¬tar, que realiza suas manutenções, ao Comando Aéreo Estratégico, •que opera fora de suas bases principais, em patrulhamento, e desteao TAC, que, por sua vez, cumpre suas missões em pequenos esqua¬drões por todo o mundo... Todo mundo faz as coisas de maneiraexatamente igual.”
Como se não bastasse, tudo era centralizado: manutenção,almoxarifado, planejamento e estabelecimento de escalas. “O contro¬le vinha do topo.” Cada simples solicitação de reparos tinha depassar pela oficina central de manutenção, denominada Controle deOperações — um processo que levava os trabalhos de manutençãoa um ritmo comparável ao de uma lesma. Conseguir uma peça paraum F-15, no almoxarifado central, segundo reportagem publicadapela revista /nc, “exigia 243 informações em 13 formulários diferen¬tes, envolvendo um total de 22 pessoas e 16 jornadas de trabalhoprocesso administrativo e no de arquivamento.” Creech concluiuque a cura era uma descentralização radical. À época da centraliza¬ção, a força aérea colocava mecânicos e aeronaves em uma oficinacentral, separada dos esquadrões equipes de 24 pilotos, cada qualcom seu próprio nome, símbolose sua lealdade, que se incorporaramao folclore americano durante a II GuerraMundial. Creecheste quadro. Designou mecânicos para os esquadrões, dando a cadaum o quepe e o distintivo respectivo de seu esquadrão específico.Designou aeronaves para esquadrões específicos, permitindo quefosse pintada, em suas caudas, a insígnia do esquadrão a que per¬tenciam — a mesma usada pelos pilotos e mecânicos. (Ele chegoua pintar o nome do principal mecânico junto ao do piloto, no narizda aeronave.) Descentralizou as operações de reposição de peças,fazendo-as disponíveis nas próprias trajetórias de vôo. E deixou queos comandantes de cada esquadrão planejassem suas próprias es¬calas de treinamento.
Creech deu toda
permitia a esquadrões e bases que se
sões. O TAC estabelecia metas claras e mensuráveis para cada
equipe. Creech encorajava as bases a que exibissem gráficos
ilustrativos da performance da manutenção, almoxarifado e dos
treinamentos. Com frequência, exibiam as estatísticas mais vitais
em grandes quadros de aviso na entrada da unidade, para que a
concorrência pudesse vê-las. O TAC começou a distribuir troféus
e a promover banquetes anuais em homenagem aos melhores es¬
quadrões. “Enfatizávamos, constantemente, a competição”, explica
Creech. “Institucionalizávamos novas metas e novos padrões, mas,
dávamos à unidade o controle sobre o ritmo e oao mesmo tempo,
planejamento que adotariam para a consecução das metas anuais
propostas.” “Não tardou para que uma forte camaradagem se
estabelecesse entre os pilotos e seus novos chefes”, segundo a
revista Inc. “E, em pouco tempo, alguns esquadrões começaram a
fazer hora-extra na tentativa de superar os demais em todos os
sentidos, desde a performance dos pilotos até a qualidade de
no
sua
manutenção.”
Os resultados falam por si:reverteu
Quando Creech deixou oTAC, 85%de seus aviões estavam
condições de uso em operações, percentual que costu¬
mava ser de 58% antes de sua chegada; o TAC, até então
considerado o pior Comando da Força Aérea, transformara-
se no melhor deles.
Os caças chegavam a totalizar 29 horas de vôo por mês,
contra as 17 que costumavam voar antes.
O TAC podia realizar o dobro de treinamentos de vôo do
que a performance antes verificada.
O tempo decorrido entre a solicitação e a entrega de um
componente de reposição caíra de 90 para 11 minutos.
A taxa de acidentes caíra de um a cada 13mil horas de vôo,
para um a cada 50 mil.
E a taxa de realistamento de mecânicos estagiários quase
duplicou.
em
a atenção a seu pessoal de reparos ccontroladores de estoque, melhorando suas condições de moradia,investindo em seu treinamento e usando de seu tempo pessoal paralhes oferecer briefings. Mandou renovar a pintura de cada prédiodo TAC e investiu em novos carpetes e móveis, construindo novosalojamentos, segundo o princípio de que “o mau aspecto das insta-
e aos
283282 Governo descentralizadoREINVENTANDO O GOVERNO
lência, do general Vuono, espelham-se nas ações de Creech, na Base
Aérea de Langley, sede do TAC.
Creech tambéu serviu de instrumento para o sucesso da iniciativa
das Instalações Modelo de BobStone. Ele diz que, quando recrutava
comandantes, algo engraçado aconteceu: “Eu conversava com di¬
versos generais e eles todos diziam, com ar tenso: ‘Você já mostrou
isso ao Creech?’ Eu dizia que não, e, então, alguns deles diziam,
“Bem, eu gostaria de ver a reação dele.’” Quando Creech se juntou
ao grupo, mais 40 comandantes também o fizeram.
O TAC conseguiu tudo isso sem novos recursos, sem aumento de
pessoal e com mão-de-obra menos experiente do que a que ali
havia nos anos de decadência. “Qual terá sido o principal fator?”,
pergunta Creech. “Para nós, foi organização. Foi descentralização.
Foi delegar a autoridade ao menor nível possível. Para nós, foi
aceitar a responsabilidade de assumir esta autoridade. Foi um novo
espírito de liderança em muitos níveis — fazendo as coisas acon¬
tecerem.”
“Em qualquer organização”, declarou Creech à Inc, “há sempre
um monte de pessoas esperando que se lhes dê alguma responsa¬
bilidade, algum senso de propriedade, algo de que possam se
orgulhar. E é incrível a quantidade de flores que brotam, depois
que se dão os primeiros passos. A organização deslancha, então,
por caminhos que ninguém jamais poderia imaginar.”
Creech acrescentou, ainda, que “os administradores tradicionais
acreditam que, se descentralizarem a autoridade, terão menos con¬
trole. Mas, na verdade, é exatamente o oposto.”
Quando deixei o TAC, detinha mais controle sobre ele que
todos os meus antecessores. Havia criado líderes e colabora¬
dores em todos os seus diversos níveis. Sem esse tipo de rede
integrada abaixo de nós, seremos líderes apenas no nome.
Não é assim tão difícil dirigir uma grande organização.
Basta pensar pequeno sobre como quer atingir seus objetivos.
Quantitativamente, é muito limitada a capacidade de lide¬
rança de alguém no topo. Não é possível microgerenciar —aspessoas se chateiam com isso. As coisas são conquistadas
individualmente, ou por grupos de duas, três, cinco ou 20
pessoas e não de 115 mil.
O general Creech se reformou em 84, mas sua filosofia se espa¬
lhou. Quando ainda estava à frente do TAC, tanto o Comando da
Europa quanto o do Pacífico adotaram muitas de suas idéias. Um de
seus discípulos, o general Larry D. Welch, sucedeu-o no TAC,
levando depois a mesma abordagem ao Comando Aéreo Estratégico,
sendo finalmente promovido ao Estado Maior da Força Aérea. Em
90, um protegido de Welch assumiu o último comando centralizado,
o Comando AéreoMilitar, e começou a propagar o evangelho segun¬
do Creech. E, no Exército, os programas de Comunidades de Exce-
;
DESCENTRALIZANDO ORGANIZAÇÕES
PÚBLICAS POR MEIO DE UMA
ADMINISTRAÇÃO PARTICIPATIVA
Em seis anos junto ao TAC, Creech praticamente dobrou a produ¬
tividade do comando. Fê-lo simplesmente por puro conhecimento da
natureza humana: as pessoas trabalham mais duro e investem mais
criatividade quando controlam seu próprio trabalho. Empresas
manufatureiras que adotam a administração participativa, têm, via de
regra, um aumento de produtividade da ordem de30 a 40%. Por
vezes, esse aumento pode ser muito maior. “O compromisso adici¬
onal de uma pessoa motivada não representa apenas 10 ou 20% de
diferença”, diz Pinchot. “Quem quer que esteja absolutamente ab¬
sorvido em seu trabalho pode fazer, em meses, o que um empregado
desmotivado levaria anos por fazer.”
A administração participativa está florescendo nas organizações
públicas empresariais, dos distritos escolares aos departamentos de
polícia. Tomemos, como exemplo, o Departamento de Saneamento da
Cidade de New York, uma organização enorme, que coleta o lixo e
varre as ruas de uma cidade de 7 milhões de habitantes. Em 1978,
quando Ronald Contino foi contratado, o Centro de Equipamentos
Motorizados (BME) estava em ruínas. Com cerca de 1.300 mecâni¬
cos, soldadores, eletricistas, ferreiros e maquinistas, o centro era o
responsável pela manutenção de todos os veículos do Departamen¬
to. Mesmo assim, só podia contar com metade de seu pessoal e 6.500
caminhões de coleta em operação a cada dia.
Contino aproveitava as idéias de seus empregados por intermédio
de um comité de trabalho de alto nível e uma série de pequenos
outros comités de gerenciamento do trabalho. Em três anos, 85% dos
caminhões de lixo voltaram à operação, e as inovações do Departa-
t
284 REINVENTANDO O GOVERNO Governo descentralizado 285
mento geraram economias superiores a US$16 milhões. “Isto foi
possível porque criou-se um ambiente em que cada indivíduo sabia
que tinha representação no processo de tomada de decisões e,
também, acesso aos escalões superiores, caso desejasse externar
seus próprios desejos e preocupações”, diz Contino. “As mudanças
nas rotinas de trabalho deixaram de ser vistas como meras ordens
geradas por uma elite distante, mas, sim, como o resultado de um
trabalho de equipe e um desejo universal de ver o trabalho progredir.”
Assim que o Departamento se consolidou, Contino começou a
passar o controle diário das operações a seus empregados. Colocou
um maquinista como chefe de sua nova Divisão de Projetos Espe¬
ciais, que lidava com as requisições de novos equipamentos. Fez
com que os mecânicos listassem todas as especificações para novas
encomendas de equipamento, testando aqueles que eram entregues
assim que chegavam e designando pessoal para acompanhar e exigir
cumprimento dos termos de garantia. Criou um grupo de pesquisa
e desenvolvimento, inteiramente composto de mecânicos, que já
desenvolveu pelo menos 50 projetos de aperfeiçoamento de design,
tendo repassado vários desses a empresas privadas em troca de
royalties para a cidade. Uma equipe de empregados chegou a desen¬
volver um novo tipo de caminhão - um veículo monstruoso usado
para transferir o lixo de um porto para um aterro. Chamaram-no de
“Nosso Bebê!”
A cidade de Madison, em Wisconsin, adotou a administração
participativa como parte de seus esforços pela Administração de
Qualidade Total. (Um dos princípios fundamentais de Deming é o
engajamento do empregado na tomada de decisões.) A primeira
equipe de qualidade de Madison, na Divisão de Máquinas, econo¬
mizou US$ 700 mil por ano ao criar um programa de manutenção
preventiva e reduzir a ociosidade de cada veículo de nove para três
dias. Outro grupo de empregados estudou os problemas com o lixo
sólido, porque o tempo de espera na Usina de Reciclagem de Energia
causava atrasos aos motoristas todas as tardes. A administração
planejava gastar US$ 1 milhão para duplicar o tamanho da rampa
onde os caminhões descarregam. Porém, com um mapeamento do
fluxo de tráfego, os empregados chegaram à conclusão de que, se
os motoristas doEast Side simplesmente começassem uma hora mais
cedo, o engarrafamento do fim de tarde poderia ser evitado.
“Se a decisão tivesse sido baseada no conselho de um consultor
externo que dissesse: ‘Ponha o pessoal do East Side para trabalhar
às 6da manhã’Jamais teria sido implementada”, afirmaTomMosgaller,
coordenador de Administração de Qualidade Total na cidade. “Teria
sido preciso barganhar até que o inferno congelasse para chegarmos
a isso. Mas, como a sugestão havia sido dos próprios trabalhadores,
tinham por ela um certo sentimento de propriedade.”
Madison chegou a demonstrar como os departamentos de polícia
poderiam usar a administração participativa. No verão de 1986, o
chefe de polícia David Couper convocou uma reunião para discutir
a idéia de um laboratório de campo, onde o departamento poderia
testar novas idéias. Mais de 50 membros do departamento compa¬
receram. Nomeou-se uma equipe de planejamento, composta por 10
membros, a qual foi treinada por Mosgaller em Administração de
Qualidade.
Após acaloradas discussões, a equipe decidiu propor a criação
de um Distrito Experimental de Polícia, composto de 38 membros
e jurisdição sobre uma área de 30 mil pessoas. Entrevistou fun¬
cionários de todos os departamentos a fim de conhecer suas preo¬
cupações, incorporando-as, depois, à estrutura administrativa do
novo distrito. Foi um passo revolucionário: Osfuncionários elegiam
seus próprios comandante e tenentes. Desenvolveram sua própria
organização de pessoal e estabeleciam, eles mesmos, suas escalas
de serviços. Projetaram e construíram o prédio que serviu de sede
ao distrito.
O Distrito Experimental de Polícia também ouviu seus usuários e
adotou um policiamento orientado segundo as necessidades da
comunidade (ver capítulo 2). Para ajudar na abordagem correta para
a comunidade, detetives, oficiais, inspetores e escrivães começaram
a trabalhar em conjunto. A cooperação entre eles cresceu de maneira
acentuada. “Eles costumavam ser bem-estratificados”, diz Mosgaller.
O mais fantástico aconteceu aos inspetores. Nunca antes tí¬
nhamos nos valido dos inspetores de estacionamento, usan¬
do-os como olhos e ouvidos do serviço policial. Simplesmen¬
te passeavam por aí, anotando multas. Porém, eles veêm
monte de coisas todos os dias. E agora sabem, exatamente, o
que os detetives estão procurando, de modo que podem aju¬
dar. São nossa melhorfonte de informação, e isso faz com que
se sintam importantes.
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286 REINVENTANDO O GOVERNO Governo descentralizado 287
Hoje em dia, o Distrito Experimental de Polícia é uma organização
altamente motivada. O número de faltas ao trabalho e a reivindicação
de direitos trabalhistas caiu vertiginosamente. Em uma pesquisa
realizada junto aos funcionários no segundo ano de funcionamento
do distrito, mais de 80% deles declararam estar mais satisfeitos ali
do que em sua lotação anterior, e mais de 60% acreditavam que sua
eficiência no combate ao crime havia aumentado. As cinco razões
mais comumente apresentadas por terem escolhido o distrito como
seu local de trabalho, foram sua administração de apoio, a menor
rigidez da estrutura, o maior incentivo à tomada de decisões, a maior
autonomia, e o clima de cooperação e trabalho em equipe. O depar¬
tamento ficou tão satisfeito com os resultados que criou, em 1991,
três outros distritos descentralizados, para cobrir o resto da cidade.
“Acho que aprendemos que equipes eficientes de trabalho são as
de 30 ou 40 pessoas”, diz Couper.
A administração participativa está se disseminando, inclusive no
campo da educação pública. Tradicionalmente, os sistemas públicos
de ensino têm sido terrivelmente centralizadores. (Antes de sua
recente experiência de descentralização, Chicago tinha 500mil estu¬
dantes em seu sistema público de ensino e 3 mil administradores. O
sistema católico de educação de Chicago, com 250 mil estudantes,
tinha apenas 36 administradores.) Além disso, estudos vêm provan¬
do, repetidamente, que as escolas cujos diretores e professores são
dotados de autoridade considerável são mais bem-sucedidas que
aquelas onde as decisões importantes são tomadas por uma admi¬
nistração central. Dessa maneira, centenas de distritos escolares
começaram a praticar o que os educadores chamam d&gerenciamento
local, delegando “os poderes de tomada de decisõesa um nível de
maior proximidade da escola propriamente dita”, como descreveu o
então governador de Arkansas, Bill Clinton, de modo a “dar a dire¬
tores e professores maior autoridade.”
Dade County, região da Florida que engloba Miami, entregou a
autoridade sobre suas escolas a equipes de diretores, professores
e, por vezes, até de pais. Ali, como também em Rochester, New York,
cada escola tem agora um orçamento direcionado. No primeiro ano
da reforma educacional de Chicago, US$ 40milhões foram repassa¬
dos da administração central para as escolas, 640 cargos administra¬
tivos foram extintos, e cada escola foi entregue a um conselho eleito,
formado de pais, professores e membros da comunidade.
Cooperação trabalhador-administração
Muitos administradores públicos acreditam que os sindicatos repre¬
sentam o maior empecilho para o governo empresarial. Os sindica¬
tos, certamente, resistem às mudanças que ameacem os empregos de
seusmembros, como faria qualquer outra organização racional. Porém,
a maioria dos administradores empreendedores afirma que os sindi¬
catos não têm sido seus maiores obstáculos. Na verdade, acreditam
que a questão central envolva a qualidade da administração”. Os
atritos entre empregado e empregador são simplesmente um sintoma
de mau gerenciamento”, afirma John Cleveland, que comandou o
Serviço de Modernização de Michigan. “O problema em todas as
organizações é a qualidade dos altos administradores. E, como ge¬
ralmente acontece em ambientes políticos, os indicados para assumir
tais funções não têm qualquer experiência administrativa. Sabem que
não ficarão ali por muito tempo e, por isso, não prestam muita
atenção ao seu trabalho.”
Quando a firma de consultoria Coopers & Lybrand realizou sua
Pesquisa sobre Empreendimento Público, descobriu que, para os
executivos do governo local, as regulamentações do governo, a
oposição institucional e a oposição política representavam as mai¬
ores barreiras ao aumento de produtividade.A oposição trabalhista
organizada foi classificada em quarto lugar.
Para Rob McGarrah, da Federação Norte-amerciana de Funcio¬
nários Federais, Estaduais e Municipais (AFSCME), os seus mem¬
bros “anseiam sugerir”.Conhecem o trabalho medíocre realizado
por muitas instituições públicas. Se a mudança significar perda
salarial ou de poder de negociação, não estarão interessadas. “Mas,
se for uma questão de novas oportunidades, estão todos famintos
por elas.”
Os sindicatos do setor público estão praticamente na mesma
situação que estavam seus correspondentes no setor privado —
quando a competição externa dizimou a indústria americana. São
capazes de resistir à mudança e assistir ao colapso de suas indús¬
trias, ou podem trabalhar em parceria com a administração para
reestruturar suas organizações e readquirir a confiança de
clientes — o público contribuinte.Quando Ron Contino assumiu o Centro de Equipamentos Moto¬
rizados, em New York, as relações entre trabalhadores e a gerência
eram desastrosas. Contino concluiu, pois, que seu primeiro gesto
seus
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288 REINVENTANDO O GOVERNO Governo descentralizado 289
teria de ser o estabelecimento de um comité de trabalhadores de alto
nível, de modo a provar, à força de trabalho, que estava disposto a
compartilhar o poder. Pediu a 20 sindicatos locais representativos
de seus trabalhadores que nomeassem os membros. “Eu disse:
Mande-me aquele ativista do seu sindicato que está sempre recla¬
mando da terrível situação existente e dizendo que tudo precisa
mudar”, relembra Contino. “É desse tipo que eu preciso.”
Os membros do Comité Trabalhista foram liberados de suas ou¬
tras obrigações. Dedicavam-se exclusivamente a melhorar a organi¬
zação. Faziam visitas aos locais de trabalho e perguntavam a seus
colegas como seu trabalho poderia ser melhorado, trazendo suges¬
tões concretas, que apresentavam a Contino e seus principais cola¬
boradores em encontros semanais. Em um ano e meio, estas suges¬
tões já tinham produzido economias da ordem de US$2 milhões. Ao
perceberem que seus representantes tinham poder legítimo, os tra¬
balhadores começavam a se manifestar, trazendo número cada vez
maior de sugestões.Tendo conquistado sua confiança, Contino criou
então os comités de gerenciamento do trabalho em vários pontos da
organização. Esses comités ajudavam o desenvolvimento de centros
de lucro, como também as iniciativas de contratação interna descri¬
tas no capítulo 3, que permitiram economizar, também, milhões de
dólares.
Muitos sindicatos estavam prontos para este tipo de parceria. A
AFSCME agora negocia comités de gerenciamento do trabalho em
muitos de seus contratos. Em Rochester e Dade County, a Federa¬
ção Americana de Professores tem sido um parceiro importante na
consecução de importantes esforços de reforma educa-cional. Em
Madison, os sindicatos têm sido importantes aliados no processo de
Administração de Qualidade Total.
Políticas de não-demissão
Talvez a melhor maneira de garantir a cooperação sindical seja
mediante a adoção de uma política de não-demissão. Como vimos no
capítulo 1, a maioria dos governos perde 10% de seus empregados
a cada ano, de modo que atritos sempre dão lugar a maior flexibili¬
dade. Os governos não precisam garantir às pessoas o emprego
específico que já têm, mas podem garantir-lhes um emprego com
salário correspondente. Foi o que se fez em Visalia. Phoenix garantiu
empregos, embora nem sempre com salários correspondentes.
O Quarto Distrito de East Harlem não demitiu nenhum professor.
Ninguém quer criar inovações para depois deixar as pessoas sem
emprego. Mas quando os empregados sabem que têm segurança,
sua atitude em relação às inovações muda completamente. Em
Phoenix, vários funcionários já propuseram a eliminação de seus
cargos. Uma vez que os empregados de Phoenix têm direito a guardar
para si 10% das economias, geradas no primeiro ano pelo programa
de sugestões da cidade, eles não apenas estão mudando de empre¬
go, mas acumulando vários bónus no processo.
Horizontalizando a organização hierárquica
A mais séria resistência ao trabalho de equipe e à administração
participativa vem dos administradores medíocres, não dos sindica¬
tos. Muito freqúentemente se interpõem no caminho, impedindo a
ação, pois seu instinto básico, que lhes justifica a própria existência,
é o de simplesmente interferir.Como bem expressaram Peters e
Waterman, agem como uma esponja e bloqueiam todas as idéias,
sejam elas boas ou más.
Com os sistemas computadorizados de hoje, os administradores
também dispõem de tanta informação que são capazes de supervi¬
sionar um número muito maior de pessoas do que podiam fazer no
passado. A abrangência de seu controle é mais amplo. Se as orga¬
nizações mantiverem todas as suas camadas administrativas e caso
os administradores medíocres continuem desempenhando seu papel
característico, um controle excessivo logo se manifesta. Por isso, as
organizações participativas acreditam que devem eliminar algumas
dessas camadas e horizontalizar suas hierarquias. David Couper
eliminou a camada de subchefes que o separava dos seus coman¬
dantes, Phoenix eliminou 39 administradores médios em um só ano,
por meio de um programa de aposentadoria proporcional. (No pro¬
cesso, lucrou US$1,5 milhão.) A Faculdade Técnica Fox Valley eli¬
minou um vice-presidente e seis posições intermediárias de adminis¬
tração ao longo dos últimos três anos, simplesmente deixando de
substituir algumas pessoas que se aposentaram.
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FORMASETÉCNICASDA
ADMINISTRAÇÃOPARTICIPATIVA Tanto Phoenix quanto
a Faculdade Técnica Fox Valley ouvem as
opiniões de seus empregados todos os anos. Quando uma pesquisa
dessa natureza, realizada no Departamento de Polícia de Madison,
revelou a insatisfação com o critério de promoções vigente, seu chefe
solicitou a uma equipe de funcionários que criasse um sistema total¬
mente novo.
A Avaliação dos Administradores pelosEmpregados, embora ainda
pouco utilizada como método, pode se revelar extremamente podero¬
sa. Os Supervisores do Departamento de Polícia de Madison desen¬
volveram um sistema de comparação de dados no qual se obtém um
feedback de quatro categorias: dos funcionários, de seus colegas, de
seus chefes e deles próprios.
As Políticas de Invenção ajudam os empregados a patentear e desen¬
volver novos produtos ou processos que tenham inventado. Em Visalia
separa-se o dinheiro para garantir a patente. Posteriormente pode-se
ajudar no desenvolvimento do projeto ou deixar que o próprio empre¬
gado cuide disso. Pode-se também ajudar empregado na transferência
dos direitos de invenção a uma empresa privada. O Estado de Oregon
e um de seus empregados detêm propriedade sobre a invenção de um
processo de divisão das faixas das autoestradas.
As Campanhas de Inovação encorajam as equipes de empregados a
inovar, enaltecendo os valores daqueles que o fazem. O programa
STEP de Minnesota, descrito no capítulo 9,é um exemplo, mas no
Hawaii e no Estado de Washington existem programas similares. No
Programa de Incentivo ao Trabalho de Equipe, grupos de empregados
que desejem fazer mudanças na prestação de serviço, reduzir custos
ou, mesmo, aumentar as receitas, candidatam-se à um comité de pro¬
dutividade. Se as suas idéias puderem ser aplicadas com êxito, 25%
dos ganhos monetários são repassados a eles. Em seus primeiros sete
anos de vigência o programa poupou ao estado US$ 50 milhões.
Os Programas de Premiação são utilizados em quase todas as orga¬
nizações empreendedoras, como forma de homenagear grandes
ços. O Prémio Groo, do Serviço Florestal Nacional nos Estados Unidos,
é o programa de premiação mais participativo que se tem notícia: a
cada ano, cada empregado pode dar a um outro colega um prémio por
bom rendimento profissional. O prémio leva o nome de seu inventor,
Tyler Groo.
A administração participativa varia quanto ao alcance e qualidade.
Alguns fatores são “decorativos” ao passo que outros, revolucionári¬
os. Alguns administradores querem simplesmente extrair mais de seus
empregados, sem dividir com eles o poder. Outros encaram seus em¬
pregados como parceiros de verdade, com quem podem dividir as
responsabilidades sobre qualquer aspecto relacionado à produtividade
ou qualidade de trabalho da organização. Quanto mais caminhar nesta
direção maior a compensação para a organização. Inúmeros mecanis¬
mos podem ser de grande auxílio:
Os Círculos de Qualidade são equipes temporárias, voluntariamente
formadas, e se utilizam dos métodos de Deming para o aperfeiçoamen¬
to dos processos de trabalho. Concentram-se em um problema a resol¬
ver ou em um processo que queiram aperfeiçoar. Mensuram os resul¬
tados; analisam os dados pinçando as prováveis causas; delineam e
implementam as soluções; checam os resultados; refinam ainda mais
as soluções; e tentam novamente. Na Administração de Qualidade
Total, essas equipes “Planejam, Executam, Avaliam e Atuam.”
Os Comités Trabalho - Administração oferecem aos administrado¬
res, bem como aos seus representantes trabalhistas, um fórum perma¬
nente para a discussão de suas idéias. O Departamento de Obras
Públicas de Phoenix, por exemplo, utiliza não só círculos de qualidade
para atacar problemas específicos, como também mantém comités de
administração do trabalho de modo a manter sempre abertas as linhas
de comunicação para as questões importantes.
Os Programas de Desenvolvimento Funcional ajudam os trabalha¬
dores a desenvolver seus talentos e habilidades através de sessões de
treinamento, workshops etc. As organizações que internamente ofere¬
cem tais oportunidades, condicionando-as a futuras promoções, de¬
senvolvem nos empregados grande lealdade e compromisso. Em
certo setor de Visalia, onde os funcionários municipais administram
todo o programa, tanto o diretor de pessoal quanto o administrador de
risco eram ex-policiais. O administrador do aeroporto era um secretá¬
rio com muitos anos de trabalho.
As Pesquisas de Opinião dão aos líderes mais informações acerca dos
sentimentos de seus empregados do que qualquer outro método.
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avan-
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REINVENTANDO O GOVERNO Governo descentralizado292 293
A ORGANIZAÇÃO DO TRABALHO DE EQUIPE Em 1972, o psicólogo social Roger Harrison explicou por que as
organizações empreendedoras apostam tanto no trabalho das equi¬
pes. Harrison dividiu as organizações em quatro tipos básicos:
as que são orientadas pelo poder, incluindo muitos negó¬
cios tradicionais, são autocráticas e hierarquizadas;
as que são orientadas por papéis específicos, como as
burocracias governamentais tradicionais, são cuidadosa¬
mente ordenadas por regras, procedimentos e hierarquias.
as que são orientadas por uma tarefa, como negócios ori¬
entados pela tecnologia, são extremamente flexíveis e ori¬
entadas segundo resultados; e
as que são orientadas a pessoas, como os grupos
assistenciais, existem somente para servir às necessidades
de seus membros.
Onde quer que encontremos organizações participativas, encontra¬
mos, também, equipes de trabalho. Madison usou os chamados
círculos de qualidade; o Comando Tático Aéreo contava com seus
esquadrões; e o Centro de Equipamentos Motorizados usava equi¬
pes de trabalhadores de todos os tipos. Visalia e St. Paul, constan¬
temente, criavam equipes intradepartamentais para o desenvolvi¬
mento de novos projetos. As escolas de East Harlem eram adminis¬
tradas por equipes. Isso não se dá por acaso. Quando as organiza¬
ções colocam a autoridade nas mãos dos funcionários, rapidamente
descobrem que, para chegarem ao ponto de poder opinar nas gran¬
des questões e tomadas de decisões, esses funcionários precisam
trabalhar juntos, em equipes.
Peters e Waterman descrevem um comportamento idêntico nas
empresas privadas. “Pequenos grupos são unidades bastante sim¬
ples. São os tijolos com os quais se erguem excelentes empresas.”
Escreveram, ainda:
Essas pequenas unidades e partes do todo podem apresentar
denominação variada — campeões, equipes, forças-tarefa,cabeças, centros de projetos, skunk works e círculos de qua¬
lidade, mas têm uma coisa em comum. Nunca constam do
organogramaformal da organização e, raramente, podem ser
encontradas na lista telefónica da empresa. No entanto, são
a parte mais visível da estrutura e que dá vida às empresas.
Há cerca de 25 anos, em The Age of Discontinuity, Peter Drucker
explicou o porquê da necessidade de trabalho em equipe por parte
dos trabalhadores pensantes:
Os trabalhadores pensantes ainda sentem falta de um
supervisor... Mas o trabalho intelectual, em si, não conhece
hierarquia, pois não há conhecimento superior ou inferior. O
conhecimento pode ser relevante em uma dada tarefa ou não.
A tarefa é que determina e não o nome, nem o orçamento, nem
a disciplina, nem a posição do indivíduo que se ocupa dela
O conhecimento, portanto, tem de ser organizado com
uma equipe na qual a tarefa é que deve ditar quem é o
responsável, por quê, e por quanto tempo.
As organizações empreendedoras caem claramente na classe das
que se orientam por tarefa. Tais organizações fazem o que tiverem
de fazer para atingir seus resultados. Segundo explicou Harrison,
modificam suas estruturas e procedimentos de acordo com suas
tarefas. Constantemente, estabelecem equipes de trabalho e forças-
tarefa. “Esses sistemas temporários podem ser ativados rapida¬
mente, equipados com a necessária mistura de capacidades e ha¬
bilidades e, depois, desativados quando a tarefa estiver concluída.
Sua utilização oferece algo que, na verdade, é uma estrutura orga¬
nizacional em constante variação”, escreveu Harrison. Como resul¬
tado, “o mais forte poder das organizações orientadas por tarefas é
a capacidade de lidar com circunstâncias mutantes e complexas.” De
modo contrastante, organizações orientadas para o poder e para o
desempenho de papéis específicos têm problemas quando lidamcom
mudanças, pois ambas “associam o controle a um cargo na orga¬
nização; nenhuma delas tem a capacidade de redesignar, rápida e
racionalmente, pessoas apropriadas às posições chaves”.
Organizações centralizadas, hierarquizadas, subdividem-se, tam¬
bém, em várias outras camadas e estruturas. As pessoas começam
a se identificar com sua própria unidade, ou seja, seu próprio terri¬
tório. A comunicação entre unidades e entre as várias camadas
administrativas que vão se formando, vai ficando difícil. Isso explica
por que as organizações inovadoras usam as equipes com tanta
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Governo descentralizadoREINVENTANDO O GOVERNO 295294
frequência, como afirma Rosabeth Moss Kanter:
“O primeiro grande obstáculo às inovações decorre da
segmentação”, escreveu Kanter em seu livro The Change Masters:
“uma estrutura altamente subdividida em departamentos e níveis,
todos eles cercados e com uma série de restrições de comunicação.
Tudo muito bem protegido.” Mesmo se uma inovação for bem-
sucedida, dificilmente se disseminará, pois a comunicação entre os
departamentos é mínima e as cercas, altas demais.
Por outro lado, organizações criativas patrocinam a comunicação
constante, para que a informação flua rapidamente, chegando a
todos. Para tanto, estão constantemente criando novas equipes e
configurações e, com isso, quase todo mundo mantém contato com
quase todo mundo. “Nas organizações inovadoras”, diz Kanter, “a
divisão do trabalho é ampla”, as lotações são “polivalentes, não-
rotineiras e orientadas para mudanças”; “as jurisdições profissio¬
nais se confundem”, e os empregados têm bastante “autonomia
local” para “prosseguir em processos adiantados de trabalho sem
precisar de aprovação executiva de alto escalão.”
Madison ilustra o argumento de Kanter perfeitamente. Quando
o prefeito Sensenbrenner introduziu a Administração de Qualidade
Total, rapidamente descobriu que as altas cercas que separam os
departamentos constituíam as maiores barreiras ao desenvolvimen¬
to de qualidade e inovação. Seu primeiro time de qualidade, na
Divisão de Equipamentos Motorizados, isolou, como uma das cau¬
sas dos problemas de manutenção dos veículos, a política da cidade
de exigir sempre a compra dos componentes mais baratos (e, conse¬
quentemente, de pior qualidade). Sensenbrenner e seu time decidi¬
ram verificar se seria possível alterar a política. Primeiramente, visi¬
taram o setor encarregado da compra dos componentes, que concor¬
dou que a política era pouco inteligente, mas culpou o setor central
de compras, cujo pessoal, por sua vez, também concordou, mas
disse que a tesouraria não lhes permitia alterar o procedimento. Em
visita à tesouraria, o tesoureiro também não discordava, mas disse
que o procurador municipal jamais aprovaria uma mudança na polí¬
tica adotada. Finalmente, chegaram até o procurador da cidade.
Querem saber o que ele disse? “Ora, é claro que pode fazê-lo... Na
verdade, eu pensava que vocês já estavam fazendo isso.”
“Isto”, diz Sensenbrenner, “foi o exemplo que faltava.”
Além da capacidade de inovar, concluir tarefas e responder ra¬
pidamente a mudanças ambientais, o trabalho de equipe apresenta
uma série de outros pontos fortes:
as equipes interdepartamentais trazem diferentes perspec-
tivas de abordagem de problemas ou oportunidades,
surgidas em diferentes pontos da organização. As pessoas
isoladas em seus departamentos, vêem apenas os sintomas
locais dos problemas. As equipes podem enxergar o proble¬
ma como um todo;
os membros de uma equipe, diante do maior número de
perspectivas, começam a pensar de maneira transcendente
a seus departamentos. Quando incorporam esse novo há¬
bito à rotina de trabalho de seus departamentos, acabam
descobrindo novas maneiras de realizar o que desejam;
as equipes derrubam as cercas que isolam os departamen¬
tos, incentivando a cooperação entre eles. “Os casos não
mais se encaixam perfeitamente dentro do âmbito de um
mesmo departamento, e as organizações que não se dão
conta disso, certamente passarão por muitas frustrações e
não se adequarão apropriadamente às mudanças contem¬
porâneas”, diz George Britton, administrador municipal de
Phoenix;
as equipes criam redes duradouras de trabalho que se es¬
palham por toda a organização, pois todos acabam conhe¬
cendo as pessoas que pensam de modo semelhante em
outros departamentos. As idéias e a informação fluemmais
rapidamente, e a ação se torna mais fácil. Para conseguir
algo significativo dentro de uma grande organização, todo
empreendedor precisa contar com uma rede informal de
aliados; e
os equipes conseguem manter funcionários de alto padrão,
introduzindo mecanismos de controle mais sutis e aceitá¬
veis do que as avaliações formais e as ordens de cima para
baixo. No East Harlem, onde pequenas equipes de profes¬
sores comandam a maioria das escolas, os professores que
não produzem “caem por conta própria, pois a própria pres¬
são criada em seu grupo os induz a isso”, diz John Falco.L L
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Governo descentralizado 297REINVENTANDO O GOVERNO296
o desperdício e a má-administração. Espoliou os funcionários da
pior maneira possível: proibindo-os de adquirir novos arquivos
suspensos, eliminando alguns abajures e proibindo a presença de
cafeteiras elétricas nas repartições do governo. Até hoje, os fun¬
cionários de Minnesota se lembram do dia em que o governador
confiscou suas cafeteiras. Em 1978, muitos deles se vingaram nas
eleições, levando Perpich a um inesperado fracasso.
Pelos quatro anos que se seguiram, Perpich trabalhou para a
Control Data Corporation, em seu escritório em Viena. Lá, pôde
aprender muito sobre como administrar trabalhadores pensantes.
Jamais esqueceu a fúria dos empregados austríacos, quando seus
superiores americanos os proibiram de manter garrafas de vinho no
frigo-bar de seus escritórios.
Quando foi reeleito, em 1982, Minnesota deparava, novamente,
com sérias questões fiscais. Seu primeiro impulso foi criar um grupo
empresarial, algo como a Comissão Grace, que fizera um levantamen¬
to do desperdício no governo federal, apresentando, depois, um
relatório que, até hoje, pode ser visto coberto de poeira em muitas
estantes do serviço público. Perpich pretendia denominá-lo Alme¬
jando Eficiência e Produtividade. Afortunadamente, convidou o
presidente da Dayton-Hudson, William Andres, para dividir com ele
a chefia do tal grupo.
Andres sabia que produtividade não é algo que se possa impor.
Tinha de ser construída internamente, de baixo para cima. “Para
tanto, é preciso dar maiores poderes aos empregados, deixando que
façam o que seja certo”, disse ele a Peter Hutchinson, vice-presi-
dente indicado por ele para o projeto. “Quando se ajuda às pessoas
a descobrir o que é certo, dando-lhes poder para executar suas
descobertas, os resultados são sensacionais. Resultados com os
quais qualquer pessoa isolada num escritório jamais poderia so¬
nhar.” Hutchinson transmitiu o recado ao grupo de trabalho reunido
por Sandra Hale, assessora administrativa de Perpich, para o desen¬
volvimento de projetos como o STEP. Propuseram uma nova abor¬
dagem, orientada pelo trabalho de equipe e pela ação com um nome
diferente, e o governador concordou.
O programa era simples. Perpich designava'um conselho STEP,
que era co-presidido por Andres. O conselho solicitava aos funci¬
onários que encaminhassem propostas inovadoras e fazia, das mais
promissoras, projetos do STEP. Os critérios utilizados eram os mes-
“Uma única maçã podre estraga todo o bolo. Eles fazem
pressão. Esses professores olham para si mesmos e vêm
falar comigo. Chegam e dizem: Não consigo render aqui.
Muitos deles preferem se transferir para outro lugar ou
abandonar definitivamente o sistema.”
CRIANDO UM FACILITADOR INSTITUCIONAL
PARA INOVAÇÃO DE BAIXO PARA CIMA
Para ser bem-sucedida, uma organização participativa precisa não
apenas dar poder a seus empregados e equipes, mas também prote¬
ção.Nem todos os administradores apreciam a idéia de ver seus
funcionários tomando decisões por aí. Muitos dos esforços por uma
administração participativa do começo da década de 80 fracassaram,
na verdade, por falta de apoio por parte dos administradores. Em
Madison, os administradores eram tão arredios à idéia de Adminis¬
tração de Qualidade Total, em seus primeiros anos, que, a certa
altura, todo um time de qualidade se demitiu.
A administração participators é também um negócio arriscado,
pois encoraja os funcionários a partilhar informações e a enfrentar
as questões subjacentes. No âmbito da Prefeitura ou do Legislativo
estadual, no qual os jornalistas estão sempre à procura de conflitos
e vazamentos de informação, isto pode significar uma propaganda
negativa. “A cautela diante do risco constitui um dos principais
temores que limitam o avanço dos administradores públicos” em
seus esforços participativos, segundo Robert Krim, que gerencia um
Consórcio de Administração em Boston, uma firma público-privada
de consultoria criada para prestar auxílio aos departamentos da
cidade.
Rudy Perpich, governador de Minnesota de 76 a 79 e de 83 a 91,
criou uma solução interessante: uma espécie de campeão, destinado
a dar maior proteção e poderes aos empreendedores existentes na
burocracia. Denominado Esforço pela Excelência da Performance
ou, simplesmente, STEP, (Strive Toward Excellence in Performance),
revelou-se bastante eficiente, a ponto de merecer um dos primeiros
prémios para inovação da Fundação Ford.
O STEP tinha uma história bem interessante. Durante seu primeiro
mandato como governador, Perpich aprendeu, a duras penas, que
muitos funcionários públicos simplesmente odeiam decretos impos¬
tos de cima para baixo. Para cortar os gastos, criou um comité contra
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Governo descentralizadoREINVENTANDO O GOVERNO 299298
litação aos motoristas, reduziu à metade o tempo de espera para os
clientes. Outro projeto ajudou também o Departamento de Recursos
Naturais a se livrar de amontoados de reclamações generalizadas
contra discriminação racial, senhorios, empregadores e bancos. Este,
em especial, demonstrou o papel do STEP de incentivo à inovação
e como mecanismo formal de proteção aos empreendedores. Quando
um diretor do Departamento se recusou a dar a seu pessoal tempo
necessário para que pudesse desenvolver o novo programa, o dire¬
tor executivo do STEP o ameaçou, dizendo que, se o projeto fracas¬
sasse, iria responsabilizá-lo por isso perante a alta administração.
No dia seguinte, o diretor voltou atrás.
A administração Perpich aprendeu um sem-número de lições
valiosas com o programa STEP, que foram resumidas em um livro
intitulado Managing Change: A Guide to Producing Innovation
from Within. Uma delas foi a de que a inovação surge de baixo para
cima.“Pelo menos um terço dos administradores do projeto STEP
são empregados de campo, não gerentes de nível alto ou intermedi¬
ário”, relata o livro. Outra lição foi a de que projetos administrados
por equipes são mais bem-sucedidos do que projetos individual¬
mente administrados. Uma terceira foi a de que a descentralização
requer um compromisso sério por parte da alta direção. Sem o abso¬
luto apoio de Perpich, o STEP não teria funcionado. Ironicamente,
nas instituições e sistemas centralizados — sejam governos estadu¬ais, sistemas escolares ou programas federais — as pessoas dosaltos escalões precisam freqiíentemente alterar as regras, antes que
as camadas inferiores possam inovar. Boas idéias podem surgir de
baixo, mas, nos sistemas centralizados, são geralmente ignoradas.
Para dar poder de ação aos empregados, aqueles que determinam as
políticas precisam descentralizar a forma como são tomadas as de¬
cisões.
Novos prefeitos e governadores que, tão freqiientemente, criam
comissões para pôr fim ao desperdício e aumentar a produtividade,
poderiam aprender muito com a bem-sucedida história dos progra¬
mas STEP e com a desastrosa experiência de Perpich, em seu primeiro
mandato. O contraste ratifica uma de nossas máximas prediletas:
esforços pelo aumento da produtividade geralmente minam não só
a própria produtividade, mas também o moral; esforços para elevar
o moral dos trabalhadores, aumentando seus poderes, geralmente
aumentam não só o moral, mas também a produtividade.
mos verificados em todos os governos empreendedores que se
espalhavam pelos Estados Unidos. Os projetos STEP tinham de ser
propostos por uma equipe, não deviam requerer injeção de novos
recursos e tinham de incorporar, pelo menos, um dos princípios
seguintes: voltar-se completamente ao cliente, administração
participativa, descentralização de autoridade, além de avaliação de
rendimentos, novas parcerias ou alta tecnologia.
O STEP aprovava um projeto, quando este dava às pessoas liber¬
dade para inovar, oferecia-lhes assistência técnica, forçava seus
chefes a que sentassem e ouvissem e, além disso, lhes dava prote¬
ção.
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Uma das primeiras equipes STEP convenceu o Departamento de
Recursos Naturais a mudar sua atitude em relação a seus clientes.
Durante a década de 80, a utilização dos 64 parques públicos deixava
de acontecer, e o orçamento se esvaía na tentativa de contornar o
problema. Um grupo de funcionários do Departamento decidiu que
era preciso uma nova abordagem de marketing. A equipe encami¬
nhou uma proposta de projeto STEP que obteve aprovação. Primei¬
ramente, essas pessoas pediram aos administradores que procuras¬
sem trazer à tona e identificar todas as necessidades possíveis de
seus clientes. Logo passaram a instalar novos brinquedos e play¬
grounds nos parques e sistemas de eletrificação nas áreas de cam¬
ping. Criaram então o Passport Club — uma espécie de programa de
benefícios para os visitantes mais frequentes, a fim de atraí-los a
parques mais distantes e menos utilizados. Em seguida, começaram
a aceitar cartões de crédito, fazendo propaganda e distribuindo
passes de entrada, como presentes de Natal. As vendas aumentaram
em 300%. Associaram-se, então, a uma empresa privada que melho¬
rou a qualidade de suas lojas de souvenir, e a venda desses itens
subiu em 50%. Finalmente, realizaram uma pesquisa de opinião entre
1.300 usuários do parque.
Durante o primeiro ano que se seguiu a esta estratégia de
marketing, o número de visitantes do parque subiu em 10%. Esses
números chamaram a atenção dos administradores do Departamen¬
to: em 1987, ao se criar o cargo de coordenador de marketing, a
equipe do programa STEP foi chamada para assumi-lo. Criou-se,
também, um Conselho de Inovações, destinado a criar e manter, no
Departamento, uma atmosfera de constante transformação.
Outro projeto STEP, na agência que expede as carteiras de habi-
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REINVENTANDO O GOVERNO Governo descentralizado300 301
INVESTINDO NO FUNCIONÁRIO Conselho Distrital da AFSCME, na cidade de New York, administra
sua própria universidade. “Nossos membros estão sedentos— quasedesesperados — por treinamento”, diz McGarrah.A descentralização só pode funcionar se os líderes estiverem dis¬postos a investir em seus funcionários. Como disse o general Creech
a respeito de seus soldados: “Não se pode tratá-los com desprezo,
alojá-los com desprezo e esperar que apresentem, em contrapartida,
um trabalho de qualidade.” A todomomento podemos verificar que as
organizações de mentalidade empreendedora pagam bem a seus funci¬
onários e se esforçam no sentido de melhorar a qualidade de seus
ambientes de trabalho. Além disso, investem alto em treinamento.
Ninguém quer que funcionários com treinamento medíocre sejam
encarregados de tomar decisões importantes. No entanto, poucos
governos investem em programas de treinamento. Não há estatísti¬
cas precisas, porém qualquer um que analise a questão se convence
de que o governo gasta bem menos com treinamento do que ocorre
com a iniciativa privada.
Durante os anos 80, a Comissão Nacional de Serviço Público, de
Paul Volcker, estimouque o governo federal gastava quase 1% de
sua folha de pagamento civil com programas de treinamento, em
comparação aos 3%da iniciativa privada. Em 90, a Comissão Revisora
da Administração, em Nova Jersey, relatou que o estado gasta com
treinamento e desenvolvimento o equivalente a apenas a 0,06% de
1% dos US$ 300 milhões de sua folha de pagamento, para os geren¬
tes e supervisores. A Western Electric, uma grande empresa desse
estado, gasta cem vezes mais do que isso.
Entendendo que estão inseridas agora em um mercado competi¬
tivo, em uma economia que privilegia o conhecimento, na qual o
aperfeiçoamento constante de habilidades é quase um pré-requisito
à própria sobrevivência, as empresas aumentaram, dramaticamente,
seus investimentos em programas de treinamento. Governos empre¬
sariais aprenderam a mesma lição. Visalia foi a primeira organização
externa a enviar seus gerentes à Hewlett-Packard para tomarem parte
de seus programas de treinamento. Madison investe alto em treina¬
mento. Phoenix oferece 25 cursos diferentes a seus funcionários, a
cada três meses. Como muitos governos, Phoenix oferece, ainda,
reembolso de mensalidades aos empregados que frequentem cursos
em instituições conveniadas.
Até mesmo alguns sindicatos investem em treinamento.
De acordo com Robert McGarrah, a AFSCME geralmente investe
dinheiro para que os órgãos públicos ofereçam treinamento. O 37®
DESCENTRALIZANDO O SISTEMA FEDERAL
Para muitos de nossos leitores a questão da descentralização é
sinónimo de federalismo. Durante as décadas de 60 e 70, em meio a
uma verdadeira explosão de movimentos nacionalistas nos Estados
Unidos, muitas atividades do governo foram excessivamente centra¬
lizadas. Entre 1963 e 1980, o Congresso criou 387 novos subsídios,
ou seja, diferentes fontes de recursos federais, sujeitos a uma gama
de regulamentos governamentais, para cobrir serviços prestados
por governos estaduais ou locais. Em 1977, representavam um em
cada US$ 4 gastos por esses governos. A despeito dos severos
cortes nos fundos e da aprovação de alguns poucos pacotes de
subsídios já comprometidos, 475 subsídios categorizados ainda
existiam em 1991. E o déficit federai só aumentava. O Congresso,
cada vez mais, lançava mão de subvenções para programas
categorizados, mesmo sem os fundos.
Já houve boas razões para centralizar responsabilidades. Duran¬
te a era industrial, dispunha-se, em Washington, de muito mais
informações que na maioria dos governos menores, estaduais e
municipais. Além disso, durante os anos 60, muitos governos esta¬
duais e municipais simplesmente não estavam dispostos a fazer o
que queria o povo americano, sobretudo no que se referia ao traba¬
lho duro da integração racial. Porém, 30 anos mais tarde, muitos
desses governos não só são mais eficientes que o governo federal,
mas, ainda, bem mais progressitas.
Líderes estaduais têm reclamado amargamente da excessiva regu¬
lamentação imposta, nos Estados Unidos, por Washington, durante
25 anos, e os líderes municipais apresentam, cada vez mais, o mesmo
tipo de queixa em relação aos governos estaduais. Ronald Reagan
prometia um novo federalismo, mas pouco fez senão cortar todo o
auxílio federal, deixando para trás o que alguns chamam âefedera¬
lismo de autodefesa. Obviamente, é hora de arrumar, inteligentemen¬
te, as regras federais, estaduais e municipais.
Não cabe, aqui, discutir completamente o programa em busca de
uma solução. Muitos livros já foram escritos sobre o assunto.
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:> Governo descentralizado 303REINVENTANDO O GOVERNO302
as missões e os resultados desejados, deixando os escalões mais
baixos do governo completamente livres para tentar consumá-los da
forma que acharem conveniente.
O que precisamos, realmente, é de um novo modelo de conces¬
sões de subsídios, estruturado segundo os princípios de governo
empreendedor. Durante os anos 80, o governador da Pensilvânia,
Richard Thornburgh, e seu chefe de polícia Walt Plosila, desenvol¬
veram um dos mais bem-sucedidos programas dos Estados Unidos
para a estimulação de inovações tecnológicas e iniciativas empreen¬
dedoras. A chamada Parceria Ben Franklin era fundamentalmente um
programa de subsídio a quatro redes regionais denominadas Cen¬
tros Avançados de Tecnologia. Cada centro oferecia subsídios idên¬
ticos, denominados Desafios, a pequenas empresas, organizações
acadêmicas e outras organizações que investiam em inovação
tecnológica.
No que nos interessa, a principal inovação foi o método de finan¬
ciamento desses centros. Todas as primaveras, cada um dos quatro
centros apresentava um pacote de solicitações para os Desafios.
Cada conselho estadual da Parceria Ben Franklin julgava cada sub¬
sídio potencial segundo o seguinte conjunto de critérios: o poten¬
cial do projeto para aplicação comercial, o número de empregos a
serem criados, o montante de investimento do setor privado exigido
etc. Reputava-os, também, com base em resultados anteriores de
cada centro, fundamentando-se em parâmetros tais como a criação
de empregos e a habilidade dos subsidiados de atrair capital priva¬
do. Os centros com as mais altas médias recebiam o dinheiro. A partir
daí, podiam realocar os recursos como quisessem.
Esta fórmula de financiamento forçava os centros a abraçar a
missão definida pelo estado— desenvolvimento comercial de ino¬vações tecnológicas — e a se esforçar por alcançar os resultadosdesejados pelo estado: criação de empregos na Pensilvânia e inves¬
timentos do setor privado. Porém, cada centro era livre para escolher
seus próprios métodos.
Traduzindo-se em nível federal, a abordagem sugeria a concessão
de benefícios em uma série de áreas de atuação diferentes.
O governo federal estabelecia um amplo critério, com base em diver¬
sos fatores, como necessidade, qualidade do programa, resultados
e envolvimento estadual ou local. Fazia, então, com que os governos
estaduais ou locais competissem pelos subsídios. Várias organiza-
Gostaríamos, simplesmente, de propor uma regrinha prática, articu¬
lada na Conferência Nacional de Legislativos Estaduais: a menos
que haja uma importante razão obrigando em sentido contrário, a
responsabilidade pela resolução dos problemas deve recair sobre o
mais baixo nível governamental possível.
Quanto mais próximo estiver um governo de seus cidadãos, maior
credibilidade terá. Isto já pôde ser comprovado em pesquisas. Quan¬
to mais próximo estiver, tanto mais responsáveis serão seus repre¬
sentantes, que tenderão, ainda, a elaborar soluções sob medida, ao
invés de se ocupar de promover programas que envolvam a todos.
Se fôssemos capazes de obedecer à essa regra básica, o governo
federal poderia ter menos empregados e prestar menos serviços
diretos, mas seu papel como diretriz da sociedade em nada se aba¬
laria. Em muitas áreas, ainda teria a responsabilidade de prover
fundos e determinar políticas, mesmo sem prestar os serviços. Entre
elas se incluem:
áreas de planejamento, que vão além da competência do
estado e dos municípios, tais como o comércio internacio¬
nal, as políticas macroeconômicas e grande parte das polí¬
ticas ambientais;
política de combate à pobreza, que requer investimento em
regiões com menos recursos financeiros. Aqui, o governo
federal precisa intervir de modo a equilibrar melhor a capa¬
cidade de investimento de cada área específica;
programas de seguridade social, como o seguro-social e o
salário-desemprego. Se quisermos benefícios justos e equi¬
librados em todo o país, não podemos esperar que estados
ricos e pobres contribuam na mesma proporção; e
investimentos tão altos que requeiram aumentos na carga
fiscal, e que podem determinar se empresas ficarão na cida¬
de ou a abandonarão (um exemplo evidente é a assistência
médica). Os estados fugirão de tais responsabiliades, com
medo de desencorajar os investimentos, a menos que o
governo federal assuma uma boa parte do custo financeiro.
Mesmo em boa partedesses casos, entretanto, os programas
podem ser desenvolvidos de modo a permitir significativa flexibili¬
dade em nível estadual ou municipal. O governo federal pode definir i
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rj 304 REINVENTANDO O GOVERNO
ções, incluindo o Comité pelo Federalismo e Causa Nacional, a
Coalizão Comunitária Nacional e a Fundação Heritage, propuseram
mecanismos dentro desta linha. O Congresso chegou a discutir a
aplicação de um programa competitivo de subsídios para o combate
às drogas.
Esta abordagem cria incentivos aos estados e municípios, mas
deixa, em suas mãos, todo o trabalho de desenvolvimento e adminis¬
tração dos programas. Valendo-se de um sistema de critérios base¬
ados no desempenho, o governo federal pode exercer controle sobre
a qualidade, sem, contanto, ditar o conteúdo e a estrutura do pro¬
grama. E ao fazer os governos competir, segundo um critério abso¬
lutamente racional, força-os à criação de novas estratégias empre¬
endedoras. Neste sentido, os desafios poderiam substituir perfeita¬
mente os subsídios categorizados e os demais, para formar o centro
de um genuíno Novo Federalismo.
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Governo orientado
para o mercado:
induzindo mudanças
através do mercado
Em vez de funcionar como fornecedores de determinados bens ou serviços
para a massa,... as organizações públicas governamentais estão assumin¬
do mais um papel facilitador, intermediário e, em mercados novos ou já
existentes, atuam na qualidade de investidores pioneiros. Muitas das
principais empresas privadas aprenderam, na última década, que este
papel mais empreendedor não pode ser bem executado pelas burocracias
tradicionais, ao estilo comando-e-execução.— Corporação para o Desenvolvimento Empresarial
Em 1930, se você quisesse comprar uma casa, teria economizado
50% do valor da transação, para fazer o pagamento inicial e pedido
ao seu banco uma hipoteca de cinco anos. Era, assim, que as pes¬
soas compravam casa em 1930, porque essa era a maneira como os
bancos faziam negócios. Durante o New Deal, a Secretaria Federal
de Habitação (FHA - Federal Housing Administration) inovou,
oferecendo uma nova forma de hipoteca com prestação inicial menor— só 20% do total — e um período de pagamento de 30 anos. Outrasagências governamentais criaram um mercado secundário, para que
os bancos pudessem repassar esses créditos. Com isso, o setor
bancário passou por uma conversão: o governo modificou o merca¬
do e, hoje, consideramos normais as hipotecas de 30 anos, com 20%
de pagamento inicial. Ora, vale a pena perguntar: nossa situação
seria melhor se Franklin Delano Roosevelt, o criador do New Deal,
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Governo orientado para o mercado 307306 REINVENTANDO O GOVERNO
administrativo. Acreditam que sua função é administrar e não
estruturar o mercado. Compartilham, com um vice-prefeito de Mos¬
cou, uma premissa silenciosa, conforme a história que nos conta E.
S. Savas. Esse vice-prefeito, comunista da velha guarda, ouviu com
ceticismo, a explicação dada por Savas sobre a necessidade de
adotar estratégias distintas para a prestação de serviços nas cidades
norte-americanas, complexas e diferentes entre si. Por fim, anunciou,
em tom definitivo: “Não se pode deixar que cada chefe de estação
prepare o horário dos trens. É preciso centralizar essa decisão: o
horário tem de ser controlado por alguém.”
Na verdade, as cidades não se assemelham às ferrovias e não
funcionam com horários rígidos. Elas não operam em uma linha
fixa, com uma só tarefa; aproximam-se, muito mais, dos mercados:
são agregados amplos e complexos de pessoas e instituições, cada
uma das quais tomando decisões constantemente e se ajustando ao
comportamento das demais, com base nos incentivos e nas informa¬
ções disponíveis.
Numa cidade, num estado, ou nação, os administradores não
podem “preparar o horário”, ou “controlar” as decisões. Pode haver
programas administrativos, controlando atividades específicas, in¬
clusive a administração de uma linha ferroviária;mas, para gerenciar
o conjunto da cidade, seus administradores precisam aprender a
navegar, conforme salientamos no capítulo 1. E estruturar o merca¬
do, talvez, seja o melhor método de navegação, criando incentivos
para que, com suas próprias decisões, as pessoas se movimentem
na direção escolhida pela comunidade.
Considerem-se os desafios enfrentados, hoje, pelos nossos go-
nos Estados Unidos: um sistema de saúde em crise; o meio
tivesse iniciado meia dúzia de programas para construir casas des¬
tinadas a famílias de renda baixa e média?
Ao inovar, lançando um novo modelo de hipoteca, a FHA estava
praticando uma forma de descentralização— diferente, é verdade, daque discutimos no capítulo 9. Com efeito, seria mais apropriado
chamá-la de não-centralização: a estratégia seguida pela FHA per¬
mitia que milhões de indivíduos e bancos tomassem suas próprias
decisões, para atingir um objetivo estabelecido pelo governo, sem
receber ordens superiores ou financiamento governamental.
O que a FHA fez, essencialmente, foi estruturar o mercado em
função de um objetivo público: um modo eficaz e económico de os
governos cumprirem suas metas. Ao identificar os incentivos que
podem induzir milhões de decisões individuais, os governos, com
frequência, podem realizar muito mais, do que mediante o custeio de
programas administrativos.
Um bom exemplo é o modo como, nos Estados Unidos, alguns
estados têm tratado o problema das latas e garrafas do lixo. No lugar
de instituir programas caros e elaborados de reciclagem, eles, sim¬
plesmente, determinaram que os consumidores fizessem obrigato¬
riamente um depósito de cinco centavos de dólar em cada lata ou
garrafa comprada — valor a ser restituído contra a entrega da lata
ou garrafa vazia. O público pôde ver a dramática diferença que fez
essa “lei do casco” nos estados que a adotaram: menos vidro que¬
brado nos parques e menos garrafas vazias jogadas nas ruas, além
de um volume menor de lixo levado para os aterros. Os que ainda não
têm essa experiência, por morar em estados onde não há tal sistema,
podem ler os levantamentos que documentam suas consequências:
nas ruas de New York, meio milhão de garrafas a menos, cada dia;
redução de 4% no peso do lixo recolhido em todo o estado; e vidro
quebrado, encontrado só em 16% dos parques de Boston.
Nos Estados Unidos, os governos sempre usaram, em algumas
medidas, os mecanismos do mercado para alcançar seus objetivos.
Há muito empregamos o zoneamento urbano para manter o cres¬
cimento das nossas cidades e dos incentivos fiscais, visando influ¬
enciar os gastos dos indivíduos e das empresas. Sempre estabele¬
cemos as regras do mercado, mudando-as, muitas vezes, quando
queremos resultados diferentes.
Mas, ao serem confrontados com um problema, os funcionários
governamentais reagem, instintivamente, procurando um programa
vernos,
ambiente ameaçado, como nunca antes; uma economia global em
que os trabalhadores precisam aprimorar, dramaticamente, sua edu¬
cação e seu treinamento, durante suas carreiras; mudanças na estru¬
tura familiar que tomam o atendimento infantil de boa qualidade uma
necessidade virtual. Será que os nossos governos têm a capacidade
de resolver esses problemas, aumentando os impostos e gastando
mais dinheiro? No contexto político e fiscal contemporâneo, a res¬
posta é clara. Assim como o New Deal de Roosevelt não podia
financiar a construção de todas as casas de custo médio de que o
país necessitava, hoje nossos governos não têm condições de as¬
segurar toda a assistência médica, a proteção ambiental, bem como
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ri REINVENTANDO O GOVERNO Governo orientado para o mercado308 309
o treinamento de trabalhadores e os cuidados à infância de que
precisamos. Isto seria impensável.
Se isto é verdade, quer dizer que os governos não têm alternativa
para a abordagem não centralizadora; precisam utilizar essa podero¬
sa alavancagem para estruturar o mercado, de modo que milhões de

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