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Revista Enfermagem Integrada – Ipatinga: Unileste-MG - V.4 - N.1 - Jul./Ago. 2011. 637 A PESSOA COM EPILEPSIA E O MERCADO DE TRABALHO THE PERSON WITH EPILEPSY AND THE LABOR MARKET Adaliany Darly Fernandes Cardoso Enfermeira. Graduada pelo Centro Universitário do Leste de Minas Gerais – UnilesteMG. Neila Maria de Morais Pinto Enfermeira. Especialista em Saúde Pública. Especialista em Ativação de Processos de Ensino na Formação Superior de Profissionais da Saúde. Docente do Curso de Enfermagem do Centro Universitário do Leste de Minas Gerais – UnilesteMG. RESUMO O trabalho ocupa lugar central na dinâmica da sociedade moderna. Dessa forma, os controles culturais desfavoráveis ao ajustamento social do epiléptico dificultam-lhe o acesso ao mercado de trabalho e, portanto, a estabilidade social, contribuindo para seu isolamento e favorecendo consequentemente a existência de patologias psicossociais. A epilepsia ainda carrega grandes mitos, tabus e preconceitos, dificultando assim a vida de pessoas que enfrentam esse problema de saúde. O objetivo da pesquisa foi conhecer como ocorre a inserção de pessoas com epilepsia, na sociedade em especial no âmbito do trabalho. Trata-se de um estudo do tipo descritivo com abordagem qualitativa. A coleta de dados foi realizada com as pessoas com epilepsia que freqüentam a Associação de Portadores de Epilepsia (AAPE) do município de Ipatinga/MG. Como instrumento foi elaborado uma entrevista semiestruturada contendo perguntas que caracterizavam as dificuldades enfrentadas pelas pessoas com epilepsia na tentativa de inserção no mercado de trabalho ou mesmo no convívio social. Os resultados obtidos no presente estudo demonstram que grande parte dos epilépticos sofre ou já sofreram algum tipo de exclusão social dificultando assim as condições de vida dos mesmos é até de seus familiares. PALAVRAS-CHAVE: Epilepsia. Trabalho. ABSTRACT The work plays a central role in the dynamics of modern society.Thus, cultural controls unfavorable social adjustment of epileptic hinder him access to the labor market and thus social stability, contributing to their isolation and thus favoring the existence of psychosocial dysfunctions. Epilepsy still carries great myths, taboos and prejudices, thus hindering the lives of people who face this health problem. The research objective was to learn through stories of people with epilepsy, difficulties in integration into society especially in the work. This is a descriptive study with a qualitative approach. Data collection was performed with epilepsy who attend the Association of People with Epilepsy (EPAA) of Ipatinga / MG. Instrument was developed as a semistructured interview containing questions that characterized the difficulties faced by epileptic in trying to insertion in the labor market or in social life. The results of this study show that most epileptics suffering or have suffered some kind of social exclusion, making it hard living conditions of those is up and their families. KEY WORDS: Epilepsia. Work. INTRODUÇÃO A palavra epilepsia é de origem grega e significa “ser tomado”. Esse nome surgiu devido à patologia ser vista pela sociedade daquela época como sendo de Revista Enfermagem Integrada – Ipatinga: Unileste-MG - V.4 - N.1 - Jul./Ago. 2011. 638 causa demoníaca ou espiritual, até antes de relatos definidos por Hipócrates, afirmando que epilepsia se tratava de uma doença do cérebro e não estava relacionada com espíritos (MIN, 2004). Somente no século XIX, pode-se estabelecer que “epilepsia é uma descarga elétrica anormal do tecido nervoso”, conclusão definida pelo médico John Huglins Jackson, e usada até hoje pela classe científica (SCOTT, 1993). A partir de então a epilepsia passou a ser vista como uma doença neurológica grave, crônica, porém comum, não é considerada uma doença contagiosa nem mental. Por um curto espaço de tempo, parte do cérebro deixa de funcionar de maneira habitual e passa a enviar descarga elétrica incorreta ao restante do sistema nervoso. Devido a essas modificações a Pessoa Com Epilepsia (PCE) apresenta alterações comportamentais súbitas, as chamadas “crises epilépticas”, que tendem a se repetir por toda sua vida (GOMES et al., 2006). Essas crises podem decorrer espontâneas ou secundárias a situações como: alterações vasculares, distúrbio eletrolítico, intoxicação, doenças degenerativas, febre. Seu início pode ser derivado ainda por um forte golpe na cabeça, abuso de álcool, drogas, infecção no cérebro, a causa pode estar ligada ainda a circunstâncias ocorridas antes do nascimento ou durante o parto. Na maioria dos casos tem etiologia desconhecida. O diagnóstico de epilepsia é clínico. O médico deve avaliar todos os aspectos de saúde do paciente, a procura de descobrir a natureza das crises, informações a respeito do que antecede, durante e depois a crise são de grande valia (JESUS; NOGUEIRA; OLIVEIRA , 2007). Apesar das decorrentes crises serem transitórias, o indivíduo diante da imprevisibilidade das mesmas, sente-se incapaz de administrar sua própria vida, podendo apresentar alterações psíquicas e dificuldade de relacionamento consigo e com a sociedade, além de tornar-se dependente de terceiros, fazendo assim com que se sinta inseguro e com extremo medo da morte (FERNANDES et al., 2001). Segundo estudos que retratam a epilepsia, constata-se que a decorrência de crises leva a múltiplas formas de exclusão e controle social das pessoas que vivem com epilepsia. Mitos, preconceitos, estigmas se fazem presente na sociedade, o que afeta negativamente a qualidade de vida dessas pessoas e de seus familiares (FERNANDES et al., 2004). O preconceito é a queixa principal de pessoas com epilepsia perante a sociedade, que ainda se alimenta de estigmas, tornando a vida desses mais difícil do que viver com as limitações físicas impostas pelas crises e tratamentos. Assim, este fator contribui para baixa autoestima desses indivíduos os levando a sentimentos de inferioridade e até mesmo, uma possível depressão (GUERREIRO, 2004). São escassas as publicações sobre as ações de enfermagem para os indivíduos com epilepsia. No entanto, é de responsabilidade da equipe de saúde, incluindo a enfermagem, oferecer esclarecimentos a população sobre a doença, seus aspectos clínicos e cuidados com as pessoas que possuem essas necessidades, colaborando na elaboração de políticas públicas de saúde mais adequadas e que favoreçam a inserção de pessoas com epilepsia na sociedade como um todo. A participação de enfermeiro treinado no atendimento das PCE é atualmente estimulada com destaque principal em prover informações, aconselhamento, suporte e coordenação da atenção entre os níveis primários e secundários (KEDE; MULLER; GOMES, 2008). Revista Enfermagem Integrada – Ipatinga: Unileste-MG - V.4 - N.1 - Jul./Ago. 2011. 639 Assim, justificam-se o desenvolvimento de pesquisas com esta temática no intuito de colaborar para diminuir mitos, tabus, preconceitos e discriminação, em especial os encontrados no âmbito do ambiente de trabalho, contribuindo, parcialmente, para o conhecimento das questões que envolvem pessoas com epilepsia. Deste modo, este estudo objetivou identificar a visão de pessoas com epilepsia sobre sua inclusão na sociedadee os fatores que interferem na inserção/participação no mercado de trabalho, contribuindo para o conhecimento das questões que envolvem esta parcela da população. METODOLOGIA Trata-se de um estudo do tipo descritivo com abordagem qualitativa. Foram considerados como critérios de inclusão pessoas com epilepsia que frequentam a Associação de Apoio a Portadores de Epilepsia (AAPE), no município de Ipatinga- MG e que fossem maiores de 18 anos de idade. Na AAPE os participantes recebem apoio psicológico, para direcionamento de muitos que ainda estão em período de descoberta da doença. São realizadas reuniões semanais com o grupo, onde se motiva os mesmos a procurarem por um espaço na sociedade, além de capacitá-los para enfrentar a luta incessante do cotidiano, que inclui a busca de inserção no mercado de trabalho. No período da coleta de dados, maio a junho de 2010, a AAPE contava com cerca de 500 pessoas cadastradas, porém 76 pessoas associados participavam freqüentemente das reuniões divididos em grupos de aproximadamente 20 participantes por reunião. O projeto de pesquisa foi aprovado pela Associação de Apoio a Portadores de Epilepsia do município de Ipatinga–MG através da assinatura do Termo de Autorização para Realização da Pesquisa. Para a coleta de dados a pesquisadora se dirigiu à AAPE no horário das reuniões semanais, abordando as pessoas com epilepsia explicando-lhes o objetivo da pesquisa, assim como sua participação voluntária na mesma. Após a assinatura no termo de consentimento livre e esclarecido as entrevistas foram realizadas com as pessoas que compreenderam os procedimentos do estudo e manifestaram desejo de participar. Pelas características do método qualitativo de pesquisa, a mostra foi sendo definida pelo grau de saturação teórica das categorias estruturadas. Participaram do estudo 10 destes associados. Como instrumento para a coleta de dados, aplicou-se um roteiro de entrevista de autorelato estruturado contendo perguntas que revelam como ocorre a inserção de pessoa com epilepsia ao buscar oportunidade no mercado de trabalho. As entrevistas foram aplicadas em uma sala disponibilizada dentro do espaço físico da própria Associação, com horário agendado e adequado ao tempo do entrevistado, sendo gravadas em aparelho digital adequado a esta função. Cada pessoa foi abordada uma única vez, com tempo aproximado de 10 minutos para duração do encontro. Para análise dos dados, inicialmente foi realizada a transcrição dos relatos, leitura minuciosa e repetida das respostas obtidas, selecionadas as informações relevantes para o estudo, destacadas as idéias centrais. A partir da análise e interpretação dos dados, estabeleceu-se uma relação entre a visão dos pesquisados Revista Enfermagem Integrada – Ipatinga: Unileste-MG - V.4 - N.1 - Jul./Ago. 2011. 640 e o referencial teórico que geraram duas categorias de discussão: como a sociedade me vê sendo epiléptico e a inserção do trabalhador com epilepsia no contexto de trabalho. Como garantia de preservação do anonimato dos participantes, os mesmos foram identificados através da letra “P” de Participante acrescido de um número seqüencial. Esta pesquisa contemplou a Resolução 196/96 do Conselho Nacional em Saúde que regulamenta pesquisa com seres humanos (BRASIL, 2006). RESULTADOS E DISCUSSÃO Os dados de caracterização da amostra estão apresentados na TAB.1. Verificou-se que 6 dos participantes eram do sexo masculino e 4 do sexo feminino. Estes resultados, estão em concordância com Guerreiro et al. (2000) que referem discreta predominância da epilepsia no sexo masculino em relação ao sexo feminino. TABELA 1 - Caracterização dos participantes da pesquisa. Ipatinga, MG, 2010. Variáveis Freqüência (n) Percentual (%) Sexo Masculino Feminino Total Faixa etária 30-39 40-49 50-59 Total Estado civil Solteiros Casados Total Escolaridade Fundamental Completo Fundamental Incompleto Ensino Médio Incompleto Total Renda Pessoal Sem renda 1 a 2 salários mínimo 3 a mais salários mínimos Total 06 04 10 05 04 01 10 03 07 10 02 04 04 10 05 03 02 10 60 40 100 50 40 10 100 30 70 100 20 40 40 100 50 30 20 100 FONTE: dados da pesquisa Quanto à idade, a média foi de 40 anos, sendo 33 a menor e 51 a maior idade, dos sujeitos, demonstrando que estão numa fase bastante produtiva da vida. No que se refere à escolaridade, quatro participantes chegaram ao ensino médio, porém sem concluí-lo. O nível de escolaridade baixo da amostra é preocupante, pois pode ser fator desfavorável na qualidade do autocuidado, além de interferir negativamente Revista Enfermagem Integrada – Ipatinga: Unileste-MG - V.4 - N.1 - Jul./Ago. 2011. 641 na empregabilidade, pois empregadores poderão utilizá-lo como critério de exclusão na contratação ou utilizá-lo para oferecer salários mais baixos. A renda pessoal revela situação financeira delicada atingindo grande parte da amostra. Muitas vezes os custos com o tratamento são onerosos e a renda salarial torna-se insuficiente para atender todas as necessidades básicas do indivíduo, apresentando-se como fator limitador de acesso a medicamentos, exames e outros procedimentos que favoreçam o cuidado. Como a sociedade me vê tendo epilepsia A trajetória histórica da epilepsia vem mostrar sua contribuição para os conceitos errôneos da atualidade. No cotidiano, é possível observar na sociedade em geral e em grande parte dos familiares que estes não sabem o que significa a doença, surgindo causas das mais absurdas, reforçando o estigma e preconceito, advindos dos tempos mais remotos. Os entrevistados destacaram situações de exclusão social, muitas vezes ocorridas no próprio lar, pelos familiares como sendo a visão que têm da sociedade à respeito das pessoas com epilepsia, motivados pelo estigma e preconceito em relação à doença. A sociedade é o seguinte, eles não aceitam a epilepsia, dentro da própria casa da gente, sempre tem aquele negócio de medo, insegurança, a gente quer ter segurança, eu tenho segurança em tudo que eu faço, mas sempre tem aquele negócio da gente ta demorando muito, e vão atrás vê porque você está demorando muito. E isso é ruim porque a gente quer ter liberdade. (P8) Excluída, depois que eu adoeci achei que tinha amigos, mais eu só tinha era clientes, as pessoas hoje tem medo da gente na maioria dos casos eles acham que epilepsiapega é um contexto muito antigo que as pessoas falavam que baba pega, então isso é uma discriminação muito grande, por parte até de familiares eu senti que minha família se afastou de mim [...] (P10) À partir do momento que ocorre uma crise epiléptica e presença de salivação excessiva (mais conhecida popularmente como “baba”) instala-se um olhar diferente, um olhar estigmatizante sobre a pessoa com epilepsia, o que pode ser exemplificado através da fala de P10 quando cita que a salivação é vista pela população, de maneira errônea, como forma de contágio da epilepsia. O que condiz com o estudo de Guerreiro (2004), que declara que a queixa mais comum entre pessoas com epilepsia é o preconceito baseado em estigmas apresentados pela doença, como a idéia de que a sialorréia (salivação abundante) seria um meio de transmissão da doença. Situações do cotidiano confirmam a discriminação com pessoas com epilepsia como relatado pelos pesquisados: [...] a gente sente que as pessoas têm discriminação demais, por exemplo, eu chego na casa das pessoas elas me servem em copos separados, com medo de pegar epilepsia. (P10) Revista Enfermagem Integrada – Ipatinga: Unileste-MG - V.4 - N.1 - Jul./Ago. 2011. 642 Muito preconceito, na sociedade sobre epilepsia, abuso, discriminação já me negaram água eu passando mal, me negaram socorro. (P1) Os estigmas, preconceitos e medo, que esta doença ainda carrega por parte da sociedade se dão muitas vezes por falta de informação correta sobre o que desencadeia as crises, alimentando dessa forma condições inadequadas para convivência ou tratamento cotidiano de uma pessoa com epilepsia, levando muitas vezes essas pessoas a um isolamento social. Como apoio social alguns entrevistados citaram a participação em igreja e na associação AAPE, locais onde se sentem mais encorajados. Nesse sentido, destacam-se as seguintes narrativas: [...] amigos eu quase não tenho, hoje meus amigos são aqui na associação e na minha igreja. (P2) [...] hoje até que não é tanto depois que surgiu associação, porque eu me sentia uma pessoa ruim, agora me sinto melhor. (P9) O estigma e discriminação associados à epilepsia influenciam negativamente na qualidade de vida da pessoa e de sua família, muitas vezes impedindo-as de conduzir suas vidas dignamente, com interações significativas na sociedade. Assim, a participação em associações que buscam defender os direitos das pessoas com epilepsia, torna-se importante por oferecer mais segurança e diminuir a sensação de inferioridade, o que vai de encontro ao estudo de Fernandes et al.(2004) que ressaltam que a participação em grupos proporciona obtenção de melhores informações sobre epilepsia e, conseqüentemente, diminuição do preconceito associado. As associações ou os grupos de pacientes com epilepsia podem ser considerados um encontro de pessoas que compartilham da mesma problemática e, através dos mesmos, é criado um espaço que permite a troca de experiências e vivências. Auxilia no conhecimento de informações, na discussão de medos, ansiedades e confusões a respeito desta condição, sendo considerada uma oportunidade para compartilhar idéias, expressar sentimentos e trocar experiências. Além disso, as pessoas podem aumentar seus conhecimentos, discutir mágoas e desconfortos relacionados à epilepsia (FERNANDES, 2004). A TAB. 2 apresenta o perfil clínico dos participantes no que se refere ao uso de medicamentos antiepilépticos e frequência das crises de epilepsia. . TABELA 2 - Perfil Clínico dos participantes. Ipatinga, MG, 2010. Variáveis Freqüência (n) Percentual (%) Freqüência das crises epilépticas Diária Semanais Controlada Total Faz uso de medicação Sim Não Total 02 02 06 10 10 00 10 20 20 60 100 100 00 100 FONTE: dados da pesquisa Revista Enfermagem Integrada – Ipatinga: Unileste-MG - V.4 - N.1 - Jul./Ago. 2011. 643 Um dos cuidados fundamentais que a pessoa com epilepsia deve ter com sua saúde é o uso frequente e correto da medicação para controle das crises. A TAB. 2 demonstra que nesta pesquisa 100% dos participantes fazem uso de fármaco controlado e que apesar deste uso 40% apresentam crises. Sarmento e Minayo-Gomez (2000) ressaltam que, com o tratamento medicamentoso, 75% dos pacientes ficam assintomáticos e cerca de 5% têm crises eventuais. Assim, a enfermagem tem importante papel como mediadora da pessoa com epilepsia e a sua inclusão social e no mercado de trabalho contribuindo com a orientação no uso correto e regular da medicação, buscando favorecer na estabilidade da saúde, colaborando para evitar problemas psicossociais A inserção do trabalhador com epilepsia no contexto de trabalho A TAB. 3 apresenta as características profissionais dos pesquisados. Somente um participante alegou estar no mercado formal de trabalho, os demais ou estão no mercado informal ou aposentados. Contrariamente, em relação a experiências anteriores de trabalho, nove já trabalharam formalmente. Segundo Cafer et al. (2005), a falta de trabalho ou impossibilidade de trabalhar pode ser um evento estressor que acarreta prejuízos tanto na sociedade quanto perdas de produtividade social e familiar. A não admissão ou a demissão do trabalho devido ao fato de ter epilepsia foi revelada pelos participantes o que pode ser característico de ausência de informações corretas ou preconceito do empregador em relação à doença. Uma em cada cinco pessoas com epilepsia é demitida do trabalho e a razão para isso é a doença. Porém, o empregador nem sempre informa o motivo real da demissão. Legalmente, a empresa não pode demitir por causa de um acometimento ou porque o trabalhador é portador de uma doença. Assim, o motivo pode ser mascarado pelas mais diversas razões, inclusive por “corte de gastos”, entre outros. Dessa forma, fica o empregado sem recursos para argumentar ou questionar sua demissão (JESUS; NOGUEIRA; OLIVEIRA, 2007). Revista Enfermagem Integrada – Ipatinga: Unileste-MG - V.4 - N.1 - Jul./Ago. 2011. 644 TABELA 3 - Distribuição da amostra segundo situação trabalhista. Ipatinga, MG, 2010. Variáveis Freqüência (n) Percentual (%) Situação trabalhista atual Empregado Desempregado Total Já teve emprego anteriormente Sim Não Total Número de empregos nos últimos três anos 0-1 2-3 4-5 Total Já deixou de ser admitido por causa da epilepsia? Sim Não Total Já foi demitido de algum outro emprego por causa da doença? Sim Não Total 01 09 10 09 01 10 06 01 03 1007 03 10 06 04 10 10 90 100 90 10 100 60 10 30 100 70 30 100 60 40 100 FONTE: dados da pesquisa Segundo Guerreiro (2004), geralmente as pessoas com epilepsia escondem sua condição ao procurarem emprego, no entanto as faltas por doença e os acidentes de trabalho não são mais freqüentes em pessoas com epilepsia do que nos demais empregados. Ansiedade, medo, insegurança, foram sentimentos citados que geralmente são desencadeados e tornam-se prejudiciais quando pessoas com epilepsia tentam entrar no mercado de trabalho. Eu me questiono no caso, eu não tenho condições, porque o fato da ansiedade que eu sofro às vezes limita eu mesma de procurar um trabalho diferente do que eu fazia, eu já me sinto insegura. (P2) Depois que fui demitido eu fico um pouco inseguro, porque eu vou ter que mentir, eu tenho medo de fichar e acontecer outra crise. Inclusive eu estou afastado há 8 anos, a companhia me mandou embora, e hoje tentando lutar na justiça federal. (P5) Os entrevistados foram unânimes ao relatarem que, as condições não são favoráveis, as portas encontram-se fechadas, para entrar no mercado de trabalho. E que a discriminação por serem pessoas com epilepsia influencia no momento da entrevista. Revista Enfermagem Integrada – Ipatinga: Unileste-MG - V.4 - N.1 - Jul./Ago. 2011. 645 Fechado, porque as pessoas que eu conheço que tem epilepsia não conseguem nenhum emprego começando pela na triagem pra fazer entrevista de emprego, a primeira coisa que eles perguntam se faz uso de algum medicamento controlado e se tem algum tipo de doença, se a pessoa fala que tem epilepsia nenhuma empresa contrata. (P2) Eu acho muito difícil, pra pessoa conseguir fichar hoje, ela tem que mentir, porque se a pessoa fala que sofre as crises e que toma remédio controlado, nenhuma firma concede essa oportunidade de trabalho. (P7) A dificuldade em falar as verdadeiras condições de saúde, o uso de medicamentos controlados, durante a entrevista de emprego foram as questões mais alegadas pelos entrevistados, pois muitas vezes é necessário esconder as mesmas para garantir uma oportunidade de trabalho. Nessa perspectiva, Salgado e Souza (2002) identificaram o desemprego como um dos problemas que mais afeta uma pessoa com epilepsia na fase adulta. Diante da possibilidade de emprego os pacientes, geralmente, escolhem não informar aos empregadores sobre sua condição de saúde, por medo de exclusão. Uma vez inserida no mercado de trabalho a discriminação aparece novamente como problema rotineiro enfrentado por quem tem epilepsia. Além disso, certos efeitos da medicação como alterações cognitivas, podem reduzir a habilidade no trabalho. Levando o paciente a desenvolver uma autoavaliação negativa de si mesmo e do ambiente, e limitando sua tentativa de procurar um emprego melhor e suas relações de trabalho (SALGADO; SOUZA, 2002). CONCLUSÃO Com base nos dados encontrados foi possível evidenciar existência de estigmas e preconceitos da sociedade segundo a visão das pessoas com epilepsia pesquisadas. Os resultados mostraram que já passaram por algum tipo de transtorno para inserção na sociedade, o que os levam a se oprimirem devido a condições conflitantes que existem na relação entre sociedade e a patologia. Devido a essa relação conflitante até mesmo com o mundo do trabalho, frequentemente a pessoa com epilepsia é levada a renunciar a seus direitos o que lhe traz repercussões adversas na vida cotidiana, afetando sua saúde física e mental. Diante de tais condições, o enfermeiro por ter um contato mais próximo com a população, pode usar dessa proximidade para esclarecer dúvidas sobre a patologia; assim como promover a conscientização do indivíduo com epilepsia garantindo-lhe autoconfiança. Pois, como visto a epilepsia alimenta estigmas por falta de conhecimento correto de suas causas. Observa-se a necessidade de orientação da sociedade em geral visando a desmistificação de tabus e mitos, garantindo a qualidade de vida de pessoas com epilepsia, favorecendo para a implementação de políticas públicas sociais e de saúde voltadas para este segmento da população, influenciando na preparação para inserção e permanência do indivíduo com epilepsia no mercado de trabalho. REFERÊNCIAS Revista Enfermagem Integrada – Ipatinga: Unileste-MG - V.4 - N.1 - Jul./Ago. 2011. 646 BRASIL. Ministério da Saúde. Conselho Nacional de Saúde. Resolução nº. 196, de 10 de outubro de 1996. Estabelece diretrizes e normas regulamentadoras de pesquisa envolvendo seres humanos. Diário Oficial [da União], Brasília, n.201, 16 out.1996. CAFER, C. R. et al. Diagnósticos de enfermagem e proposta de intervenções para pacientes com lesão medular. Revista Acta Paulista de Enfermagem, São Paulo, v.18, n.4, p. 347-353, out./dez. 2005. 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